O herdeiro Vieira voltou a casa permanentemente assombrado com o medo do seu passado. Impressionante como um passo irrefletido e irresponsável pode trazer consequências gravíssimas na vida das pessoas.

Logo a seguir ao jantar, Edgar se foi deitar pensando em como seria ser o seu encontro com Laura no dia seguinte. Por um lado, se sentia muito entusiasmado, desejoso por a ver novamente, pois sentia um encanto fortíssimo por ela. Por outro, se sentia receoso, pois não sabia como iria resolver a sua situação. Se ele lhe contasse a verdade, provavelmente ela nunca mais o quereria ver, mesmo lhe explicando as circunstâncias em que aquilo aconteceu. Porém, ao lhe ocultar a verdade também sentiria que a estaria traindo, dando-lhe a entender que era um homem livre, quando de fato não era. À noite se foi deitar com esse peso na consciência e acabou dormindo mal por causa disso.

No dia seguinte na fábrica, Edgar pediu a seu pai para lhe dar um tempo livre logo a seguir ao almoço, pois precisava de resolver um assunto particular:

— Vá! Mas não demore, viu! Temos muita coisa para fazer. - disse Bonifácio, que logo desconfiou que o assunto particular se tratava de saias.

Edgar saiu então e correu para a igreja onde ficara de se encontrar com Laura.

Todo ele tremia enquanto caminhava, desejando e ao mesmo tempo temendo este encontro.

Quando chegou à igreja reparou que uma enorme fila de beatas estava aguardando a sua vez para se confessarem. Todas elas tinham o mesmo ar: ingénuo, carente e superficial, nada que tivesse a ver com a maneira de ser de Laura. Todas elas estavam vestidas de preto, lá à frente ao pé do confessionário, enquanto Laura estava cá atrás, vestida de branco. Ela estava sentada, lendo. Edgar a viu e se emocionou com a sua imagem. Entrou e se dirigiu para junto dela.

— Olá! – disse Edgar timidamente.

Laura olhou e lhe respondeu com um sorriso:

— Olá!

— Dá-me licença? – perguntou Edgar pedindo para se sentar a seu lado.

— Claro. – respondeu ela.

Ele discretamente se sentou ao lado de Laura e reparou que o livro que trazia eram as Confissões de Santo Agostinho.

— Já leu? – perguntou ela.

— Não. – respondeu Edgar embaraçado, se sentindo um ignorante. — Mas já ouvi dizer que é uma obra extremamente interessante.

— É sim. – respondeu Laura. — O que é que o senhor… o que é que você queria… porque é queria me ver? – perguntou ela um pouco nervosa, devido ao desejo que estava sentindo por aquele rapaz.

— Necessitava de a ver. – respondeu ele inebriado, a olhando, arrepiado. Era maravilhoso e ao mesmo tempo assustador a ter tão perto.

Entretanto, uma das beatas que estava lá à frente ouviu o zum-zum que Laura e Edgar estavam fazendo. Incomodada com o suposto namorico daqueles jovens, olhou para trás e pigarreou. Laura e Edgar se aperceberam que realmente aquele local não era o mais apropriado para conversarem e por isso decidiram sair, se decidindo ficar lá fora à porta da igreja.

— Ainda não me respondeu porque me queria ver. – disse Laura, um pouco tensa.

— Já lhe respondi a isso. – disse Edgar. — Acho que daria em doido se não a visse…

Edgar sentia que estava perdendo a cabeça ao lhe dizer aquilo. Era como se dentro dele tivesse havendo uma guerra entre a sua cabeça e o seu coração, na qual seu coração estava ganhando cada vez mais terreno.

— Senhorita, eu…

— Por favor, me chame pelo meu nome… Laura. – pediu ela com alguma tranquilidade.

— Laura… - disse ele; como lhe soava bem aquele nome aos seus ouvidos: Laura!

— Edgar… - disse ela. — O que se está passando entre a gente? É tudo tão estranho… - dizia ela constrangida, olhando para ele.

Edgar a olhava inebriado, lânguido. Espontaneamente colocou sua mão no rosto dela e disse:

— Você mexe comigo, Laura!

Laura, um pouco assustada com aquele gesto, que lhe pareceu um pouco ousado, se afastou e disse:

— O senhor também… quer dizer, você também… Edgar. Mas só isso não chega, como deve calcular.

— Me perdoe, se eu fui um pouco ousado. Não era a minha intenção. – desculpou-se Edgar atrapalhado.

— Quais são as suas intenções comigo, Edgar? – perguntou ela com muita frontalidade, como se tivesse se defendendo.

Edgar, ficou alguns segundos calado, a olhando especado, sem saber o que dizer. Mediante a luta entre a cabeça e o seu coração, onde o seu coração se estava saindo vencedor, ele tomou uma decisão:

— O meu maior desejo é me casar com a senhorita. – disse ele, completamente apaixonado.

— Se casar comigo? – questionou ela um pouco assustada. — Mas nós mal nos conhecemos!

— Para isso é que serve o namoro, para um casal se conhecer. Aceita o meu pedido de namoro? – perguntou ele.

— Você está me pedindo em namoro? – perguntou ela.

— Estou sim e se você aceitar, hoje mesmo irei falar com seu pai para que ele me autorize a te cortejar. -

Laura estava contente, mas ao mesmo tempo confusa. Ela era muito mais racional que Edgar e por isso, tudo aquilo apesar de bonito, lhe parecia um pouco precipitado.

— Ai não sei… eu gosto de você, mas tudo me parece tão rápido. A gente mal se conhece!

— Compreendo… - disse Edgar, um pouco inibido. — Mas a gente para se conhecer melhor, só mesmo através da corte. Me dê esta oportunidade de a fazer feliz!

— Eu vou pensar no assunto. – respondeu Laura. — Mas agora se me permite, acho melhor irmos embora, pois estamos num local público e eu não quero que chamemos a atenção.

— Claro.

— Para você não tem mal nenhum, pois é homem, mas para nós mulheres, as coisas são bem mas difíceis. À mínima coisa somos é-nos apontado o dedo. É como estivéssemos num tribunal.

— Precisamente por causa disso, eu desejo pedir autorização ao seu pai para a cortejar, pois não quero que meus sentimentos te prejudiquem. – disse ele com uma expressão mais séria. — Hoje mesmo falarei com o seu pai por causa disso, pois você é uma moça de família, digna de respeito. Eu te quero respeitar, Laura!

— Entendo. – respondeu ela. — Bem, faça o que quiser. Apenas peço para que me dê algum espaço e algum tempo para refletir.

Edgar não perdeu tempo: no mesmo dia deste encontro, Edgar se dirigiu à mansão dos Caldeira Camargo, onde pediu formalmente ao Dr. Alberto Camargo, médico sanitarista bastante conhecido, autorização para cortejar sua filha. O médico ao início ficou um pouco surpreso, mas depois de uma longa conversa acabou simpatizando com Edgar e acatou o seu pedido de bom grado. A partir daquele momento então, o herdeiro Vieira passou a frequentar assiduamente a casa de Laura, com o intuito de lhe fazer a corte.

Estaria ele louco ao fazer uma coisa dessas? Por acaso se tinha esquecido do que fizera no passado?! Como diz o velho ditado, “O amor é cego…” e foi o que acontecera com Edgar: a paixão por Laura o cegara completamente para todos os perigos eminentes bastante realistas que aquele relacionamento teria. Todos os medos, receios que tinha antes desapareceram completamente, dando apenas lugar a um otimismo ingênuo.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.