Carta para você

Uma Surpresa Inesperada


- Você tem certeza disso, Jethro?

— Você não tem, Jen?

— Mas essa? Não sei? Talvez...

— Jen, será que você não percebeu que anda meio indecisa nos últimos meses?

— Eu não estou indecisa. Só acho que é cedo demais! Jethro, é sério! Ainda temos tempo! – Ela me sorria.

— Você vai se surpreender como o tempo voa, Jen. Ainda mais nessas circunstâncias. – Eu peguei a mão dela e a guiei para outra parte da loja.

— Quem é o ansioso agora? – Ela parou de frente a uma prateleira, pegando dois itens e os encarando.

— E quem é a indecisa? Você sempre pega dois de cada. E nunca consegue escolher.

— Dá um tempo, Jethro, é tudo tão... lindo e tão novo para mim, que é impossível de não me encantar. Olhe isso! – Ela estendeu dois vestidinhos de bebê na minha direção, um branco com florzinhas vermelhas e outro rosa claro com um enorme laço lilás nas costas. – Vai me dizer que não são perfeitos.

— Jen, ela ainda nem nasceu! – Eu passei a mão sobre sua barriga de cinco meses. – E você já está olhando vestidos para crianças de dois anos.

— Como você disse, o tempo passa rápido. – Ela deu de ombros.

— Você conseguiu decidir que cor quer o quarto? Porque... - E ela me interrompeu.

— Me dê a sua mão. Sua filha está se mexendo. – E ela colocou a minha mão exatamente onde pude sentir a nossa pequena chutando, ou seria se espreguiçando? – Sentiu? – O sorriso dela era imenso. Mas não maior que o meu.

— Sim. - Eu sorri de volta. – Papai está doido para te conhecer, pequena. – Eu disse em direção à bebê.

— Ele só quer saber quem vai ganhar a aposta, bebê. Ele ou eu. Não me decepcione e nasça com os olhos de seu pai! – Jen cantarolou em direção à própria barriga.

— Na verdade, – eu me abaixei para ficar na altura da barriga de Jen e coloquei as mãos em ambos os lados de seu abdômen – venha do jeito que você quiser, tenho certeza que será linda de qualquer jeito. – Eu sussurrei para minha filha ainda não nascida. E, como resposta, senti um chute bem onde minha mão estava. – Viu, ela já me reconhece.

— Bobo! – Jenny ria. – Agora, será que você pode se levantar, olha a cena no meio da loja, Jethro!

Olhei em volta, realmente algumas pessoas, na maioria as vendedoras nos encaravam. Elas queriam mais? Não tinha problema. Me levantei e peguei Jen para o beijo. Quando nos separamos, ninguém mais nos olhava.

— Você, Jethro, é maluco, mas sabe de uma coisa? Eu te amo.

— Também te amo, Jen.

—--------------------

- Jethro... ei... acorda. – Eu tentava, em vão, fazê-lo soltar seu aperto em mim, nem que fosse um pouco. Mas ele nem se mexeu.

— Jethro! Por favor... – consegui me virar na sua direção, e quando eu vi sua expressão, quase desisti de acordá-lo. Era tão em paz, e ele tinha um sorriso tão lindo, me perguntei com quem ele sonhava.

Coloquei uma mão no rosto dele e fiz um carinho em seus cabelos. Com pouco ele foi despertando.

— Bom dia! – Eu disse. – Sonho bom?

Ele demorou para me responder. Apenas me fitou por um tempo.

— Sim. – E o sorriso voltou. – Você não imagina o quanto. – Ele disse antes de me beijar e, estranhamente, levar as duas mãos na minha barriga.

— Você acordou misterioso hoje, mas te perdoo. Principalmente por conta do seu sorriso. – Falei depois que ele terminou de me beijar.

Sua risada rouca ecoou em minha cabeça pelo resto do dia. Definitivamente o sonho dele foi bom.

—------------------

— Então, como vamos avisar para um Will que, muito provavelmente está apagado agora, que ele voltou a ser o cara da vigilância? – Jen vinha do quarto, em direção à sala.

— Eu já o acordei e avisei. Contrariando tudo o que você disse, ele me pareceu bem feliz por voltar a ficar atrás do computador.

— Bem, tem gente que tem paciência para isso. – Ela deu de ombros. – Agora um outro problema... eu não estou liberada para voltar.

— Esse seu problema...

— Nosso... – Ela sorriu diabólica.

— Que seja, esse nosso problema, logo não será mais. Liguei para Ducky. Ele deve aparecer a qualquer momento para pode te avaliar.

— Mas você está apressado, hein? – Ela riu, sentando do meu lado.

— Tenho lá as minhas prioridades. – Respondi sem olhá-la.

— Sei quais são as suas prioridades, Jethro, sei muito bem. – Ela me cutucou com o cotovelo. – E aí, algo de interessante nas notícias de hoje?

— Isso, é trabalho seu. Pode ficar à vontade até Ducky aparecer. E vê se dessa vez, esconde o café!

- O café vai ser fácil. Já não tenho tanta certeza quando às marcas que estão espalhadas pelo meu abdômen. Você saberia me dizer de onde elas vieram, Jethro? – Jen levantou uma sobrancelha curiosa em minha direção.

— Muito provavelmente do mesmo lugar que os arranhões nas minhas costas e peito.

— Tem algo de muito perigoso naquele quarto. – Ela falou em tom de conspiração.

— Talvez, à noite nós descubramos o que pode ser... – deixei a frase solta.

— É uma boa ideia. – Jen me respondeu com um sorriso.

Então começamos a pensar em como iríamos nos manter invisíveis para perseguir as vans, quando Ducky chegou.

— Hora da verdade. – Jenny fez uma careta quando o bom doutor chegou observando tudo ao redor.

—--------------

- Sim, minha querida. Vamos saber se você pode voltar a campo. Pelo visto, dessa vez você seguiu as minhas recomendações à risca. – Ele começou assim que me viu.

— Todas elas. Eu mesmo fiz questão de monitorar o que Jen fazia, Ducky. – Jethro respondeu por mim.

— Isso é verdade? – Doutor Mallard me encarou.

— Acho que se eu não voltar logo à campo, Ducky, Jethro é bem capaz de matar o Will, assim o serviço de ficar ao lado dele vai sobrar para você! – Eu disse solenemente.

— Melhor eu me apressar então, - Ducky começou a rir. – Tudo o que menos quero é parar em uma missão.

Olhei para Jethro que escondia a risada por trás de uma caneca de café. Eu me mantive quieta, enquanto era examinada.

— Como está para andar? – Ducky me perguntou depois que constatou que minha perna estava praticamente boa.

— Não dói, mas também não posso correr uma maratona. – Falei a verdade.

— Nem pode calçar saltos. – Ele continuou por mim.

— Não?! Como não! O buraco foi na coxa, não na panturrilha... que mal vai fazer um par de saltos? – Disse exasperada.

— Para mim essa é uma boa notícia. – Jethro disse com uma cara debochada.

— Minha cara Jennifer, não quero por mais pressão do que o necessário na sua perna, portanto, nada de saltos. Vamos combinar, por pelo menos um mês?

Era a minha morte! Sem meus saltos? E que outra escolha eu tinha a não ser seguir as ordens de Ducky.

Respirei fundo e contrariada respondi:

— Tudo bem, um mês sem saltos.

— É para o seu bem, minha querida. Acredite em mim. – Ele deu um tapinha em meu ombro como me reconfortando.

— Acredito em você, Ducky. – Disse por fim.

— Então, aqui está a notícia que vocês – ele olhou tanto para Jethro quanto para mim – queriam ouvir. Pode voltar a atuar no campo, Jennifer, mas com cuidado, por favor.

Essa era uma excelente notícia.

— Sempre temos cuidado, Ducky. Mas às vezes ter cuidado não basta. – Disse a ele.

— Sei disso, minha cara. Mas meu dever como médico de vocês é sempre pedir que tenham cuidado. Os dois já brincaram com a morte durante essa missão.

— Eu sei... – minha mente automaticamente voltou à Positano.

— Bem, vou indo. E não quero ter notícias de vocês dois por um bom tempo. Só quero ser avisado quando formos mudar de cidade. Tenham um bom dia. E comportem-se. – Ele se despediu.

— Tchau Ducky. – Respondi enquanto ele fechava a porta.

- Porque eu acho que esse “comportem-se” não tem nada a ver com o que vamos fazer? - Perguntei para Jethro.

— Esse escocês é mais esperto do que nós dois imaginávamos. – Foi a resposta que recebi.

— Não diga?! – Eu ainda olhava para a porta, até onde Ducky sabia das coisas?

— Então, já que você está liberada. Acabou a boa vida, vamos logo Jen. – Jethro não sabe o quão feliz estava de poder escutar estas palavras.

—----------------

— Esses caras estão fazendo um tour pela cidade? Eles já rodaram todos os pontos turísticos de Londres. E têm uma certa atração pela London Eye. – Expressei os nossos pensamentos.

— Chelsea, South Bank, Westminster, Kensington e The City. Rodamos por cinco distritos de Londres... e em cada um havia um depósito. – Jethro disse, estacionando o carro alguns metros atrás da última van, mais uma vez, os libaneses paravam em South Bank para dar uma voltinha pela London Eye.

— Então, creio que nossa missão esteja completa... – Disse, mas algo chamou a minha atenção. – Onde estão os binóculos?

— O que você viu? – Ele me passou o que pedi e, também se pôs a olhar na direção da famosa Roda Gigante.

— Eles não estão turistando, Jethro. Isso é um encontro. Repare, todas as vezes eles pegaram a mesma cabine. Número 7.

Jethro se concentrou nos rostos e eu peguei a câmera.

— Algum deles estavam em nossa lista de Belgrado? – Ele perguntou.

— Que eu reconheça, não. São pessoas novas. Mais inteligência para a equipe autorizada pelo Mossad. – Eu sorri.

— E quero ver o que Morrow vai escrever no próximo e-mail. – Jethro fez piada.

— Muito provavelmente algo como: “Não fizeram mais do que a obrigação de vocês, depois que a agência gastou tanto dinheiro com a extração da Sérvia!” – Eu tentei imitar o tom do Diretor, mas falhei miseravelmente.

— Eles estão saindo. – Jethro me avisou.

Preparei a câmera e bati quantas fotos foram possíveis.

Nossos amigos se despediram, uma maleta preta tinha trocado de mãos. E foram embora.

Esperamos alguns minutos. E, quando um dos libaneses se aproximou de nosso carro, só tivemos tempo de esconder o equipamento de vigilância e Jethro me puxou para um beijo, que de falso não tinha nada.

— Acha que ele acreditou? – Perguntei quando terminamos e Jethro olhava ao redor com um sorriso presunçoso.

— Se acreditou, eu não sei. Mas que está morrendo de inveja, ele está! – Ele me confirmou. Fui virar a cabeça para olhar, mas Jethro me impediu, me dando outro beijo de tirar o fôlego.

— Pode parar, está querendo aparecer para o cara? – Me fingi de ofendida.

— Não. O segundo foi só para te beijar mesmo... sua curiosa. Ele já se foi há um tempo. – Ele sorriu debochado em minha direção e deu partida no carro.

— Olha aqui, se eu não gostasse tanto assim de você, eu juro que te dava um tiro, viu? – O ameacei, batendo em sua cabeça com a câmera.

— Então é melhor eu continuar fazendo você gostar de mim até que essa missão termine... – Ele continuou debochando de mim.

— Ainda temos a aposta. Quem mata quem primeiro! – Ri em sua direção.

Ele me olhou torto.

— Como se um de nós fosse ter coragem de matar outro. – Ele terminou o assunto, enquanto chegávamos perto de nosso apartamento.

O nosso maior problema, ele tinha razão, nenhum dos dois era capaz de matar o outro, nem que fosse para salvar a vida um do outro...

—-----------------

— Vai passar essas fotos ainda hoje para o escritório? Você sabe que eles não vão te responder rápido. – Falei para Jen que já estava com o computador no colo.

— Eu aprendi a lição de não ficar esperando uma resposta rapidamente, Jethro. Pode ter certeza. Eu só vou fazer a minha parte do trabalho. Quanto mais rápido passo a informação, mais rápido podemos voar para Paris. – Ela deu de ombros.

— E assim, vamos poder ir atrás de Zukhov.

— E finalmente voltar para casa! – Ela terminou feliz.

— Dessa vez, Jen, você ganhou.

— Eu sabia! Um dia você iria admitir que eu era melhor do que você. – Ela lançou alguma coisa na minha cabeça enquanto eu passava em direção à cozinha.

— Não seja tão convencida. Talvez eu só esteja com pena de você, e tenha te falado isso para te fazer sentir melhor. – Respondi a ela que não gostou nem um pouco do que disse, tendo em vista que o que ela arremessou depois foi um canivete.

— Dá próxima vez, Gibbs, o canivete vai estar aberto! – Ela xingou da sala.

— E se eu levar uma oferta de paz, e te devolver o canivete, você tenta não me matar hoje? – Perguntei enquanto servia duas xícaras de café.

— Depende do tratamento que vou receber nos próximos dias... mas saiba que você está na minha lista negra. – Jen disse sorrindo quando viu a caneca de café. – Mas agradeço o primeiro mimo.

— Depois eu mando a conta. – Falei no ouvido dela.

— Conta?! Ora, ora... é você quem me deve! – Ela retrucou séria.

— Eu?!

— Sim. Olha só quanto tempo eu tenho que te aturar por dia... uma mísera canequinha de café não é nem 1/8 do que eu tenho que aguentar.

— Eu mereço ouvir isso. – Levantei do sofá e a deixei lá com o computador e falando sozinha.

— Pense bem, Jethro, já é final de outubro. Daqui a pouco vira o ano e nós dois sabemos que toda essa bagunça não vai durar muito. Estamos caminhando para o final!

Fiquei pensando. Em quatro meses já terá passado um ano que estamos aqui. E, o que Jen falou é correto. Se tudo desse certo, não nos alongaríamos mais nisso. Creio que antes do verão acabar, já estaremos de volta aos EUA.

Mas antes de pensar na volta, tinha uma outra data que se aproximava. E eu queria saber o que Jen achava dela.

—-----------------------

Já tinha alguns poucos dias que Jethro estava estranho. Bem, não que ele já não fosse, mas estava agindo de forma esquisita até mesmo para ele.

E eu não sei porque motivos isso me incomodava tanto.

Continuamos com a nossa vigilância, tentando pegar mais vislumbres de qualquer outro negociante que aparecesse, mas nenhum novo jogador entrou no negócio.

E, entre passar o dia perseguindo vans pela cidade, e noites ainda esperando a resposta de D.C. os últimos dias se passaram.

E Jethro ficou distante. E isso me incomodou. Ainda mais depois da forma como ele me olhou naquela noite. Eu achei que tinha algo a mais ali.

Como eu disse, eu achei... não deveria ter mesmo. Nunca teria... ou teria? Será que eu poderia ter um pedacinho do coração dele?

Céus! Eu estou divagando com base nos meus sentimentos e na minha depressão pré-aniversário.

Evidentemente eu nunca contaria para nenhum dos dois homens que compunham a equipe que meu aniversário estava chegando, e muito menos que, ao contrário da maioria das pessoas, a única coisa que eu conseguia sentir era tristeza.

Era bem compreensível para mim esse sentimento, afinal, quem mais comemoraria o meu aniversário comigo, sendo que toda a minha família já se fora?

Agora, para dois homens, a única coisa provável que escutaria era: larga de frescura e cai na noite.

E, por conta de reações como esta, que não comento com ninguém sobre a data, ninguém sabe, ninguém me perturba.

Mas, eu esperava ter um dia diferente nesse ano. Não sei porque me dei esse tipo de esperança, mas, no fundo, no fundo, eu esperava que fosse diferente.

Ledo engano. Não seria. Mesma melancolia dos últimos dois anos. Dois anos... às vezes o tempo passa rápido até demais.

Contudo, aqui estou eu, prestes a fazer 30 anos, estando em um outro país, podendo ter a liberdade de fazer o que quero, sem ninguém para me impedir. E tudo o que eu quero é que este dia passe sem que eu o perceba.

E pelo visto, é o que vai acabar por acontecer.

A manhã, até agora, tinha sido como outra qualquer. Jethro tinha se levantado, como de costume, antes de mim e estava rondando a cozinha para fazer o café. E eu, como sempre, ficava até o último segundo na cama. Nunca gostei de levantar cedo, e a chuva que batia na janela só me convidava a enterrar minha cabeça nas cobertas e esquecer que o mundo existe.

Mas o mundo existe, eu faço parte dele e tenho um trabalho a fazer, então, muito a contragosto tive que me levantar. A notícia boa era a caneca de café me esperando no balcão.

— Dia, Jen.. – Era a saudação de sempre.

— Bom dia, Jethro. – Perguntar se ele tinha dormido bem era, por assim dizer, desnecessário, ainda mais com a noite que tivemos. Mas eu consegui lançar um sorriso para ele. Por mais que eu não quisesse admitir, talvez ele fosse meu presente – temporário é verdade – de aniversário, e eu poderia conviver com isso, por enquanto.

Tomamos o café em silêncio. Não precisávamos discutir detalhes do que tínhamos que fazer durante o dia. Era fácil como respirar.

Na hora de sair para a tempestade, ele foi na frente, abriu a porta, me deixou passar. Por algum instinto estranho – ou seria só o costume de nos passarmos por um casal? – eu sempre o esperava trancar a porta para que pudéssemos descer em direção ao carro. Eu do lado dele, ele com a mão direita apoiada na minha lombar, seu braço esbarrando em minha cintura. A imagem do casal feliz que sai para trabalhar todo santo dia.

Então, depois de algumas horas rodando pelos principais cartões postais da chuvosa e gelada Londres, Jethro afirmou que tinha que parar em um determinado lugar.

Vi ele deixar a van – a última do dia, conforme Will havia nos informado - seguir o seu caminho para o galpão que nós já conhecíamos e virar em direção à West End, mais precisamente em Bond Street. Eu ri internamente, o que ele faria ali? Essa rua era muito mais parecida comigo do que com ele, porém preferi ficar calada e observar as vitrines das lojas de luxo.

Suspirei frustrada. Tinha quanto tempo que eu não saia para dar uma voltinha em lugares assim?

Muito tempo e não seria hoje que eu iria, muito provavelmente, estourar o limite do meu cartão...

Estava tão distraída com a vitrine da Tiffany’s que mal percebi o carro parando. Quando dei por mim, Jethro assoprou em meu ouvido dizendo que voltava logo.

Não resisti ao impulso e me dei o luxo de sair e olhar as vitrines dali de perto. Confesso que nem reparei a direção que ele havia tomado, só quis atravessar a rua e olhar mais de perto as joias.

Não sei quanto tempo eu fiquei ali, entre me apaixonar por este ou aquele cordão, ou seria o par de brincos? Só sei que deve ter sido um bom tempo, pois quando voltei os olhos em direção ao nosso carro, Jethro já estava lá dentro, tomando um copo de café.

Foi quando a minha curiosidade tomou conta de mim. O que ele fora fazer naquele bairro, naquela rua?

Voltei para o carro, e, no console central um copo de café me esperava. Quando o agradeci com um beijo no rosto, aproveitei para dar uma olhada no banco traseiro, não havia nada ali.

O mistério continuava.

— Pronta para ir, ou ainda quer comprar aquele cordão e brincos que você namorava com tanto interesse? – Ele me perguntou.

— Pode ir... mas como você? Quer saber, esquece... – Eu me enrolei. Na verdade, meu cérebro processava a informação de como foi que ele passou atrás de mim e eu não notei? Será que fico tão absorta em vitrines que até o Jethro pode passar atrás de mim que eu não vou notar?

Ele pareceu ler os meus pensamentos.

— Mulheres e vitrines... o maior caso de amor do mundo. Confesso que fiquei com ciúmes daquele conjunto... – Ele riu. – Você olhava para as joias com uma cara tão apaixonada que tive medo de você em trocar por elas.

Eu ri, bem alto.

— E vocês homens nunca vão entender o fascínio que nós mulheres temos por uma bela joia... e só te aviso uma coisinha – Disse baixo – cuidado, a troca pode se tornar realidade, hein?

Ele me olhou incrédulo e arrancou o carro. Seja lá o que ele foi fazer naquele lugar, ele não me contaria.

—--------------------

Então era hoje o aniversário dela. Achei que ela mencionaria algo, ou insinuaria a data com alguma dica. Mas nada, Jen não abriu a boca para comentar nada sobre o seu aniversário. E olha que não era uma data qualquer... não é todo dia que se faz 30 anos. E, pelo visto, ela não estava surtando por conta da idade, Jen estava distante, como se este dia não importasse mais.

Veremos se não importa mesmo.

Meu plano inicial era esconder o presente até o último minuto, contudo, tendo em vista a falta de animação de Jen com o próprio aniversário, eu resolvi brincar, se não com ela mesma, com a curiosidade dela.

Então, no meio da tarde, eu a levei junto comigo para buscar o presente dela. A cada metro que percorríamos da cara e exclusiva rua, pude notar o rosto de Jen.

De início ela ficou surpresa por nós estarmos ali. Na verdade, eu consegui ler no rosto dela, ela se perguntava internamente o que eu fazia ali. Depois, com um suspiro de saudade, começou a olhar todas as vitrines. Acho que se ela pudesse, tinha descido do carro, entrado em todas as lojas e só sairia de lá quando estivesse abarrotada de sacolas. E ela ficou tão absorta com a vitrine da Tiffany’s que nem notou que eu tinha parado o carro.

Admito que fiquei com ciúmes da vitrine...

Quando eu disse que tinha que descer ela tomou um susto, porém, em nenhum momento me perguntou onde eu iria. Estranhei, normalmente a curiosidade dela é quem sai vencedora.

Fiquei observando por cima do ombro se ela me seguiria, a única reação que ela teve foi descer do carro e correr para a vitrine da cara joalheria. Quem diria...

A minha encomenda já estava pronta a um tempo, tinha aproveitado os dias em que ela ficou dentro do apartamento para poder pensar no que daria de presente a ela. Tinha que ser algo que fosse do gosto dela e, que mesmo assim, ela saberia quem tinha dado.

E o gosto caro e chique de Jen me trouxe para uma das lojas mais caras da Inglaterra. Não me importei, o presente que ela havia mandado para Kelly não tinha sido muito mais barato mesmo... assim, com o embrulho em mãos, voltei para o carro. Tinha meu discurso pronto caso ela resolvesse despejar o interrogatório em mim, mas quando avistei o carro, ela não estava lá.

Por um momento achei que pudéssemos ter sido seguidos, e que algum dos homens do porto tivesse levado ela ou coisa pior. Levei minha mão à cintura, buscando pela arma, foi quando a massa de pessoas que estavam no passeio do outro lado diminuiu e tive o vislumbre de Jen ainda parada na frente da Tiffany’s. Isso era um bom sinal, pelo menos por enquanto.

Guardei o presente no porta-malas e resolvi ver o que ela tanto olhava naquela vitrine. Cheguei perto, mas ela, absorta como estava nas joias, não me notou, apenas observava, com ar apaixonado, um conjunto de cordão, brincos e pulseira. Comecei a rir, até mesmo uma agente treinada consegue ficar alienada quando se trata de joias.

Resolvi deixa-la por lá mais um pouco, enquanto ia buscar um café. Fui, voltei e Jen só havia mudado de posição para ver outras joias, mas seus olhos sempre voltavam ao mesmo conjunto.

Ela só saiu de seu transe uns dez minutos depois, quando voltou correndo para dentro do carro, e só deve ter demorado pouco porque tinha voltado a chover.

Quando ela viu o café, me agradeceu com um beijo no rosto, e foi ali que eu percebi, ela estava realmente curiosa com a minha presença naquela rua. Notei que ela vasculhou a parte de trás do carro e quando não achou nada, ficou com um ar desapontado.

Eu teria que ter muito cuidado com essa chave até a noite, se eu quisesse manter a surpresa.

Nossa volta ao apartamento foi tranquila, mas não perdi os olhares que ela me lançava de quando em quando, sempre procurando em meu rosto a resposta para a pergunta muda dela: “O que raios você foi fazer naquela rua, Jethro?”

Tive que manter a cara séria, mal sabia ela o que era.

No apartamento, ela chegou, e se jogou no sofá, dessa vez nosso dia tinha realmente terminado e ela não tinha nada o que reportar para D.C. e, pelo visto, não queria saber de verificar nenhum e-mail.

Esperei que ela ficasse confortável, o que claro pode ser traduzido como se escorar totalmente em mim, me usar de travesseiro e ficar brincando com cabelo da minha nuca, para falar, como se não fosse importante:

— Vamos jantar fora hoje.

— O que? – Ela se levantou tão rápido que ficou tonta.

— Você me ouviu, temos uma reserva, às oito em ponto. – Respondi e continuei a trocar os canais da TV.

— Jethro! Você não pode simplesmente jogar uma bomba dessas e fingir que está tudo bem? Por que não me falou mais cedo? – Ela pediu, e estranhamente não me xingou como eu previra.

— Estou falando agora.

— Mas, mesmo assim, está em cima da hora... – Ela protestou tentando se levantar.

— Você ainda tem quatro horas para se arrumar, Jen. Não precisa ter pressa. – Eu a puxei para o lugar de antes. – Pode ficar quieta por aí que quando for a hora eu te chamo.

Ela estreitou os olhos na minha direção.

— Hora? A sua hora de se arrumar ou a minha?

— E tem diferença? – Perguntei só para irritá-la.

— Você sabe que tem! E pare de brincar com a minha cara! – Recebi um tapa do ombro.

— Eu não estou brincando! – Me defendi.

Ela prendeu meu rosto em suas mãos e o virou – com uma força desnecessária – em sua direção.

— Sim, você está. Posso ver em seus olhos, esse brilho travesso não me engana mais, Jethro!

Aproveitei a posição e a beijei... achei justo começar a comemorar o aniversário dela um pouco mais cedo.

E cedo demais ela parou.

— Você sabe muito bem o que beijos como este levam... e, se deixarmos, perdemos a reserva... sinto muito. A sobremesa fica para depois do jantar. – Ela disse séria.

— Podemos ter um aperitivo.

— Jethrooo, não. – E ela saiu correndo para o quarto.

— Volta aqui, Jen... são quatro horas...

— Conte três, porque até chegarmos lá.

— Mas mesmo assim!

— Eu demoro muito para me arrumar. E você sabe disso! Sabe tão bem que vive reclamando!

— Jenny!

— Foi ideia sua, Marine! Aguente as consequências. – Ouvi a risada dela de dentro do quarto.

Eu tinha duas opções, ou ia no carro e trazia o presente para dentro do apartamento sem que ela visse, ou colocava aquela porta abaixo e invadia aquele quarto, ela não precisava de três horas para se arrumar.

Decidi pela segunda, afinal, enquanto ela demora a eternidade para ficar pronta, eu poderia sair e voltar com o presente dela sem que ela notasse.

—--------------------------

Eu bem que tentei ficar um pouco sozinha, mas ele parecia não entender que não é não. Por que ele tinha que invadir o quarto e ser tão persuasivo?

Persuasivo ao ponto de praticamente me fazer jogar metade do meu guarda-roupas abaixo enquanto ele me beijava.

Tudo bem, eu tenho que admitir, quatro horas eram exagero. Duas estão de bom tamanho. Bem, uma meia se eu não der um jeito de sair dessa cama.

— Ainda vai demorar muito! – Gritei em direção ao banheiro.

— Eu te ofereci para vir comigo! – Ele me respondeu.

— E era aí que não sairíamos hoje mesmo. – Retruquei.

E menos de trinta segundos depois ele saiu de lá. Eu tenho que admitir, quando ele quer, ele fica ainda mais irresistível.

— Nossa... isso tudo é para o jantar de hoje? – Perguntei assombrada. Por que ele tinha que combinar a roupa com a cor dos olhos?? Para me deixar ainda mais desnorteada?

— Algum problema? – Ele pareceu confuso com a minha pergunta, e eu achei até fofo.

— Nenhum... é que você está, digamos, extremamente irresistível com essa roupa Jethro... – Eu me aproximei dele mordendo o lábio inferior. – E se eu for seguir a vozinha na minha cabeça, eu não vou te deixar sair assim. – Falei enquanto alisava a lapela do paletó.

Ele deu uma risada, que, por mais inusitado que possa parecer, era nervosa. Ele tinha ficado com vergonha do meu elogio!!

— Eu falei algo demais? – Perguntei ainda alisando o paletó dele. Alegre demais que, pela primeira vez eu o tinha deixado se graça.

— Não. – A resposta veio rápida demais e ele não olhou para mim. Ao contrário, desviou os olhos e suas orelhas ficaram com as pontas vermelhas.

— Você está sem graça por conta do elogio! – Eu acusei, sorrindo abertamente.

— De onde você tirou isso? – Ele me encarou, mas eu via, eu tinha certeza, ele estava sem graça!

— Você não está acostumado a ser elogiado, está? – Eu perguntei, segurando o braço dele para mantê-lo ali, na minha frente.

— Estou.

— Só da Kelly. Você só recebe elogios da Kelly. E por isso ficou vermelho quando eu disse que você está irresistível! – Meu sorriso era ainda maior para o desespero dele.

E as orelhas ficaram mais vermelhas ainda! E ele tentou sair do meu aperto.

Ele já tinha feito graça quando eu fiquei envergonhada. Era a minha vez de dar o troco. Então o soltei e dei uma volta em torno dele, apreciando o terno azul escuro e a camisa combinando.

Ele fingiu não notar o que eu estava fazendo, mas vi o engolir em seco umas duas vezes, e ajeitar a postura, claramente desconfortável com a atenção que eu estava dando a ele como um todo.

— Definitivamente, irresistível... e muito bonito, ainda mais com esses olhos... – sussurrei no ouvido dele. – E como não está acostumado a ouvir elogios, fica sem graça. Mas eu acho que não vou dividir essa visão com ninguém essa noite. – Dei uma mordida no lóbulo da orelha dele.

— Jen. – A voz dele estava entre rouca e sem graça.

— Tudo bem, senhor bonitão. Vou te deixar aqui... mas não tente fugir, eu te acho! – Pisquei pra ele e entrei no banheiro sorrindo. Quem diria que Leroy Jethro Gibbs fosse ficar sem graça com um elogio.

Quando saí do banheiro, ele não estava no quarto. Acho que exagerei na brincadeira. Aproveitei os minutos de paz, já que os olhos dele estavam me deixando tonta de tão lindos hoje, e fui terminar a maquiagem. Estava praticamente pronta, quando ele entrou no quarto, carregando um enorme embrulho nos braços e um sorriso aberto nos lábios.

Levantei a sobrancelha em curiosidade. Não me lembrava de nenhum pacote no apartamento.

— Não vai perguntar o que é? – Ele brincou comigo.

Logicamente eu estava curiosa, mas não queria dar o braço a torcer e dizer que eu era curiosa. Então só o encarei.

— Vamos lá, Jen. Eu sei que você está curiosa sobre este embrulho desde hoje à tarde. – Ele parou atrás de mim e me encarava pelo espelho. Tudo isso para poder ver a minha reação.

— Então foi isso que você foi buscar em Bond Street?

— Foi. – Ele sorria.

Lancei mais uma olhada para a caixa. Era bem grande. Poderia ter qualquer coisa ali dentro.

— Realmente não vai pergunta? – A respiração dele era quente na pele do meu pescoço e eu estava começando a achar que ele estava pagando com juros e correção a brincadeira de mais cedo.

— Não. – Falei firme.

— Mentirosa. – Ele sussurrou.

— Que droga, Jethro! – Me virei para ele. – Posso terminar de me arrumar?

Então, ele me olhou de cima embaixo. Do mesmo jeito que eu tinha feito.

— Espero que esteja gostando do que está vendo! – Falei, não me deixando intimidar com os olhos escuros dele.

— Estou. Muito... agora sou eu que acho que não vamos sair desse apartamento...

— Me avise se mudar de ideia, porque assim não termino nem a maquiagem. – Dei de ombros e me virei para o espelho.

Ele não desistiu e se sentou na cama. Alisando a caixa como se fosse um gatinho. E cada vez que ele fazia isso, sorria na minha direção. Jethro estava definitivamente testando os meus limites.

O problema é que ele ganhou. Pois, além de curiosa com o que havia na caixa, eu não estava resistindo a ele ali, daquele jeito. O melhor era acabar com a tentação.

— Tudo bem, você venceu! O que tem nessa caixa? – Eu me virei para ele colocando as mãos na cintura.

— Já está pronta?

— Não faça isso comigo! – Eu pedi. Ele me tentou igual ao capeta enquanto estava me maquiando para depois trocar de assunto?

— Eu preciso saber se você já está pronta. – Ele me garantiu.

— Sim. Eu estou. Prontinha. – Falei mal-humorada.

Ele levantou uma sobrancelha e deu aquele sorriso de lado tão característico dele. O que me fez segurar a respiração e quase avançar na boca dele, mas me mantive parada.

Depois de me olhar e aprovar minha escolha de roupa. Ele se levantou e, muito lentamente caminhou na minha direção, parando na minha frente e olhando no fundo dos meus olhos.

— Feliz aniversário, Jen. – E me estendeu a caixa.

Eu fui pega totalmente desprevenida. Não esperava ganhar nenhum parabéns, muito menos um presente. E ali estava ele, além de saber a data do meu aniversário, ele teve a delicadeza de me dar um presente E fazer uma surpresa para mim.

Tinha tanto tempo que isso não acontecia que eu estava realmente sem palavras. E ele interpretou mal o meu silêncio.

— Jen? – Ele me chamou em dúvida quanto à minha falta de reação.

— Obrigada! – Eu disse e não consegui conter o sorriso que eu abri. – Muito obrigada! – Eu o beijei.

— Mas você nem abriu o presente!

— Não me importo com o que você me deu. Eu agradeço o gesto, e a lembrança! Como você sabia que era hoje? - Eu me enrolei com as palavras.

Ele ficou mais aliviado.

— Vamos dizer que eu sabia, Jen Eu só sabia. – E ele me beijou de novo. - Agora faça o favor de abrir o presente ou nós dois não vamos sair nem desse quarto!

Confesso que estava curiosa, por mim ele tinha ido até Bond Street. Eu só podia imaginar o quão caro foi aquele presente. Peguei a caixa das mãos dele e me sentei na beirada da cama. Ele me acompanhou, sentando do meu lado e observando cada uma das minhas reações. Abri com cuidado a caixa só para me deparar com o mais lindo – e caro – casaco da Dior que já tinha visto. Jethro não tinha poupado em nada para me dar esse presente. Estendi o presente na minha frente e admirei a peça. Era maravilhoso!

— Jethro, você realmente não precisava. – Tentei agradecer.

— Não comece com isso. – Ele me alertou tirando o casaco das minhas mãos e o segurando para que o vestisse.

— Mas é sério!

Ele me olhou torto.

— Mas eu amei. – Dei um sorriso para ele. – É divino e toda as vezes que eu o usar eu vou me lembrar de você!

— Você merece. – Ele falou depois que eu experimentei o presente. Tinha ficado perfeito. – Agora vamos ou chegaremos atrasados.

Dei uma última olhada para o espelho admirando o presente inesperado e, por que não, nós dois juntos. A vontade que eu tinha de tirar uma foto nossa, naquele momento era enorme.

— Que foi? – Jethro me perguntou quando eu não saí do lugar, suas mãos em minha cintura.

— Eu só estava guardando essa imagem de nós dois na memória, já que uma foto assim, é fora de cogitação. – Eu respondi sincera.

— Eu ia estragar a foto. – Ele brincou beijando a minha orelha.

— Ia nada. É você o mais bonito aqui. – Disse, só para vê-lo ficar sem graça.

— Vamos logo, Jen. – Ele me puxou pela mão e para fora do apartamento. – Temos que comemorar o seu aniversário.

E, depois de muito tempo eu estava sendo realmente feliz neste dia. E tudo por causa dele. E, por isso, eu me permiti ter esperança, esperança de que podíamos, sim, dar certo no final das contas.