Código Zero

Capítulo 21 - Dia do Julgamento


A reunião final foi realizada pela manhã. Todos os generais foram inicialmente para a sala de reuniões do senhor Manson e logo em seguida, foram transferidos para a sala de ferro em que o Jin trabalha para que o teste da rainha pudesse começar. Dessa vez, os assistentes foram permitidos no local e a grande quantidade de pessoas assistindo dava a impressão de que era algo para nosso entretenimento. Mas não era bem assim.

Hidelgarde foi trazida algemada e percebia-se claramente uma marca vermelha em seu rosto, causada pela general da nove, porém, a rainha entrou naquela sala de cabeça erguida como se fosse apenas uma expectadora e não alguém que seria julgada.

Dois cientistas que trabalhavam para a serpente entraram carregando uma grande mesa de metal, outros três entraram com alguns recipientes de vidro e depois de algum tempo, Jin chegou carregando uma bancada enquanto guiava dois guardas que traziam Pandora numa espécie de maca.

A assistente parecia estar adormecida e tinha grossas correntes em seus pulsos e tornozelos. Ela parecia tão exausta que fiquei chocado ao vê-la daquele jeito. Era assim que a Ordem Zero tratava quem era considerado um inimigo? Foi exatamente o que pensei ao ver aquela cena.

Como tínhamos planejado, Hoshitake não havia ido ao teste que Hilda faria e a grande quantidade de curiosos presente conseguiu esconder a ausência dele. Já o Bruce estava junto de seu general e do lado oposto ao que eu me encontrava e só iria participar do resgate se algo desse errado. Ele serviria como um plano B, pois sua grande altura poderia acabar chamando a atenção, e isso era tudo que não queríamos.

As algemas da cientista foram trocadas por outras que tinha uma corrente maior, para que ela pudesse ter um melhor desempenho em seu teste. Gilliard foi chamada para erguer uma barreira que abrangeria uma área que contivesse a mesa de ferro, a assistente e a réu em seu interior.

Pan foi colocada na mesa de ferro e depois disso, o teste foi finalmente iniciado.

Hidelgarde misturava alguns líquidos de diferentes tons, criando novas cores. De repente, ela virou-se para Gilliard que estava mantendo a integridade da barreira e falou:

- Desfaça o encantamento que faz com que ela continue dormindo. – A rainha ordenou referindo-se a sua assistente.

A morena olhou para o líder que assentiu levemente com a cabeça. Gilliard virou-se para o público e chamou seu assistente:

- Venha ficar em meu lugar mantendo a barreira enquanto desfaço a DayDream.

Um silêncio percorreu toda sala até que os burburinhos começaram. O líder se pronunciou rapidamente:

- Façam silêncio! – Ele virou-se para sua assistente e deu a ela uma ordem. – Nora, vá buscar o Hoshitake imediatamente. Ninguém pode trocar com a Gilliard a não ser ele que também entende de magia.

A senhorita Houkiboushi acenou positivamente com a cabeça e saiu daquela sala. Segundos depois, ela retornou trazendo o assistente de Gilliard, que entrou em silêncio e foi diretamente ao encontro de sua general.

- Onde estava? – Perguntou a general.

- Eu não queria ver esse teste então permaneci em meu quarto até agora. – O espião respondeu. – Não me disseram nada sobre ser obrigatório a presença de assistentes.

- E não é, mas no momento estou precisando de você, então sua presença se tornou necessária. Venha, fique em meu lugar para manter a barreira de pé enquanto desfaço a DayDream.

A troca foi feita e Pandora foi liberta do feitiço que a prendia em sono profundo. Todos aguardavam ansiosamente por alguma reação das duas que estavam dentro da barreira, mas não houve nenhum movimento. Hidelgarde olhava fixamente sua assistente até que Pan saltou rapidamente da mesa de metal e investiu ferozmente em direção a rainha, que bloqueou aquele golpe com a mão em chamas, jogando a oponente para o lado.

Aquela era, sem dúvida nenhuma, o príncipe da ira, Azazel.

A fera levantou-se e já preparava outra investida contra a serpente, mas ao tentar fazer isso, percebeu que seus movimentos estavam paralisados. Ainda no chão, Azazel fez um esforço e olhou para cima: Hilda estava segurando uma pistola que atira dardos!

- Não se esforce a toa. – Disse a rainha. – Coloquei um veneno em você que impede que os fluxos de sinais elétricos cheguem ao cérebro. Em outras palavras, você não conseguirá mexer nenhum músculo do seu corpo até que o efeito passe.

Sem pestanejar, Hidelgarde abaixou-se e virou o príncipe de frente. Feito isso, a serpente pegou um bisturi e começou a desenhar algo na testa da pobre assistente.

Inicialmente, Hilda escreveu um “S” e logo em seguida o circulou. Junto deste circulo ela desenhou mais um círculo menor em cada um dos lados externos do grande circulo e os ligou ao maior usando uma reta. Na circunferência da direita, a senhorita Rhyca fez um “X” que a dividia em quatro partes iguais. Já na esquerda, foi passada somente uma reta que dividia o círculo horizontalmente em duas partes também iguais. Tendo finalizando o desenho, a rainha pegou um líquido de cor azul e jogou por cima do desenho, fazendo com que o corte espumasse, cicatrizando quase que instantaneamente, embora uma marca de cor violeta fosse “tatuada” no formato do desenho.

Mais da metade das pessoas que estavam naquela sala ficaram boquiabertos olhando aquele teste, enquanto outros sequer agüentavam olhar e foram retirados daquele local. Hilda virou-se para Gilliard e falou:

- Preciso que você leia estas palavras. – A serpente falou apontando para um livro que estava em cima da bancada. - Com certeza, uma general que trabalha com feitiços saberá recitá-lo melhor que eu.

A bela morena caminhou até a bancada e começou a ler as palavras ali escritas. No fim daquilo, a marca na testa de Azazel brilhou intensamente por alguns segundos e, logo depois, voltou a ser como uma tatuagem.

- Está pronto. – Hidelgarde falou. - Esse selo irá durar por cerca de 5 anos. Até lá, Padora já saberá como “domar” esse hospedeiro indesejado, já que não temos poder suficiente para destruir nenhum dos sete príncipes.

De repente, Gilliard caiu de joelhos no chão e se apoiou numa das mãos para não cair mais, levando a outra mão à cabeça.

- O que foi que você fez Rhyca?! – Falou a general bravamente.

- Ah! Esqueci de avisar, mas eu precisava de alguém com uma grande quantidade de poder acumulado para que o selo funcionasse. Quanto mais poder, mais tempo ele dura.

- Como se atreve sua... Sua...

- Mas não se preocupe. Basta apenas descansar e todo seu poder voltará ao normal.

O senhor Manson levantou-se e mandou uma equipe médica levar a general do 7 para uma enfermaria e outra equipe de especialistas para examinar o selo. Esse era o ultimo passo do teste. Se tudo estiver certo com o selo, Hilda e Pan escapariam da execução. Tudo que nós podíamos fazer naquele momento era torcer para que tudo ocorresse bem.

A análise levou cerca de vinte minutos, mas pelo menos trouxe boas notícias. De acordo com os especialistas, o selo estava funcionando perfeitamente. Não lembro de ter sentido tanto alívio antes em minha vida. Uma vez que tudo tinha dado certo, Hidelgarde-sama e Pan foram devidamente inocentadas e receberam seus postos de volta.

Todos nós da LawBreak ficamos felizes, mas Lewinsk e Fallman estavam claramente aborrecidos com os resultados. Eles já estavam saindo do recinto quando a rainha chamou a general do nove. De repente eu lembrei dos tapas que a loura tinha dado, e tive a certeza de que a serpente não iria deixar barato:

- Espere Lewinsk. Até onde eu me lembro, nós temos negócios inacabados.

- Sim, nós temos. - A loura falou, em um tom amargurado. - Temos dez anos de negócios pendentes Rhyca. Acho que finalmente chegou a hora de resolvermos isso.

- Dez anos? Você sempre relembrando o passado não é mesmo? Mas eu falava de acontecimentos bem mais recentes.

Lewinsk abriu um meio sorriso, enquanto jogava os fatos na cara de Hilda-sama:

- Nunca senti tanto prazer na minha vida como quando te dei aqueles tapas. Vejo que eles ainda estão marcados no seu rosto.

- Existem duas coisas que eu não tolero Lewinsk. Uma, é que mexam com o meu dinheiro. A outra, é que mexam com o meu orgulho. Vou lhe mostrar o que acontece com quem se atreve a fazer uma dessas coisas.

- Você se acha muito poderosa não é? Mas eu tenho treinado muito durante todos esses anos. O suficiente para pisar mais um pouquinho nesse seu orgulho gigante.

- Enquanto você era assistente eu já era general. Devo lembrar que você é quatro anos mais velha que eu? - A serpente provocou, os olhos luzindo com a raiva contida.

- Luto com você aqui e agora se for preciso. Tenho dez anos de ódio acumulado para despejar sobre você - Lewinsk berrou, caindo tolamente na provocação da serpente.

- Amanhã. Lutaremos amanhã, nesse mesmo horário.

Então a rainha se encaminhou para a saída, mas parou junto do líder e falou em alto e bom tom:

- Manson, eu espero que você já tenha alguém para ocupar o posto de general do nono esquadrão, porque a partir de amanhã, ele estará vago...

O rosto de Lewinsk se coloriu de um vermelho intenso, e ela teve claramente que se segurar para não voar no pescoço de Hidelgarde-sama. Fallman se apressou em ir para junto dela, provavelmente para garantir que ela não fosse perder a compostura.

De qualquer forma, naquele momento eu estava mais preocupado com Pan, e estava indo até ela quando os dois cientistas de Hilda a retiraram dali, não mais acorrentada, mas novamente inconsciente. Shishou chegou perto de mim, e vendo minha preocupação, tratou de me tranquilizar:

- Não se preocupe Shion, Pan está sendo levada para o terceiro esquadrão. Tenho certeza que Hilda quer manter os olhos nela.

- Estou feliz shishou. Feliz porque deu tudo certo.

- Eu também. Não me perdoaria se algo acontecesse a elas. Muito menos se acontecesse algo com Hilda.

Ao ouvir aquilo eu decidi fazer uma pergunta que me atormentava já a algum tempo:

- Shishou, eu tenho notado que o senhor está sempre preocupado com a Hidelgarde-sama, sempre defendendo ela e tudo mais. O senhor, por um acaso é... Apaixonado por ela?

A cara dele foi quase cômica. Ele ficou pálido e arregalou os olhos, tratando logo de explicar seus motivos:

- Claro que não Shion, Deus me livre! É que quando a Hilda acabou o noivado com Blover, ele veio me pedir para cuidar dela por ele. Você sabe, uma vez que eles não tinham mais nenhuma ligação, Hilda tratou de se manter bem longe dele. Como Richie sabia da minha amizade com ela, ele confiou isso a mim.

Eu ainda estava assimilando tudo quando o shishou agarrou meu braço e começou a me arrastar para fora daquela sala:

- Vamos Shion! Agora é hora de comemorar, e vamos fazer isso jogando pôquer (agora de verdade) e enchendo a cara. Hoje eu quero ficar completamente bêbado!

Não reclamei com ele dessa vez. Eu também estava em clima de festa, e disposto a fazer farra ate o dia amanhecer. Enquanto todo mundo saía da sala de ferro, uma figura desconhecida se aproximou do líder e falou:

- Senhor, trago notícias importantíssimas comigo.

- Do que se trata? É sobre Gehenna, para ser tão importante assim?

- Não senhor. Descobertas que fiz recentemente indicam que Richie Blover pode estar vivo.

- O que? - O líder pareceu bastante surpreso, e começou a levar o espião dali - Vamos até a minha sala, quero saber tudo sobre isso...

Enquanto isso, no quarto esquadrão, o pôquer e a bebida já rolavam soltos, e todo mundo estava animado, até mesmo o preguiçoso do Blackgate. Bruce, sempre paciente, tinha me ensinado direitinho as regras, e eu já tinha ganhado umas três partidas seguidas. Quem perdia tinha que tomar uma dose da tequila mais forte do shishou, ou seja, a maioria ali já estava meio bêbada:

- Issho é muuinto injusshto - Shishou começou, a voz já engrolada e com os olhos fora de foco. - Por que o quarto eshquadrão tem taanta mulher bonita? Eu quero todssh elash comigo no quinto. O harém do Alexish!!!

- Proteshto!! - Disse Blackgate, igualmente ébrio. - Elash tem que ir pra junto de mim. O oito shó tem um monte de homem... É tããão shem grasha...

- Acho melhor vocês dois pararem de beber sabe. - Bruce disse - Desse jeito vão entrar em coma alcoólico daqui a pouco.

- Deixa eles Bruce. Hoje é dia de se divertir mesmo.

- Mas mano...

- Deixa Bruce.

- Okay, você que sabe...

Eu estava me divertindo como nunca, e até tomei uns golinhos de alguma coisa não identificada. Sentia minha cabeça girar, mas não estava nem aí. Queria esquecer tudo de ruim que tinha acontecido até ali, e enquanto pegava mais uma dose de bebida, eu desejava intensamente que dali em diante só coisas boas acontecessem.

Lentamente todos foram caindo no sono, um após o outro, por causa da bebedeira. No fim da festa, até mesmo Darkreid, que era todo rígido, estava podre de bêbado cantando músicas horrorosas com shishou e Blackgate. Eu acabei passando da conta, e também dormi com a cara na mesa de jogos.

Fui o primeiro a acordar no dia seguinte, com uma dor de cabeça terrível. Aquela era a primeira ressaca da minha vida, e eu já estava jurando que seria a última. Shishou acordou logo depois, parecendo meio desorientado, e reclamando loucamente da dor de cabeça:

- Ai, parece que minha cabeça está rachada... Bem que meu pai dizia que a ressaca é uma vadia, viu...

Eu ainda estava me situando quando levei um choque: a luta entre Hidelgarde e Lewinsk era hoje! Eu olhei desesperado para o relógio e constatei que faltavam apenas duas horas até o início do confronto. Eu teria que usar esse tempo para acordar todo mundo e fazê-los ficar apresentáveis. Tinha certeza que eles não iriam querer perder aquela luta. Falei isso para o shishou, e serviu para fazer com que ele esquecesse momentaneamente a dor de cabeça:

- Briga de mulher! Vamos acordar esses marmanjos logo Shion, não quero perder isso por nada!

- Err... Acho que não vai ser bem como o senhor tá pensando não shishou...

Mas era tarde demais. Ele parecia alucinado, e não parava de repetir a mesma coisa:

- Briga de mulher! Briga de mulher! Briga de mulher!

Quase que na mesma hora, Blackgate levantou a cabeça, parecendo que ainda estava meio bêbado:

- Alguém aí falou em briga de mulher?

Depois que todos os beberrões estavam apresentáveis e embora a dor de cabeça ainda permanecesse constante, fiz com que shishou e os demais fossem se informar do local onde a luta aconteceria enquanto fui atrás do Hoshitake, que estava na enfermaria visitando Gilliard. Ao chegar lá, fui surpreendido pela raiva que o espião tinha da Hilda-sama:

- Viu o que ela fez com a Gilliard! Eu avisei que ela era uma cobra venenosa, mas minha general não me deu ouvidos...

- Se acalme Hoshitake. – Falei um pouco espantado. – Acho que vim trazer uma boa notícia para você. Hidelgarde-sama irá lutar contra a general Lewinsk daqui a pouco. Vim aqui pra saber se você virá assistir.

- Mas é claro que vou. – O espião falou. Embora ele tivesse a boca coberta, seus olhos passavam claramente a sensação de que ele estava sorrindo malignamente.

Pouco tempo depois, encontrei com shishou dizendo que a luta seria na maquina de teste do Jin e que estava quase começando. Nos apressamos para não perder nenhum segundo daquela emocionante batalha que aconteceria.

Dentro da maquina, Hilda e Lewinsk tomavam seus lugares para que o confronto começasse.

- Está com medo Rhyca? – A loura provocou.

- Por quê eu estaria? Não tenho medo de colocar as pessoas em seus devidos lugares.

- Você deveria escolher logo em que quarto da enfermaria vai querer ficar, queridinha.

- Hahahahahahaha – A rainha gargalhou ironicamente. – Lewinsk, minha querida, pode deixar sua prepotência de lado. Ela não irá pagar suas despesas com a cirurgia de restauração facial, que você irá fazer.

- É o que veremos, sua anã mão-de-vaca.

- Pode apostar, mal amada.

E mais uma vez eu estava prestes a assistir uma luta entre generais, no mesmo lugar da anterior. Me pergunto se não há algum problema para a Ordem Zero se elas se confrontassem.