Cíclico

Capítulo Único


Cíclico

Era apenas questão de alguns meses.

Quando ela deu por si, no entanto, já haviam passado anos.

O caminho estava ficando cada vez mais torturoso naquela terra devastava. Mewni agora era só uma sombra do que outro já fora. Em meios aos escombros, ela prometia a si mesma que resolveria tudo, quando acabasse. Mas não estava ali por isso. Tinha um objetivo a cumprir.

Havia perdido os companheiros há semanas. A terra seca, envolta em destroços e e depressão, eventualmente cobrava a vida dos soreviventes da guerra. Não havia mais nada para se fazer.

Não ali pelo menos, não agora.

Foco, droga, foco. Mantenha o olho no prêmio.

Já haviam se passado anos desde a morte dele, mas a voz que eventualmente martelava em sua cabeça (com mais frequência, ultimamente) sempre era a de Glossaryck.

Não da mãe, ou do pai, mas sempre de Glossaryck.

E sempre que pensava nele, um ânimo, ainda que curto, lhe subia nas veias.

E era isso o necessario para que ela conseguisse com êxito, cruzar aquele emaranhado de destroços. Aquela pilha de pedras, banhadas em sangue e suor, estavam longe de refletir o castelo que formavam, em sua plenitude.

Você está quase lá, só mais um pouco.

Como de costume, ela assentiu ao pensamento, aquela voz firme em sua mente.

E lá estava.

A torre, que anteriormente estava a metros de altura, agora estava tombada ao lado do portão. A única coisa que havia se mantido de pé, em todo esse tempo.

Mais um pensamento lhe ocorreu de súbito. Uma memória esparsa. O rei Cabeça - Pônei se vangloriando de como eram fortes e belos os portões de sua moradia.

Pelo menos isso, ela não podia negar. Pena que não se pôde dizer o mesmo de todo o resto.

Contornou o portão, e com facilidade, escalou as pedras. Depois de anos de conflitos, ela percebera que suas mãos já não eram mais as de uma princesa. Mais pareciam mãos de um ferreiro. Entretanto, naquele momento, era uma vantagem.

Estava prestes a entrar pela janela.

Tic. Tic. Tic.

Os barulhos de dedos nervosos em uma velha mesa de cedro entregavam a presença de alguém. Sacando sua varinha (ou o que ainda restara dela), saltou para dentro dos aposentos.

Firme. Determinada.

Como qualquer outro soldado.

No fim, não era exatamente o que ela esparava. Junto a mesa (que na verdade revelava-se os restos de uma penteadeira), não havia um monstro, ou um mercenário, tampouco um saqueador. Era um rosto familiar.

Ela detestava um rosto familiar. Preferiria mil vezes qualquer outra coisa a essa altura.

— Você demorou – disse Tom – Achei que não conseguiria.

— Sério?

— Por um momento, sim.

— Eu vim a pé.

Tom levou apenas um segundo para anaisá-la de cima a baixo, desde as botas enlamassadas e gastas até aqueles trapos que em algum mmomento, pareceriam roupas humanas. Ela nã estava brincando quando disse que veio a pé.

— Percebi, disse por fim.

E nas mãos dele, jazia o prêmio. Tom notara no instante seguinte que, do momento em diante em que ela entrou pela torre, não olhara em seu rosto em nenhum momento. Quase que em transe, seu foco era todo em exclusivo para o item em que ele mantinha em suas mãos.

— Devia ter vindo voando. Ganhei meia hora de vantaegm.

Ela deu de ombros.

— Minha montaria morreu.

— A julgar pelo seu estado, diria que todo mundo morreu.

— Isso também.

Tom tentou se acalmar, passando a mão pelo rosto, deixando um silêncio no quarto, tão profundo que podia se ouvir o barulho do vento tilintar os restos da cortina da janela.

Tentou ao máximo mantar o tom de voz calmo e tranquilo. Não queria um confronto. Queria respostas dela. Um esclarecimento. Apenas isso.

— Cinco soldados. Valeu a pena, só para conseguir isso?

Ela se segurou em responder por um momento. No seguinte, com uma calma na voz, disse:

— Perderia muitos mais, se fosse necessário.

E com essa resposta, Tom perdeu a voz. Não havia mais nada a dizer. Não preparado, pelo menos. Ensaiou diversos discursos, mas não estava preparado para essa resposta.

Não dela.

— Pode me entregar agora?

O chifre era o ultimo ingrediente. Tom não havia entendido o que ela estava prestes a fazer até ouvir os boatos dessa incurssão suicida. Mas ele sabia (e ela também) que os súditos ainda faziam tudo por ela. Morreriam por ela, se necessário. E de fato, o fizeram.

Ele jogou o chifre para ela, que agarrou sem dificuldades. Colocou em sua bolsa, e começou a se preparar para descer da janela, quando ele a interrompeu.

— Acha que a Cabeça - Pônei iria gostar que você usasse o chifre dela assim?

— Se ela estivesse aqui, entenderia.

— Duvido.

Mais uma vez, ela deu de ombros. Com um leve suspiro, ela o olho com a cabeça inclinada, uma última vez.

— E o que você sabe, Tom? Você mal a conhecia.

Ele não pôde mais suportar. Não mais. Perdeu qualquer compostura que ainda lhe restara.

O que eu sei? O QUE EU SEI?

E a cada palavra, seu tom de voz ia aumentando, assim como a vontade de chorar, e ao mesmo tempo, de esbofeteá-la, deixando – a no chão.

Mas ele não o fez. Nem um, nem outro. Apenas se limitou a urrar de raiva.

— Ela não concordaria. Não assim.

Ele continuou. Ela não se virou nenhuma vez. Manteve-se parada de costas, de frente a janela.

— Ela morreu por você! Todo mundo morreu por você! E pra que? Para alimentar sua ilusão? Onde você estava quando Ludo invadiu? Onde você estava quando ele arrancou isso dela?

Ela estremeceu. Mas não respondeu.

— Você quer voltar no tempo. Consertar tudo, desde o começo. Desde aquele dia.

Não vai funcionar.

Finalmente ela demonstrou alguma reação. Ainda sem se virar, no entanto. Ela se aprumou e apenas perguntou:

— Por que não?

— Não quer voltar para quando ele roubou o livro. Ou para quando Glossarick morreu. Quer voltar para quando o Marco se machucou. Para quando você perdeu o foco.

— Vai funcionar.

— NÃO VAI! – E junto ao urro, um soco violento partiu o resto da penteadeira ao meio.

Simplmesmente não vai. Por que voce não está fazendo por ele. Mas por você mesma.

As coisas não vão mudar. É impossível.

— Não é não. E eu vou provar.

Tom passou as duas mãos pelo rosto. Já não aguentava mais aquilo. Não mais.

— Marco já te perdoou. Mesmo quando soube que não ia mais andar. Na verdade, ele nunca te culpou.

Essa ela não respondeu. Optou mais uma vez em deixa o silêncio tomar conta.

— Ele seguiu em frente. Ele está com a Jenna agora. E está feliz. A solução não é ir para trás.

Sem reposta.

— Eles têm dois filhos agora. Dois filhos. Você vai fazer o quê? Voltar no tempo e mudar tudo?

Acha que ele vai escolher você? Você acha mesmo que merece estar com o Marco? Depois disso tudo? Voce acha, Star?

Ela finalemente se mexeu. Pôs uma perna fora da janela. Depois a outra. Um último suspiro, o último que Tom ouviria por um bom tempo dela.

— Perdão não é o bastante. E não me chame de Star.

Antes que ele pudesse responder, ela completou:

— Me chame de Eclipsa.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.