Rosette observava as gravações do vídeo de segurança onde Chrno atravessava o pátio e arrebentava com os portões. As lágrimas corriam ao mesmo tempo que assistia. Remington, que já via aquele vídeo pela quarta vez, ainda ficava perturbado com as imagens…

- O Aion admitiu de uma maneira indireta, que foi ele a fazer aquilo ao Chrno. – informou Remington – Ainda não sabemos concretamente qual é o plano dele, mas pensamos que tenha a ver com aquilo que ele começou em 1929.

- Ele está vivo. – murmurou Rosette, sem saber se devia matar Aion ou agradecer-lhe – E tem os cornos de volta. O que quer dizer que já não precisa de fazer um contrato comigo.

O “felizes para sempre” que Remington tinha dito ser impossível, parecia cada vez mais próximo para Rosette.

- Ele pensa que tu estás morta. – disse Remington, já que ela parecia não perceber a gravidade do assunto – Está descontrolado e o Aion está a manipula-lo. Sabes o que é que pode acontecer?

- Se ele pensa que eu estou morta, basta ir lá e mostrar-lhe que não estou. – disse Rosette, como se fosse a coisa mais fácil do mundo – O Chrno não é mau. Tenho a certeza que, se lhe explicarmos o que aconteceu, ele vai voltar ao normal.

- Aquilo é o normal! – exclamou Remington, apontando para o ecrã, onde o vídeo estava em “repetir” – Devia tê-lo matado quando tive a oportunidade e, quando o encontrar, é isso que vou fazer.

- Ele é bom! – gritou Rosette – Como é que pode pensar o contrário depois de ele nos ter ajudado durante tantos anos!

- Ele matou Madalena e depois matou-te a ti! – contrapôs Remington – Mesmo quando tenta fazer o bem, só consegue fazer o contrário! Eu só o aceitei na Ordem porque, quando te encontrei, tu já tinhas feito o contrato com ele e disseste que não virias sem ele!

Chocada, Rosette deu um passo atrás como se tivesse a tentar fugir das palavras de Remington.

- O Chrno morreu pela Ordem… - murmurou Rosette.

- Ele morreu por ti. – corrigiu Remington – E só porque se sentia culpado. Tens de te separar dele.

- Não. – recusou-se Rosette, imediatamente.

- Se te afastares dele, eu deixo-te voltar como membro efetivo do grupo de exorcistas. – disse Remington, vendo Rosette abrir a boca – Até já tenho uma missão para ti. Então, o que é que achas?

- Não vou deixar o Chrno sozinho. – foi a resposta de Rosette – Ele estava comigo muito antes de você me acolher e nunca me deixou. Mesmo que nunca volte a ser exorcista, não posso perder o Chrno, outra vez.

Descontente com a resposta de Rosette, Remington pegou no pulso dela, arrastou-a até entrar nas catacumbas onde prendiam demónios e prendeu-a numa das celas.

- Hei! – gritou Rosette, enquanto Remington lhe prendia os pulsos e os calcanhares.

- Eu não vou cometer o mesmo erro duas vezes. Não consegui proteger Madalena, mas vou conseguir proteger-te a ti. – disse Remington, depois de fechar a cela - Eu volto depois de ter matado o Chrno.

- Não! – gritou Rosette, contorcendo-se – Por favor! Eu preciso dele!

- Wow, isso foi uma grande confissão. – Bobby, que estava na cela ao lado a interrogar um demónio, entrou na cela de Rosette depois de ter a certeza que o Padre já tinha saído das catacumbas – Porque é que estás aqui?

- Bobby, liberta-me! – disse Rosette – Eu tenho de parar o Padre Remington!

- Infelizmente, não posso fazê-lo. Só o Padre é que tem as chaves das correntes. – disse Bobby – Mas, a verdade é que estou em divida contigo, por ter matado o teu namorado. Por isso, há alguma coisa que possa fazer por ti, para além de te libertar?

- Tens que ir atrás do Padre e impedi-lo de matar o Chrno! – disse Rosette, sem hesitar.

- Nem pensar. – foi a resposta de Bobby – O teu demónio de estimação disse que me ia matar. Prefiro não estar perto dele.

Rosette começou a pensar noutras soluções, tentando não entrar em pânico. Mesmo que Bobby fosse atrás de Remington, não seria capaz de o parar. Satella conseguiria, se estivesse ali, mas…

- A Fiore! – lembrou-se Rosette. Ela disse que estava disposta a ajudar-me no que eu precisasse.

- Quem é a Fiore? – perguntou Bobby.

- A Fiore é…a minha empregada. – perante o olhar confuso de Bobby, Rosette continuou – Tens que ir a minha casa. Provavelmente vai ser ela a abrir a porta mas, se for outra pessoa, perguntas se podes falar com a Lisa. Ninguém pode-te ouvir, por isso tens que a levar para um sítio onde tenham privacidade. Depois, diz-lhe que eu preciso de ajuda e trá-la até mim.

Provavelmente o Padre ainda teria de pensar num plano antes de se dirigir até Chrno, pensou Rosette. Dava-lhe tempo para falar com Fiore.

- Está bem. – concordou Bobby, virando costas – Eu volto daqui a nada.

Rosette só rezava para que fosse a tempo.

Depois de receberam a notícia de Rosette que afinal, a morte de Chrno tinha sido um engano, Fiore não ficou surpreendida. Já tinham acontecido coisas mais estranhas. No entanto, Joshua estava visivelmente chocado.

- Já aconteceu. – disse Fiore – Muitas vezes, os médicos pensam que o paciente está morto e depois ele volta. Não são boas notícias?

- A minha irmã parecia feliz. – disse Joshua – Isso é o que importa.

Quando ouviu a campainha, Fiore fez uma vénia e dirigiu-se à porta. Não demorou dois segundos a perceber que alguma coisa estava mal quando viu o homem com uniforme do convento.

- Posso ajudá-lo? – perguntou Fiore, como fazia normalmente.

- É sobre a Rosette. – disse Bobby, sem perder tempo – Podemos falar nalgum sitio seguro?

Fiore franziu as sobrancelhas, mas decidiu ir com o homem para trás da casa. – Esta parte está em remodelações. O Joshua não está autorizado a vir até aqui. Agora, o que é que se passou com a Rosette.

- Um Padre do convento prendeu-a nas catacumbas. – explicou Bobby – Eu não consigo libertá-la, mas o Padre vai atrás do Chrno. A Rosette disse que prometeste ajudá-la quando ela precisasse. É verdade?

- Sim. – respondeu Fiore – Mas não sei se tenho os meus poderes. Nem sei onde é que está a minha joia. A minha irmã é que a tinha quando eu morri. O que é que aconteceu com o Chrno?

E Bobby explicou tudo, enquanto Fiore permanecia ali, em silêncio. Quando o selador finalmente acabou, Fiore suspirou.

- É claro que o Aion-sama quer usar o Chrno e é claro que o Padre quer impedi-lo, matando o Chrno. Tal como quer impedir a Rosette de se meter. – disse Fiore – Mas, para parar o Chrno, só usando a Rosette. Quanto ao Padre, teria que encontrar a minha joia primeiro.

- Isso não importa, agora. – disse Bobby, abanando a cabeça – A Rosette pediu para que fosses ter com ela. Se ela disse isso, deve ter um plano.

Fiore anuiu com a cabeça, concordando com Bobby. E, depois de informar Joshua que iria sair, acompanhou Bobby até às catacumbas do convento, onde Rosette esperava-os.

- Rosette-sama. – Fiore fez uma vénia e aproximou-se até estar cara a cara com ela – O que é que eu posso fazer para a ajudar?

- Fiore, eu preciso que pares o Padre Remington! Ele quer matar o Chrno! – disse Rosette imediatamente – Eu sei que precisas da tua joia. Depois de a Satella morrer, o Chrno disse-me que enterraram a joia ao lado da árvore onde ela morreu. Eu não sei se ela ainda está lá, mas tens de tentar.

- Eu não sei se tenho os meus poderes, Rosette-sama. – disse Fiore.

- Se conseguires salvar o Chrno, a minha próxima prioridade vai ser encontrar a Satella. – prometeu Rosette, obtendo a atenção de Fiore – Se não o impedires, um deles vai acabar morto.

Fiore desviou os olhos para o chão. Durante a luta em 1929, Fiore tinha ouvido uma coisa que a tinha perturbado. Se fosse verdade, ela tinha medo de não voltar.

- A minha irmão…eu tenho a certeza que ela está viva. – disse Fiore, à beira das lágrimas – Tens que me prometer que vais encontra-la, custe o que custar. Ela deve estar sozinha, assustada, confusa. Vai precisar de alguém que a proteja.

- Eu vou encontra-la. – garantiu Rosette – E tu vais estar comigo quando eu o fizer.

Fiore anuiu e saiu da cela, dirigindo-se imediatamente para a árvore onde a irmã tinha morrido, no pátio do Convento.

- Vai com ela, Bobby. – pediu Rosette – Tenho a certeza que o Padre não lhe fará mal se tu te intrometeres.

Bobby concordou e foi ter com Fiore, até a ajudou a cavar até encontrarem a pequena joia. A única coisa que tinha sobrado da sua família. Quando Fiore tentou usar os poderes, foi com alívio que viu que conseguia. Se ela conseguia, a irmã também e isso significava que tinha meios de se proteger.

Esperaram os dois no pátio, atraindo atenções de várias Irmãs que passavam, mas nenhuma fazia nada. Quando o Padre saiu para o pátio, Fiore esticou o braço e criou uma lança, depois levou a mão à joia e fechou os olhos.

- Laden. – disse ela, fazendo a joia brilhar – Anfang Welder!

De imediato a mulher que quase tinha matado a sua irmã apareceu atrás dela, com uma lança numa mão e um escudo noutra. Chocado, Bobby deu dois passos para trás. Nunca tinha visto nada assim. A freiras que estavam ali perto, começaram a correr para lugares mais seguros.

- Fiore. – disse Remington, aproximando-se normalmente – Já não te via há muito tempo. Como é que tens andado?

Fiore esticou a lança e, apesar de esta nem ter chegado perto do Padre, a sua invocação, que tinha esticado a lança ao mesmo tempo que Fiore, chegou até estar apontada ao pescoço de Remington.

- Eu não me lembro de si. Para ser sincera, não me lembro de muitas coisas depois de ter sido raptado pelo Aion-sama. – confessou Fiore – Mas lembro-me que feri o Joshua-sama e a Rosette-sama. Por isso, não posso deixá-lo passar.

- Lembras-te de teres matado a tua irmã? – perguntou Remington, vendo a lança de Fiore tremer por alguns segundos – Tu foste a causa da morte dela. Arruinaste a vida dela e depois mataste-a. Lembras-te disso?

- Não vou deixá-lo passar! – reforçou Fiore.

- O teu corpo voltou como estava antes de morreres, certo? – perguntou Remington, sorrindo – Continuas a ser apenas um pedaço de joia sem coração. Mesmo que encontres a Satella, só vais continuar a arruinar-lhe a vida.

- Pare! – gritou Fiore, começando a chorar – Mesmo que diga isso, eu não vou deixá-lo passar!

- Foi a Rosette que te pediu? – perguntou Remington – Foi ela que te disse onde é que enterramos a tua joia depois de enterrarmos a tua irmã?

- No fim, você não é muito diferente do Aion. – disse Fiore – Sempre a tentar controlar as pessoas, como se soubessem o que é melhor para elas. Mas só fazem isso para concretizarem os seus próprios desejos! Não passam de criaturas egoístas!

E foi assim que a luta começou.

Entretanto, Chrno continuava sentado ao pé do lago, ao lado da tumba de Rosette.

Aion, que tinha ido espiar o Convento, voltou com um sorriso na cara. Nunca pensara ver Fiore outra vez. E muito menos a lutar contra o Anjo. Não era preciso ser um génio para saber quem ganharia aquela batalha.

Quanto a Rosette, não a tinha visto em lado nenhum, até tinha ido a sua casa, mas só tinha encontrado Joshua. Teria que agir rapidamente, antes que Rosette tivesse tempo de intervir.

- Está na hora de começarmos. – anunciou Aion, sentando-se ao lado de Chrno, que ainda não se tinha mexido desde então – Os humanos estão a planear alguma coisa contra nós.

- Não faz mal. – disse Chrno, simplesmente – Eles não vão estar vivos durante muito tempo.

- Tens algo em mente? – perguntou Aion.

Chrno levantou-se, mas continuou a olhar para o lado que brilhava intensamente, perante o pôr-do-sol.

- Vamos abrir as portas do Pandemonium e mostrar a luz aos demónios. – disse Chrno, sem mostrar qualquer hesitação – Vamos trazer o fim a este mundo.

- E, finalmente, o nosso sonho será realidade. – concluiu Aion.