Usagi olhou de novo para o banco onde Seiya estava sentado. Mais gente havia chegado naquela quinta-feira e, apesar de estar longe da lotação máxima, o bar trabalhava em ritmo de final de semana. Por essa razão, ela decidiu adiar a continuação de sua conversa com o ex-namorado e começar a trabalhar. Não, a razão era simplesmente precisar respirar antes de dizer qualquer coisa. A felicidade que lhe tomara ao saber que os dois poderiam voltar havia sido interrompida pela chegada de um fantasma de seu passado, Mamoru Chiba. Era como uma lembrança de que sua vida não fora muito para frente desde a última vez que se viram. Devido a isso, por mais que quisesse abraçar Seiya e dizer que era louco em achar que ela não o aceitaria de volta, pediu um tempo para pensar, escusando-se por estar ocupada. Seiya, ao mesmo tempo em que aceitou, não fez qualquer movimento para lhe dar o espaço que acabara de ser pedido, remanescendo ali, com o copo de suco de laranja intocado à sua frente.

Umas das mulheres na mesa mais barulhenta se pôs de pé e escolheu alguma música no karaokê. Por cima de sua voz, Usagi percebeu que estava sendo chamada por Seiya.

— Já está indo? — perguntou, ansiosa por fechar aquela conta.

— Não, só queria algum drinque legal. Que tal um rum com coca?

— Não é melhor só uma cerveja? — disse, suspirando. — E você nem terminou esse suco. — Fez menção de recolher o copo, mas o outro estendeu a mão como um escudo.

— Eu não sou fraco com álcool que nem esses japoneses. — Jogou a cabeça para trás, um japonês não mais engravatado e com o rosto bem vermelho fazia dancinhas enquanto tentava acompanhar a música cantada pela colega de empresa. — Posso ter um pouco desse sangue, mas acho que já diluiu tanto que agora só me restou o nome.

Usagi assentiu. Quando foram apresentados, ela achara que Seiya era só um nome americano parecido com sua versão japonesa e espantara-se quando o estrangeiro lhe disse que até o escrevia em kanji. "Estrela e campo", disse fingindo escrever na palma da mão da moça, roçando de leve a ponta de seu dedo quente a cada traço.

— Bem, já vou trazer, — resignou-se, virando-se para preparar a mistura, sem poder ignorar o complemento em voz alta, que lhe dizia para caprichar na dose.

Estava também altamente consciente de como Motoki se entretinha conversando com o amigo no outro canto. Queria muito olhar para lá, saber se Mamoru estaria curioso com o estrangeiro com quem Usagi conversava. Permanecia indecisa se devia ir até lá e falar com ele. Fosse qualquer outra pessoa a quem não visse por anos, já o teria feito desde o início, correndo animada como um cachorro que fazia festa para o dono. Mas era justamente Mamoru...

Suspirando, entregou o drinque para Seiya e foi atender um casal recém-chegado que se sentara no balcão. Toalha quente e porta-copo, ainda se repetia mentalmente, enquanto dava as boas-vindas com o cardápio e atendia o pedido.

— Pode recolher os copos daquela mesa de novo? Um deles não para de passar a mão na minha bunda — reclamou Rei, assumindo o casal recém-chegado.

— Mas é você quem os está servindo, né?

— Gorjeta nenhuma vale isto.

— E na minha bunda tudo bem porem a mão?

— Não se preocupe com isso. — Rei sorriu.

Usagi pegou a bandeja, xingando-a mentalmente. Caminhou recolhendo tudo o que não estivesse mais em uso e só parou pois alguns deles queriam mais pedidos. Antes de sair, um dos homens perguntou pela outra mulher, e Usagi, aborrecida, teve que se conter para dar a resposta apropriada. De volta para trás do balcão, não podia acreditar que além de terem ficado longe de suas partes traseiras, ainda tiveram a cara de pau de perguntar por Rei. Era para estar aliviada de não ter seu espaço pessoal violado, mas ainda se sentia violada. Encheu os copos com os pedidos de bebida e levou-os até lá, voltando correndo para a cozinha a fim de preparar as onion rings. Voltou mais uma vez à mesa, serviu-os, recolheu os novos copos vazios e foi ao balcão. Ainda intocada.

Ao menos, pôde aproveitar o momento de calma para observar Mamoru de trás, com medo de a qualquer momento ele sentir seu olhar e fazer piadinha. Ele parecia mais alto, se era possível. E encorpado, mas isso podia ser a roupa que estava usando, talvez até tivesse ombreiras. Mas quem usava ombreiras neste século? Bebia lentamente um coquetel e respondia a Motoki o que este conseguia lhe perguntar entre limpar o balcão e a pia. Poderia ir lá e reclamar que o chefe não estava trabalhando, Motoki sempre lhe dera toda a liberdade, mas ainda não conseguia decidir se queria falar com Mamoru. Ele próprio não viera lhe cumprimentar, apenas baixara a cabeça rapidamente e se direcionara ao oposto no balcão. Por que ela devia andar até lá? Decididamente, o homem não padecia de falta de atendimento com Motoki sempre ali. Bem, se tivesse que falar com ele, ia ter que ser por uma boa razão, decidiu por fim, voltando à mesa problemática para atender mais pedidos e recolher pratos e copos vazios.

Mesmo ela estando de férias da faculdade, Motoki sempre fora enfático para que Usagi saísse no horário certo. Até em um dia caótico como aquele, ela sabia que tinha que ficar ali apenas até as onze da noite, a partir de quando era para juntar suas coisas e ir. Não receberia além das onze nada além de uma bronca de seu patrão. Motoki tratava igualmente todos os de meio-período por achar que jovens deviam ser jovens e se divertir enquanto podiam. Não era também muito diferente para ele, sempre aparentando estar entretido com as conversas dos clientes. Usagi também queria um dia descobrir sua vocação e correr atrás dela como seu irmão postiço fizera.

Eram quase onze da noite quando ela se aproximou de Seiya, já na sua terceira cuba libre, e anunciou que estava indo.

— Ainda tem bastante gente aqui, tem certeza? — Ele apontou mais uma vez para o grupo atrás.

— Esses não ficam muito depois, todos temos nosso trem para pegar, né? E já estão bêbados demais pra pedirem muito mais... — Passou um pano para limpar perto de Seiya e deu-lhe as costas. Não deixava de registrar que Mamoru ainda estava ali, com a mesma expressão de antes. É, no final, não se falariam; era melhor assim.

Usagi caminhou até o armário, consciente de que passava na frente de Mamoru, e pegou sua bolsa e casaco. Como já combinado, as contas pelo serviço eram acertadas aos sábados, a menos que ela não pudesse ir naquele dia. Motoki o fazia como um incentivo para que ninguém faltasse ao turno mais pesado, com exceção de Rei e outra pessoa, que nunca estavam nos sábados e raramente nas sextas. Para a felicidade de Usagi, apenas em dias especiais, os turnos coincidiam com o da dondoca temperamental.

Olhou para a própria, quem entregava um último pedido a um jovem que a convidara para mais um drinque. Apesar de convites para drinques não significarem algo em especial, aquele provavelmente havia gostado da Rei. Não seria o último, com certeza. Talvez pelo lucro duplo que Motoki aceitava que ela continuasse na equipe, mesmo não podendo ir nos dias de maior movimento. Isso e sua disponibilidade nos dias de semana para cobrir qualquer um. Rei não morava longe dali, Usagi ouvira uma vez, então podia trabalhar a qualquer hora, sem depender de trem.

Por isso, não a esperou terminar e seguiu sozinha pela porta, despedindo-se somente de Motoki assim que ele se direcionou à cozinha.

O vento do lado de fora a lembrou de que estava sem o casaco, mas era bom sentir ar puro, sem o cheio de álcool e cigarro que ficava no interior do Drunk Crown. E aquele tinha sido um dia tão cheio de tudo que Usagi poderia chorar de emoção por sair da realidade paralela. Quando chegou às escadas para o térreo, porém, a porta do bar abriu e a fez se virar.

— Por que não me esperou? — Seiya inquiria, com seu casaco vestido apenas pela metade.

— Achei que fosse ficar mais um pouco.

— Eu só estava te esperando sair, para conversarmos melhor.

Usagi pensou na hora em como tinha ao menos quarenta e cinco minutos se quisesse ter certeza de não perder o trem.

— Eu realmente queria continuar de onde paramos. — Seiya havia se aproximado de um jeito incerto. O cheiro dos drinques que tomara chegava leve ao nariz de Usagi, não competindo muito com o perfume. A grande indicação de que o homem havia bebido um pouco demais era a ausência de distância entre ambos. — Pra mim, é como se nada houvesse existido nos últimos meses. Não quero recomeçar e sim, continuar. — Com isto, ele a beijou com firmeza.

Continuará...

Anita