CN Beyond: Menino de Verdade

Prólogo - Caro Tommy...


Em meio ao início de uma tarde, um rapaz de vinte e um anos corria apressado pelos corredores da Universidade Van Rijsselberge, Califórnia, segurando em suas mãos uma caixa de quase uma tonelada, cheia de ferramentas e peças mecânicas. Seu nome era Tommy Turnbull. Era loiro de cabelos médios, 1,79 de altura, tinha olhos pretos e usava um jaleco branco de laboratório por cima de sua camisa branca com estampa de seu super-herói de quadrinhos favorito: o Punho Humano.

Tommy estava atrasado para o seu estágio com o Professor Moshimo, uma das maiores mentes de toda a universidade e um dos maiores especialistas em robótica avançada e inteligência artificial da atualidade. Tommy admirava demais Moshimo desde seus doze anos e assim que entrou na turma dele o cientista notou o potencial do garoto para essa área. Logo, foi só uma questão de tempo para ele estagiar ao lado de seu ídolo. Após meses de estágio, Tommy foi promovido a ser seu assistente pessoal para atuar em seu laboratório com direito até a um salário. Depois de quase dois anos trabalhando juntos, Moshimo passou a ver o garoto como o filho que nunca teve ou como uma versão mais jovem de si mesmo. Passou a notar que o rapaz tinha mais do que o talento para ciência, tinha também um coração cheio de valores e sonhos, igual o velhote era em seus melhores dias. Moshimo sempre dizia ao seu pupilo que ele era uma das pessoas que ele mais confiava em toda a sua vida e que talvez um dia essa confiança teria de ser testada e colocada à prova. Tommy não sabia ainda, mas esse dia tinha acabado de chegar.

Apressadamente, Tommy entra pela porta do laboratório do cientista, nervoso e agitado e já esperando as repreensões de seu chefe e mentor.

— Professor, mil perdões! Foi mal pelo atraso, sério mesmo. — Disse o jovem colocando sua caixa de ferramentas em cima de uma mesa próxima. — A culpa não foi minha, foi do Gus. A lanchonete fechou, então a gente teve que almoçar fora da faculdade, mas aí aquele gorducho teve a ideia de comer em restaurante que ficava lá do outro lado da cidade. — Enquanto murmurava desesperado, o jovem loiro abria as cortinas do laboratório para entrar uma luz. — Ai eu tive que voltar de ônibus que, aliás, quebrou no meio do caminho. Eu sei que é uma desculpa esfarrapada, mas eu espero que você me...

Ao abrir as cortinas, o jovem reparou a bagunça que estava no laboratório. Aliás, mais do que bagunça, o laboratório estava como se um tornado tivesse passado por ali. Papéis espalhados, armários e gavetas abertos e largados, itens importantes jogados em cada canto, os três computadores do laboratório haviam sumido e o mais estranho, Moshimo não estava lá como sempre estava.

Tommy ficou pasmo. A primeira coisa que pensou é que foi um assaltado, mas logo descartou essa hipótese quando percebeu que apesar do sumiço dos computadores, os materiais caros ainda estavam no lugar. Esperto, o jovem já deduziu que foi alguém que entrou ali interessado nas pesquisas que ele e Moshimo trabalhavam, muitas delas estavam salvas dentro dos computadores. Mas, onde estaria o Moshimo? Confuso, ele olhou o mural que havia no laboratório onde cientista costumava colocar bilhetes para seu aprendiz. A maioria era avisos antigos, no entanto, havia um que não estava ali no dia anterior. O bilhete dizia:

Tommy, não esqueça de devolver aquela edição de ‘As Aventuras de Pinóquio’ para a biblioteca. O prazo termina hoje” com a palavra “hoje” grifada duas vezes.

O bilhete deixou o jovem ainda mais confuso, pois ele não havia pegado esse livro na biblioteca. O que isso significava? Seria algum tipo de aviso? Um código? Ele ficou com muita curiosidade e ainda mais dúvidas em sua mente, mas resolveu guardá-las por hora. Indignado, Tommy saiu do laboratório e foi até a reitoria da faculdade prestar uma queixa sobre a bagunça que encontrara. Contudo, a reitora, uma mulher uns vinte anos mais velha que ele, com a cara mais suspeita possível, lhe disse que os computadores estavam com problemas e foram mandados para o concerto e que a bagunça do laboratório foi causada pelo próprio Moshimo que teve de sair às pressas para uma viagem inesperada ao Japão sem uma previsão de volta. Ela mostrou a ele até uma carta de recomendação deixada pelo Professor Moshimo para ele tentar trabalho em qualquer empresa ou laboratório que ele quisesse. Tommy percebeu que a letra da assinatura era realmente a mesma do seu mentor, no entanto, não acreditou em nada do que a reitora falou, especialmente dos computadores e a bagunça no lugar. Talvez, seu mentor tenha realmente tido que ir viajar às pressas, mas aquela bagunça não era dele. Moshimo era muito organizado e delicado, além disso, os computadores estavam ótimos ainda no dia anterior. O rapaz deduziu que alguém da faculdade se aproveitou da ausência de seu chefe para botar as mãos nos projetos dele. Não seria impossível isso ser verdade já que o Professor Moshimo era um gênio famoso e reconhecido, tendo muitos rivais no mundo científico.

Mas, como isso se liga àquele bilhete?” Ele pensou profundamente. Seja lá qual for, a resposta estava na biblioteca.

Ao sair da reitoria, Tommy foi direto a ela. Lá, não ficou surpreso ao ouvir da bibliotecária que só havia um único exemplar de “As Aventuras de Pinóquio", obra clássica de Carlo Collodi. Ele correu até a sessão de ficção e pegou da quinta prateleira da fila de contos de fadas o livro que ele procurava. Quando o jovem abriu a obra de Collodi, viu algo caindo de suas páginas. Era uma carta com “Para Tommy” escrito em seu envelope com a letra do Professor Moshimo. O jovem olhou para os lados, analisando se alguém o observava, o que, felizmente, não era o caso. Espertamente, o jovem loiro pegou uns livros aleatórios da prateleira, como quem quisesse lê-los, escondeu a tal carta entre eles e foi andando calmamente até uma sala de estudos que havia por ali. Era o lugar perfeito, já que as salas de estudos ficavam em um ponto-cego das câmeras de vigilância. Ali, ele poderia ler e se passar por mais um estudante lendo livros para estudar.

Tommy sentou na mesa, e abriu a carta discretamente. Sempre sagaz e precavido, ele a colocou sobre um dos livros para dar a impressão de que ele estava lendo era o livro. Enfim, na carta dizia...

Caro, Tommy.

Sinto muito pela minha ausência repentina. Você deve estar confuso e com todas as razões. Senão me engano, você deve estar lendo esta carta após ver que nosso laboratório foi revirado e ter sido totalmente bagunçado. Eles devem ter levado os nossos computadores, mas não se preocupe quanto a isso. Antes de sair, apaguei tudo neles e escondi todos os arquivos importantes. Não vão achar nada ali.

Não me espere nos próximos dias, talvez, nem pelos próximos anos. Ir embora foi uma das decisões mais difíceis que tive que fazer na vida, mas era necessário. Eu sinto muito por ter escondido algo de você todo esse tempo, mas é que não queria envolver você. Agora, eu já não tenho escolha. Tommy, você é a minha única esperança, é a única pessoa que eu confio para isto. Em nosso tempo juntos, você tem sido o que mais próximo que tive de um filho e me orgulho demais de você. Mas, eu sempre vi algo em você que ia muito além de talento e inteligência. Você tem o coração de um menino, junta a uma força de vontade e uma sabedoria grandiosa. Podem parecer atributos banais, mas estes valores são raros nesse mundo. Eu mesmo não tenho isso.

Por isso, o que vou lhe pedir, cabe apenas a você, pois apenas alguém com seu bom coração pode realizar essa tarefa. Você não sabe, mas eu trabalhei muitos anos em um programa secreto do governo chamado “Prometheus”. Lá, junto ao meu amigo Dr. Otomo Kamikazi II, fizemos engenharia reversa de algumas tecnologias desconhecidas e usamos elas para criar uma coisa nova. Nós tínhamos a ideia de criar um indivíduo artificial perfeito, com inteligência igual ou superior à complexidade humana. Chamamos esse projeto de “Robotboy”. No programa, eu e Kamikazi desenvolvemos um protótipo, mas no meio de seu desenvolvimento, eu e ele nos desentendemos. Tínhamos visões diferentes dos rumos de nosso projeto, as intenções dele eram boas, mas perigosas e descuidadamente violentas. Eu saí do programa e levei boa parte da pesquisa comigo. Ele nunca me perdoou por isso. Anos depois, o câncer levou o meu amigo. Em nome dele, eu continuei o nosso trabalho, só que nas sombras usando meus próprios recursos financeiros. Levei anos para finalizá-lo, mas finalmente consegui. Devo dizer, o trabalho da minha vida, a minha obra-prima, a minha maior invenção que superou todas as expectativas.

O problema é que eu temo que ela caia em mãos erradas. Minha invenção tem um gigantesco potencial para o bem da humanidade. Mas, percebi que alguém anseia pelo poder bélico que minha invenção pode trazer. Essas pessoas têm que entender que ele não é uma coisa, ele não é uma arma, ele é uma pessoa. É por isso que eu tive que sumir e levar toda pesquisa dele comigo. E é por isso que eu deixo ele com você. Eu nunca entendi muito bem as pessoas, eu não posso ensinar alguém algo que eu nunca entendi direito. Ele precisa de alguém para guiá-lo, alguém para ser sua consciência, alguém que mostre ele o que é ter um coração nobre, alguém para ensiná-lo o que é ser humano, a ser um menino de verdade. Você é essa pessoa, Tommy.

Você irá encontrá-lo no endereço que estará escrito no verso desta carta. No envelope há uma chave para o cadeado do armazém de onde ele está. Dentro do lugar, você irá encontrar mais algumas instruções mais detalhadas, vídeos antigos e informações e dados deste projeto.

Cuide dele, Tommy. Proteja-o, ensine-o. Eu prometo que em breve nos encontraremos de novo e eu irei lhe mostrar ainda mais novas ideias para melhorar o mundo.

Eu conto com você.

Do seu amigo, mentor e professor, Akira Moshimo.”

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.