Cronicas de Arcadia

A Aberração e o Ninguém - Parte 3


Ozires sente seu corpo sendo puxado cada vez mais para o fundo do lago, descendo em grande velocidade. Tudo foi ficando escuro até ele não conseguir ver mais nada. O frio congelante do lago desaparece. O jovem sente que até o próprio lago, aparentemente, desapareceu. Seu corpo passa a flutuar no nada.

— O experimento foi um fracasso. - Diz uma voz feminina. - Deveríamos destruir ele.

Uma luz ilumina toda a escuridão. A imagem de um humanoide surge na frente de Ozires. Ele estava de olhos fechados, abraçando os joelhos e aparentemente, chorando. Era branco como mármore e não possuía cabelos.

Mas, as orelhas eram de um elfo. Ozires sente um aperto no estomago.

"Sou...Eu...?"

— Ela ainda pode ser útil para alguma coisa – Retruca uma voz masculina.

— Ela!? Não trate essa aberração como se fosse uma pessoa.

A "coisa" reagiu a palavra olhando com fúria para Ozires. Seus olhos eram prateados como os de...

"Valavë!" Ozires estica o braço tentando sem sucesso tocar a amiga. Ele tenta encontrar seu braço olhando para todas as direções sem nem se quer encontrar seu corpo. Ozires volta a olhar para a garota que ainda o encarava.

Seu olhar o deixava terrivelmente perturbado. Como se ele tivesse alguma coisa a ver com aquilo.

— Ela ainda pode servir de cobaia para experimentos futuros... – A voz do homem volta a falar.

— Essa coisa nem tem centelha. Um elfo sem centelha! - A voz feminina diz em tom zombeteiro. - Ela se quer apresenta características de um hibrido. Fracassamos totalmente.

— Por isso que eu estou curioso. O que será que ela tem de especial? - A voz masculina aparenta caminhar. - Quero fazer alguns testes com ela e ver como o corpo dela reage.

A expressão de Valavë muda lentamente de ódio para medo. Ozires olha para trás tentando enxergar alguém, mas não vê nada. Ele volta a olhar para amiga e vê que ela está se arrastando para trás, como se estivesse tentando fugir de algo.

"Vaaaal! Correeee!" Ozires diz tentando chegar perto dela. A garota segura o pescoço como se algo estivesse estrangulando-a. Ela tenta dizer alguma coisa, mas as palavras saem engasgadas.

E então, tudo ficou escuro.

E com a escuridão, vieram os gritos.

Os gritos da garota vieram de todas às direções. Gritos de dor e de pânico, emendados a choros, soluços e suplicas.

"Valavë! Cadê você?" Ozires tentava gritar mais alto do que ela, mas não conseguia. Ele olhava por todas as direções a procura de sua amiga. Ozires leva a mão aos ouvidos tentando amenizar os gritos. "Não... Eu não fiz isso." Ele começa a chorar. "Eu não fiz isso com ela... Faz parar... Por favor..." Os gritos aumentaram de intensidade. "Eu era assim?" Os gritos param. "Eu sou assim?" Ozires diz olhando para às mãos.

O silencio parecia concordar

— Ri-ri-ri-ri...

Alguma coisa ri atrás do garoto fazendo seu sangue gelar. Ele tenta olhar para trás, mas é impedido por mãos gélidas que seguram seus ombros. Ozires engole em seco e fica paralisado. Às mãos que o seguravam descem até sua barriga se envolvendo em um abraço.

— Você se lembra? - Às vozes de dezenas de pessoas sussurravam ao mesmo tempo em seu ouvido.

— Va-v-Val... - Ozires tenta dizer em meio ao pânico - S-ssso...

- Você está pedindo ajuda para a elfa!? Ririririri - Às mãos apertam o garoto. - Depois de tuuuuuuudo o que você fez...? - As vozes dizem em tom agonizante.

— Por que? Por que eu fiz isso com ela? - Ozires diz em meio a soluços.

— Quem sabe? Talvez você nem tinha um motivo...

— UuuuaaAAARArrrrgh! – Ozires berra. - Não é real. Isso não é Real!

— Se não é real, por que você tem medo? Por que você resiste? Entregue-se ao que você é!

— O que que está acontecendo...? - Ozires diz parando de chorar. - Onde eu estou?

— Você está onde merece estaaaaaar...

— Se eu fiz isso com a Val, por que ela estaria ao meu la[...]

— Silêncio!

Um brilho surge na frente de Ozires. Iniciou-se como o de um vagalume e seguiu ganhando tamanho e intensidade. Até se tornar um braço estendido

— Nããããããão! – Às vozes dizem.

— Val? – O garoto diz estendendo a mão dele para ela.

Dessa vez, eles se tocam e se seguram firmemente. O braço da elfa puxa o garoto para cima deixando a escuridão para trás.

***

Valavë corre para o local onde Ozires foi jogado. Ela se ajoelha e agarra o garoto emergindo o corpo dele. Os olhos dele estavam abertos, mas a pupila estava totalmente dilatada.

— Ah droga! – A elfa diz saindo do lago. – Ozires? – Ela batia no rosto dele enquanto caminhava. A guerreira o deita no chão e coloca a cabeça no peito dele.

“Parou...?”

— Não, não, não! - A elfa senta em cima de Ozires e começa a pressionar o peito dele. – Ozires! Acorda! – Valavë o tampa seu nariz e assopra em sua boca. – Por favor, era brincadeira! – Ela volta a massagear desesperadamente.

Vários minutos se passaram entre massagens, respiração boca-a-boca e checando o coração do garoto. Ele permanecia imóvel. Lagrimas começam a escorrer pelo rosto de Elfa.

— Não me deixa! – Ela passou a esmurrar o peito dele. – Volta!

Uma piscada.

Foi rápido, mas ela pode jurar que ele piscou. A elfa ouve os batimentos cardíacos do garoto e enxuga as lagrimas. Ela nota que os olhos dele voltavam lentamente ao normal.

A primeira coisa que Ozires registrou foram os olhos prateados de Valavë . Ele tenta dizer algo, mas engasga com agua que havia em seu pulmão. Ele tenta se levantar, mas a elfa, ainda estava sentada nele.

— Por um segundo eu achei que teria que te enterrar. – Ela diz num tom ríspido.

— Tinha... – Ozires respira fundo – Algo, me puxando!

— Era só você boiando feito uma pedra! – A elfa sai de cima dele sentando-se ao lado do garoto.

Ozires se senta segurando sua cabeça enquanto se lembrava do que havia acontecido. Ele escuta um eco dos gritos de Valavë e olha para ela espantado.

— O que foi? –Ela diz. – Você esta me assustando.

Ozires agarra sua mestra em um abraço.

— Por favor, me diga: O que você sente por mim?

— Hum!? Que merda de pergunta é essa?

— Eu te fiz alguma coisa no passado, Val? – O garoto desaba em choro e tremedeira. – Ozires era alguém que você não quer que eu lembra?

— Ozi...– A elfa diz num tom quase triste e abraça ele. – Do que você lembrou?

Ozires não responde, apenas chora nos braços dela.

— Hey, calma Oz, você é... A ultima coisa que iria querer me fazer mal na face da terra. – Valavë diz acariciando o cabelo dele. – O Ozires é e sempre foi esse ser fantástico que esta aqui e agora.

— Jura? – Ele diz em meio aos soluços.

— Juro! Eu não sei o que você viu. Mas, o que eu sinto por você...

— Urgh. – Ozires geme segurando o peito. – Esta doendo pra caramba.

— Por que será? – Valavë tenta disfarçar um riso. Ela iria se levantar mas é impedida pelo garoto que a segura pela nuca.

Ozires a beija.

Inicialmente, os dois ficaram imóveis. Gradativamente, eles moviam os lábios enquanto se deliciavam com a explosão de sensações que vinham da boca e espalhava pelo corpo. Para Ozires, aquilo era, de alguma forma, o certo a se fazer naquele momento.

Eles desfazem o beijo. Ozires nota que às marcas negras da elfa haviam desaparecido. Mas, decidiu não comentar.

— Vamos. – Valavë diz. – Temos muito que andar.