Cartas Do Passado

O sacrifício de Elizabeth (parte 4)


Darcy havia dito a Elizabeth que levaria Georgiana à pousada pela manhã. Quando os tios foram encontrar alguns amigos, ela sequer cogitou a hipótese de se afastar dali. A curiosidade era maior que seu “senso social”.

Os tios logo voltaram com um italiano alto e de voz grossa. Os três pediram para que ela se sentasse.

- Querida, eu e seu tio estamos preocupados com seu futuro. Sabemos que tem talento, mas a América não é o lugar certo para explorá-lo. – Disse a tia, pegando suas mãos.

- Por isso, decidi mandar seu currículo para Francesco Salvatore, este belo rapaz – e os dois gargalharam.

- Devo dizer que me impressionei muito com suas habilidades e notas. Importa-se de responder a algumas perguntas?

Finalmente Lizzie entendera o porquê dos tios a levarem justamente pela Inglaterra. Deveria ter desconfiado, os Gardiners não davam ponto sem nó.

Após algumas perguntas pessoais e profissionais, o italiano levantou-se e afirmou que traria a resposta no outro dia.

Quando este saía, Elizabeth ouviu barulhos de vários carros na entrada da pousada e seu coração pulou.

- Tio, tia, fiquem. Estou esperando a visita de Georgiana e Fitzwilliam Darcy.

Os dois ficaram surpresos e o olhar da tia se mostrou ainda mais inquisidor. Quando Elizabeth a mirou com mais atenção, porém, percebeu que havia um sorriso esquisito em suas faces.

“Oh, não. Ela descobriu!”, pensou Lizzie, mas logo se controlou. E qual era o problema? Sabia que a tia jamais a confrontaria com um assunto do gênero.

Georgiana e Darcy finalmente apareceram à porta do pequeno apartamento. Elizabeth constatou que a irmã do rapaz estava tão embaraçada quanto ela. Alguns haviam dito que era exatamente como Darcy, orgulhosa. Uma avaliação mais profunda do caráter dela fez com que Lizzie percebesse que só era muitíssimo tímida.

A moça era mais alta que Lizzie. Seu semblante lembrava muito o do irmão, embora fosse mais suave.

- Elizabeth, Sr. e Sra. Gardiner, esta é minha amada irmã, Georgiana – e passou as mãos de leve no cabelo dela.

- Olá! – e um rubor coloriu-lhe as faces.

- Bingley está chegando para cumprimentá-los.

Lizzie sentiu-se feliz em reencontrá-lo, já que parte de seu ressentimento contra ele havia se amenizado. O rapaz, embora conversasse da maneira animada de sempre, falava menos e a olhava constantemente. Relembrava-se exatamente do dia em que havia ido embora e perguntara se todas as irmãs de Lizzie permaneciam em Nova York.

Elizabeth prestou atenção no comportamento de Georgiana e Charles durante a visita e, para seu enorme deleite, percebeu que nada ali havia. Todas as insinuações de Caroline faziam jus aos próprios desejos.

Darcy e Lizzie não tiveram muitas oportunidades de conversar, mas a moça ficou ainda mais contente com a mudança de comportamento do rapaz. Fitzwilliam fazia de tudo para agradar aquelas pessoas que mal conhecia e que havia denegrido com tamanha rudeza. Havia, também, um sorriso em seus lábios e a alegria deste gesto lhe alcançava os olhos.

- Precisamos ir. Gigi, reforce o convite para o jantar.

A moça sorriu:

- Por favor, jantem conosco! – e embora a timidez se fizesse presente, ela segurou as mãos de Lizzie nas suas e fez uma expressão de súplica.

Com tamanha gentileza, não houve meios de recusar o convite.

Elizabeth sabia que os tios iriam indagá-la sobre os mais diversos assuntos. Disse que estava com dor de cabeça e foi se deitar, o medo de expressar em voz alta o que sentia por dentro a impelia.

Os tios conversaram com os mais diversos habitantes de Lambton e descobriram que, apesar de ser acusado de orgulho, o rapaz Darcy era muito querido na região. Quase não parava em Pemberley, era verdade, mas sempre deixava ordens expressas de auxílio aos pobres e doentes.

Por outro lado, perceberam que George Wickham era pouco admirado, mesmo que a maioria dos que ali viviam pouco soubesse sobre sua história com Darcy.

Em seu quarto, Lizzie tentava decifrar as próprias emoções. Quando reencontrara Fitzwilliam, pensara que ele a trataria com desprezo e distância, mas nada disso acontecera. O rapaz tentara deixá-la confortável e valorizava seus parentes. Respeito, admiração e gratidão eram os sentimentos com os quais Lizzie se envolvia. Seu amor por ela também não desagradava a moça, só desejava saber se seu coração havia mudado o suficiente para que ela sentisse o mesmo pelo rapaz.

O jantar seria na noite seguinte, mas os tios decidiram retribuir a visita pela manhã. Tudo se devia à curiosidade entre as relações de Elizabeth e Darcy.

E, é claro, ao desejo de pescaria do tio.

_*_

Francesco Salvatore apareceu na pousada logo de manhã e contratou Elizabeth. Seu salário seria de 10 mil euros fixos e 5% de comissão no valor de cada venda. Lizzie ficou muitíssimo feliz e agradeceu com todo o seu coração. Deveria mudar-se para a Itália e começar a trabalhar no final do mês

Agora que suas maiores apreensões estavam sob controle, Elizabeth não conseguia definir qual seria a reação de Caroline.

Tentaria denegri-la? Ou se manteria à distância?

O tio logo se juntou aos rapazes. Sra Gardiner e Elizabeth juntaram-se a Georgiana, Sra. Annesley, a cuidadora de Gigi, e Caroline, que estavam no quarto da moça.

A irmã de Darcy as recebeu com a alegria intensa que sua timidez permitia. Caroline apenas acenou de longe para as recém-chegadas. A Sra. Annesley e a Sra. Gardiner logo se viram entretidas em uma conversa interessante.

Lizzie gostaria muito de conversar com Georgiana, embora tudo o que falasse fosse ouvido por Caroline. Sentara-se, porém, distante e não podia deixar de desejar e temer que o dono da casa se juntasse a elas.

Darcy estivera com os outros rapazes durante a manhã, mas soube que Elizabeth e a tia haviam visitado sua irmã e decidiu voltar para casa.

Ao entrar no aposento, todos os olhares recaíram sobre ele e Elizabeth. Os presentes desejavam saber quais seriam suas atitudes para com o outro e até onde suas desconfianças eram plausíveis.

O rapaz estimulava todas as conversas possíveis entre Lizzie e Gigi. Caroline, enciumada, tentou logo denegrir a moça:

- Os universitários já deixaram Nova York, Lizzie? Que pena, suas irmãs devem ter ficado arrasadas.

Elizabeth logo percebeu as intenções de Caroline e cuidou para que sua resposta fosse distante e indiferente. Os olhos dela e de Darcy não se separaram um segundo sequer enquanto falava, o segredo pairava sobre eles. Gigi havia abaixado a cabeça e seu rosto ruborizara violentamente. O objetivo de Caroline se tornou outro: ao tentar atingi-la, havia magoado Darcy e Georgiana e, Lizzie desconfiava, não seria perdoada tão rapidamente.

Logo o grupo voltara ao comportamento anterior, deixando Caroline furiosa e desapontada. Seu tiro saíra pela culatra.

Os Gardiner e Elizabeth foram embora logo depois. Assim que Darcy retornou, Caroline não perdeu a oportunidade de criticar todos os aparentes defeitos de Lizzie.

- O rosto dela é fino demais e os olhos, que já ouvi serem um deleite, não possuem charme algum.

Darcy ficara irritado, mas continuou em silêncio. Caroline prosseguiu:

- Ah, querido, lembro-me de tê-lo ouvido dizer: “Se Elizabeth é bonita, a mãe dela é inteligente!”, mas acho que mudou de opinião.

- Sim, Caroline – finalmente decidiu falar. – Há muito tempo a considero uma das mulheres mais belas e charmosas que já conheci.

E deixou o recinto.