Lucy não sabia como agir perto de Gajeel. Era visível que ele ainda estava completamente apaixonado por ela, mesmo ela não sendo exatamente a mesma pessoa que ele conheceu. Ela conseguia sentir o olhar intenso dele atrás dela, e quando ela se virava, ele sempre tentava disfarçar. Era engraçado até.

Quando Lucy estava com Natsu, ele não agia como um completo bobo apaixonado. Ele era o mesmo Natsu, um pouco mais querido. Mas em Gajeel era uma mudança enorme.

Lucy tinha concordado em ficar com Gajeel na casa dos dois porque ele tinha concordado que ia ajudá-la. Por mais que a ajuda fosse pouca, porque honestamente, Gajeel adorava ter ela ali com ele e não fazia questão nenhuma de deixar ela ir, mas ela conseguia sentir pelo menos algum apoio.

Antes, ela tinha uma guilda inteira para apoiá-la. Agora, ela tinha apenas Gajeel.

Por uma semana, ela foi até a biblioteca e Gajeel foi junto, já que ele não queria que ela se encontrasse com Kotarou sozinha. Ele a ajudou a encontrar mais alguns livros a respeito do assunto e se ela precisasse que fosse anotado alguma coisa, ela pedia para ele. Ela pulava de livro em livro, procurando de sessão em sessão, ainda sem saber exatamente o que ela estava procurando.

Naquela semana inteira, Lucy se sentiu completamente desmotivada. Ela não sabia mais o que estava procurando e estava começando a ficar com medo de ter que ficar ali. Não que ela não gostasse de Gajeel, mas ela sentia falta da sua vida inteira. Sentia falta das palhaçadas da sua guilda, sentia falta das suas amigas. E honestamente? Ela estava começando a sentir falta de Natsu também.

Então, vendo isso, naquele sábado, Gajeel tentou fazer alguma coisa para animá-la. Ele se lembrava de que quando ela estava daquele jeito, ela sempre gostava de sair para fazer alguma coisa. Ela sempre foi uma pessoa extremamente extrovertida. Ela provavelmente deveria estar cansada de estar dentro de casa aquele tempo todo.

Chegou sábado. Lucy estava suspirando na cama novamente, cansada de ler, desanimada, sem saber o que fazer. Gajeel odiava ver ela daquela forma.

— Você está bem? — Ele perguntou chegando nela no quarto e Lucy virou o rosto para o outro lado. — Lucy?

— Eu estou bem. — Ela disse com a voz abafada pelo travesseiro. Gajeel não estava olhando para ela, mas conseguia perceber que ela não estava bem. Não estava nada bem. Imaginou que ela estivesse chorando.

— Quer que eu te deixe sozinha? — Gajeel perguntou e ela acenou com a cabeça no travesseiro. Ele suspirou e quis deitar na cama com ela, emprestar seu ombro para ela chorar enquanto ele fazia carinho no seu cabelo. Mas aquela semana inteira ela parecia estar afastando ele, então, imaginou que talvez… Ela realmente precisava de um tempo sozinha.

Mas ele não queria deixar ela sozinha. Não daquele jeito.

— Você quer sair e dar uma volta na cidade?

Lucy não respondeu. Apenas acenou que não com a cabeça, ainda enfiada no travesseiro.

— Uma coisa que costumava ajudar bastante… Não sei se você está com ânimo para isso, mas a gente sempre costumava ir numa missão juntos, quando você estava para baixo.

Lucy imediatamente virou o rosto para Gajeel, o encarando com olhos molhados e cabelo grudado na bochecha.

— Eu acho que seria legal. — Ela disse e Gajeel tirou as mechas loiras de seus olhos. — Eu nunca fui numa missão com você.

Gajeel riu suavemente, lembrando-se pela décima terceira vez naquela semana de que ela não era a Lucy dele. De que ela não se lembrava dele.

Essa era a chance de ele conquistar ela de novo.

— Então, toma um banho. Depois vamos na guilda procurar uma missão pra nós dois.

Lucy se levantou e pegou uma roupa e foi para o banheiro e nesse meio tempo, Gajeel se jogou na cama, olhando para o teto, pensando no que fazer para conquistá-la ou se talvez estivesse na hora de ele aceitar o fato de que ela nunca seria sua. Afinal, ela ainda estava emocionalmente presa num universo que não existia.

Talvez se ela finalmente entendesse onde ela estivesse… Talvez se ela somente… aceitasse a realidade. Ele se levantou e foi para a sala, esperar Lucy sair do banho.

Talvez fizesse já algum tempo que Lucy não tomava um banho tão demorado e gostoso. Sentir a água quente cair em seu corpo costumava fazer ela se sentir bem. Hoje, qualquer coisa que ela fazia era apenas um lembrete de que as coisas nunca voltariam a ser como eram antes. Tomou banho chorando.

Quando saiu do chuveiro, relutantemente olhou para si mesma no espelho, para seus olhos inchados. Seus cabelos dourados molhados pareciam que tinham perdido vida, assim como ela. Ela sentia como se tivesse perdido parte da sua alegria de viver. Ela sentia como se tivesse sido roubada de si mesma, por si mesma.

Ela levantou a mão direita para puxar as olheiras para baixo, para ver o quão inchado seus olhos estavam, quando reparou que seu reflexo tinha a marca da Fairy Tail na mão. Ela olhou para a própria mão, assustada, sem saber o que era real. Mas sua marca não estava mais na sua mão. Ela olhou para a coxa, sendo lembrada mais uma vez de que ela estava na guilda errada.

Olhou para seu reflexo novamente e lá estava a marca na mão direita.

Ela estava delirando, pensou consigo mesma enquanto uma lágrima escorreu. Ao invés de chorar junto com ela, seu reflexo bateu contra o espelho, quebrando-o do lado de dentro. Lucy pulou assustada e saiu do banheiro apressada sem nem ao menos colocar a toalha em seu corpo.

— O que aconteceu? — Gajeel saiu da sala correndo para ver o que tinha acontecido com Lucy e a pegou nua, assustada e ainda molhada na frente da porta do banheiro. Ela estava branca, mas não foi isso que Gajeel reparou. Ela correu para o quarto, pingando no apartamento inteiro, agarrada em seus seios, envergonhada.

Fazia semanas já que ele não via o corpo dela daquela forma, ele sentia saudades. Teve que sentar-se no sofá e se acalmar enquanto Lucy se secava no quarto e colocava uma roupa. Ele pensou e repetiu consigo mesmo várias vezes para tentar se controlar.

“Ela não se lembra de mim. Ela é a Lucy, mas agora não. Não posso agora. Eu tenho que ajudar ela. Agora não” Repetiu consigo mesmo, tentando acreditar nessas palavras. Ele não tinha percebido o quanto estava necessitado. Do quanto ele queria aquilo.

Quando Lucy voltou do quarto, agora já com roupas e seca, Gajeel olhou para ela de relance, mas voltou a encarar o chão, tentando desver o que tinha visto, sabendo que não poderia esquecer. Ele via aquele corpo algumas vezes por semana durante alguns anos. Ele nunca iria esquecer.

— Aconteceu alguma coisa? — Perguntou sem conseguir olhar para os olhos dela. Lucy começou a se perguntar se seria uma boa ideia sair para fazer uma missão naquele estado. Ela, depressiva e ansiosa. Ele, com tesão.

Lucy engoliu em seco, pensando se contava para ele ou não. Provavelmente iria achar que ela estava louca.

— Não. Eu só deixei a escova cair.

Gajeel não acreditou nela.

— Vamos? — Lucy o chamou, louca para sair daquela casa para fazer qualquer coisa que não fosse pesquisar e estudar.

Lucy foi na frente, mas ela estava indo na direção errada. Gajeel riu baixinho consigo mesmo e pegou na mão dela. Ele chegou um pouco mais perto dela e Lucy percebeu então que era a primeira vez que eles tinham estado tão próximos um do outro. Ela não tinha reparado no quão bonito os olhos dele eram.

— Você está indo pro lado errado. — Ele disse e Lucy ficou vermelha, enquanto pensava no quão cheiroso ele era. Era um perfume forte, amadeirado, que combinava com ele. — Deixa que eu te levo lá.

A guilda ficara literalmente para o lado oposto que Lucy estava indo antes. A calçada era apertada e desnivelada, enquanto andava, os ombros de Lucy raspavam no braço de Gajeel, e ela estava extremamente consciente de que eles estavam perto demais.

Perto demais.

Eram dez minutos de caminhada até a guilda, mas Lucy achou longe demais.

— Ah, uma coisa que eu esqueci de comentar para você. — Gajeel sussurrou perto do ouvido dela antes de eles entrarem. — Eu não falei ainda para eles o que aconteceu com você. Então, tecnicamente, para eles, você é minha namorada.

Foi naquele milésimo de segundo antes de Gajeel abrir a porta que Lucy se arrependeu de ter ido junto. Ele abriu a porta com a mão que não estava segurando a mão de Lucy.

Phantom Lord era completamente diferente do que ela imaginava ser. Lucy imaginava que a guilda teria correntes quebradas penduradas pelo teto, imaginava sangue no chão, janelas quebradas, luzes queimadas, um ambiente mais escuro e tenebroso. Imaginava as pessoas sentadas em bancos de madeira, encarando ela com raiva enquanto tomavam seus chopp.

Mas a realidade era diferente. Talvez fosse assim alguns anos atrás, mas agora Phantom Lord estava diferente.

O interior da guilda era sim de madeira, mas era uma madeira de cor escura, envernizada, brilhante. Tinham dois lustres no salão principal, as mesas e os bancos eram bem cuidados e todos usavam porta copos nas mesas. As pessoas não eram mal encaradas, e sim queridas.

Todos eles sorriram para Lucy, perguntando se ela estava bem. Afinal, ela tinha sumido. Ela sorriu e disse que sim, sem saber como agir ali dentro. Como que ela agia dentro da guilda?

Um jovem de cabelos laranjas pulou nas costas dela enquanto Gajeel a levava para o mural de missões, puxando ela para trás, quase caindo. Ele tinha dentes pontudos e usava apenas uma jaqueta de couro, sem camisa.

— E aí, sua biscate? Achei que não ia voltar mais. Por um segundo, eu achei que o Gajeel estava te mantendo em cárcere privado. — Ele disse e tinha uma voz um pouco mais aguda do que o esperado. Ele parecia ser muito próximo de Lucy e ela se sentia mal por não saber o nome dele.

— Cala a boca, Akito. — Gajeel disse, mas o jovem não ficou ofendido. Apenas fez biquinho.

— Mas e aí, você resolveu voltar para a gente? Eu senti sua falta.

— Eu também. — Lucy disse, tentando ser simpática. Ela era simpática com eles também, não era?

— Gajeel aqui disse que você estava mal essas últimas semanas. — Um homem mais alto que Gajeel e gordo disse, aparecendo atrás de Lucy, assustando ela.

— Takeshi, você assustou ela! — Akito disse, abraçando Lucy de novo.

Gajeel tentou salvar Lucy dos dois, achando que eles estavam incomodando ela, mas ele viu que ela estava sorrindo. Pela segunda vez, em muito tempo, ela estava sorrindo.

Ela sentia um clima diferente ali, claro, não era a guilda que ela amava, não era sua família, mas o clima era gostoso. Ela sentia que poderia ser amiga com eles. Sentia que poderia fazer amizade com eles novamente.

Gajeel, então, apenas ficou em silêncio enquanto a observava conversar com eles, como se fossem grandes amigos. Akito contou para ela as fofocas do que aconteceu na guilda, quem tinha começado a sair com quem, até que Akito falou algo que Gajeel preferia que ele não tivesse falado.

Akito falou baixinho, mas alto suficiente para Gajeel escutar.

— E aí, ele já fez a pergunta?

— Que pergunta? — Lucy perguntou, sem saber o que ele quis dizer.

— Você sabe, o… — Akito disse e antes mesmo de completar a frase Gajeel a pegou na mão dela e puxou de leve.

— A gente veio aqui só para escolher uma missão. — Gajeel disse, se afastando. Lucy ficou sem entender o que aconteceu e Akito entendeu, pela reação de Gajeel, que ele ainda não tinha feito pedido ainda.

— Ai, ai… Esses jovens de hoje em dia. — Akito disse, e Takeshi o cortou.

— Você tem a mesma idade que eles.

De longe, agora na frente do mural, Lucy perguntou.

— O que ele quis dizer com pedido?

Gajeel fingiu que ela não tinha falado nada.

— Aqui, a gente recebe muito pedido de resgate. — Gajeel disse mostrando o mural. Lucy resolveu deixar aquele assunto para depois. — Tem outras missões diferentes, mas elas geralmente são mais difíceis. Nós sempre pegavamos missões de classe A, mas se você quiser pegar uma mais baixa…

Lucy deu uma breve olhada no mural, tentando ver se ela encontrava alguém que já conhecia ali. Mas nada. Não conhecia ninguém. Então, ela escolheu uma missão classe C, encontrar uma mulher desaparecida. A mulher era parecida muito com Lucy, talvez tenha sido por causa disso.

Tinha pouca informação no folheto, somente dizia que ela tinha sumido durante uma caminhada que tinha feito no bairro e nunca mais apareceu em casa. Gajeel se perguntou porque ela tinha escolhido aquela missão especificamente, mas apenas concordou. Dentro de poucos minutos, escolheram a missão, e já estavam indo em direção à casa da pessoa que tinha feito o pedido.

E nesse tempo todo, Gajeel estava louco para pegar na mão de Lucy novamente.

A casa da pessoa que tinha feito o pedido era enorme, era no mesmo bairro que a guilda. Era uma casa de dois andares com grades brancas, e dois cachorros guardando a entrada. Foram recebidos pelo dono da casa que os cumprimentou e os levou para dentro de casa, com um aviso.

— Eu tinha feito esse pedido no dia em que minha mulher desapareceu. — Comentou antes de entrar na casa. — Eu não sabia o que tinha acontecido com ela, porque ela nunca foi de fazer isso, sabe. Ela sempre foi muito querida e simpática… — Disse antes de suspirar e abrir a porta.

E, no momento em que entraram na sala, viram a pessoa que estava no pedido. Era a mesma mulher fisicamente, mas não parecia nada com o que o marido estava falando dela. Estava sentada de pernas abertas, comendo algum salgadinho, enquanto lia um livro e deixava marcas de gordura na ponta das páginas.

— Amor, não! — O marido, George, correu para salvar o livro dos dedos engordurados.

— Já te disse pra não me chamar de amor! — Ela disse, deixando que ele pegasse o livro mas já era tarde demais para salvá-lo. Estava completamente engordurado. — Eu vou pro quarto.

— Você disse que ela tinha desaparecido. — Gajeel falou, agressivamente. — Mas claramente ela está aqui.

George chegou mais perto, para falar baixinho.

— Essa não é minha mulher.

— Estamos perdendo nosso tempo. — Gajeel falou virando as costas e Lucy o puxou com força.

— Espera, vamos ouvir o que ele tem a dizer. — Lucy disse, e encarou Gajeel até fazer ele voltar para dentro da casa e sentar-se em um dos sofás.

George sentou-se no sofá também, suspirando fundo.

— Alguns dias atrás, nós brigamos. Hana achou que tinha me visto com outra mulher e brigamos, no mesmo dia ela saiu de casa. Disse que ia dar uma caminhada. Ela sempre fez isso. Mas, ela não voltou.

— Ela está aqui.

— Mas essa não é ela. — George disse e então esfregou o rosto, tentando pensar em uma forma de fazer eles entenderem. — Essa não é a minha esposa. Acredite, eu conheço a minha esposa. Essa Hana chegou aqui um dia depois que a minha esposa desapareceu e ela não me reconhece mais. Está tudo diferente. Eu conheço a minha esposa, por favor.

Lucy sentia que conhecia aquela história.

— Vamos tentar. — Lucy disse, sentindo uma pontada de animação. Se isso aconteceu com outra pessoa, então, ela tinha uma chance, mesmo que pequena, de encontrar o que aconteceu com ela. E, esperançosamente, mudar aquilo.

Gajeel olhou para Lucy e então entendeu o que ele quis dizer. Ele também tinha passado pela mesma situação, percebeu que Lucy se empatizou com a esposa.

— Primeiro, precisamos que nos diga tudo o que você consegue contar para a gente sobre Hana.