Clichê

Capítulo 2


O meu primeiro dia de aula não demorou a chegar, era impressionante como o tempo passava rápido. Na primeira semana eu ainda consegui enrolar meu pai e ele me liberou para ficar em casa, mas na segunda isso não foi possível e eu tive que ir estudar. Escola nova vida nova, não é o que dizem? Lá ninguém me conhecia e eu decidi ser diferente, não que eu fosse esconder quem eu era porque isso eu nunca faria, simplesmente tentaria me fazer inquebrável. Eu não estava pronta para voltar mas precisava, não podia me esconder pra sempre. Tinha só que respirar fundo e ir.

O despertador tocou as 6:40 da manhã, acordar cedo era a coisa que eu mais odiava fazer. Acabava me levantando chata e me irritava com tudo, eu definitivamente não era uma pessoa matinal. Levantei e desci para tomar café da manhã, comi uma tigela de cereal e voltei para o meu quarto. Tomei um banho rápido para tirar a preguiça, vesti meu jeans a camiseta do colégio e meu vans. Como morava perto da escola eu optei por ir sozinha mesmo, coloquei a mochila nas costas, peguei meu longboard branco e remei por volta de dez minutos até chegar na escola.

Sentei na primeira fileira sem olhar para ninguém, logo um menino lindo veio sentar do meu lado:

– Eae?

– Oi...

– Sou o Miguel e você?

– Giovana.

– Bem vinda Giovana! Se você quiser sentar lá atrás com a gente fique a vontade.

– Ah, vou ficar aqui por enquanto, obrigada.

– Tudo bem então. Ah! E você é muito linda.

Ele sorriu para mim e voltou para seu lugar, eu corei. Miguel parecia se legal e educado, sem contar que era lindo. Eu não me achava a menina mais linda do mundo mas também não me considerava feia. Não sou muito alta, tenho cabelos compridos e castanhos, meus olhos são verde escuros, tenho seios fartos e barrica reta, meu corpo é bem definido já que amo natação e boxe, faço essas atividade com o maior prazer e tento ocupar a maior parte do meu tempo com elas. Eu também tenho uma pequena tatuagem com o símbolo do infinito no pulso que havia feito com minha irmã a pouco mais de um ano atrás.

Permaneci na minha cadeira até o sinal do intervalo bater. Fui até a cantina comprar alguma coisa pra comer, a escola era pequena comparada com a que eu costuma estudar, tinha paredes azuis e brancas assim com as cores que levava no uniforme. A fila da lanchonete estava imensa e eu acabei perdendo uns bons minutos lá. Não costumo reparar muito nas pessoas, os alunos passavam por mim e eu mal via seus rostos. Fiquei distraída com meu celular trocando mensagens com minha irmã que já deveria estar na faculdade esse horário, ela ficava falando dos meninos bonitos da sua sala me fazendo rir com comentários sobre a aparência de algum deles.

Depois de comprar meu salgado me senti um pouco deslocada no pátio cheio de rostos desconhecidos e acabei voltando para minha sala que estaria vazia se não fosse por uma menina ruiva de olhos claros muito bonita sentada um dos cantos. Me aproximei e comecei uma conversa:

– Oi, posso sentar aqui?

– Claro... Como é seu nome?

– Giovana e o seu?

– Ah! Sou Amanda. Você que faltou na primeira semana né?

– Eu mesma! – abri um sorriso.

– Ouvi falar que você é americana, é verdade?

– Não. Eu nasci aqui em São Paulo mesmo, mas morei lá nos últimos dois anos.

– Que sonho! Eu queria muito me mudar. – ela me disse baixando o olhar. O sinal bateu de novo indicando o fim do intervalo – bom, acho melhor você voltar pro seu lugar agora, não vai querer ser vista falando comigo.

Antes que eu pudesse perguntar o motivo avistei os outros alunos entrarem e Miguel se direcionando até nós:

– Ei Giovana! Tá fazendo o que com essa sapatão?

– Você é lésbica? – Perguntei para Amanda que balançou a cabeça confirmando.

– Ela não te contou? Sapatão, não acredito que fez isso! Já te de olho na menina nova? Ela não é pro seu bico, é linda demais pra você, essa já é minha– ele disse olhando para a menina ao meu lado. – Vem Giovana, senta lá comigo.

– Bom, na verdade, não sou sua e acho que vou ficar aqui mesmo.

– Como é que é?

– Qual parte você não entendeu?

– Falando desse jeito parece que você é sapata também.

– Eu não lembro de ter falado que não era.

– Agora pronto! Por falta de uma entrou outra. Esse mundo esta perdido mesmo, essa escola já foi melhor frequentada.

– E isso foi quando? Antes de você começar a estudar aqui?

– Nossa gatinha, não precisa ficar brava não. Eu continuo achando vocês duas bem gostosas e acho que eu posso fazer vocês mudarem de time, então qualquer coisa é só me chamar! – ele disse piscando para mim enquanto caminhava até o seu lugar. Esqueci tudo que pensava de Miguel e comecei a acha-lo um babaca.

Amanda me deu um sorriso tímido e eu dei de ombros. Não sei da onde saiu tamanha coragem, mas eu não ia deixar isso acontecer de novo e nem deixaria aquela menina passar pelo que passei bem na minha frente sem fazer nada.

As aulas não demoraram a passar, logo me vi voltando para casa. Chegando lá resolvi retomar a tradição que tinha antes de me mudar, tirei toda minha roupa e me joguei na piscina gelada, me sentia segura embaixo de toda aquela água. Fiquei lá por um bom tempo antes de decidir comer e tirar um cochilo.

Barbara chegou da faculdade no fim da tarde e foi direto para o meu quarto, ela acabou me acordando:

– Cheguei meu amor!!!!!!

– E ai, como foi no faculdade?

– Nossa que animo hein? Foi normal... E a escola? Já se apaixonou por alguém?

– Eu? Me apaixonar? HA-HA! Não sou igual você que se apaixona perdidamente a cada dez minutos.

– EI! Eles eram todos lindos, juro!– ela começou a me fazer cocegas e logo estávamos rindo. – mas serio agora, foi tudo bem lá?

– Acho que sim, não sei...

– Aconteceu alguma coisa?

– Nada demais... Bom, eu estou morrendo de fome! – disse mudando de assunto – O jantar já esta pronto?

– Acho que sim. – eu me levantei quase correndo para a sala de jantar e ela continuou - Se quiser conversar eu estou aqui viu?

Sorri e a abracei. Ela me puxou pelo braço me arrastando até o andar de baixo de nossa casa. Sentamos todos na mesa e começamos a conversar sobre nossos respectivos dias, Babara comentava sobre os alunos da faculdade e minha mãe ria com o jeito que ela falava dos garotos, meu pai fazia cara de bravo mas acabava por rir da situação. Acabei de comer, subi para meu quarto, liguei musica alta e comecei a desenhar em uma das paredes, fiquei lá até meus olhos implorarem por descanso, me joguei na cama de qualquer jeito e adormeci ouvindo um reggae qualquer.