Se tinha uma coisa que Lucy odiava mais do que tudo, era brigar com seu namorado. Mas aquelas brigas estavam ficando cada vez mais intensas. Cada vez piores. Lucy odiava ter que brigar com Natsu, mas a culpa não era dela. Era ele que não parava de fazer besteira atrás da outra. Eles tinham decidido meses atrás, no momento em que eles passaram a morar juntos que iam diminuir as brigas. Mas não adiantava nada. As brigas apenas continuavam, e, depois que eles começaram a morar juntos, apenas pioraram.

Como se eles não soubessem mais como agir perto um do outro. Eles ainda riam, claro, ainda brincavam, sabiam conversar. Mas agora, não conseguiam mais parar de brigar um com o outro. E o que era pior, era que qualquer coisinha se tornava assunto de briga.

Qualquer coisa.

A tampa do vaso levantada, esquecer de colocar um outro rolo de papel higiênico, esquecer de lavar um prato, e então as coisas foram ficando cada vez mais sérias. Eles começaram a desconfiar um do outro. Quem era ela, porque você está olhando para ele.

A gota d’água para Lucy, no entanto, foi quando ela pegou Natsu olhando para Lisanna. Ela sabia como que ele se sentia por ela. Sabia que, mesmo que isso fosse anos atrás, literalmente, eles eram praticamente casados. E isso incomodava Lucy.

A briga então, foi a maior de todas. Eles saíram da Fairy Tail, voltaram para casa, e quando voltaram de novo, ainda estavam brigando. Discussão de casal que ninguém queria se envolver. O que foi um erro.

Porque a última coisa que Natsu disse para Lucy naquele momento foi as palavras que fizera Lucy destruir um universo.

— Se você me odeia tanto, então porque entrou para a Fairy Tail? — Ele gritou, suas palavras ecoaram na guilda. Seu rosto estava rosado, da mesma cor que seu cabelo. Ele estava nervoso, Lucy estava nervosa. Eles não estavam mais falando coisa com coisa, eles estavam irritados um com o outro e consigo mesmo. Lucy cerrou seu punho e, por um momento, naquele clima tenso que tinha se tornado ao redor dos dois, todo mundo achou que ela ia bater em Natsu. Todo mundo achou que ela ia explodir ou fazer algo do tipo.

Ela realmente explodiu. Mas não da maneira como todos estavam imaginando ou esperando que fosse acontecer.

Lucy respirou fundo e soltou suas mãos, cruzando os braços.

— Ta. — Ela disse, com tamanha calma, sua voz tão baixa que todo mundo se espantou. Espera um pouco, ela tinha realmente…? — Eu saio da Fairy Tail então.

Disse e então, virou-se em direção para a porta, seu cabelo balançando ao redor de seu rosto vermelho. Seus olhos estavam cheios de determinação, seus passos estavam travados, seus braços tremendo de raiva. Ela queria chorar. Mas não choraria.

Não por ele.

Assim que Lucy saiu da guilda e alcançou uma distância que achou que ninguém iria atrás, ela começou a correr. Correu como se aquele fosse seu último dia. Correu como se estivesse fugindo pela sua vida. Como se fosse a última coisa que faria em sua vida.

Correu até não saber mais onde estava. Ela tinha passado da cidade, o asfalto tinha sumido debaixo de seus pés e sido substituído por pedras e terra. As casas foram substituidas por arvores frutiferas e havia mais sombra do que tudo. Lucy parou, respirou fundo, sentindo dor por todas as suas pernas. Ela não sabia por quanto tempo tinha corrido. Ela percebeu que o sol tinha baixado.

Ela riu consigo mesma. Ela adorava quando fazia aquilo. Agora, ela ia sentar ali, no chão, e esperar pelo seu herói de capa vermelha aparecer e salvá-la daquela escuridão. Ela não queria ser uma donzela indefesa. Ela era muito mais que isso.

Lucy não queria voltar para sua casa. Não queria ter que encarar Natsu tão em breve. Não queria ter que dizer, ter que decidir realmente, se saia da guilda ou não. Ela tinha dito no calor do momento, não quis realmente dizer aquilo. Ou será que quis?

Involuntariamente, sua mente voltou no tempo. Ela começou a pensar em como que tudo seria se ela não tivesse aceitado o convite de Natsu tanto tempo atrás. Ela começou a pensar consigo mesma como que sua vida teria ficado se ela tivesse decidido ir para outra guilda, se ela nunca tivesse encontrado Natsu. Lucy riu consigo mesma.

Como se houvesse um outro universo onde ela nunca tinha conhecido Natsu. Como se tivesse um outro universo onde ela teria escolhido uma outra guilda. Fairy Tail era a guilda que ela tinha escolhido desde que era uma criança com sonhos de adulto.

Lucy deitou-se no tronco de árvore caído ali no chão e encarou as folhas dançantes na frente de seu rosto. O vento frio batia nas folhas das árvores e em seu cabelo dourado. Ela não sabia dizer exatamente o que naquele clima que a deixava tão calma. Talvez fosse o frio, ou o vento. Ou a combinação dos dois.

O sono foi atingindo Lucy e ela foi fechando os olhos, cada vez mais e mais. E aquele pensamento sobre escolher outra guilda a perseguiu em seus sonhos. Tanto que, no momento em que fechou os olhos e abriu novamente, ela conseguiu se ver naquele momento em um ano atrás. Ela achou engraçado no quanto tinha mudado em somente um ano.

Ela se lembrava daquele momento. Ela tinha acabado de chutar uma lata de lixo porque o vendedor da loja não tinha dado desconto suficiente para ela e ela tinha considerado aquilo uma falta de consideração. Lucy estava rindo de si mesma.

Então, ela continuou caminhando, se lembrando de detalhes daquela cidade que ela não conseguia se lembrar. Do formato engraçado dos paralelepípedos, do canto dos pássaros naquela árvore de maçãs perto da ponte. Era altura suficiente para conseguir pegar algumas maçãs, as mais de cima, as melhores de todas. E então, ela ouviu um barulho. Gritaria. Gritos de mulheres surtando, pessoas se esbarrando uma nas outras, saltos altos batendo contra o chão de pedra. Dali de cima da ponte ela conseguia enxergar o falso Salamander. O homem que fingia ser um membro da Fairy Tail. Agora, olhando para trás, para aquela menina de cabelos loiros em cima da ponte, ela percebia o quanto tinha sido tonta. Ela deveria ter percebido desde o começo que aquele homem não era o Salamander da Fairy Tail. Mas agora, ela sabia quem realmente era o Salamander. Ela conhecia ele.

Lucy se lembrava de que ela teve que se declarar para ele e pedir ele em namoro, porque estava cansada de esperar que ele fizesse algo. Ele sorriu, todo bobo, e desviou a conversa. Eles começaram a namorar algumas semanas depois daquilo, quando ele finalmente tinha percebido que gostava dela.

Foi aí que o sonho de Lucy mudou. Ela viu uma versão sua descer e ir cumprimentar o Salamander e continuar os eventos do primeiro dia que viu Natsu. Enquanto que Lucy que tinha acabado de terminar com Natsu seguiu para o caminho oposto. Porque, naquele momento, ela não queria nada a ver com Natsu. Não queria mais saber de Fairy Tail.

Ela andou um pouco ainda pela cidade, tentando prestar atenção aos detalhes da cidade, mas esquecendo-se deles no momento em que virava os olhos para outro lado, da mesma forma como acontece em um sonho.

Então, ela esbarrou em alguém e antes de encarar os olhos da pessoa na sua frente, ela acordou.

Lucy demorou um pouco para descobrir onde estava. Ela estava em uma cama macia, tão macia que ela estranhou. Ela não se lembrava de ter uma cama tão macia assim em seu quarto. Lucy abriu os olhos lentamente, tentando se lembrar do momento em que caiu no sono na noite anterior. Ela não conseguia se lembrar em como que ela tinha parado naquela cama. Não se lembrava de ter voltado para casa.

Foi então que ela percebeu que ela não tinha voltado para casa. Na verdade, não. Ela tinha adormecido num tronco de madeira caído no chão, ela não deveria estar em sua casa. A menos que Natsu tinha encontrado ela e a levado de volta para sua casa. Provavelmente aquilo tinha acontecido.

Então… Lucy olhou para baixo, sentindo nenhuma barreira impedindo a coberta de tocar sua pele. Ela estava pelada debaixo da coberta. Quando que Natsu tinha tirado sua roupa e colocado ela para dormir em sua cama? Ela precisava de receber uma boa explicação sobre tudo aquilo. Lucy levantou-se com cuidado, sentindo a coberta deslizar por sua pele aveludada e sentindo um leve choque de temperatura quando seus pés quentes tocaram o chão gelado. Lucy sentiu um leve calafrio quando percebeu que suas roupas não estavam dobradas no canto. Elas estavam espalhadas pelo chão do quarto, dobradas e viradas do avesso, não como se Natsu tivesse tirado do corpo dela, mas como se Lucy tivesse deliberadamente tirado suas próprias roupas para ir para a cama.

Ela queria saber imediatamente o que ela tinha feito naquela noite passada, porque ela não se lembrava de nada. Não se lembrava de mais nada depois de ter dormido na floresta. Lucy pegou suas roupas e as colocou rapidamente, mal podendo esperar para encontrar-se com Natsu e falar umas boas e poucas para ele. Queria entender o que tinha acontecido depois que eles brigaram.

Ela abriu a porta do quarto e foi até a cozinha, não encontrando com Natsu pela sala. Ela abriu a porta da geladeira, buscando por algo para comer. Ela não se lembrava de ter comprado metade daquelas coisas. Desde quando ela tomava iogurte de pêssego? Ela fechou a porta da geladeira em frustração e virou-se para procurar pelo Natsu. Precisava continuar a briga que eles estavam tendo.

Quando não encontrou ele nem no quarto, nem na sala, nem na cozinha, Lucy desistiu e resolveu tomar um banho. Ela estava precisando. No momento em que ela levou sua mão para empurrar a porta do banheiro, a porta se abriu sozinha e um homem musculoso, com apenas uma toalha em sua cintura apareceu do outro lado. Não era o Natsu.

Natsu não tinha cicatrizes no peito. Não era tão musculoso e tão bronzeado daquele jeito. Não tinha piercings e não tinha o cabelo preto e comprido. O rosto de Lucy ficou imediatamente vermelho e naquele um milésimo de segundo que Lucy precisou para identificar que Gajeel estava na sua frente, ela saiu correndo, nervosa, parando na sala, sentando-se no braço do sofá, com as mãos no rosto quente. Ela tinha acabado de ver Gajeel semi nu na sua frente.

Ele a seguiu, rindo. A toalha ainda em sua cintura.

— O que aconteceu, coelhinha? — Ele perguntou com um sorriso sarcástico. E, por Deus, aquele homem precisava colocar uma roupa. Ele parecia um deus grego com aquele tórax definido e músculos perfeitamente delineados. Ela se pegou encarando e então virou o rosto.

— O que você está fazendo na minha casa? — Lucy conseguiu enfim perguntar, seu rosto ainda vermelho, sua voz tremida. Ela estava nervosa e Gajeel percebeu aquilo. Ele queria aproveitar aquele momento.

— Como assim? — Gajeel sorriu, arqueando a sobrancelha. — Essa é a minha casa. Eu moro aqui.

— Não, você não mora aqui. — Lucy disse e tentou encarar os olhos dele, mas ele estava perto demais agora. Tinha gotas d’água escorrendo pelo seu abdômen e Gajeel estava centímetros dela. Lucy caiu para trás no sofá, suas pernas levemente abertas e só então ela tinha se lembrado que não tinha encontrado sua calcinha. Ela imediatamente se arrastou para o outro braço do sofá, apertando a saia entre suas pernas.

— Você está me expulsando? — Gajeel perguntou, não conseguindo entender o que ela estava fazendo. Ela não estava bem. Estava claramente nervosa e ele não conseguia entender porque ela estava tão nervosa assim. Afinal, ele sabia que aquela não era a primeira vez que ela via ele sem roupas. — Amor, você está bem?

— Porque você está me chamando desse jeito? — Lucy perguntou, seu rosto mais vermelho do que nunca. Agora, ela estava em uma posição da qual não conseguiria sair tão cedo. Gajeel tirou sua mão da toalha, amarrando-a na cintura e foi sentar-se ao lado de Lucy no sofá. Ela tentou fugir, mas atrás dela estava a parede e do seu lado, as costas do sofá. Ela estava encurralada.

— Porque você é minha namorada. — Gajeel disse e seu sorriso desapareceu. Ele chegou mais perto dela e Lucy fechou os olhos. Ela sentiu o toque dele em sua testa. Ela abriu os olhos novamente e viu que ele estava preocupado com ela. Porque? E o que ele estava fazendo ali? — O que houve? Você se esqueceu de quem eu sou?

— Eu sei quem você é. — Lucy disse, sua voz ainda tremida, porém, um pouco mais baixinha agora. Ela não tinha para onde fugir. — Eu só quero saber o que você está fazendo aqui na minha casa.

— Coelhinha, você que me chamou para a gente morar junto. Depois de seis meses de namoro. Você realmente não se lembra? — Gajeel perguntou. E ele então tocou na bochecha dela. Lucy estava achando tudo aquilo estranho. Ele nunca foi carinhoso assim. Nunca tinha visto aquele lado dele antes. O máximo de fru fru que ela já tinha visto era Gajeel de terno branco cantando.

— Isso é uma pegadinha, não é? — Lucy perguntou. Era a única explicação lógica. — Quem te colocou para fazer isso? Foi o Gray? O Natsu também está envolvido nisso?

— Não me diga que você conhece esses frutinhas. — Gajeel disse, franzindo o cenho.

— Não me diga que você não conhece eles. — Lucy disse, achando tudo aquilo mais confuso ainda. — Eles estão na mesma guilda que você.

Foi então que Gajeel parou para rir. Uma grande e longa risada que deixou Lucy mais confusa. Ela estava começando a ficar tonta. E então ela percebeu. No braço dele, ao invés da tatuagem da Fairy Tail, havia outro desenho ali.

Quando Lucy ergueu sua mão direita, ela viu que estava tremendo. O desenho da Fairy Tail não estava ali. Ela não tinha nenhuma tatuagem em suas mãos. Ela passou suas mãos por seus braços, procurando alguma coisa. Gajeel parou de rir e começou a observar Lucy surtando em silêncio. Não tinha nada que ele pudesse dizer para ela naquele momento. Ele percebeu o que ela estava procurando. Lucy sentiu o toque da mão dele em sua coxa e pulou com o susto.

— Calma. — Ele pediu, erguendo a saia com um pouco de cuidado, expondo para ela uma tatuagem preta na parte externa de sua coxa. Lucy arregalou seus olhos. Era o mesmo desenho que tinha no braço de Gajeel.

Phantom Lord.

Ela não fazia parte da Fairy Tail e sim de Phantom Lord.