— Esse eu vou creditar como milagre! – Foi o que Dr. Taft disse quando as linhas dos aparelhos começaram a se mexer e os bipes indicativos de que um coração batia encheram o ambiente.

— Com certeza. Mas será que não há nenhum dano? – A anestesista perguntou.

— Doutora Gibbs. É você a neurologista aqui. – Taft deu espaço para que Kelly pudesse fazer os exames preliminares.

— Inicialmente não vejo nada. Mas temos que examinar com mais cuidado, uma lesão cerebral não é assim tão fácil de ser identificada. – Kelly disse.

— Vai ter que esperar eu terminar, Doutora. – Taft falou. – Não vou demorar muito. O pior já passou. Não falei que essa aqui era guerreira?

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Com o fim da cirurgia, Jenny, após se recuperar da anestesia, foi levada para um quarto, onde aguardaria para ser levada para exames mais detalhados, no outro dia.

Segui Doutor Taft para a sala de espera, nós tínhamos notícias para dar, algumas boas, outras nem tanto. E, para ser bem sincera, eu estava receosa, afinal, como eu explicaria toda a situação para meu pai? Jen estava viva, essa era a boa notícia. Já a má notícia, não saberia dizer como papai poderia reagir, pois o estado de coma de Jen não tinha prazo para terminar.

E foi eu pisar na sala de espera, que quatro pessoas se levantaram e vieram na minha direção. Respirei fundo. Era a hora da verdade.

Papai não teve tempo de formular uma pergunta, pois Taft foi logo tomando a frente e dando as notícias.

— Ela está viva. – Ele começou. – Passou um susto na cirurgia, mas está viva. Da minha parte, ela se recuperará bem. Conseguimos conter a hemorragia e operá-la sem maiores complicações. Agora temos que aguardar que seu corpo se recupere por ele mesmo.

— Isso tem um prazo? – Ziva pediu.

— Dos tiros no ombro e nos braços, poucos dias. Agora o tiro no abdômen será mais delicado, até porque não é o primeiro que ela leva naquele local.

— O senhor disse, da sua parte, tem algo mais? – Tony disse.

— Essa não é a minha área, por isso a Doutora está aqui. Gibbs, é com você. Qualquer coisa que precisarem estarei de plantão nas próximas sessenta e quatro horas, não hesitem em chamar.

Todos agradeceram e mal o excêntrico médico tinha virado as costas, os quatro pares de olhos me encararam.

— Kells...

— Pai, não tem forma mais delicada de dizer isso, então vai ter que ser de uma só vez. Jen está viva, mas está em coma. Ela teve uma parada cardíaca na mesa de cirurgia e demorou muito para voltar, e somando às outras duas que ela já tinha tido ainda no restaurante, seu cérebro ficou muito tempo sem oxigenação. Esse coma é induzido, até segunda ordem. Preciso que ela se recupere bem, para depois poder precisar se ela terá alguma lesão ou não.

— Você tem um prazo para isso?

— Não, Tony. Não tenho. Queria ter, hoje mais do que nunca, mas não tenho. Não sei quando ou se ela vai acordar. Foi muito tempo...

Se ela vai acordar? - E aí estava a reação de papai. A reação que temia.

— Sim, papai. Se. Não há certeza na Medicina. O corpo humano não é um motor de carro, onde se uma peça quebra é só trocar. Aqui, cada organismo reage de um jeito ao mesmo tratamento. – Tentei ser o mais didática e resumida possível, contudo eu conhecia aquele olhar. – Pai... eu, mais do que qualquer um aqui, queria poder precisar o prazo certo, te dizer com exatidão quando Jenny vai acordar e como ela vai estar, mas não posso. Tudo o que eu posso fazer é estender o meu plantão e ficar de olho nela nessas primeiras vinte e quatro horas.

- E depois? – Ziva me perguntou.

— Quanto mais tempo se passa em casos assim, menores são as chances. – Fui sincera e vi em primeira mão as reações que minhas palavras causaram. Porém, a pior reação foi a de meu pai que saiu da sala batendo a porta. Eu respirei fundo, conhecia aquela atitude muito bem.

— Se ele soubesse o que eu estou passando, ele não pensaria só em uma recuperação rápida...

— Não entendi. – Tony falou.

E Mike Franks pediu desculpas com um menear de cabeça e saiu atrás de meu pai.

— Eu tinha exatos oito anos quando minha mãe morreu, Tony. Nos trouxeram para este mesmo hospital. Nós duas entramos aqui, só eu saí. Sophie tem oito anos...

— Isso não vai se repetir. – Ziva garantiu, mas pareceu mais uma prece, uma oração.

— Como eu já disse, gostaria de ter certeza. Mas não tenho. Gostaria de trazer Sophie aqui e colocá-la perto de Jen para que a falação de minha irmã pudesse ativar algumas partes do cérebro da mãe, contudo, depois da experiência fracassa há dois anos, não quero nem sugerir a ideia.

— Seu pai nos mandou voltar para Washington.

— Alguém tem que controlar a minha irmãzinha, Tony. – Permiti-me um minuto de descanso e me sentei em uma das cadeiras.

— Não, Kelly, alguém tem que contar a verdade para ela, mas como fazer isso?

— Eu não sei, Ziva. Juro para você. Não faço a menor ideia! A única coisa que se passa na minha mente agora foi como eu me senti quando recebi a notícia de que a minha mãe não iria voltar. E, do fundo do meu coração, eu não quero que a Moranguinho passe por isso.

Ziva se sentou ao meu lado e ficou perdida em pensamentos. Tony começou a andar de um lado para outro.

— Tony... – Eu o chamei.

E ele não me respondeu e nem parou de andar, aliás, seus passos ficaram ainda mais rápidos.

— DiNozzo!! – Praticamente gritei.

— Que foi? – Ele parou e nos encarou.

— O que houve? Você não está sendo você.

— Eu... eu não gosto de hospitais. – Ele admitiu relutante. – Me trazem péssimas lembranças.

Tanto eu quanto Ziva o olhamos, ele tinha que ter uma explicação melhor.

— Minha mãe.

Engoli em seco.

— Você também?!

Ele deu de ombros.

— Kelly, faça o seu melhor para deixar Jenny viva. Se não for por você, que seja pelo seu pai, mas, principalmente, por Sophie. Ela não pode receber uma notícia dessas.

— Quantos anos você tinha, Tony? – Ziva perguntou.

— Oito.

Eu sabia que meus olhos estavam arregalados enquanto eu fitava o Agente Sênior.

— Temos mais em comum do que você pensava, hein Kelly? – Ele deu um sorriso de lado, ao perceber a minha expressão.

Desviei meu olhar. Definitivamente Sophie não merecia entrar para o clube.

— Vou dar uma checada em Jenny. Depois vocês podem entrar para visitá-la. Será bom para ela. – Falei. – E se virem o meu pai, ele já está na lista de acompanhantes, avisem isso para ele, por favor. – Me levantei e fui para o quarto onde a Diretora do NCIS, guardada por seguranças, estava.

Antes de abrir a porta, respirei fundo e tentei por em minha cabeça que ali era uma paciente qualquer, que ela não tinha nada de especial, só que foi inútil, bastou que eu visse Jenny deitada, pálida no centro da cama de hospital para que meus olhos ardessem e eu tivesse que engolir o bolo que se formou na minha garganta.

Caminhei até a cama, dei uma conferida na prancheta, depois passei a examinar seus reflexos e, principalmente a dilatação da pupila. Aparentemente não havia lesão cerebral grave, mas só uma ressonância e exames completos me dariam a plena certeza.

Antes de sair, olhei em volta e conferi o relógio, ainda tinha algo como uns dez minutos para ficar ali sem que nenhuma enfermeira entrasse, assim, me sentei na beirada da cama e falei.

— Sabe, Jen. É verdade que ouvir a voz de alguém conhecido pode ajudar em casos de pessoas em coma, se não os trazem de volta, pelo menos ativa-se memórias ou até mesmo pode acalmar o sistema nervoso. É isso que eu espero que esteja acontecendo com você nesse momento, pois eu preciso te contar uma coisa: Você não pode morrer. Não pode. Ainda vai viver muito, tem que viver. Você não pode me deixar aqui, eu não posso perder a minha segunda mãe! Jen... por favor, resista, lute, lute como você lutou quando a Sophie nasceu, lute como eu sei que você lutou na Sérvia... como eu sei disso? Está na sua ficha médica, depois de nove anos eu descobri a verdade, mas agradeço terem me poupado naquela época, eu teria enlouquecido... eu quero que você lute pelo meu pai... ele já te perdeu uma vez, Jen, não vai suportar te perder de novo... eu sei que ele não vai... Mas, principalmente, eu quero que você lute por Sophie... que você trouxe ao mundo no meio do caos, lute pela garotinha que você não desistiu de ter, lute pela Ruivinha que foi a sua centelha de vontade em ficar viva quando você foi sequestrada no Cairo, lute pela minha irmã que não merece passar pelo que eu passei... eu tive a chance de ter uma segunda mãe... duvido que ela terá uma se você se for... lute pela sua filha que está te esperando voltar para casa, para te dar um abraço de urso e um beijo na bochecha, que está te esperando para poder te contar todas as novidades que você perdeu... por favor, não desista da sua filha, do amor da sua vida, da sua carreira, não desista de mim, Mãe... por favor, reaja, lute e volte para esse mundo! – Pedi a ela. E, durante essa torrente de palavras eu busquei por qualquer reação interna, que só os aparelhos que estavam ligados nela poderiam me dizer.

E eu tive duas respostas...

Uma acelerada no batimento cardíaco e uma leve alteração nas ondas cerebrais. Era o que eu queria.

Ela estava lutando.

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— Ducky....

— Diga Abigail.

— Ela vai ficar bem, não vai?

Ele, que estava verificando a Jibblet pela terceira vez, me olhou.

— A quem você se refere, Abigail? A nossa Sophie aqui, ou à Jennifer?

Dei de ombros.

— Às duas.

— Sophie está bem... apesar do sono agitado, mesmo com o calmante que tive que ministrar, ela vai dormir a noite toda. Quanto à Jennifer... eu não posso te dizer nada com certeza. Nossa Diretora já passou por muita coisa e sobreviveu Abigail. Ela é forte e é uma lutadora. Se apegue a isso e, como estamos muito longe para ajudarmos presencialmente, tenha sempre em pensamento que ela vai voltar.

Abracei Ducky com força. Sophie tinha parado de chorar quando demos o calmante a ela, mas eu ainda não tinha conseguido.

— Eu estou tentando pensar nisso, Ducky. Você me conhece, sou uma eterna otimista e acredito em coisas boas. Mas eu não consigo parar de pensar em como vai ser se o pior acontecer... eu fico tentando imaginar como vamos viver sem a nossa “mãe”, como vai ser o NCIS sem ela, como Kelly ficará sem a mulher que ela só não chama de mãe porque não quer, como Gibbs vai reagir a tudo isso e, principalmente, na Jibblet... que é tão apegada à mãe, tão protetora com ela que eu...

— Abigail... não pense nisso. Pense em situações alegres, traga à sua memória as lembranças boas e, tente pensar em uma situação futura na qual Jennifer estará conosco.

— Mas qual?

— Eu sei que você tem imaginação para trazer uma que não seria de todo impossível.

Abri um sorriso.

— O que você me diz de tentarmos imaginar a formatura da Sophie no FLET-C?

— Uma ótima ideia, minha querida... como serão as reações de todos?

— Bem... eu vou começar pela mais fácil.

— Que é?

— A minha!

E eu passei a discorrer sobre o que eu achava que seria esse momento nas nossas vidas, na vida de Sophie. Eu consegui imaginar Gibbs e Jenny de mãos dadas, vendo, orgulhosos, a filha se tornar uma de nós... foi a melhor coisa que pude fazer, pois assim, as horas passaram e, pelo menos, uma notícia chegou da Califórnia.

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Kelly havia desaparecido para o quarto onde Jenny estava, Gibbs e Franks também haviam sumido desde que ficaram sabendo da possibilidade de que a Diretora não voltasse, na sala de espera só restou a mim, pois Tony tinha saído para o hotel para arrumar as nossas coisas. Entre as opções de ficar no hospital e não ter notícia nenhuma, e voltar para o hotel sem avisar para ninguém, eu preferi a primeira. Alguém tinha que mandar alguma informação para D.C., mesmo que lá fosse quase madrugada agora.

Peguei meu celular e encarei a tela, mandaria mensagem ou ligaria? Mensagem era melhor, porque se tivesse alguém dormindo, e por alguém entenda-se Sophie, ela não acordaria. A minha outra pergunta e mais importante era: avisar sobre o que? A possibilidade de Jenny nunca voltar para casa? Que a cirurgia foi bem sucedida? Que, de alguma forma conseguimos chegar a tempo de tirá-la com vida de dentro daquele restaurante, mas que ela não estava tão bem assim?

Sacudi a cabeça, não seriam notícias que eu, como alguém ansiosa por novidades, iria querer receber. Assim acabei por guardar o celular no bolso e apoiei a cabeça na parede.

Contando os passos para cima e para baixo das pessoas que trabalhavam no hospital, eu tentei entender o que aconteceu no meio daquele deserto.

Um caso antigo que Jenny deixou em aberto. Deve ter sido um bem no início da carreira dela, pois quando eu a conheci, ela não tinha medo de executar nenhuma ordem que requeria a eliminação de alvos.

Assim, quando esse alvo reaparece, ela busca ajuda em Mike Franks para acabar com a única ponta solta do passado dela...

Enquanto eu sabia que Tony, Franks, McGee, Abby e até mesmo Gibbs estavam julgando o ato dela, achando que ela foi, no mínimo, otimista demais, eu era a única que tinha a certeza de que faria o mesmo.

Sim, eu, Ziva David, também faria isso, chamaria um contato de confiança, e iria para o tudo ou nada, se a segurança da minha família dependesse disso, como foi o caso com Jenny. Só tinha um único problema, entre os mortos do restaurante, não havia nenhuma mulher, o que significava que Jenny quase tinha morrido em vão e que tanto Gibbs quanto Sophie ainda estavam em perigo.

E, mais uma vez uma ordem de Gibbs fez sentido. Ele sabia disso, desde o exato momento em que entrou no Restaurante. Nos mandar de volta para D.C., garantia que Sophie ficaria segura, pois ela não precisava, necessariamente, ficar dentro da casa da família e, qualquer coisa, ela teria três agentes de confiança como seguranças.

— Definitivamente você não dá pontos sem nós, Gibbs. – Murmurei.

Só que eu não sabia que não estava mais sozinha na sala e me surpreendi ao ver Kelly parada na porta, com as mãos nos bolsos do jaleco.

— O que meu pai fez agora?

— Mandou que eu e Tony voltássemos para Washington.

— Sophie....

— Sim, creio que ela tem dado trabalho para Abby e Tim.

— E vai continuar dando até que os pais voltem para casa. – Kelly confirmou as minhas suspeitas.

— Sim... e ela terá que ser paciente agora. E Jenny, como está?

— Lutando.

Encarei a médica.

— De verdade, Ziva, é pouco para quem está de fora, mas quando se estuda como o cérebro trabalha, as poucas reações que tive agora são excelentes. À propósito, você quer ir vê-la?

Lembrei da cena que vi no restaurante, no que havia presenciado do lado de fora.

— Melhor não. – Falei. – Sei que Jenny vai me entender quando acordar.

— Então, vocês já estão voltando para D.C.?

— Sim, mas antes vou passar essa informação que você me deu para Abby. Ela, Ducky e Tim, merecem saber.

— Faz bem... e Ziva. Eu posso te pedir um favor?

— Claro, se estiver ao meu alcance.

— Só queria te pedir que tentasse manter a Sophie na rotina dela... ela vai precisar de um pouco de normalidade nesse caos todo.

— Eu vou fazer isso, nem que eu precise carregá-la nos ombros para as aulas. – Garanti. – Mais alguma coisa?

— Fale a verdade para a minha irmã... ela merece saber, isso vai praticamente deixá-la desesperada, mas antes ela conviver com a verdade da situação agora, do que...

— Entendo. Contar que o cachorro sumiu no telhado...

— É o gato subiu no telhado, Ziva, mas essa é a ideia.

Meu celular tocou, era Tony dizendo que estava de volta.

— Preciso ir, Kelly. Avise seu pai para nós. E você, não se esqueça da regra 10.

— Acho que ela não se aplica mais aqui....

— Tente aplicá-la... ou você também pode acabar sofrendo demais, você já está fazendo tudo o que pode, está fazendo o seu melhor... não se esqueça disso. – Falei e Kelly meneou a cabeça, e eu vi a incerteza que ela estava. Envolvida demais para largar o caso de Jenny, e sabendo que não tinha mais nada que ela pudesse fazer por agora.

Saí da sala de espera digitando uma mensagem que enviei tanto para Abby quanto para McGee.

Jenny está estável, ainda em coma, mas Kelly me garantiu que houve uma pequena melhora no quadro, uma melhora que pareceu animá-la.

Eu sabia que, por enquanto, isso acalmaria o restante da equipe, até que chegássemos lá.

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Vi Tony e Ziva irem embora, a Israelense parecia que passava uma informação para alguém, e tinha uma expressão serena no rosto. Com os dois fora do hospital e indo em direção à minha filha mais nova, voltei para a sala de espera, só para encontrar Kelly me esperando.

— Acho que Ziva não te deu o recado que pedi. – Ela começou.

— Não, não encontrei com ela.

— O senhor é o único que pode ser o acompanhante de Jen. Parece que só há dois números de emergência na ficha médica dela, o senhor e Ducky.

Assenti.

— O quarto é o último da esquerda. Tem um agente na porta. – Me informou. – Me ligue se algo acontecer, preciso voltar para casa e dormir um pouco, ou pelo menos tentar descansar. Volto ao anoitecer. – Ela me abraçou forte. – A Jen vai sair dessa, papai, eu sei que vai, ela é forte e é uma lutadora.

Kelly não fazia ideia do que Jen já havia vencido.

Segui as coordenadas que minha filha mais velha tinha me passado, e antes de abrir a porta tentei por na minha cabeça que, seja qual for a situação que Jenny se encontrava agora, era mil vezes melhor do que aquela que eu havia visto pela manhã.

Dei o passo para dentro do quarto só para perceber que estava enganado. A cena do restaurante e esta que agora estava na minha frente eram ruins na mesma proporção.

E eu me senti um inútil, ela tinha me colocado como contato de emergência, contudo, ali dentro daquele quarto, ao lado dela, não havia nada que eu pudesse fazer, nada.

Busquei por algum pedaço de Jen onde não havia tubos ou aparelhos ligados, só a sua mão direita estava quase livre, a segurei e puxando uma cadeira que estava ali perto, me sentei ao lado da cama e encarei a ruiva na minha frente.

Eu não precisava me esforçar muito para saber o que tudo isso me lembrava.

Era quase a mesma imagem de Londres, logo depois que ela recebeu aquele tiro na perna.

— Um dia você vai me explicar o motivo de você ter praticamente entrado em uma missão suicida, Jen?

Eu sabia que, por enquanto, ela não me responderia, mas continuei falando.

— Por que não me ligou? Não começamos isso juntos? Ela não ameaçou a nossa filha? Jen, por que você fez isso?

O monitor que marcava os batimentos cardíacos dela aumentou a frequência, nada que preocupasse, porém, foi a esperança que me disse que talvez ela realmente estivesse me escutando.

— Você me prometeu, Jen, que não faria nada estúpido... e agora você está aqui... eu só quero saber se, em algum momento, você pensou em Sophie?

Mais uma vez a frequência do monitor aumentou.

— Foi por Sophie? Então, me explique... naquele restaurante não tinha nenhum corpo de mulher, Jen. Svetlana não estava lá... e você sabe onde ela pode estar agora, não sabe?

A marcação na tela me dizia que o coração de Jen estava batendo a quase 120 por minuto, mas eu não desisti, eu precisava de uma última tentativa.

— Sophie só vai ficar bem quando você voltar para ela, quando nós dois voltarmos... então, trate de lutar, Jen, lute com todas as suas forças, sua Miniatura depende de você...

Com certeza o aumento da frequência cardíaca de Jen deve ter soado algum alarme na estação das enfermeiras, pois logo duas entraram no quarto e começaram a examinar os resultados que eram impressos pelos aparelhos. E quando elas viram os resultados do momento, e que o batimento cardíaco estava estabilizado, me lançaram um olhar raivoso e saíram do quarto murmurando que aquelas reações não eram normais.

Esperei que as duas estivessem longe do quarto e novamente me sentei ao lado de Jen e peguei a sua mão. E esse simples gesto fez seu coração começar a bater acelerado.

- Você não tinha que aguentar tudo isso sozinha, Jen. – Murmurei. – Não deveria. O seu demônio reapareceu, eu sabia disso, mas por que você não me contou que a viu? Por que envolver Abby, Mike?

E ela continuava seu sono induzido. Me perguntei se essa sensação de impotência foi o que ela sentiu quando os papéis eram trocados.

— Agora eu estou aqui do seu lado, impotente. Não posso nem pensar em te deixar aqui, sozinha, Jen. Mas me preocupo com a Ruiva e com tudo o que ela está passando de novo.

Me recostei na cadeira e tentei me lembrar se eu já tinha ouvido sobre uma criança que tivesse sofrido tanto com apenas oito anos. Claro, Sophie teve suas quotas de travessura, de bagunça, de castigos que ela mereceu, mas isso? Ela ficou meses sem ver a mãe quando tinha três anos, só foi me conhecer aos cinco, Kelly ia e vinha sempre que podia, mas nunca foi uma presença constante até que as duas ficaram no mesmo país. Isso, sem contar nos meses que seguiram ao meu coma...

— Ah... Ruiva... será que se eu te trouxer até aqui, a teimosa da sua mãe acorda?

Fiquei em silêncio, só o monitor cardíaco fazendo barulho no quarto quase escuro. Horas se passaram e eu logo recebi uma mensagem de DiNozzo. Ele e Ziva tinha chegado em D.C. e logo iriam ver Sophie.

Eu começava a duvidar que ela ouviria algo que um dos dois tinha a dizer.