Come Back

Quantos corações destinados a sofrer pt.2


Os olhos negros dela me fitavam aflitos, apertei as duas latas de cerveja com força, e as coloquei na mesa. Eu quase podia ver aquela mulher que aos meus olhos era tão pequena se esvaindo pelos meus dedos.

– A gente pode ir pra um lugar mais calmo e...

– Não, fala logo Jimmy. Você teve a chance de me levar pra um lugar mais calmo, mas preferiu me trazer pra cá. Agora fala, você ficou com ela? – Ele apontou com a cabeça para Lea.

Meu corpo inteiro pesava

– Foi só um beijo – Os olhos dela se desviaram, estavam impossíveis de serem lidos. Senti meu fôlego encurtar, eu estava muito estressado e quando isso acontecia a “máquina” começava a dar defeito. Ela não disse mais nada, e isso só me deixou mais aflito – Mas Allie eu não ia esconder isso de você, não significou nada pra mim.

– Não fale isso James – ela olhou para mim com um sorriso entristecido – Eu não faço parte dessa história, é com ela que você tem que ficar.

– O quê? Não! Eu quero ficar com você.

– Você não entende, eu nunca devia ter me envolvido emocionalmente com você. Acho que ficou claro que não podemos ficar juntos

– Não! Pare de falar isso! – eu a puxei para junto de mim – Não não não não, Allie não me deixe. Eu sei que meus defeitos magoam as pessoas e eu sinto muito pela maior vitima ser você, mas quando você está perto de mim eu sinto que posso melhorar.

Senti ela soluçar em meu peito, ela estava chorando e a culpa era minha.

– Jimmy, você precisa de uma mulher de verdade, não sou o suficiente pra você, nunca fui. Eu nem sei por que me iludi achando que era possível você gostar de mim. Mas agora eu voltei a realidade, minha missão aqui é outra.

– NÃO – eu a apertei com força no abraço – Sem você eu vou ficar perdido – eu estava mesmo implorando pra ela não me deixar? Sim eu estava e aquilo era mais forte do que eu. Nos olhos dela eu podia ver que aquilo era em vão. Folguei um pouco do abraço e a encarei por alguns segundos tentando ao menos adivinhar o que estava passando na mente dela, mas naquele momento parecia totalmente bloqueada para mim – É isso então? Se queria desistir de mim podia ter dito logo a verdade

– Eu nunca vou desistir de lutar pela sua vida Jimmy, e você tem que entender que é por isso que eu não sou a mulher certa pra você – Ela se afastou – Acho que a festa acabou pra mim.

Ela olhou para Leana mais uma vez e me deu as costas, pensei em gritar para que ela voltasse, mas eu não o fiz. Fiquei lá parado, apenas observando-a desaparecer feito uma miragem. Naquele instante tive certeza que a contagem regressiva para o meu fim havia se iniciado, eu estava completamente só.

– Hey man, não fique assim, toma a sua cerveja – Brian estava ao meu lado com a lata de cerveja já aberta, peguei a lata da sua mão e virei quase a metade na boca. Deixei que o sabor amargo se unisse ao meu sangue, eu já não ligava pra dor nenhuma em meu corpo. Não havia mais motivo algum pra preservá-lo.


Allie

Chuva. Ela se armara o dia inteiro justamente para cair junto com as minhas lágrimas. Eu corria o mais rápido que conseguia, a chuva batia em minha pele dolorosa, quase como se fosse sólida, mas a dor física não chegava nem perto do que eu estava sentindo agora, por dentro.

Parei de correr, olhei em volta, não fazia a menor ideia de onde estava, meu peito arfava. Ele disse que o beijo não significara nada, mas na história original, foi com ela que ele ficou até seu ultimo dia de vida, então aquele beijo significava que era com ela que ele devia ficar. Eu estava ali para fazê-lo feliz e ela era a felicidade dele.

– Mas onde diabos eu estou? – Não havia nada familiar por perto, eu estava perdida, era mais de 1h da manhã e eu não ia ligar para Jimmy – Merda Alison!

A chuva estava me deixando encharcada, puxei o celular do bolso, era minha única alternativa, por mais irritante que talvez isso fosse.

– Allie? – Uma voz muito arrastada pelo sono atendeu

– Sam! Eu preciso de ajuda

– Você está na cadeia ou alguma coisa assim?

– Não, mas eu estou perdida – olhei para mim mesma – e muito molhada. Pode me buscar?

– Ahm – ele fez uma breve pausa – Claro, onde você está?

– Se eu soubesse não tinha te ligado, seu imbecil.

– Haha okay, mas diz pelo menos um ponto de referência?

Olhei em volta, havia um prédio com um outdoor do McDonalds no topo.

– Eu sai correndo, to mais ou menos perto da casa do Jimmy, eu acho. Tem um edifício com um outdoor do McDonalds no topo.

– Vou procurar, fique a vista.

Depois disso ele desligou o telefone, a chuva agora tinha se reduzido apenas a um leve chuvisco, eu tremia de frio e mordia o lábio inferior tentando evitar que meus dentes batessem, algo totalmente em vão. Eu abraçava meu corpo encharcado.

Alguns longos minutos depois um par de faróis dobrou a esquina, um carro prata se aproximou com velocidade reduzida até parar na minha frente. A janela abaixou e ele me analisou por alguns instantes

– Entra logo no carro garota.

Dei a volta no carro correndo e entrei no banco do carona, haviam duas toalhas secas no banco, sentei sobre uma e me enxuguei com a outra.

– Desculpe por perturbar tão tarde.

O carro deu a partida novamente, o aquecedor estava ligado, me senti um pouco mais confortável.

– O que estava fazendo vagando por essas redondezas sozinha, de madrugada e na chuva?

Abaixei os olhos

– Me desculpe, você estava certo, eu não sou a mulher certa pra ele

Ele freou o carro bruscamente e olhou para mim

– Vocês terminaram?

Terminaram. Aquela palavra doeu, foi como se eu tivesse colocado fim em algo que já não tinha mais outra saída a não ser o fim, mas no fundo a esperança de que desse certo ainda não se esvaíra. Como uma fã idiota eu sempre acreditei que era a melhor mulher para fazê-lo feliz, talvez eu pudesse fazer meus pôsteres felizes, o Jimmy de carne e osso era mais difícil.

– Sim, isso ter deixa mais feliz?

– Me deixaria, se você também estivesse feliz – Ele tocou meu rosto de leve com os dedos mornos.

– Não pense que só por que eu ele não estamos mais juntos que você e eu...

– Eu não penso.

Ele voltou os olhos para a direção e acelerou o carro novamente, não falou mais nada durante todo o trajeto.

– Está entregue – ele falou ao parar em frente a casa dos Sullivan.

– Muito obrigada Sam, eu nem sei como te agradecer – Os olhos dele fixaram nos meus por alguns instantes.

– Não precisa agradecer.

Me estiquei um pouco e dei um beijo na bochecha pálida dele, ele sorriu de leve e depois eu sai do carro.



– Você o quê??? – Eu estava inerte no sofá, fitava a televisão que passava uma porcaria qualquer – Olha pra mim Alison

Fui obrigada a encará-la, tinha as mãos postas na cintura e batia incessantemente o pé no assoalho, parecia minha esposa.

– Nós terminamos

– O que tem de errado com você?

Eu sorri de leve

– Por que está falando isso? Achei que você o quisesse pra você

– Mas é claro que eu quero ele pra mim, mas ele não se interessa pelo que eu sou agora, ele se interessa pelo que eu vou ser. Que é você, sua anta.

– Você está errada, ele só gosta de mim por que pensa que eu posso salvar a vida dele.

Ela olhou cética para mim

– Alô? Você pode salvar a vida dele.

– Você não entende

– Então por que não me explica? Você sempre me deixa de fora de tudo, não confia nem um pouco em mim. Parece até que me vê como uma inimiga.

Ela parecia muito sincera. Como eu estava sendo burra, vivo reclamando que odeio ser excluída das coisas e acabei fazendo o mesmo com ela.

– Eu realmente sinto muito, senta aqui Allie

– Joy – ela sorriu sem graça

– Não, eu prefiro te chamar de Alison, pelo menos quando estivermos só entre nós duas. Agora me deixe te falar de tudo que eu sei, de como eu cheguei aqui e do quanto as coisas não são tão fáceis quanto parecem.

– Eu realmente quero ouvir


Jimmy

Casa vazia, luzes apagadas, apenas o meu corpo jogado no carpete. Sentia meu peito arfar, aquela sensação era uma merda e parecia ficar mil vezes pior quando não há ninguém para ao menos dizer que vai passar. Ela se foi, eu deixei ela escapar de mim e agora eu estava mais só do que nunca.

Amigos? Às vezes estar rodeado de amigos não impede com que você se sinta solitário. Se eu ligasse para o Matt agora provavelmente ele viria correndo, me daria uns murros e me mandaria parar de agir feito um cuzão. Se eu ligasse para Brian ele viria até aqui e também me bateria, se jogaria no sofá e beberia algo comigo e falaria “Você está esculhambado cabeção, não pode fazer merda e se esculhambar ainda mais. Esquece a Wade, sabe, eu conheço um ótimo lugar”. Na verdade ele realmente conhecia ótimos lugares, ótimas pessoas, mas eu não queria sair dali. Eu não queria mais me sentir bem. Aquele solidão me rondava já alguns anos, a medida que minha saúde ia piorando eu me sentia mais distante de tudo, eu tentava, eu juro que eu tentava permanecer com eles, mas as vezes era inevitável ficar meio perdido e sozinho, mas pelo menos meu lado criativo se alimentava disso, da minha dor. E as músicas só ganhavam mais alma, a minha alma que eu perdia aos poucos.

Tirei a camisa que já grudava no meu corpo por causa do suor, o tempo estava úmido, mas abafado, minha respiração pesava. Caminhei até a geladeira, a luz dela iluminou o cômodo que eu insistia em deixar escurecido. Peguei uma garrafa das verdinhas, minha cerveja favorita, eu estava na fossa, mas permanecia tomando cerveja de qualidade.

– Olha só pra mim, eu tenho dinheiro pra caralho, os melhores amigos do mundo e mesmo assim ninguém quer estar ao meu lado – Minha risada soou estranha, eu estava mesmo falando sozinho?

O fato é que, não havia cura para a minha solidão.

Tomei mais duas garrafas de Heineken que tinha na geladeira e depois levantei meio trôpego, eu tive a ideia do século, e a mais imbecil também.

Ainda haviam alguns comprimidos na minha carteira, apenas três. Abri cápsula por cápsula colocando o conteúdo de cada um deles em filas estreitas do pó fino. Ecstasy. Eu gostava desse por causa do efeito, eu ficava feliz e apenas engolir os comprimidos não tinha nenhuma graça.

Arranquei um pedaço de folha do bloco de recados e enrolei em cilindro formando um fino canudo, abaixei o rosto, levei o canudo a uma das narinas e aspirei vagarosamente a primeira fileira. Eu sorri para mim mesmo, podia sentir meus músculos vibrarem, meus batimentos cardíacos aceleraram e eu ri novamente. O celular estava em meu bolso, o puxei e admirei a tela brilhante sorridente, era estranho como me parecia muito engraçado. E lá estava o nome dela, era um dos primeiros da Agenda, bem na letra A.

– Oh honey, por que tinha que ser a primeira da porra dessa lista? – eu apertei o botão de chamada, mas no fundo eu queria correr, pular e gritar até que ela voltasse. Enquanto chamava eu levei o canudo novamente à narina e aspirei a segunda fileira, o efeito agora não fora tão bom, na verdade tudo começou a doer.

– Alô? Jimmy?

Eu queria falar, mas minha voz não saia e eu também não fazia a menor ideia do que dizer. A voz dela era tão suave, parecia uma criança acabando de acordar.

Tambores. Era com isso que meus batimentos se assemelhavam agora, eu mal ouvia o que eu estava pensando.

– Allie – eu falei enfim, mas doía, cada palavra parecia tomar um pouco do que me sobrava de energia.

– Jimmy – a voz dela tinha um tom de surpresa – Como está?

Eu soltei uma gargalhada histérica, minha garganta também doía.

– Quer saber, acho que estou morrendo, consegue ouvir meus batimentos? Por que eu consigo e eles estão me tirando do sério

– O que está aprontando? Você fala como um maníaco!

– Talvez eu seja um maníaco – Aspirei metade da ultima fileira – Mas eu não vou mais machucar ninguém, eu prometo.

– Onde você está?

– Em casa, mas oh, não precisa sentir pena de mim. Você fez o certo. Eu sou o único que consegue suportar essa coisa mesmo. Arg! – meu peito começou a formigar – Yeah, eu acho que enfim a dor vai parar, eu sinto muito Allie. Eu queria muito ter feito você feliz.

– NÃO FAÇA NADA ESTÚPIDO! EU ESTOU INDO ATÉ AI

Meu fôlego começou a falhar

– Sabe Allie – respirei fundo, meus olhos pesavam – Gosto mais de você do que eu imaginava, me desculpe ok? Não é minha culpa ser um idiota – Meu peito apertou, merda, fiz burrice com meu corpo de novo. Mas agora a dor era muito aguda, merda merda merda! O que foi que eu fiz? Meu fôlego encurtou muito, ainda – Allie, eu acho que vou morrer agora. Me perdoe.

– NÃO, JIMMY!

– Meus olhos estão fechando

– NÃO FECHE OS OLHOS JIMMY, NÃO FECHE – Ainda ouvi o soluço dela no telefone, ela estava chorando por minha causa outra vez.

Meu corpo pendeu para fora da cadeira do balcão e eu caí no chão frio de mármore, tudo era tão escuro agora.