Caçadoras

Sam - Capítulo Um - O Chamado


Era madrugada de sábado. Uma coruja agourenta passou piando na rua enquanto eu só pensava que estava preparada. E repetia isso na minha cabeça enquanto Tommy beijava as minhas costas. Fazia um pouco de cócegas. A situação não era muito propícia para estarmos fazendo aquilo, mas eu estava quase desesperada.

Minha melhor amiga Grace, das líderes de torcida da escola, havia sumido quando voltávamos do cinema na semana passada. E encontraram um menino com o sangue totalmente drenado no córrego. Então, encontrei uma maneira de entrar em pânico.

E eu estava dando um passo à frente.

"Oi Sam", disse ele sorrindo.

Eu quase gritei quando abri os olhos, mas consegui tapar a boca a tempo. Não podia acreditar no que via, em meu quarto. Era madrugada de sábado e eu e meu namorado Tommy estávamos, bem, eu já estava preparada para fazer aquilo, então decidimos dar um passo à frente, se é que você me entende.

Yosef havia sumido há quatro meses. Ele deixou toda a família atordoada e seus pais resolveram ir embora da cidade, moravam na minha frente. Yosef era meu amigo de infância e simplesmente me deixou sozinha e preocupada. Tommy não preenchia o vazio de amigo de Yosef.

"Eu posso explicar, eu posso explicar tudo, fica calma...", mas eu não deixei ele terminar e minha mão em punho derrubou ele sobre meu assoalho. meu pai deve ter levantado e instantaneamente voltado a roncar.

"O que você pensa que estava fazendo? Onde você estava? Deixou todo mundo preocupado e ainda perdeu meses de aula!!", eu apontava pra ele endurecida e nervosa.

Ele foi se levantando, devagar, com a mão no olho, mas com uma expressão de fascínio esquisita. "Foi por uma causa maior, Sam é algo que você não pode evitar, você já foi chamada e eu vou coordenar você..."

"Do que está falando? Cadê o Tommy? Você não tem o direito de invadir meu quarto num momento como esse..."

"Eu te garanto que eu também gostaria, com certeza, de ter chegado outra hora. Mas precisamos ir rápido! Amanhã mesmo começamos!"

Eu estava desconfortável, em roupas íntimas, e ele percebeu isso. Yosef estalou os dedos e a camisa de Tommy pendurada no cabide próximo me envolveu. Lembro de ter ficado estarrecida e ele riu da minha cara.

"Devia ver a sua cara", disse ele entre risos. "Escuta, eu preciso falar, eu posso?"

Eu me sentei, mas virei a cara para ele de tão aborrecida.

"O Tommy está dormindo em algum lugar. Olha, eu sei que errei em fugir mas você não sabe quanta coisa eu descobri, Sam, a mágica é tão legal!" Ele estava magro e com olheiras. Os olhos estavam totalmente negros.

"Você esta se drogando!" Eu afirmei.

"Talvez, mas não essas drogas de humanos, ah sei lá, Sam! Eu descobri por que você tinha aqueles pesadelos desde criança, que você tanto reclamava, mas eu me fascinava!"

Olhei para ele, assustada. Lembrei-me dos pesadelos que me acordavam e as vezes acordavam a casa toda. Foi desde que eu tinha cinco anos de idade. Eu era outra garota, em outra época, e sempre era assassinada no final. A revolução francesa que vimos na aula de história. bem, eu já estive nela. Na China antiga também.

De tão assustada, comecei a praticar artes marciais, nunca soube por que eu me sentia tão segura lutando. Eu livrei o Tommy de um assalto num beco uma vez, o que para ele foi constrangedor. Mas eu ainda me sentia segura com ele.

"Como assim? Olha Zef, isso é muito sério, você não tem ideia do que é um pesadelo tridimensional com monstros e estacas!"

"Eu sei sim! Eu vi!"

Eu já estava ficando confusa com aquele tanto de informação só naquela noite. Mandei Yosef desembuchar logo e calei minha boca de vez.

"Eu estava na Finlândia. Estava aprendendo magia poderosa com um amigo meu feiticeiro e caçando vampiros finlandeses. E é por isso que estou aqui. Por que você também vai ter que ir."

Entortei as sobrancelhas o máximo que eu pude.

"Vampiros."

Me levantei em direção a porta, pronta para expulsar Yosef, mas enquanto eu mudei de ideia e fui até a janela, ele continuou.

"Era o que você fazia nos sonhos. Eles mostravam o seu destino, Sam, você já estava predestinada pra isso. As meninas que você 'era' nos sonhos, eram caçadoras de vampiros antigas, elas eram uma só pra cada geração, mas agora não inúmeras, ainda não sabemos o por que."

Abri a janela pronta para arremessar Yosef para fora. Eu sabia que podia, mas nunca me perguntei o porquê.

"Você quer me jogar pela janela! Você sabe por que? Como você sabe que pode? E a sua força? De onde você acha que ela vem?"

"Eu luto taek-wondo desde os onze anos, Yosef. Cai fora'', eu disse, apontando para fora da janela. Só um poste iluminava nossa rua.

"Não é isso!", ele disse, e a janela fechou, quase prendendo meu dedo. Olhei nervosa para ele, outra vez.

"Sam, você foi chamada. Você é uma Caça-vampiros. Aceite isso e me ajuda a exterminar esses bichos por aí, vamos montar uma equipe!"

Lembrei-me imediatamente dos pesadelos, de novo. O homem com cara de morcego lambendo sangue das mãos. Meus braços arranhados, roupas rasgadas. A fogueira acesa, em queimando.

"Você acha que isso é vida?" Eu já estava acreditando nele.

"Você tem poder, só morre se quiser..."

"Do que você tá falando? Todas as meninas de antes, elas tinham poder, não tinham? E qual foi o destino delas? Onde elas estão agora?"

Eu já estava ficando quase louca com essa ideia de caçar demônios. Não podia me tornar isso, eu queria ser policial. Fui relutante até o fim com Yosef.

"Soubemos, eu e meu amigo, que foi uma Caçadora que acionou você e todas as outras no mundo. A Marllen, Sam. Ela também é uma de vocês."

Uma de nós.

Marllen era a namorada de Yosef. Uma brasileira que vivia na cidade e que eu tenho que admitir que tem olhos lindos. Nós achávamos que ela era meio esquisita e misteriosa, mas eu sempre simpatizei com ela. Por isso ela era "misteriosa". Era o que eu me tornaria.

"E ela está caçando agora. E também tem uma vindo de Los Angeles, pelo que fiquei sabendo. Mas eu não a conheço, ainda."

"Tá, então seremos uma equipe, é isso? As Meninas Super poderosas Sanguinárias?"

Eu amarrei meu cabelo longo e negro num rabo de cavalo bagunçado, e me refleti no espelho por alguns momentos.

"Eu gostei do nome. O que você vê aí, Sam?", ele perguntou enquanto eu encarava meu reflexo. "Você lembra do dia do torneio de taek wondo? O que aconteceu lá, naquela hora?"

Eu lembrava. Eu estava morta de medo, como se a plateia fosse me devorar. Como se as pessoas das arquibancadas fossem os monstros dos meus pesadelos. E a adversária também, aquela garota medonha. Eu vi a minha mãe filmando tudo e todo mundo torcendo. Mas eu tinha medo. E quando eu estava quase para correr daquele ginásio, eu senti.

Não sei definir o que eu senti. Apenas veio. Senti envolver o meu coração, era gelado. E então eu fechei minha mão em punho. Pelo que eu soube, a menina foi parar no hospital, mas não foi algo que eu fizera propositalmente.

Então foi aquilo. O chamado. E eu pareci tão pronta para matar os vampiros naquele momento, mas dias depois, naquela noite, no quarto com Yosef, sabendo do meu destino e tudo mais, eu não estava nada pronta. Eu tinha medo. E o medo atrapalha.

"O medo atrapalha, Sam", ele advertiu. "Só venha se estiver disposta a matar e não a morrer.

Eu tentei chorar, mas não consegui.

"Ah, e sobre a Grace, a sua amiga que eu fiquei sabendo que desapareceu... bem, ela é uma vampira agora. Desculpa."

O quarto ficou mais escuro do que já estava e eu abri os olhos na cama, deparei-me com as flores florescentes no teto, e Tommy ao meu lado. Já era de manhã.

"Nossa eu sonhei que tava no Egito, foi um sonho tão real... tridimensional, acredita?" Me entristeci de vez.

Não, eu não estava preparada.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.