Cenas Inéditas Feliko

Pronto. Estou pronto.


No quarto deles em Angra, se arrumavam para almoçar e passar a tarde de domingo fora. César ficaria com a cuidadora, com a qual ele estava se relacionando até bem demais, para a alegria de todos, e eles iam sair com as crianças, conhecer o parquinho novo que abriu no shopping de Angra, visitar algumas lojas, pegar um cinema talvez, tomar sorvete com certeza e o que mais a família tivesse vontade.

Niko já estava arrumado. Olhou no relógio e a hora voava. Quem não voava era Félix que, ainda sem camisa, observava compenetrado os perfumes sobre a cômoda tantando decidir qual usaria naquele dia.

Niko aproximou-se, com toda a paciência do mundo e a sabedoria de um Carneirinho que conhece bem seu companheiro.

– Félix... você ainda não está pronto amor? - Disse enquanto lhe fazia um carinho.

– Falta pouco, Carneirinho.

– Porque você é sempre o último a se aprontar? Falemos sinceramente, pra tirar a roupa você é rápido, mas pra vestir...

– Niko, já passsou por essa sua cabecinha que talvez não seja eu quem demore mas sim você que se arruma rápido demais?

– Você acha que me arrumo rápido? Tem alguma coisa errada em mim? Pode falar, Félix... estou feio?

– Niko! Pelas contas do Rosário... você feio? Mas é o apocalipse...

– Sei lá, você disse que me arrumo rápido...

– Não, esquece. Retiro o que eu disse. Eu que demoro mesmo, ta? Sou assim... fazer o que... gosto de me arrumar, me perco no tempo escolhendo roupa, passando perfume, creme disso, creme daquilo...

– Félix, você sabe que não precisa de nada disso, não sabe? Você ficaria maravilhoso, mesmo vestindo um saco de batatas.

– Carneirinho! - Félix ri. - Mas só se eu tivesse sido camelô na Via Sacra pra vestir um saco de batatas...

– É verdade, Félix. Você tão é lindo que as pessoas nem iam notar o saco de batatas.

– Eu sei. Sou mesmo. Apareço naturalmente, chamo atenção por onde vou...

Félix se virou para o enorme espelho, que há ao lado da cômoda, e ficou a admirar-se enquanto se auto proclamava a mais linda das criaturas. Se deixasse ele não sairia dali nunca. Com alguns tapinhas em suas costas, Niko o tirou do transe.

– Tá, tá bom. Félix... já sabemos. Vai, se veste, anda. Daqui a pouco é hora do almoço e o senhor está ai, feito Narciso se admirando, se olhando nesse espelho...

– Você que está me distraindo!

– Eu?

– É sim... Eu estava aqui escolhendo perfume e você chegou, se aproximou, puxando assunto... Não sabe me ver sem me tocar. Parece criança em loja de brinquedo, quer por a mão, interagir...

– Félix... você... - Niko ria enquanto fingia indignação. A verdade era que ele, por muitas vezes, parava apenas observando Félix se vestindo, quando não o tentava ajudar, o que quase sempre atrasava mais ainda todo o processo porque eles acabavam se envolvendo em outra atividade. Mas não dessa vez. Félix sabia que era manhã de domingo e eles precisavam sair de casa para aproveitar o dia.

– Carneirinho vai, vai lá ver se as crianças estão prontas e me deixa, eu já vou. Você aqui falando, tira minha concentração, vai, vai...

– Vou mesmo que é o melhor que eu faço. Até porque Fabrício agora também leva um século pra se arrumar. Mal completou cinco anos e quer combinar sapato com bermuda, troca de camisa dez vezes até achar uma que considera boa... coitada da Adriana viu...

– Adoooro meu mini Carneirinho!

– Quem será que esse menino está puxando, hein?

– Vai ser lindo, chique e elegante feito eu, Niko! Aliás, ele já é! Vai, vai lá que eu já vou. Você me lembrou bem, vou correr aqui porque vou arrumar o cabelo dele.

– Ainda vai arrumar o cabelo dele?

– É Niko... ele gosta de sair com o cabelo todo estilizado e só eu sei arrumar. Aproveito dou uns toques em Jayminho, porque a criaturinha não tem talento nenhum pra escolher roupa... aquele puxou você.

Niko olha no relógio... aquela ia ser uma longa manhã antes de conseguirem sair de casa.

– Mereço... - Ele saiu do quarto sorrindo.

–-- Fim de cena ---