Chicago, Illinois;

31 de Outubro de 1996.

Johnny abriu os olhos subitamente.

Acordado, encarou o ventilador de teto velho do quarto do motel naquele subúrbio, refletindo sobre a visão do passado que acabara de ter sido submetido. Apesar de terrível, a lembrança significava um bom sinal. O que era suficiente para fazê-lo sorrir pelo o que esse sinal significava, mas mesmo se quisesse, isso seria impossível.

Deveria falar com sua irmã sobre isso.

Olhou para a cama do outro lado à procura de sua gêmea, mas Maggie não estava ali. Johnny estava sozinho no quarto, e havia um vazio e silêncio absoluto ao contrário do cômodo ao lado ao que parecia um som abafado de risos femininos misturados ao som de “The Beautiful People”, do Marilyn Manson.

Maggie poderia estar lá? Não havia dúvidas, ela nunca perdia a oportunidade de estar metida em algum tipo de diversão.

Afinal, era halloween. O momento não podia ser mais propício. Mas enquanto as pessoas comuns andavam na noite pelas ruas enfeitadas, vestidas com os frutos de suas imaginações em fantasias, sem imaginar que o verdadeiro mal existe, os irmãos esperavam a oportunidade para finalmente concluir o objetivo de suas missões de vida.

Johnny não se juntava a esse tipo de evento, muito embora um dia já garantiu o título de melhor fantasia numa festa halloween adolescente no passado, por conta de sua aparência mórbida, o que lhe remetia a um ar excêntrico.

Por isso ele decidiu esperar, descansar em meditação. ó não esperaria cair num sono tão profundo, está que lhe trouxe uma informação intrigante. Assim, Johnny se levantou e decidiu ir até a porta do quarto vizinho.

Ele vestia uma calça jeans esfarrapadas, coturnos desbotados e uma regata preta que exibia bem as tatuagens que cobriam seu braço e pescoço, até mesmo seu corpo magro e esguio exposto ao clima gélido de Chicago.

Mas ora, frio não era nada pra ele.

— Maggie?

Chamou contra a porta, mas ela não pareceu ter ouvido. Então simplesmente abriu e, sentindo o cheiro de tabaco e gim barato, viu o que ocorria ali. Sim, Maggie estava lá, mas por mais que tivesse imaginado que estaria acompanhada de uma mulher… ele não imaginaria que estivesse com duas.

O que não era novo, afinal a loira não era nada discrepante quando se tratava de parcerias sexuais. Maggie era lasciva, sexualmente agressiva e não tinha pudor nenhum, podia viver nua o tempo inteiro se não fosse os padrões sociais e morais da sociedade.

— Ei, seu idiota! – A loira se irritou com sua presença e resmungou. — Não sabe mais bater na porta?

As outras que estavam à sua volta ficaram caladas e se encolheram entre os braços cobrindo seios e outras partes íntimas que ficaram à mostra.

Johnny, por sua vez, que já havia desviado o olhar, apenas disse.

— Preciso falar com você.

— Estou bem ocupada, se você ainda não percebeu…

— Também não estou feliz com isso — acrescentou ele com certo incômodo no respirar —, mas é... importante.

Maggie o fulminou com os olhos de desgosto, mas acabou por suspirar, com impaciência. Sabia que quando dizia que algo era importante, era de fato importante e particular. Ela podia sentir isso através do sentido bivitelino. Se isso fosse sequer possível.

— A gente ainda não terminou, docinhos. – Sibilou docemente para as duas, enquanto tocava os cabelos morenos da mais baixa delas. — Porque não se divertem um pouco enquanto eu resolvo um pepino, uh?

Maggie piscou antes de se enfim levantar da cama. Assim, se sujeitou apenas a vestir a jaqueta de couro sobre os seios nus. Aliás, usava por baixo apenas uma lingerie de renda com as meias ⅞ que usava por preguiça de vestir o restante das roupas. E, conforme elas começam a trocar os toques, a loira alcançou a carteira de Marlboro e um isqueiro com estampa de Jack Daniel's sobre a mesinha de cabeceira, e rumou para fora do quarto encontrando-se o irmão no corredor.

Não iria se incomodar se alguém olhasse, ela não era de se importar com o que pensassem dela afinal.

— Seja rápido, por favor. Eu não quero perder a melhor parte.

Séria, ficou a ouvir enquanto acendia um cigarro despreocupadamente. Johnny se encostou na parede e pôs as mãos nos bolsos.

— Eu tive uma visão do tempo em que nos perdemos na floresta…

Mal havia começado e a irmã já bufou, revirando os olhos e levou a mão à testa, impaciente.

— Pff!! Sério que você me incomodou pra isso? E daí que você tem visões, irmãozinho? Estou mais do que cansada de saber que você vê o passado. Droga, troca essa fita!

— Eu estava na pele dela.

— …? — Maggie não conseguiu sentir o peso daquela informação nos primeiros segundos. — Na pele de quem?

— Nyx.

A gêmea puxou o ar e a fumaça, mas sem conseguir soltá-las. E sentiu um calafrio percorrer a espinha de uma maneira que ela nunca admitiria para ninguém. Mas sabendo o quão poderoso era a habilidade do irmão de pressentir as coisas devido à entidade selada dentro de si, cogitou não ignorar aquela alegação.

— Espera aí… Está me dizendo que sentiu ela?! Como se fosse ela própria?

Jonny assentiu positivamente.

Maggie fez uma careta de nojento.

— Uhh, credo… deve ser muito nojento ter a sensação de ser aquela mulher por dentro.

E ela chacoalhou os ombros, espantando aquela imaginação. — Mas afinal, e daí, o que isso quer dizer?

— Eu não tenho certeza, mas acredito que pode significar que estamos perto de encontrá-la.

Ele dizia sem pressa ou preocupação, era característico sua postura fria e serena a qualquer coisa.

Maggie logo abre o sorriso.

— A-há! Eu sabia que ela estaria por aqui... – e a irmã comemora com expressão de vitória, empolgada deu uns pulinhos –, sabe o que isso significa, não e irmãozinho?

E diferentemente de seu irmão, Johnny permanece quieto. Por mais que ele quisesse era incapaz disso.

— Mas não sabemos exatamente onde ela está. – Comentou ele, desviando o olhar dos da irmã para a rodovia, onde passava um grupo de crianças fantasiadas com alguns adultos acompanhando. – Chicago é grande demais. Podemos levar a noite inteira, ou mais, e a lua cheia só durará até daqui três dias.

— Eu sei. Sua aí. Mas tenho uma pista, você sabe... – Afirmou confiante Maggie – Só precisamos encontrar a "casa". E procurar não é tão difícil para nós, assim. E aí, meu irmãozinho, vamos pegar essa maldita bruxa e eu mesmo vou acabar com ela, vou arrancar aquele coração podre com minhas próprias mãos. Acredite… eu vi isso!

Maggie puxou a fumaça do cigarro com mão trêmula, furiosa demais para demonstrar fragilidade se recordando de sua visão desde o princípio. A bem verdade é que a irmã não era nenhum pouco frágil, era uma porradeira de primeira.

Ao contrário de Johnny, que podia vislumbrar o passado, Maggie era capaz de prever o futuro. E o incrível é que a maior parte de suas visões se concretizam, dificilmente são enganosas.

— Desde que você não acabe cometendo uma besteira, eu apoio seu objetivo. Não se esqueça que você é boa em cometer desastres…

Comentou o irmão, sendo duro nas palavras, mas admitiu que zombava.

— Esse é o meu verdadeiro dom, irmãozinho...

Maggie deixa escapar um sorrisinho debochado. Mas perturbada, tragou o cigarro mais uma vez, constantemente indo aos seus lábios com batom meio borrado.

— Eu falo sério, Maggie. Tem que tomar cuidado. Ou coisas piores podem acontecer!

— Você fala como se eu fosse o problema... — Torna a resmungar, descrente, cruzando os braços. — Como por exemplo, a vez que seguimos seu senso de direção, nos ferramos bonito!

Agora ele se irrita.

— …

Então o silêncio impregna, e Johnny parece demonstrar uma insegurança.

A bem verdade é que nenhum dos dois sabiam controlar seus próprios dons e impulsos. Mas sentindo que não deveria deixar o irmão se sentir assim, uma sensação fruto da ligação fraterna que possuíam, Maggie respira bem fundo e afirma.

— Olha, confie em mim. Assim como eu confio em você. Nós vamos acabar com essa maldição de uma vez, e vai ser de uma vez por todas. Tá me ouvindo?

Ela ficou cutucando com a ponta do dedo na altura do peito dele fazendo com que ele prestasse atenção nas suas palavras. Johnny acena positivamente, meio hesitante, mas dando seu voto de confiança.

— Ótimo! E o que você acha disso? O que vamos fazer agora?

Ele demorou um pouco para responder. Por um momento ele olhou para o lado, para o vazio do corredor do motel, atitude no qual Maggie franziu sutilmente desconfiada.

— Eu soube de um galpão onde acontecem encontros noturnos de wiccanos na zona leste. Eles estão se reunindo esta noite. Eles devem saber de alguma coisa.

Maggie ouve e fica impressionada.

— Nossa, e de onde você ouviu sobre esse lugar assim tão rápido, hein? — E e ela riu já deduzindo a resposta.

— Você sabe. Algumas bruxas se infiltram em cultos wiccanos para atrair mais seguidores… é comum, para se misturar entre os humanos.

E deu de ombros, fingindo ser uma informação aleatória.

— Ah claro… entendi. Mas agora pode parar com essa mentira descarada, sei que isso veio dos seus amiguinhos do além.

Com sarcasmo, Maggie riu.

O rapaz cerrou e revirou lentamente os olhos, desdenhando o deboche. O fato de poder se comunicar com os mortos e ter acesso ao mundo inferior era algo que Maggie adorava zombar.

— Como eu soube disso, não é da sua conta. – Rude, ele continuou. – Só precisamos agir logo.

De repente, se ouve um gemido vir de dentro do quarto. Maggie percebe que as garotas estavam se divertindo sem ela, por isso apressou com as palavras ao irmão.

— Certo, mas vamos ver isso mais tarde, ok? Agora, se me der licença... tenho um serviço particular para resolver por aqui.

Ela abre a porta, vislumbrando as duas jovens inquietas, mas parrou para perguntar algo para o irmão, que ainda tinha o olhar vago para o lado da rodovia.

— Não vai querer se juntar, não é? Alice é ótima em dar uma animada, você iria gostar.

A pergunta trouxe um certo silêncio, e Johnny não desviou o olhar para ela apesar de não olhar mais para a rodovia.

— Não.

Maggie, por sua vez, ri da situação cinicamente.

— Ah é, esqueci… Você prefere os mortos. Então porque não caça um fantasminha por aí enquanto isso? Ouvi dizer sobre uma tal de "mulher de branco" que ronda as rodovias por aí a noite, que tal? Ela parece ser boazuda para atrair tanta gente…

— Tsc. — Estalou a língua com irritação enquanto ouvia as risadas da loira que zombava.

— Você deveria se distrair com coisas mais legais, irmãozinho!

E logo a loira entrou no quarto e fechou a porta, voltando à sua festinha particular. Enquanto isso, Johnny permaneceu quieto e parado no corredor e pensou em ir para o seu quarto e ficar sozinho que era melhor para si mesmo. Ou, pelo menos, no silêncio absoluto.

Mas a voz o interrompeu ali mesmo.

...

"Sua irmã tem razão... Você deveria se distrair mais."

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.