Corta!
Capítulo 3
- Sakura, faça um pouco mais de comida hoje, vamos ter companhia no jantar. – disse Touya, assim que chegou a casa depois de mais um comercial.
- Deixe-me adivinhar... – ironizou a menina sentada no sofá. – Essa pessoa é... O Syaoran, acertei?
- Sim, acertou. – respondeu o outro como se não tivesse percebido a ironia.
- Já não acha que esse cara anda filando muita bóia aqui em casa, não?
- Ele é meu amigo, Sakura. Que eu saiba, tenho direito de ter amigos e convidá-los para vir até minha casa. Além do mais você só vai precisar fazer o jantar, já que ele é quem trás a sobremesa. – a menina fechou a cara e rumou até a cozinha pisando duro.
Já havia se passado vários dias desde o primeiro comercial da carreira de Touya e de Syaoran, onde o diretor em quase todos os trabalhos que tinha convidava tanto o moreno quanto sua irmã, porém Sakura declinava o convite. Com o primeiro pagamento Touya comprou um carro e fez pequenos reparos na casa; noventa por cento do cachê de Sakura ele guardou numa poupança e os dez por cento restantes entregou a ela para que fizesse o que quisesse. Trabalho era o que não faltava, unindo ainda mais os dois homens e consequentimente à adolescente ao diretor, já que Touya sempre o convidava para o almoço ou o jantar, fazendo com que Sakura se sentisse incomodada com a presença do chinês que, sem quê nem pra quê, mexia com a sua cabeça e seu coração.
- Okaeri! – saudou Touya, assim que abriu a porta depois do tocar da campainha. O chinês sorriu constrangido.
- Sumimasen.
- Já disse que não precisa dessa formalidade, você já é quase um membro da família. – enquanto falava acompanhou o visitante até a sala.
- Não exagera.
- Mas é verdade! – Touya chegou mais perto e olhou para os lados, enquanto se sentavam no sofá, para sussurrar: - Eu vi a Sakura usando um conjunto que dei a ela. Tudo bem que ela não saiu do quarto, mas só o fato de ter colocado uma roupa feminina por livre e espontânea vontade já é um milagre!
- E você acha que eu tenho algo a ver com isso? – sussurrou também.
- Tenho certeza!
- Não viaje Touya! Ela deve ter visto alguma menina usando algo parecido e resolveu ver como ficava nela.
- Você não a conhece! Já cansei de vê-la olhar para muita menina, até mesmo com inveja, e mesmo assim nunca tocou numa blusinha cor de rosa!
- Ainda acredito que não tenho nada a ver com isso.
- O que vocês estão cochichando, hein? – perguntou Sakura, no portal que dava para sala de jantar com as mãos na cintura. – Quem cochicha o rabo espicha, sabiam?
- Estávamos falando de você, se é isso que quer saber. – confessou Touya ficando em pé, sendo seguido pelo chinês.
- E sobre o que exatamente? – indagou assim que o irmão ficara lado a lado com ela.
- Sobre o fato de você de você estar caindo de amores pelo diretor chinês que vai jantar aqui em casa hoje. – implicou em resposta.
- Mas isso é mentira! – exclamou com o rosto pegando fogo, quanto virava o corpo em direção do irmão, que já se encontrava a mesa.
- Por favor, pequenas (grandes) crianças. – pedia Syaoran conduzindo a adolescente até a mesa pelos ombros. – não inventem de brigar agora, sim?! – puxou uma cadeira e fez com que a menina se sentasse indo sentar-se na sua mesma cadeira costumeira.
- Mas o que o Touya disse é mentira!
- Pode até ser. Não acredito em nenhum dos dois com relação a esse assunto, portanto, vamos comer em paz? Aliás, trouxe torta de limão!
Touya segurava o riso enquanto via sua irmã indignada e o chinês comendo tranquilamente. Logo o sorriso do moreno se alargou depois de lembrar o que ouvira sem querer...
- Estou para lançar um novo perfume e precisava de um casal diferente! Infelizmente a notícia de que o casal anterior eram irmãos vazou rápido demais! – dizia um homem.
- Realmente. Mas, convenhamos, o Lee é um rapaz bonito, não merece ficar só atrás das câmeras. – comentou a mulher que acompanhava o tal homem.
- Verdade. Talvez... – deu uma pausa. – se usássemos a menina com o Lee...
- Melhor não! Tem que ser um casal diferente.
- Então! É melhor de que os irmãos juntos, ainda mais num comercial que tem que abusar da sensualidade. E outra, não quero me desfazer dela. Assim juntaremos o útil ao agradável!
Não podia dizer que ficara de certo ponto indignado, mas depois percebeu que eles tinham razão, afinal era deles o perfume em que fizera seu primeiro comercial e se eles propuserem isso mesmo poderia fazer com que os dois se aproximassem mais.
...
- Não, não e não!
- Pelo amor de Kami, nem pense em recomeçar!
- Mas Touya...!
- Não adianta Sakura! Você vai e ponto final.
- Você não manda em mim!
- Mando sim!
- Eu não quero!
- Como não quer? Você não estava reclamando que precisava de dinheiro?
- Mas eu tenho dinheiro! É você quem não me dá!
- Você tem que dar valor, fazer por merecer. Só pelo o que você acabou de dizer, dá pra perceber que ainda tem muito que aprender.
- Pára de graça! Já disse que não quero! – nesse instante, por um triz, a paciência de Touya não se esvaíra a ponto de esbofeteá-la.
- Está bem. Se você quer agir como uma garota mimada, o problema é teu. Só quero deixar bem claro que não vou cuidar de você a vida inteira, portanto, trate de declarar sua independência se não faço isso por você! – e logo em seguida subiu para o seu quarto.
Certa de cinco minutos depois, Sakura o seguiu.
- Desculpa Touya. Você tem razão. Agi como uma criança mimada, não tinha necessidade e...
- Também tenho que me desculpar. – a pegou pela mão e sentou-a ao seu lado na cama. – Eu não posso ficar te obrigando a fazer as coisas. – abraçou-a pelos ombros e deu um beijo em sua testa.
...
- COMO É QUE É? – gritou Sakura quando recebeu o script e as coordenadas.
- Descobri hoje, antes de vir pra cá que foi quando me entregaram isso e me explicaram o que é para fazer. – se explicava o chinês.
- Mas, mas... – a menina ainda estava incrédula.
- Se não tivesse sido tão difícil te convencer a fazer esse comercial, até poderia te dar a sugestão de voltar atrás. – comentou Touya.
- Aposto como deve estar morrendo de felicidade. – alfinetou a adolescente.
- Pra ser sincero não estou muito contente...
- Se quiser eu converso com os responsáveis do perfume, vê se dá para modificar alguma coisa... – propôs Syaoran.
- Não. – respondeu Touya antes de Sakura. – Eles vão alegar falta de ética e pode impor a decisão deles ou coisa do gênero.
Depois de terem convencido Sakura a aceitar o papel, começaram-se os ensaios, que, aliás, era uma comédia! Sakura não tinha o menor jeito e vestida feito um menino perecia mais um casal gay do que hereto, sem contar o constrangimento do jovem chinês, tendo que seduzir e ser seduzido na frente do irmão da garota. Já este quase ria vendo os dois naquela cena atrapalhada.
- Será que vou ter que sair da sala para vocês ficarem a vontade, ou não? – indagou Touya com um olhar de troça, fazendo os dois ficar mais sem jeito.
- Não precisa! – quem teve coragem de falar foi o chinês – Aliás, já estou de saída...
- Mas já?! – Sakura deixara escapar.
- Bem... Acho que quem tem que sair é eu. – disse Touya, saindo da sala.
- Se quiser paramos por aqui e recomeçamos amanhã ou depois...
- Não! – Sakura quase gritou. – Digo... Não precisa ir embora agora, tem coisa... Que ainda não entendi. – disse sem jeito.
- Daijoubu, então.
Sakura tentava ensaiar e se perguntava por que diabos insistira para que o homem ficasse, afinal antes de ele chegar fizera a costumeira reclamação de que ele praticamente mora ali e que para variar iria filar bóia de novo; agora quase o mandara ficar. Sabia que estava de certa forma incomodada com o modo como a tratava, como se ela fosse uma estranha, uma desconhecida; sentia falta daquela “paixão” com que ele a abraçara naquele comercial em que estrearam. Isso a incomodava e muito! Também entendia que o fato de estar vestida feito um homem atrapalhava bastante!
Syaoran não sabia como levar aquele ensaio, Sakura era só uma adolescente e tinha medo de ela não separar as coisas e acabar se apaixonando ou achar que esta se apaixonando, sem contar que ele também corria esse risco. Ora! Não era cego e tinha plena consciência do corpo que ela tinha, da beleza dela, beleza que ela escondia com esse jeito de moleque que acabava encantando-o mesmo assim. De repente sentiu uma mão espalmada em seu peito e quando a fitou viu o olhar travesso nos olhos da menina, sentiu ela o empurrando e fazendo-o deitar-se no sofá.
- Mas o que...? – indagou incrédulo.
Syaoran percebeu que apesar da ousadia, ela estava hesitante. O que ela queria? Sakura deitou-se sobre ele observando-lhe todo o rosto e detendo-se algumas vezes em seus lábios. O chinês percebeu que ela desejava um beijo e aquilo o deixou alarmado. Não sabia como havia sido a sua vida antes de se vestir de garoto e se já foi beijada alguma vez, sem contar que o Touya poderia estar escondido em algum lugar. A menina foi se aproximando e antes que ela conseguisse o que queria Syaoran levantou-se do sofá, deixando a adolescente surpresa e decepcionada no mesmo lugar.
- Gomen. – pediu ele arfando. – Eu não posso...
- Daijoubu. – interrompeu ela com a voz mais doce do que de costume. – Eu sabia que... Sabia que você não ia querer nada comigo. – Sorriu azeda enquanto se sentava de cabeça baixa. – Sou só uma menina, irmã do seu colega de trabalho, enquanto você é um homem que já deve ter namorada.
- Não é isso! – adiantou-se o rapaz sentando ao lado dela e tomando suas mãos nas dele. – Você... É mais nova, isso é fato, mas... – suspirou. – Não vou negar que...
- Vá embora. – pediu Sakura com a voz embargada.
- Olha, eu...
- Vá embora! – exigiu.
Syaoran não teve alternativa que não seja fazer o que ela queria.
...
- Sakura, sai logo desse quarto!
- Já disse que não vou sair!
- Não quero que perca o ano na escola!
- Prometo que amanhã eu vou.
Touya nada fez a não ser suspirar. Sabia que não fora uma sábia idéia deixá-los sozinhos na noite anterior. Agora ela não queria sair do quarto de jeito nenhum. Resolvendo fazer o que ela queria, encaminhou-se para a sala pensando em procurar o possível causador do problema, quando a campainha tocou. Achando estranho alguém aparecer àquela hora, Touya abriu a porta dando de cara com Syaoran segurando uma caixa embrulhada que parecia ser de bombom. O convidou para entrar e antes que fizesse qualquer pergunta o outro contou resumidamente o que aconteceu e que queria entregar o presente a ela, porém não pessoalmente.
- Tem certeza? – perguntou por desencargo de consciência.
- Absoluta. Pelo pouco que a conheço imagino que não me queira ver nem pintado.
- Bom, então espere ai que eu...
- Não! Já estou de saída. – informou o outro rapidamente.
Touya estranhou.
- Deijoubu. Você é quem sabe. – mal terminou de falar e o chinês se despediu e saiu. – Esses dois estão muito estranhos pro meu gosto... – pensou em voz alta subindo as escadas. Logo foi entregar o tal presente. – Sakura abra a porta.
- Já disse que não vou sair!
- E não vai, só quero que abra a porta. Te trouxeram um presente.
- Presente? – ouviu a pergunta abafada antes de a porta abrir. – Quem trouxe?
- Essa pessoa me disse que você não ia gostar nem um pouco de saber.
- Será que foi o baka do Eriol? – dizia ela pensando alto. – É impressionante! Ele gosta da Tomoyo, no entanto vive no meu pé!
- Não sabia desse. – comentou desconfiado. – Demo não é esse não, parece que é outro que você não quer ver pintado de outro.
- Outro? Demo quem...? – ela pegou a caixa ainda pensando. – A não ser que seja o diretor... – vendo a cara do irmão logo percebeu que acertou na mosca. – Mas que...
- Olha a boca...! Bem, o presente está entregue.
- Ele está aí?
- Iie.
- Ah...
- Tenha um bom dia! – Virou as costas e saiu.
Sakura fechou a porta e sentou-se na cama com o intrigante presente. Estava na cara que era chocolate, mas... Porque ele se dera o trabalho de lhe dar um presente? E ainda mais entregá-lo tão cedo. Consciência pesada talvez...? Suspirou enquanto desembrulhava a caixa e se surpreendeu ao encontrar um cartão preso a ela.
Perdoe-me pelo meu erro
Não queria decepcioná-la
Lee Syaoran
A jovem passava a mão pela caligrafia bem feita escrita no cartão. Sabia que sentia algo forte por ele, mas será que era recíproco? Releu o cartão e recordou-se da primeira vez que chegara tão perto de um homem.
- Corta! Por Kami, corta! – Touya assustou-se e Sakura se encolheu. – Olha, eu estou tentando, de verdade, manter a paciência, mas desse jeito não dá! - Syaoran levantou da cadeira e foi em direção ao cenário pisando duro. – Ele é seu irmão! Não vai pegar mal se você chegar mais perto dele! – exclamou para Sakura, sentindo-se incomodado por tratá-la de forma rude, mas não conseguia parar. – Custa você abraçá-lo assim? – e antes que pudesse pensar no que estava fazendo, pegou a garota pela cintura usando uma força mais do que necessária, fazendo com que seus corpos se chocassem.
Suspirou mais uma vez. Aquele maldito chinês tomara o seu coração e ela sabia disso. Iria beijá-lo ontem só para ter certeza, entretanto a recusa dele já foi suficiente. O motivo por querer ficar em casa era justamente esse, já que todos diziam que ela estava diferente e só agora descobrira por que. Não queria enfrentar as pessoas e assumir algo que estava na cara: apaixonou-se pelo chinês. O que mais doía era o fato de que ele nunca olharia para ela com outros olhos a não ser da fedelha chata que só se veste feito moleque e que é irmã de seu mais novo “amigo de infância”. Só que não podia negar que a admirara quando usara aquele vestido para o comercial. Será que se abandonar essas roupas de menino e voltar a ser uma garota como há anos atrás ele vai notá-la da forma que ela quer? Mas e o sonho da sua mãe? Sakura suspirou pela terceira vez. Estava num verdadeiro dilema.
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