Meera me deu um sermão longo pra caramba no dia seguinte, porque eu agredi Ressler a ponto de deixá-lo inconsciente. Prometi que pediria desculpas para o agente, mas acabei não fazendo isso. Ele mereceu! Que coisa.

Bem, nós dois evitamos uma conversa por algum tempo, apenas conversando o essencial para as missões. Mas, por que eu me recusei a pedir desculpas, Meera me tirou do caso da vez, que envolvia o desaparecimento de Harold (Reddington disse que não falaria mais nomes até resolver um assunto pessoal).

Detestando a decisão da substituta do diretor assistente, eu fui para minha sala de treino, descontando minha ira num saco de areia. Treinei o suficiente para ficar com uma camada de suor na pele. Quando parei para tomar água, alguém entrou na sala.

—Malik mudou de ideia e vai me deixar sair também?-Perguntei, Ressler fez que não e se aproximou. –Não sei se você lembra, mas acertei sua cabeça com força semana passada, por que você se aproximou demais. Sugiro que se afaste, ou vai levar outro soco.

—Estou disposto a correr esse risco. –Abri a boca para avisar que era melhor ele não fazer isso, quando o agente me puxou pela cintura e me beijou.

Ok, isso era o que eu estava tentando evitar, e sabia que se realmente queria escapar disso tinha que empurra-lo, mas não o fiz, apenas correspondi.

—Você me chamou de infantil, impulsiva, inadequada, impossível, rebelde e grosseira. –Lembrei, me afastando um pouco. –Agora está me beijando?

—Não consegui evitar. –Sorri.

—Agora sabe por que o beijei naquele contêiner. –Passei os braços em volta do pescoço dele e o puxei para me beijar. Se alguém nos visse, provavelmente estaríamos encrencados, mas ninguém costumava aparecer na “minha sala” (onde havia apenas um saco de areia e um cano de pole dance). Alguma coisa vibrou entre nós, o celular dele. Me afastei, enquanto Ressler pegava o celular e lia alguma coisa.

—Tenho que ir.

—Nós precisamos conversar.

—Eu juro que conversamos quando voltar.

—Então tá. –Dei um último beijo rápido e o deixei sair. –O que foi isso?

Sorrindo, eu me virei e voltei a acertar o saco de areia.

***

Tomei um banho, troquei de roupa e fui direto para a grande sala de operações, onde toda a “magia” acontecia. Meera parecia nervosa e falava ao telefone, enquanto Keen mexia num curativo que tinha na testa. Olhei em volta, nada de Ressler. Os dois tinham ido juntos, então onde ele estava?

—Cadê o Ressler?-Perguntei. Elizabeth olhou pra mim, parecendo escolher o que falar. –Alguém cortou sua língua?

—Tivemos um... Pequeno problema na missão. O agente Ressler está no hospital. –Meu coração bateu mais rápido, cheio de preocupação.

—Ele está bem? O que ele tem?

—Ele está... Em coma. –Abri a boca, mas nada saiu. A sala pareceu se apagar na minha frente. Me apoiei em uma mesa, torcendo pra não desmaiar. –Está no hospital perto daqui, sem alterações. Jenna?

—Ressler. –Sussurrei. Então saí correndo.

Não me lembro do caminho que fiz até o hospital, mas sei que dirigi como se fugisse do inferno. Fiz o maior escândalo que consegui na recepção, então me deixaram entrar para ver Donald.

Empaquei na porta, de início, então entrei, surpresa ao constatar que lágrimas enchiam meus olhos. Ele parecia muito mal, pálido. Parecia morto. Acharia isso se não visse seu peito subir e descer devagar, e se o aparelho ao lado da cama não fizesse seu barulho habitual.

—Donald?-Chamei, me aproximando. Toquei a mão dele. –Diz que isso é uma brincadeira estúpida, por favor. Acorda e ri da minha cara. Vai. Por favor, abra os olhos. –Ele sequer se mexeu.

Não podia ser verdade. Depois de catorze anos eu decidi tentar me envolver com alguém, e esse alguém entra em coma. Talvez nem desse certo, mas eu queria tentar alguma coisa, e tentar com Ressler. Tentar... Não sei. Na minha idade, eu já devia ter namorado pelo menos uma vez, ou não?

Esse tipo de coisa tinha que acontecer justo comigo. Justo com a arma da Dangerous. “É por que você foi criada para matar, não amar”, uma pequena voz sussurrou na minha cabeça. Não. Eu não era uma arma. Eu era humana.

Apertei a mão de Ressler, esperando uma reação. Não houve nada.

“Eu juro que conversamos quando voltar”.

—Você prometeu, Ress. Prometeu que conversaríamos. Acorda. Por favor.

Peguei no sono sentada na poltrona ao lado da cama de Ressler. Acordei com alguém tocando meu ombro. Reddington. Elizabeth estava atrás dele.

—Que horas são?-Perguntei, esfregando os olhos.

—Oito da manhã. As enfermeiras queriam te tirar daqui, mas já resolvi isso.

—Tem alguma missão?

—Não. Pedi à Meera algumas férias pra você. Vai querer ficar ao lado do seu... Namorado?

—Ele não é meu namorado.

—Então por que passou a noite aqui?-Suspirei.

—Como ele está?-Keen perguntou.

—Não sei. –Respondi. –Não falei com os médicos. Nem sei se quero. –Olhei para o rosto pálido de Ressler. Acima de tudo... Ele parecia... Em paz.

—Ele vai ficar bem. É bem durão. –Sorriu.

—Não sejamos muito esperançosos. –Reddington disso. –Ele pode ficar em coma pra sempre.

—Red!

—O que?

—Não vai me tirar do sério hoje, Raymond. –Avisei. –Não enquanto Ress estiver assim. –Reddington ergueu uma sobrancelha ao me ouvir pronunciar “Ress”, mas não disse nada.

—Bom, se precisamos de alguma coisa, me avise.

—Obrigada.

Passei os dois dias seguintes ali, raramente saindo de perto da cama de Ressler. Foi Keen quem me fez ir pra casa tomar um banho e comer alguma coisa. Fiz isso rapidamente, então voltei correndo, apenas para ver Donald no mesmo estado.

Falei com os médicos pra tentar entender o que estava acontecendo. Ressler sofreu uma queda horrível e bateu a cabeça com força, causando traumatismo craniano. Ele estava, ao contrário do que imaginei, em coma induzido. Não entendi mais do que isso, por isso achei melhor parar de fazer perguntas. Quanto menos eu entendia, mais nervosa ficava. E se Ressler jamais acordasse? Eu é quem precisaria ficar em coma induzido, ou faria uma besteira.

—Mas você vai acordar, não é?-Perguntei, me sentando ao lado dele. Não sabia se ele me ouvia, mas gostava de pensar que sim. –E vamos ter aquela conversa.

—Dependendo do caso, ele não pode te ouvir. –Me virei. Reddington entrou no quarto e se sentou na poltrona maior que eu ocupava durante a noite. –Quando ele acordar, não pergunte se ele lembra do que você disse, ele não se lembrará.

—Por quê?

—Ele recebeu muitos medicamentos, e tem...

—Não, esquece. Prefiro não saber. Quanto menos souber, melhor. Não entendi quase nada do que os médicos falaram sobre o estado dele. O que acha que acontece com pessoas que entram em coma? Eles estão em algum lugar, ou... É como dormir?

—É uma boa pergunta. Talvez Ressler te responda quando acordar.

—Agora está lidando com o fato que ele vai acordar? Você achava que ele ia ficar assim pra sempre.

—Por que ele não acordaria? Tem alguém o esperando desse lado. Você. Quando se der conta disso, ele vai acordar. –Sorri.

—Espero que esteja certo. É... Tão estranho vê-lo assim. Imóvel, pálido, precisando de aparelhos para respirar. Me deixa nervosa.

—Vocês estão juntos?

—Não. Nós... Íamos falar sobre isso, mas então ele saiu naquela missão com Keen e... Ficou assim.

—Então com certeza ele vai acordar.

—Já se passaram alguns dias.

—Não se pode apressar essas coisas.

—Estou liberada para ficar aqui por quanto tempo?

—Tanto quanto precisar.

—Obrigada, por... Conseguir isso pra mim. Mas... Por que está fazendo isso?

—Por que sei o quanto é importante pra você.

—E por que se importa com o que é importante pra mim? Sua protegida é Elizabeth.

—Você é um pouco irritante, Jenna, mas é uma boa pessoa. Acho que vejo um pouco de mim em você. –Olhei pra ele, tentando esconder a surpresa.

—Eu sou maluca, maníaca e traidora?

—Não. Você sabe que não estou falando disso. –Se levantou e foi para a porta. –Boa noite, Mhoritz.

—Boa noite.

O que eu podia ter em comum com Raymond Reddington? Ah, talvez... A solidão. Acima de tudo, Red era um cara solitário. Acho que conviver com a sua nova “equipe” era um jeito de fugir disso. Ele também tinha um humor estranho, como o meu. E parecia que nunca amava alguém, exatamente como eu. Me perguntei se ele havia perdido alguém, ou se alguém havia o deixado.

Era meio impossível entende-lo. O homem era como uma rocha que não havia como perfurar. Seus segredos estavam bem guardados, e era difícil encontrar alguma rachadura que permitia algo de dentro dele vazar. Ele tinha alguma ligação com Elizabeth, isso era claro. Acho que no fim, ambos encontramos alguém para nos importarmos.

Infelizmente, a minha pessoa estava inacessível.

***

—Você passou a noite aqui de novo?-Elizabeth perguntou me entregando um copo grande de café. Bocejei, me ajeitando na poltrona.

—Onde mais ia passar a noite, Keen?

—Você está aqui há dias.

—Conta uma novidade. –Dei um gole no café. –Só saio daqui quando Ressler acordar. Ok, o que você e Reddington têm que não saem daqui?

—Reddington esteve aqui?

—Arrã. É alguma parada obrigatória?

—Não. Só vim ver como você e Ressler estavam. Além de querer saber se você quer conversar.

—Estou bem. Dolorida por dormir nessa poltrona, mas bem.

—Sabe que não precisa ficar aqui.

—Ah. Preciso. Preciso sim. Você não entenderia.

—Eu entendo. Você gosta de Ressler e quer ficar perto dele. –Pisquei confusa.

—Como sabia que... Esquece. Você as pessoas, não é? Eu deveria ter imaginado.

—Não precisa ficar brava, não tem problema algum nisso.

—Tem sim. Não sei lidar muito bem com sentimentos.

—Então está na hora de aprender. –Ela sorriu e saiu. Olhei para Ressler.

—Você vai me ensinar, não é, Donald?