Chrono Crusade - After Heaven

Capítulo 38 -- À Solta


Amitiel foi escoltada até ao quarto de Rosette antes de os guardas que o Papá tinha mandado para buscá-la tivessem tempo de chegar a ela. Pediu a Remington algum tempo a sós com Rosette, e trancou a porta quando ficaram sozinhas.

–Quem és tu? - perguntou Rosette, levantando-se da cama.

–O meu nome é Amitiel. - respondeu ela, encostando-se à porta - E tu és a Maria de Magdala.

–O meu nome é Rosette Christopher. - corrigiu Rosette, cruzando os braços - Quem és tu para me dizeres quem é que eu sou!

–Tu tens de fazer o que o Papa te vai pedir. - disse Amitiel, surpreendendo Rosette.

–Eles querem usar-me como arma! - disse Rosette.

–Para matar demónios. - concluiu Amitiel - Esse é o teu propósito. Mesmo que negues que não és a reencarnação de uma Santa, tens de admitir que és uma exorcista e, como exorcista, prometeste exterminar demónios. Com o poder que tens, podes exterminá-los de uma vez por todas.

–Como é que sabes de isto tudo!? - perguntou Rosette, um pouco irritada com a mulher.

–Não precisas saber isso. - respondeu Amitiel, irritando Rosette ainda mais.

–Sim, preciso! - gritou Rosette - Porque esta era para ser a minha segunda oportunidade! Passei a minha vida anterior dedicada, não só a tentar libertar o meu irmão das mãos do Aion, mas também a salvar a população das mãos dos demónios! Eu morri ao tentar prevenir o Apocalipse e agora estás a dizer que queres que eu faça o mesmo?

–Mas todas as reencarnações têm a mesma obrigação. - continuou Amitiel.

–Sacrificarem-se? - perguntou Rosette, vendo Amitiel virar a cara - Eu não quero matar todos os demónios.

–E porquê? - perguntou Amitiel, dando um passo em frente. Dessa vez foi Rosette que virou a cara - Porque é que não queres matar todos os demónios?

–Por causa do Chrno.

Amitiel olhou para trás e viu Remington à porta, com as chaves do quarto na mão.

–O Chrno? - perguntou Amitiel, confusa - Mas ele é um demónio muito perigoso.

–Vem comigo Amitiel. - pediu Remington - Os guardas do Papa já andam atrás de ti. Mas acho que há um sítio que eles não vou pensar em procurar.

Antes de sair, Remington olhou para Rosette.

–Fica aqui. - murmurou ele - Mesmo que venham para te buscar, tenta resistir.

–Porquê? - perguntou Rosette, com um mau pressentimento.

–Porque eles já levaram a Azmaria e não sei para onde. - Remington levantou a mão quando Rosette se levantou repentinamente da cama - O melhor que podes fazer por ela agora é manteres-te afastada.

Rosette sentou-se novamente quando ouviu Remington a trancar a porta depois de sair.

O que é que estava a acontecer lá em baixo?

...

Azmaria olhava à sua volta, enquanto um dos exorcistas a puxava para dentro da Catedral da Ordem do Vaticano. Ao ver os outros Apóstolos, teve um estranho "deja vu". Quando passou por Joshua, parou, o que fez o exorcista parar repentinamente e resmungar.

–Joshua? - Azmaria tentou tocar-lhe, mas o exorcista impediu-a.

–Continue a andar, por favor. - pediu o exorcista, dando-lhe um pequeno empurrão - Temos um horário a cumprir.

Pararam na fileira da frente e o exorcista obrigou-a a sentar-se no banco de madeira. No altar, encontrava-se uma cruz de madeira no chão e as duas anteriores reencarnações.

–Vai buscar a Santa. - Azmaria ouviu um exorcista a sussurrar para outro.

–O que é que estamos todos aqui a fazer? - perguntou Azmaria, olhando para um dos exorcistas - Vão fazer a mesma coisa que o Aion nos fez antes?

–Cuidado com a língua, menina.

Azmaria olhou para a frente quando sentiu um estalinho na testa e viu o Papa.

–Nós nunca iriamos fazer uma coisa tão impura como a de copiar um ritual feito por um demónio da categoria do Aion. - respondeu o Papa - Porque é que não ficas quieta, um pouco? Vai tudo acabar cedo...ou começar.

–Vocês são todos iguais. - murmurou Azmaria.

–E, no entanto, ouvi dizer que aspiravas a ser uma exorcista, na tua vida anterior. - disse o Papa, sorrindo.

–Eu aspirava a ser como a Rosette. - corrigiu Azmaria, franzindo as sobrancelhas.

–Em todo o caso... - continuou o Papa, cansado de falar com ela - Fica quieta. Há vários exorcistas a guardar esta catedral.

Azmaria baixou a cabeça, tristemente.

Mais uma vez, não conseguia fazer nada.

...

Remington caminhava pelas catacumbas da Ordem de Madalena do Vaticano, com Amitiel atrás de si. Havia várias pessoas nas celas. Tanto ladrões, assassinos e demónios, mas apenas os últimos gritavam "anjos" quando os viam passar. Os restantes gritavam coisas mais desagradáveis que Remington e Amitiel tentavam ignorar o melhor que podiam.

Apenas uma cela estava em silêncio.

Quando eles chegaram lá, Remington parou e olhou para lá para dentro, tal como Amitiel.

–Chrno? - chamou Remington, assustando a sua acompanhante.

Chrno levantou-se, saiu da escuridão e aproximou-se das grades.

–Padre Remington. - disse Chrno, com uma cara horrível - O que é que se passa? A Rosette está bem?

–Ela está bem. Está no quarto dela. - confirmou Remington - E tu?

–Estou numa cela. - respondeu Chrno, sorrindo ligeiramente - Mas isso não é nada a que eu já não esteja habituado, certo? Com a diferença de que, da última vez que estive na cela de uma Ordem, acabei morto.

–Esta é a Amitiel. - apresentou Remington.

–A arcanja veio parar o Apocalipse? - perguntou Chrno, monotonamente.

–Como é que sabes sobre mim, criatura? - perguntou Amitiel.

–Eu era um amigo próximo do governador do Pandemonium. - explicou Chrno - E ele sabia tudo sobre ti.

Ele estava a falar sobre Lúcifer, pensou Amitiel. Mas como era possível? Lúcifer nunca faria amizade com tal demónio.

–Então, ela veio aqui para tirar a Rosette daqui e acabar o trabalho? - perguntou Chrno.

–Na verdade...

Remington contou aquilo que Amitiel tinha dito e achava que Rosette devia fazer.

–Ela não tem obrigação a fazer nada disso! - gritou Chrno, pondo as mãos nas barras violentamente - Quem é que pensas que és para dizer à Rosette que ela tem de morrer para salvar o mundo!? Ela também merece ser feliz!

–Quem disse que ela tinha de morrer? - interrompeu Amitiel - Se me bem informaram, ela morreu na vida anterior porque fez um contracto com um demónio.

Quando Amitiel apontou-lhe o dedo, Chrno rangeu os dentes, mas não ripostou.

–Já chega. - disse uma voz, vinda da cela à frente da de Chrno.

Remington virou-se e ficou chocado ao ver Trugy, atrás das grades.

–O que é que estás aqui a fazer? - perguntou Remington.

–O Aion disse que eu tinha de entrar com a primeira reencarnação quando a veio entregar. - explicou Trugy - Mas eles trouxeram-me até aqui logo que perderam o Aion de vista.

–Eles já têm a primeira reencarnação? - perguntaram Chrno e Remington ao mesmo tempo.

–A Rosette é minha amiga. - Trugy continuou, ignorando a pergunta - Eu ajudei-a a evitar ser "descoberta", antes de ser obrigada a vir para o Vaticano. Não quero que ela seja usada como arma. Mesmo que ela não morra, não quer ser usada.

–Mas, o dever dela...

–Só por ter aquelas marcas malditas, não quer dizer que seja do dever dela sujeitar-se ao perigo de confrontar perigos extremos. - disse Trugy, interrompendo Amitiel - Ela contou-me que se sacrificou na sua vida anterior e, já que lhe tinha sido dada uma segunda oportunidade, gostava de ser feliz até morrer...ao lado dele.

Quando Trugy apontou para Chrno, Amitiel abriu a boca.

–A Santa está apaixonada por um pecador!? - perguntou Amitiel, olhando para Chrno, à procura de respostas. Quando ele virou a cara, ela esticou as seis asas, fazendo com que uma luz intensa se espalhasse pelas masmorras - Deves tê-la enganado!

–Tu não estavas apaixonada pelo pai? - perguntou Trugy, distraindo Amitiel, que estava prestes a atacar Chrno - Ele era o governador do Pandemonium. E tenho a certeza que deves saber de alguns "pecados" que ele cometeu.

–Ele...ele... - lentamente, Amitiel começou a recolher as asas, até as catacumbas voltarem ao seu estado sombrio - Não importa o que digam. Não importa o que ela quer. A original Maria de Magdala não conseguiu cumprir o seu destino. Por isso é o objecto de cada reencarnação fazê-lo.

Amitiel virou costas e começou a andar.

–Vamos, "Remington"? - perguntou Amitiel, sem olhar para trás nem parar.

Remington seguiu-a, perguntando-se como é que tinham conseguido corromper uma alma tão pura como a de Amitiel.

–Uma alma tão pura. - murmurou Trugy, pegando no punhal de Amitiel, que tinha usado para salvar Chrno em São Francisco - Uma alma que se preocupava com pecadores. - de repente, teve uma ideia - Temos de voltar para São Francisco! Estávamos bem lá! Na casa da bruxa das joias!

No entanto, quando olhou para Chrno, a primeira coisa que viu foram os cornos, depois os olhos vermelhos. Quando a aura à volta dele começou a aparecer, Trugy deu um passo atrás.

...

Deprimida por ter falhado na única tarefa que o Padre lhe tinha dado, Rosette caminhava de cabeça baixa, escoltada por três exorcistas em direção à catedral.

Quando os exorcistas pediram desculpa e agarraram-na pelos braços antes de entrar na catedral, Rosette franziu as sobrancelhas, confusa com toda aquela situação. No entanto, tudo fez sentido quando entrou e viu Joshua e Azmaria, já lá dentro, sentados e guardados por exorcistas.

Ela debateu-se e percebeu porque é que os exorcistas a tinham agarrado.

–Azmaria! - gritou Rosette - O que é que se está a passar aqui!?

–Rosette! - Azmaria tentou levantar-se, mas o exorcista encarregue dela puxou-a para baixo.

–Tirem as mãos de cima dela! - gritou Rosette, debatendo-se mais um pouco - Joshua!

–Tenha calma, sua Santidade. - pediu o Papa, aparecendo à frente de Rosette - Vão ficar todos bem. A menina Azmaria só vai cantar um bocadinho para nós.

–Porquê? - perguntou Rosette, confusa.

–Não tem de perceber. - o Papa olhou para os exorcistas para a empurrarem com cuidado até ao altar, onde a cruz de madeira já estava de pé - Só tem de saber que tudo vai ficar bem se a sua Santidade cooperar.

Rosette parou em frente à cruz até o assistente do Papa ir buscar umas pequenas escadas. Rosette olhou para Madalena, que se mantinha parada, ao lado da cruz. Ao vê-la abanar a cabeça, o coração de Rosette começou a bater mais depressa.

–Suba, por favor. - o Papa ajudou-a a subir as escadas, com um sorriso - Agora, pode pôr-se de costas?

–O quê!? - perguntou Rosette, olhando em volta.

Antes de Rosette ter tempo de descer das escadas, Um dos exorcistas segurou-a de costas contra a cruz e os outros dois prenderam-lhe os braços com cordas. O assistente retirou as escadas e os exorcistas levantaram a cruz completamente para que o assistente pudesse atar os tornozelos dela, enquanto o Papa colocava gentilmente, uma coroa fina de ouro na cabeça de Rosette.

–Muito bem, querida. - disse o Papa, virando-se para Azmaria - Podes começar a cantar.

–Não! - exclamou Azmaria.

–Tu sabes que existem outras maneiras, não sabes? - perguntou o assistente do Papa vendo lágrimas a encherem os olhos de Azmaria - Vá lá, nós não queremos magoar-te.

Azmaria olhou para Rosette que, lentamente, anuiu com a cabeça. Azmaria suspirou fundo e abriu a boca mas, quando ia cantar, ouviu-se uma explosão vinda das catacumbas.

–Nível Nove! - gritavam exorcistas em pânico, do lado de fora da Catedral - Temos um Nível Nove à solta!

Mas só se conhecia um "Nível Nove", pensou Rosette.

–Chrno. - murmurou Rosette.