Broken Home - One Shot

Capítulo 1 - Capítulo Único


Eu nunca fui muito religiosa. Meus pais nunca frequentaram igrejas, cultos ou qualquer que seja a celebração para exercitar a fé. Na verdade, acho que meu pai é ateu... Mas eu só conseguia orar fervorosamente para um Deus que não conheço. Um Deus que era minha única esperança de salvar essa família.

Eu estava trancada no meu quarto e nem as paredes grossas, nem a porta trancada, nem o travesseiro sob minha cabeça conseguiam abafar os gritos dos meus pais no quarto ao lado. Eles não pareciam sequer se importar com a filha dentro de casa. Quando as coisas começaram a ser assim?

- Sebastian, por que você não consegue concordar em nada comigo? – mamãe soltou furiosa. – Isso é sobre a Ana!

- Você me perguntou se ela pode ir ver o show do Luke, que é nosso vizinho e conhecemos há anos. Ela já está grande, Adele! Sabe o que é bom para ela ou não. – meu pai retrucou.

- Mas é em um bar, Bas! Um bar! Onde tem álcool, drogas e homens maus! – Adele Hezer era, definitivamente, a mãe mais dramática de todas.

- E Luke Hemmings estará lá! Assim como aquele amigo dele que é muito responsável, como é o nome dele? Ashton?! – ele tentou amenizar a situação. – Além disso, aquela amiga da Ana namora esse menino, certo?

- A Ana já não anda mais com as mesmas pessoas, Sebastian! Quando você parou de prestar atenção na nossa filha?! – mamãe falou escandalizada.

- Eu sei como Ana está se comportando! – ele se descontrolou e berrou furioso. – Desde que começamos a brigar dia sim dia não ela tem saído cada vez mais e se envolvendo com pessoas de quem eu não gosto nada, mas estou tentando confiar na minha filha!

- Eu confio nela! – mamãe gritou ofendida. – Mas aquele ambiente não é apropriado para adolescentes menores de idade! Têm bebidas, cigarro, drogas!

- Isso não quer dizer que Ana leva a sério a frase “Sexo, Drogas e Rock’n Roll”! – papai sempre me defendia, mas sempre tinha os maiores sermões. – Se já tomou sua decisão sobre não deixar Ana ir, por que ainda pede minha opinião?

- Porque pensei que você me apoiaria, Sebastian! – a voz da minha mãe soou alta, mas cansada. – Pensei, que ao menos sobre a segurança de Ana, você concordaria comigo.

- Ela já tem 17 anos, Adele. Não é mais uma criança. Ela tem feito coisas erradas, sim, é claro que está! Mas são os amigos dela! Aqueles que conhecemos desde quando tiravam meleca do nariz! – ele suspirou irritado, mas continuou falando alto demais. – Deve ser importante para ela! Ela pediu permissão! Quando ela fez isso nos últimos meses? Vamos dar um voto de confiança, Adele. Essa é a minha maldita opinião!

- Sebastian! É um bar! - mamãe parecia irredutível. – Não quero minha filha mais perto de bebidas alcóolicas do que já está! Sabe quantas vezes ela volta com as roupas fedendo à cerveja?! Sabe quantas noites eu a vi chegar sem conseguir andar em linha reta?!

- É claro que eu sei! Eu estava do seu lado! Carreguei-a escada acima até o chuveiro e joguei água gelada nela! – a voz do meu pai falhou. – Sempre que ela faz isso meu coração se parte e só consigo sentir que a culpa é minha. Mas eu confio em Ana com a minha vida. Por mim, ela pode ir a esse show, mas a decisão é sua.

- Não é assim que deve ser, Sebastian! – mamãe gritou mais uma vez. – Não era para ser assim!

- Do que você está falando agora? – ele se enfureceu mais uma vez.

- Você sabe, Bas! Que casamento é esse? – ela gritou chorosa.

- Estamos discutindo a Ana agora! Quando o assunto passou a ser o nosso casamento? – papai perguntou confuso.

- Não concordamos nem se nossa filha pode ou não ir a um show dos amigos, como isso é chamado casamento? – ela chorou.

- As pessoas pensam diferente, Adele. Isso é normal! – eu conseguia imaginar a expressão desesperada no rosto dele.

- Éramos tão jovens e tão tolos! Como poderia ter dado certo? Casamento?! O que nós pensamos? – ela riu histericamente.

- Adele! Nós conseguimos por 18 anos! Isso é mais que muita gente consegue! O que você está querendo dizer?!

- Eu estou cansada, Sebastian! Cansada! Nós brigamos por quase tudo e quase todos os dias, não fazemos nada para mudar isso! Nosso casamento simplesmente caiu na rotina, pois não conseguimos nem escolher um restaurante para sair de vez em quando. – ela suspirou profundamente.

- Não estou gostando do rumo que você está tomando. – papai interrompeu-a.

- Bas, eu amava você quando nos casamos. Eu amo você por ter me dar a Ana. E nós conseguimos mais que muita gente, é claro que sim! – ela fungou e eu sabia que secava as lágrimas – Mas não dá mais para brigar assim! Olha o que estamos fazendo com nossa filha e com nós mesmos. Não faz bem para ninguém, Bas!

- Você não está... – ele começou, mas a voz de mamãe o fez parar.

- Sim, Bas. Vamos nos divorciar. Por favor! – e ela chorava alto.

Meu pai chorava alto.

Eu chorava alto.

E eu não quis saber de mais nada depois das palavras da minha mãe. Apenas saí correndo. Fugindo daquele quarto sufocante. Fugindo do meu lar.

E eu corri. Para fora do quarto. Escadas abaixo. Pela porta da frente. Pelo quintal. Pela calçada. Para a rua.

Olhei em volta e o ar não entrava pelos meus pulmões. Eu não sentia nada além de dor. Não via nada além de borrões. Não ouvia nada além dos meus soluços.

Cambaleei para trás, tropecei no que eu acho ser o meio fio e caí sentada. Apenas me encolhi ali mesmo. Abracei os joelhos contra o peito e escondi o rosto nos braços. E chorei. Os soluços saíam do fundo da garganta. As lágrimas desciam pelo meu rosto, grossas e pesadas. Meu nariz escorria de maneira nojenta e eu pouco me importava. Eu deveria estar completamente horrível, mas mais terrível era o que eu sentia no meu coração.

Toda aquela dor não desapareceria. A dor era insuportável. Chegava a ser físico. Quando mamãe falou a palavra com D, parecia uma faca perfurando cada camada da pele, os músculos e o esterno, até atingir o coração. Quando o amor acabou?

E nos últimos trinta minutos, eu chorei sentada naquela calçada. Tentei respirar, tentei parar de soluçar. Mas as lágrimas se recusavam a diminuir. E eu sabia que molhei toda a manga do meu moletom.

Funguei de uma maneira nada bonita, limpei o nariz com o punho da própria blusa.

Papai e mamãe se casaram aos 18 anos, depois de namorarem no colegial. Eles foram contra todos e se casaram, tinham certeza de que se amavam e que seriam felizes. Mesmo sem planejar, mamãe engravidou e me teve aos 19. Todos estávamos felizes. Eu era a criança mais amada e feliz do mundo. Aprontava de tudo com meus amigos, Luke e Sophia. Mas, desde os meus 15 anos, meus pais começaram a discutir. Sempre por coisas bobas, mas faziam as pazes rapidamente e tudo ficava bem. Mas nos últimos meses, não sei exatamente quando, tudo mudou.

As brigas se tornaram cada vez mais frequentes, eu não queria ficar em casa vendo aquilo. Distanciei-me dos meus amigos. Sempre que tinha uma festa eu estava presente. Comecei a beber, cerveja era horrível, mas depois de um tempo eu me acostumei. As minhas novas “amigas” tinham o cérebro tão pequeno quanto o comprimento dos vestidos que elas usavam (tão curtos que elas pareciam querer mostrar o útero e não o corpo). E agora ficar com os meninos era fácil, bastava uma cerveja e eu já me sentia desinibida o bastante para beijar qualquer sapo que aparecia.

Mas nada disso me fazia feliz. A ressaca do dia seguinte me assombrava, pelo menos, duas vezes por mês. Agora eu tinha uma imagem social e um mundo gigante e complexo demais para se compreender dentro de mim. E nenhuma dessas pessoas que me cercam hoje consegue entender os meus temores, as minhas dores, as minhas angústias.

Sinto falta do que era antes. Sinto falta dos meus amigos. Sinto falta dos meus pais unidos. Sinto falta de tudo que não tenho mais.

E o pior que eu sei que a culpa é toda minha por perder todas essas coisas.

- Vizinha?! – a doce voz masculina invadiu meus ouvidos e interrompeu meus pensamentos.

- Não enche, Hemmings! – falo sem dar oportunidades para as gracinhas dele e sem encará-lo. – Não estou com humor para retrucá-lo e aguentar suas brincadeiras sem graça.

- Quem morreu, Ana? – ele perguntou irônico.

- Por favor, Luke. – ouvi a surpresa na respiração dele, quando o chamei pelo nome. Havia meses eu não o chamava assim. – Deixe-me em paz só por hoje! Amanhã você pode me zoar por estar parecendo louca na calçada. – pedi ainda sem olhá-lo.

- Eu até deixaria, porém você esta impossibilitando a passagem. – dei de ombros. – Além disso, você está gripada? Sua voz está estranha.

- L-Luke... Falo sério. Me deixa sozinha só um pouco! – então ergo meu rosto para ele e Luke se assusta ao ver as lágrimas escorrendo e os olhos vermelhos. – Eu só quero respirar um pouco, eu estou sufocada lá dentro.

Luke era alto, loiro e magrelo. O cabelo ondulado era alisado constantemente, apenas para ficar em pé naquele topete bagunçado. Até o ano passado, usava uma franja emo, o que me fez zombar dele por muito tempo. Quando éramos crianças, ele era gordinho. O que restou hoje foram alguns músculos, muita pele e muito osso e covinhas meigas nas bochechas. A criatura tem péssimos hábitos alimentares e ainda não engorda. Acho que tocar guitarra funcionou mais do que a natação. Além disso, ele ficou mais bonito com a puberdade. Acrescentou um piercing no lábio inferior.

Mas mesmo depois de todas as mudanças em Luke, duas coisas nele nunca mudaram e eu tinha certeza, nunca mudariam.

Luke era Luke. Atencioso, carinhoso, engraçado, ótimo guitarrista, com uma voz perfeita, um coração gigante e o melhor amigo de todos. Essa era a personalidade dele e era a primeira coisa que nunca mudaria.

Outra coisa que eu sempre amei nele e era impossível mudar, era como todas as emoções dele eram refletidas naqueles olhos azuis. Os olhos mais azuis e transparentes que eu pude conhecer. Azuis como o céu e transparentes com a água.

E ao olhar para Luke Hemmings, eu só conseguia ver a preocupação estampada em seus olhos e em todas as expressões do seu rosto e na postura dos ombros largos.

- Eu sou bom com esse lance de respiração, me deixa te ajudar. – ele sentou ao meu lado. – Além disso, já fomos melhores amigos. Nunca deixarei você sozinha nessa situação.

- Você nem sabe o que está acontecendo, Hemmings. – revidei rude.

- Então porque você não me conta?! – ele ergueu uma sobrancelha. – Talvez eu possa te ajudar. Como nos velhos tempos.

- Por que você se importa? – cortei-o. – Eu me afastei de vocês. Não deveriam estar com raiva ou chateados e coisa do tipo?

- Esquece isso. – ele fez um gesto com a mão dispensando o que eu disse. – Finja que voltamos no tempo e nós temos 15 anos e ainda somos melhores amigos.

- Não consigo fazer isso. – olhei para ele, sequei as lágrimas e tentei dar um sorriso. – Você tinha uma franja de emo.

- Assim?! – ele disse puxando o topete para baixo e alisando em cima dos olhos e me fazendo rir.

- É. – e um brilho de alívio apontou naqueles olhos.

- E então?! Não vai me contar nada? – ele disse ainda segurando o cabelo no rosto.

- Há dois anos meus pais não estavam falando a palavra com D. – desabafei.

- Palavra com D? – ele soltou o topete e eu assenti. – Divórcio?

- Não fala a palavra com D, Luke Hemmings! – e meus olhos se encheram mais uma vez e mais lágrimas caíram.

- Desculpa. – ele disse arrependido. – Quando isso começou?

- Eles estavam brigando sobre eu ir a um lugar. – omiti o fato de ser um dos shows dele. – E a minha mãe soltou a palavra com D e eu saí correndo.

- Eles estavam brigando na sua frente? – ele se surpreendeu.

- Não. Eu estava no meu quarto e eles estavam gritando no quarto deles. – sorri tristemente.

- E como eles chegaram a esse ponto? Até a última vez que falamos sobre isso eles brigavam de vez em quando e logo se acertavam. – Luke parecia realmente preocupado.

- Desde então eles brigam quase sempre, sem concordar com nada. – disse decepcionada. – E eu sou o motivo das discordâncias em 80% das vezes.

- E os outros 20% das vezes? – ele ergueu a sobrancelha.

- Estão divididos entre a comida, o restaurante da vez, o canal da TV e essas coisas pequenas. – eu ri, porque eles sempre discutiam sobre essas coisas, mas antes eram discussões carinhosas.

- Eles sempre brigavam por essas coisas, mas sempre acabavam se beijando. – ele lembrou com um sorriso.

- Pois é... Agora eles estão cada vez mais distantes. E eu apenas vejo como se a relação deles fosse paredes desmoronando. – fiz uma careta e funguei. – Além disso, todas as palavras que eles têm trocado parecem facas ou cacos de vidro que machucam e cortam minha pele. Principalmente a palavra com D.

- Mas você não deve guardar as memórias ruins, Ana. – Luke apoiou uma mão no meu ombro. – Pense nas melhores lembranças. Não perca as esperanças.

E quando o loiro falou de boas lembranças, imagens da minha infância brilharam na minha mente. Imagens minhas e de Luke pequenos correndo pela rua e indo até o parque no fim da rua. Eu e Luke andando de bicicleta pelo bairro e sendo seguidos por nossas mães. Eu e meu pai acordando minha mãe no dia de seu aniversário.

- Eu gostaria de saber quando a felicidade acabou. – eu disse com um sorriso triste. – Quem está certo e quem está errado?

- Acho que não importa quem é o culpado. – Luke me olhou e passou a mão por meus cabelos. – Talvez seja melhor eles separados. Menos brigas, menos discussões.

- Mas quando o amor acabou? - meus olhos se encheram de lágrimas novamente. – Porque tudo que eu vejo agora são fantasmas nos corredores. Tudo que eu sinto é um vazio. E eu estou sozinha ali, em um lar completamente destruído.

- Você não está sozinha. Nunca esteve, Ana. – Luke desviou os olhos dos meus.

- É só que eles não me ouvem mais. Ninguém ouve o que tenho a dizer. – revirei os olhos.

- Do que você está falando? - ele voltou a olhar para mim.

- Acho que meus pais já decidiram todo o meu futuro por mim. Em todos os aspectos. E eles não querem saber minha opinião. Nem mesmo sobre o que eu quero fazer da minha vida. – olhei para a janela do meu quarto. – Venha comigo. Quero te mostrar uma coisa.

Sem dar tempo para Luke concordar, puxei-o pela mão até a minha casa. Lá dentro, conduzi-o até meu quarto e abri a porta. Imediatamente ele arregalou os olhos para a parede atrás da minha cama.

Eu havia pintado um castelo, em uma ilha, cercado por água. Em vários tons de azul, cinza e laranja. A imagem tomava grande parte da parede.

- Eu quero pintar. – falei explicando para Luke o que eu queria conseguir falar para meus pais. – Não quero ser médica, advogada ou engenheira ou qualquer outra coisa. Quero apenas fazer isso aqui.

- Por que você não fala isso para eles? – Luke olhou-me orgulhoso e confuso ao mesmo tempo.

- Porque eu não tenho mais esperanças de ser ouvida. Porque não tenho mais onde me apoiar. Porque a culpa de tudo isso que estou sentindo é minha. – eu dei de ombros e as lágrimas apenas escaparam dos meus olhos.

Eu tinha consciência de que meus atos me trouxeram a essa solidão que eu sinto.

Se eu não tivesse me afastado dos meus verdadeiros amigos ainda teria eles para me confortar.

Se eu não estivesse tentando ocupar o vazio que eu senti com as brigas dos meus pais com bebidas, festas, garotos e vestidos que não cobrem nem o meu corpo direito, acho que não estaria segurando sozinha um sonho.

Enquanto eu pensava nas coisas que poderiam ter sido e na culpa que eu sentia, não percebi Luke se aproximar.

Ele ergueu meu rosto até encarar seus olhos sinceros. Aqueles olhos azuis que transpareciam confiança, força e coragem. E amor. Luke desceu uma mão para minha cintura e me puxou para mais perto dele. Nossos rostos estavam muito próximos.

- Se você quiser, eu posso ser esse apoio. – e junto com essa promessa, seus lábios tocaram os meus.

E aqueles lábios me trouxe vida novamente. E aquele beijo acendeu a luz que havia se apagado em algum momento. E todo o conforto e consolo daqueles braços preencheram um pedacinho do buraco que estava aberto em meu peito.

E eu sabia que tudo ficaria bem. Tudo ficaria bem desde que Luke estivesse na minha vida.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.