Como não se apaixonar por um bruxo

[2] Olhos verdes e seus mistérios


Louis

Fecho os olhos tentando lembrar daquela imensidão verde que aparece toda noite nos meus sonhos, os cabelos cacheados que nunca consigo tocar e aquele rosto que me encara como se pudesse ver minha alma. Meu coração acelera tanto com as lembranças que só consigo me perguntar: como posso me apaixonar por alguém que nem existe?

O celular vibra mais uma vez sobre meu peito e finalmente saio do transe, ligando para Shawn que deixou muitas mensagens.

— Sabia que são três da madrugada? — Digo direto, sem nem dar um “oi”

— Louis — o modo que ele diz meu nome faz meu corpo ficar em estado de alerta e me sento na cama. — Precisamos nos mudar, agora. Estou indo para sua casa te buscar. É meu pai.

A menção de seu pai já é o suficiente, desligo sem dar tchau e começo a colocar as roupas na mochila. Meu colega de quarto protesta quando ligo a luz e faço barulho, mas não me importo com isso. Olho de relance para janela, o céu está realmente bonito nos seus tons roxos e azuis, não há ninguém na rua, nem mesmo carros e o silêncio é desconfortante. Vou sentir falta daqui, dessa vista e dos poucos colegas que fiz, mas Shawn precisa de mim não só por ter salvado minha vida, mas por ser meu melhor amigo.

Coloco a mochila nas costas, pego meu celular e dou uma última olhada no colega de quarto que me proporcionou algumas risadas e até mesmo um romance fofo de verão. Sinto uma dorzinha no coração quando fecho a porta e fico parado no corredor. Alguns conhecidos da faculdade bebem e jogam alguma coisa, me cumprimentam rapidamente e logo voltam para o que estão fazendo. É sempre melhor assim: ser invisível torna tudo mais fácil e mesmo assim ele nos achou, de novo.

Assim que saio a lufada de ar quente deixa minha respiração mais difícil por alguns segundos, seguro a alça com mais força tentando me equilibrar e aqueles olhos verdes voltam a minha cabeça dando uma leve acalmada no meu corpo que treme. Começo a digitar uma mensagem dizendo que estou pronto, mas o barulho alto do motor — que reconheço a quilômetros de distância — me faz guardar o aparelho e sorrir. Não espero que ele estacione e jogo minha mochila na carroceria entrando na cabine, cumprimento Shawn que sorri tenso atrás do volante.

— Desculpa te acordar assim no meio da noite, mas você sabe como as coisas são.

Aumento a música e dou de ombros, até gosto de me mudar, mas estou cansado de abandonar as pessoas. Meu amigo tira uma mecha que insiste em cair no rosto e da um suspiro acelerando o carro, consigo ver as olheiras embaixo dos seus olhos e sua testa está cheia de marcas de expressões. Apoio o queixo no braço que está escorado na janela e fico observando a cidade ser deixada para trás e a estrada se abrir diante de nós.

— Para onde vamos dessa vez? — Pergunto, já que não discutimos nada e nem pensávamos que teríamos que mudar tão rápido.

Ele faz um estalo com a língua e dá uma olhada rápida para mim, sua sobrancelha erguida e o suspiro alto que solta já me dão uma resposta, mas ele fala mesmo assim.

— Acho que só vou indo. Deixar a intuição me guiar dessa vez, tudo bem?

Assinto, não quero entrar nessa discussão de intuição e misticismo que sempre acaba em uma briga entre nós. Dessa vez quero paz, precisamos disso e se Shawn fica bem acreditando nisso, posso confiar nele. Encosto a cabeça na porta da maneira mais confortável que consigo e fecho os olhos, pedindo para sonhar com o garoto de olhos verdes e cabelos cacheado.

Acordo quando estamos estacionando em um posto, dá para perceber que a cidade é pequena só pelo modo que as pessoas me cumprimentam, todas alegres e simpáticas. Tiro a jaqueta porque aqui o sol não está nada convidativo e meu estomago ronca. Shawn aponta para a própria barriga e depois para o restaurante que tem ali, faço um joinha com a mão e vou até lá pedir comida para nós.

Quando entro um sininho toca e o cheiro de bacon e panquecas é extraordinário, ao contrário da decoração caída e em tons marrons e amarelo. Pelo menos o chão branco é bem limpinho e isso me deixa aliviado de comer ali, sento na mesa perto da porta para ficar mais fácil de me achar e uma garçonete vem me atender. Ela masca chiclete com a boca aberta e os dentes da frente estão borrados de batom rosa.

— Bem-vindo, o que vai querer? — Pergunta com uma voz robótica e volta a mastigação.

— Duas batatas fritas grandes, um suco de laranja, um milk shake de chocolate e panquecas.

Ela ergue a sobrancelha enquanto anota e quem pode culpá-la? Observo a garçonete dar a volta no balcão e entrar na cozinha, depois ela sai e começa servir as xícaras de café dos outros clientes, quase todos caminhoneiros pelo modo que se vestem ou os bonés com frases engraçadas. O sininho toca e Shawn entra, a blusa que era cinza claro está escura e grudada no seu corpo por causa do suor, ele me vê e se joga na cadeira de frente a mim.

Ele desliza um panfleto pela mesa onde algumas pessoas sorriem para foto mostrando a língua e segurando copos vermelhos, já estou pensando em que festa Shawn quer me meter, mas quando leio o título vejo que na verdade isso é uma propaganda de universidade.

— Ok, mas.... — Deixo a frase no ar porque realmente não entendo o que ele quer com isso.

Shawn revira os olhos e aponta para um círculo embaixo do papel, lá diz que tem vagas para dormitórios e matrículas abertas.

— Mas nada. Liguei lá e consegui vagas para nós dois.

— E como exatamente você conseguiu isso?

— Nem sempre precisamos saber de tudo, Lou. — Ele diz e me lança uma piscadela.

Até penso em protestar, mas a garçonete chega com nossas comidas e não consigo pensar em mais nada além de me alimentar. Um gole do milk shake e meu corpo todo refresca. Shawn é mais contido em comer e mexe no celular entre as garfadas, mas ele mantem um sorriso que reconheço bem: está flertando com alguém. Sempre que faz isso suas orelhas e bochechas ficam rosadas

— O que tá rolando? — Pergunto de boca cheia mesmo.

— Nossa nova universidade tem um Tinder só deles e eu acabei de dar um match num gatinho.

Ele vira o aparelho para mim e me mostra a foto, o rapaz está sentado com um violão, o cabelo loiro meio bagunçado e os olhos azuis dão um charme. O sorriso é bem bonito e sincero.

— Niall Horan — Leio o nome abaixo da foto em voz alta. — Diferente e bonito, combina com ele.

— Vou mandar uma mensagem. — Shawn diz soltando uma risadinha anasalada e eu volto a comer.

Queria ser mais como ele, flertar assim com qualquer pessoa bonita que aparecer, mas não consigo. Estou ficando cheio quando o sininho toca e risadas preenchem o local, que antes só tocava uma música ambiente onde as conversas se sobressaltavam uma sobre as outras, ergo a cabeça e o garfo que seguro para a alguns centímetros da boca. Shawn percebe e se vira também, nada discreto.

— Não pode ser... — Ele sussurra quando vê o garoto loiro entrando.

Demoro algum tempo para processar e posso estar babando, mas Niall gesticula animadamente para o amigo do lado e esse é o problema. Eu reconheceria aqueles cachos em qualquer lugar do mundo, mas ele estava ali na minha frente. O garoto dos meus sonhos, mas como ele pode ser real?

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.