Counting Stars

Único; No more counting dollars, we'll be counting stars


Dedicado a Angie

“Ultimamente, eu tenho perdido o sono. Sonhando com as coisas que poderíamos ser. Mas, querida, eu tenho rezado muito. Eu disse: Chega de contar dólares. Nós vamos contar estrelas”

(Counting stars - OneRepublic)

Eu te conheci quando tínhamos onze anos, no fundamental, lembra? Sempre tão intelectual, reclusa e inteligente, vivia dentro da biblioteca. Foi lá que nos falamos pela primeira vez. Seus cabelos eram longos e pretos, usava sempre a blusa de frio roxa surrada, óculos grandes e finos de lentes grossas, me chamavam atenção, assim como seu aparelho ortodôntico. Você sentia vergonha dele, Kitten e suas manequins não a deixavam em paz. Resolvi as enfrentar, te proteger — ao menos tentar. Continuaram te enchendo e eu virei um novo alvo para elas também, mas em compensação nós criamos um laço naquele dia, nos tornamos amigos.

Depois disso, viramos uma dupla inseparável, estilo “Chris e Greg”, onde um estava o outro acompanhava. Eu não recordo ao certo quando minha visão se aflorou e eu comecei a te ver de outra maneira, só me recordo que o sentimento foi avassalador. Te amei em segredo por um bom tempo, minha insegurança apitava, procurei não arriscar perder nossa amizade por um sentimento que poderia dar em nada.

— É burrice — Richard, nosso amigo em comum, me disse uma vez. — Se você a ama, é burrice não contar.

— Mas e se…?

— Não sei qual dos dois é mais cego. É óbvio que os dois são loucos um pelo outro. Se eu fosse você tomaria logo uma atitude, Malchior anda rondando ela, e sinto te dizer, mas, segundo a Kory, ele é um bom partido. — declarou, sério.

Richard e sua grande boca!

Você chegou a ter um affair com aquele cara problemático, não sei o que viu nele, de verdade. Eu o odiava, e isso ia além de ciúmes, afinal ele só te fez sofrer, pisoteando seu coração, te tratando como se fosse nada.

Quando deu um basta no relacionamento, você ficou mal, mas era o certo a se fazer. Apoiei sua decisão e fiquei ao seu lado como um bom amigo deveria fazer. Te chamei para sair para vários lugares, a fim de animá-la, desde uma tarde agradável na biblioteca — mesmo que eu não lesse nada, amava te ver concentrada enquanto lia um livro maluco de Stephen King — às atrações anuais que vinham a Gotham, como o parque de diversões.

Graças a mim, voltou a sorrir largamente e ver seu sorriso bonito deixava meu coração quentinho.

O mais irônico é que, meses depois, você tomou uma atitude em relação a gente. Se declarou, com o apoio de Kory. Sempre te considerei uma mulher de atitude, porém conseguiu suprir minhas expectativas. Aconteceu durante uma chuva de meteoros, Kory quem sugeriu o local, nós contávamos estrelas, encostados na grade de segurança, no desfiladeiro, no pico mais afastado e alto da cidade.

Vestia uma camisa preta com a estampa de uma banda de rock oitentista, calça jeans azul escura, all star branco e lilás nos pés. Brincos de caveiras encaixados nas orelhas. Maquiagem leve, sombra preta e batom roxo. Pulseiras de couro artificial no pulso direito. Linda!

Quando se declarou estava toda envergonhada.

— Sei que o que vou dizer agora é bem improvável — iniciou, temerosa. Suas palavras marcam vivas em minha memória. —, mas eu tenho sentimentos por você, e eles vão além da amizade. Eu não sei o que sente por mim, muito menos acredito que seja correspondido, mas eu tinha que confessá-los para você antes que me sufocassem. Eu gosto muito de você, Garfield Logan, gosto muito mesmo! Nem sei como explicar.

Arregalei os olhos com a descoberta. Pisquei algumas vezes, quase me belisquei para garantir que não era um sonho.

— Eu também gosto muito de você, Rae — confessei colocando minha mão em cima da sua. Minhas bochechas esquentaram, meu coração disparou. Sorri de orelha a orelha. — Gosto há muito tempo, pra falar a verdade, só era covarde demais para te contar, até nesse quesito você consegue se sobressair a mim — ri.

Começamos a namorar desde então, seu beijo era tão doce. Fomos felizes no tempo que ficamos juntos. Dois anos de namoro, até que terminamos o ensino médio e começou a corrida para se ingressar em uma faculdade, o ponta pé inicial para a vida adulta. Você estava ansiosa, suas unhas roídas que o digam. Como eu disse, não precisava se preocupar, seu nome saiu na lista da segunda chamada de medicina em Harvard. Ao contrário de mim, ausente nas chamadas no curso que prestei. Para frequentar teria que se mudar para Boston, quase se recusou a ir por minha causa, a impedi.

Para mim, você, Rachel Roth, era perfeita, meu encaixe perfeito, tudo que eu precisava para me manter firme, mas eu não era o que você precisava...

Com muita dor no peito, a deixei voar, a deixei ir. Não me arrependo disso, pelo contrário, me alegrava ver que estava radiante, feliz atrás de seu sonho. Infelizmente, não pude acompanhá-la. Só iria a atrapalhar!

Vi todos nossos amigos entrando na vida universitária. Kory cursou artes visuais e abriu um ateliê, Richard entrou para a academia de polícia, anos depois, fez o teste e se tornou detetive, o relacionamento deles superou a barreira da fase jovem adulta, apesar de uns deslizes e eles se casaram há três anos e Victor conseguiu uma vaga em engenharia mecatrônica. Inevitavelmente me afastei deles, o mesmo deve ter acontecido contigo.

Tentei seguir a vida, creio que também tentou. Busquei passar em alguma faculdade, no ano seguinte, sem sucesso. Comecei a ajudar na padaria dos meus pais, sendo um dos atendentes. Diariamente recebia cantadas das clientes, apenas sorria, educado. Às vezes respondia, marcava encontros, raramente ultrapassava isso.

Não posso negar que saí com outras mulheres durante esse tempo distante. A que eu fiquei por mais tempo foi a Tara Markov. Você chegou a conhecê-la na academia, numa das poucas vezes que pisou aqui depois de se formar, era a personal trainer do seu pai, Trigger. Seu pai que apresentou vocês duas, ela me disse que a percebeu se sentir incomodada ao ver o anel brilhante no dedo dela, seu olhar te dedurava. Duramos três anos e meio juntos, chegamos até a noivar, no entanto, achei imprudente levá-la ao altar. Ela me amava como se eu fosse tudo, eu era incapaz de retribuí-la na mesma intensidade. Mesmo com o término, continuamos amigos ou quase.

Com o tempo, decidi deixar a vida amorosa de lado e começar a focar em outras coisas, como o artesanato. Aos vinte e cinco anos entrei na faculdade de Biologia, que fica aqui mesmo em Gotham, confesso que desanimei bastante e nem esperava que fosse fazer um curso superior algum dia.

Durante anos lhe escrevi cartas, cartas nunca enviadas. Coragem faltava, sentia vergonha disso. Sua mãe, Angela, pode confirmar, foram duas às vezes em que a pedi seu endereço na esperança de um dia conseguir enviar alguma coisa. Ela também me disse quando se formou na faculdade, mostrou seu book de formatura. Você estava linda. Antes de ir embora, ela frisou o fato de que viria visitá-la naquele final de semana, queria muito que eu a reencontrasse. Mas eu falhei com ela, falhei comigo, não tive ânimo de ir ao seu encontro. Evitei aquela avenida nesse fim de semana. Temi o seu olhar de desapontamento.

Me cansei de pensar nas possibilidades nossas, do que poderíamos ter sido. Será que se insistíssemos naquilo teríamos futuros? Ainda estaríamos juntos? Eu a convenceria a adotar algum bichinho de estimação? Será que a notória Dra. Roth reservava um momento da sua vida corrida para pensar em mim? Eram perguntas ao vento, o qual nunca me daria uma resposta. Essas dúvidas roubaram-me o sono, passava noites em claro refletindo.

Quase morri uma vez. Fui fechado por um carro num cruzamento, de moto, enquanto chovia. Fiquei inconsciente. Mamãe me contou que você veio me visitar, Angela te deu a notícia e veio correndo para cá, pedindo férias adiantadas no hospital. Me velou quando inconsciente, mas não pôde estar aqui quando despertei, a ala da psiquiatria te chamava.

Outro desencontro. Desencontros viraram um costume entre a gente.

O que mais posso te dizer? Bem, meus pais se separaram quatro anos posteriores de sua partida. Minha mãe teve enfisema pulmonar recentemente devido ao uso frequente do cigarro, ficou internada, todavia agora está se recuperando. Meu pai se mudou para outro estado, casou com outra mulher e hoje tenho um irmão de sete anos, acredita?

Sobre mim… Eu amadureci, parei com minhas piadinhas sem graça. Deixei meu cabelo crescer, a barba por fazer, gostei do resultado. Lembro-me que você chegou a comentar uma vez que achava homens de cabelos compridos atraentes. Olha eu pensando de novo em alguém que se encontrava distante… até o antepenúltimo domingo...

Empadeci.

Meu coração gelou.

Passou longe de minha imaginação de que naquela tarde fria, tendo tudo para ser mais uma normal que cairia no esquecimento, iria me fazer quase colapsar ao ver suas orbes violetas que tanto senti falta se cruzando com as minhas, novamente, dez anos depois, adentrando no meu estabelecimento.

Você sorriu docemente para mim, saudosa. Sentou-se numa mesa no fundo, perto da janela — a mesa que costumávamos revisar o conteúdo após a escola, que só de olhá-la me fazia pensar em nós. Assustou-me quando envolveu seus braços ao meu redor, com força, quando fui atendê-la.

— Senti saudades, muitas saudades. — afirmou. — Não te dei permissão para sumir desse jeito de minha vida, idiota!

Ali nasceu um novo start para a gente. Eu me sinto vivo, disposto, depois de muito tempo. Agradeço por existir e fazer parte da minha vida!

Podemos voltar a contar estrelas, no desfiladeiro, juntos.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.