Broken Bonds

Capítulo único.


À mesa de uma humilde casa, um homem dos cabelos negros, de pele claríssima, estava sentado, à espera de alguém. Sobre a mesa, apenas velas acesas, dois prato, dois copos, os talheres, uma garrafa de champanhe e um singelo shortcake de morango. Era véspera de ano novo e, do lado de fora daquela humilde casa, nevava bastante. Em silêncio, o moreno permanecia, olhando para a chama acesa. Estava solitário, mas nem sempre fora assim. Oz, seu melhor amigo e por quem no passado fora totalmente apaixonado, havia se casado com Alice, uma garota que ele conheceu nessas casas noturnas de Londres, mas não era nem um nem outro por quem Gilbert ansiava a presença. Era por Vincent, seu irmão.

[...]

– Gil, você sabe que tudo o que eu faço é por você. – Disse o Nightray mais novo. – Você não pode ir!

– Cale a boca, me deixe sair agora! – Enfatizou o mais velho.

– Não, Gilbert! Não vai ser bom pra você, nem para ninguém. – Argumentou o loiro, segurando-o. – Eu sei que está magoado com o Oz, mas, por favor, se controle! – Pediu. – Indo lá, você só vai se machucar ainda mais e eu não posso te deixar sofrer assim!

Com as palavras do outro, Gilbert o fitou enfurecido. Em uma brutalidade absurda, ele se soltava do outro, deferindo-lhe um forte soco no rosto do irmão, que acabou cambaleando.

– Por que você não vai cuidar da sua vida, Vince? Eu estou de saco cheio de você! – Gritou o rapaz enquanto o encarava com desdém. – E se eu quiser barraco naquela porcaria de casamento, e daí? E se eu quiser sofrer pelo Oz, e daí? Isso não é problema seu! É a minha vida!

O mais novo limpava a boca que levemente havia cortado e por isso sangrou.

– Eu te odeio, Vincent! Eu te odeio! – Gritou com o mesmo, com raiva. – Eu não te quero nem mais como irmão! Desapareça da minha vida!

Ao proferir aquela sentença, nos olhos heterocromáticos do irmão calado ele viu as lágrimas aflorarem. Elas caíam voluntariamente, pesadas. Trêmulo, parecia que ele desabaria a chorar, mas assim ele não o fez. Com o seu olhar cheio de mágoa, Vincent fitou o irmão de volta, indo a sua direção novamente. Ele segurou aquele que o golpeou pelo pulso e, ao invés de revidar ou começar uma nova briga, ele tomou os lábios alheio e assim o beijou suavemente por alguns instantes. Sem delongas, ele o soltou, bem como logo se afastava.

– Eu também, Gilbert. Eu não queria ter nascido seu irmão.

Sem mais nada a dizer, o loiro saía de casa. Para trás, somente deixava as últimas lágrimas vistas por Gilbert caírem.

[...]

Ele olhava para o relógio. Quinze para meia-noite. Sabia que ele não viria. Há quantos Natais e Anos Novos Gilbert esperava pelo seu retorno? Há cinco anos que sequer o via. Cinco anos de solidão e dor. De saudade. De culpa. Não sabia sequer se estava bem ou até mesmo vivo, mas ele... Ele voltaria. Afinal de contas, era o Vincent, aquele que sempre se preocupou consigo e que sempre estava ao seu lado. Ele nunca o abandonaria. Nunca...

Sabia que havia sido horrível com seu irmão. Hoje conseguia compreendê-lo, mais do que realmente queria. Os lábios que, naquele dia, ele tocou com os dele um dia agora lhe faziam falta. Aquela voz melodiosa, aquele sorriso sincero que só esboçava para ele, atenção que lhe dava... A casa tinha mais vida, diferentemente que ela se tornou, tão escura, fria e silenciosa.

[...]

­­­– Gil! – Disse o irmão mais novo ao entrar em casa com uma pequena sacola de compras, empolgado. – Advinha o que eu comprei para hoje à noite?

– Hã? –Respondeu desatento enquanto preparava um frango que havia ganhado da vizinha para a noite de Ano Novo. – O que você comprou?

O loiro foi até o mais velho, puxando-o até a mesa só para mostrar o que havia trazido da cidade.

– Tadaam! – Expressou-se contente. Fitava o mais velho, inquieto, ansioso pela reação do irmão.

Quando o moreno abriu a sacola, franziu o cenho em uma expressão brava.

– Fogos de artifício, Vince? – Bronqueou. –Nós não temos dinheiro para ficar jogando fora com essas coisas!

Apesar de a tonalidade do outro ser um tanto grotesca, ele sorriu.

– Não seja tão duro assim, Gil. – Falou o caçula. – Dizem que fogos de artifício eram usados antigamente para agradecer aos deuses a produtividade e espantar espíritos malignos. Dizem até que se fizermos um desejo para o ano que vai se iniciar, ele pode realizar! – Explicou ao outro. – Quem sabe ano que vem nossa vida não melhore?

[...]

Era meia noite quando os rojões começaram a ser arremessados e aquele show pirotécnico anunciava o início do ano, juntamente com o soar do Big Ben. E assim aquele novo ano havia começado como os anteriores... Sem ele. O moreno se levantava e ia até a janela, de onde passou a observar os desenhos de fogo se formar no céu de inverno. Se tivesse um desejo que quisesse fazer naquela noite era ter seu irmão... Não, seu Vincent de volta, a salvo. Vivo.

De seus olhos caía uma singela, porém sincera, lágrima. Voltou a olhar para a mesa, tão solitária. Por que estava parado ali, afinal de contas? Se queria tanto que ele estivesse consigo, por que afinal de contas nunca pensou em procurá-lo? Por que nunca foi atrás? Uma vez mais fitou o céu festivo e ali viu a estrela d’Alva brilhar intensamente. Podia ser tarde demais buscar por ele, mas não podia continuar na inércia... Não queria!

Decidido, ao vestir adequadamente e calçar sua botina preta, ele saiu de casa. Precisava encontrá-lo! Não tinha a mínima ideia de como o faria, mas estava disposto a ir até onde corpo não aguentar mais. Onde ele estava? Precisava dele! O vento gélido batia no rosto exposto de Gilbert e queimava a pele alva do moreno. Tinha que confessar. Aquilo era doloroso, mas ficar sem ele era muito mais. E se ele estivesse com frio? E se ele estivesse em apuros? E se ele...? Não podia e nem queria pensar no pior.

Corria pelas ruas de Londres, na tentativa de avistá-lo entre a multidão. Nada. Jurava que não queria imaginar desgraças, mas a cada minuto que se passava à procura do mesmo esse tipo de hipóteses se tornava inevitável.

– Deus, por favor... Ajuda-me a encontrar meu irmão. Eu Te suplico... Por favor!

Estava para entrar em desespero e desistir daquela busca insana, no auge do inverno inglês, quando, ao longe, notou um homem loiro e magro, junto com um menino moreno, igualmente magro, que estava em seu colo. Eles estavam sentados ao fundo de um beco, isolados, diante uma fogueira.

– Vincent.

Soube reconhecê-lo no mesmo instante em que o viu. Sem delongas, ele correu até aquele homem de quem tanto precisava, de quem tanto sentiu falta. Ele estava vivo... Vivo! Corria o mais rápido que podia. Se seus cadarços estivessem desamarrados, certamente já teria tropeçado neles. Ao passo que se aproximava dele e do menino que o acompanhava e sua velocidade, aos poucos, era reduzida, seu coração começava a bater a mil. Depois de tantos anos sem vê-lo, sem ter notícias dele... Finalmente o encontraria.

– Vince. – Chamou pelo irmão mais velho depois de muito tempo, fitando-o com os olhos marejados.

Os olhos do loiro se arregalavam e, assim como o do outro se encheram de lágrimas. Neles, Gil podia ainda observar a mesma sombra que havia notado antes de ele partir de sua vida. Ela se chamava mágoa. Os olhares se cruzaram e ali, em silêncio, ambos permaneceram. Vincent estava acuado, com medo. Parecia não queria vê-lo.

– Gil... – Respondeu-lhe, a desviar seus olhos para o chão encoberto de neve. – Quanto tempo.

– Vince...

O moreno notava o quão havia feito de mal para seu querido e amado irmão, o quanto o havia magoado.

– Papai conhece ele? – Perguntou a criança, tocando a face do loiro. Fitava-o profundamente nos olhos, gracioso.

O Nightray mais novo olhava de volta para o menino. A resposta, porém, não saía. Seus olhos marejavam ainda mais, quase a ponto de transbordar aquelas lágrimas. Ele hesitava em proferi-la. E aquela cena cortou o coração do mais velho. Sem pensar, Gilbert foi ainda mais à frente e se ajoelhou diante do outro. A segurar os ombros, fitou firmemente os olhos heterocromáticos do irmão, sincero.

– Vince, olha para mim. – Pediu, embora não fosse ouvido. – Vince... Olha para mim. Por favor. – Disse já em voz trêmula.

Ao ver que o loiro parecia ter medo de si, não conseguiu segurar aquelas lágrimas que involuntariamente começaram a cair sem sua permissão. A história acabaria daquela forma, tão fria e infeliz? Com a mesma coragem que havia chegado até ali, o moreno levou seus lábios aos do irmão, assim como o outro havia feito há cinco anos. Com o ósculo, o loiro voltava a fitar o mais velho, confuso. Ao desfazê-lo, Gil encostava sua testa a do outro e desse modo o mirou no fundo dos olhos verdadeiramente.

– Eu preciso de você, Vincent... Eu não quero que você desapareça da minha vida. – Confessou o mais velho, com a voz falha. – O Gil estava errado o tempo todo... Gil foi ignorante. Desculpa, Vince... Desculpa. – Disse, honesto. – Eu te amo, Vince. Você é tudo para mim.

Com as últimas palavras, o falante desabou em chorar, como há anos queria ter feito de verdade. Diante da situação, do que ouvia e do que o outro confessava Vincent também teve suas lágrimas escorregando pelo seu rosto, tão castigado pelo frio. Assentiu silenciosamente com um sorriso, sem nada a dizer. É claro que perdoaria!

O mais velho, ao vê-lo chorar, limpava suas lágrimas com a mão enquanto o fitava, amoroso.

– Eu te peço, Vince... Eu te imploro. – Começou o moreno. – Volta para casa. Deixa-me cuidar de você, por favor.

Com o pedido do mesmo, ele se encolheu. Abraçava o menino que lhe chamava de pai, acariciando o rosto do pequeno. Ele sorria todo gracioso, infantil, para o loiro. Então o irmão mais novo olhava para o mais velho, sem jeito.

– Posso levar o pequeno Albert comigo? Eu o encontrei abandonado recém-nascido... Desde então ele só tem a mim. Eu não posso deixá-lo sozinho.

O moreno sorriu.

– Claro que pode, Vince. Ele será muito bem-vindo. – Disse o mais velho a fitar o irmão e logo em seguida para a criança. – Prazer em conhecê-lo, Albert.

– Eu vou ter dois papais? – Perguntou o menino, fitando o loiro, esperançoso.

O outro, diante o olhar do pequenino, apenas sorriu em resposta positivamente.

– Então eu volto, Gil. – Disse Vincent. – Eu volto para casa.

E para o humilde lar de madeira eles retornavam, de onde Vincent jamais deveria ter saído ou sido expulso. Agora, porém, com mais um integrante na família: Albert.

Enquanto os demais se banhavam na água quente para se aquecerem adequadamente, Gilbert estava novamente frente à janela a observar a estrela mais brilhante da noite. De olhos fechados, ele agradecia a Deus, por ter ouvido suas súplicas e ter lhe dado aquela oportunidade de recomeçar.

– Gil. – Chamou o loiro, logo atrás. Com um sorriso ele lhe esperava.

Virava-se rapidamente ao ouvir aquela voz que tanto amava e, ao ver aquele sorriso tão singelo e belo que o outro lhe esboçava, o moreno caía no choro novamente, indo às pressas abraçá-lo fortemente. Queria senti-lo ali consigo, ter a certeza que ele estava ali. Soluçava como uma criança aos prantos.

– Você realmente está aqui... Você realmente voltou. – Disse com a voz abafada no peitoral do outro. – Eu estou feliz, Vince... Eu estou feliz!

Graciosamente, o mais novo erguia o rosto do irmão e o fitava, com os olhos úmidos. Sorridente, acariciava o rosto do amado enquanto, lentamente, unia outra vez seus lábios aos dele em um ósculo puro e cheio de amor, que logo fora retribuído pelo outro, e só fora desfeito quando a ar parecia lhes faltar.

– Eu também te amo, Gil. – Proferiu suavemente enquanto o mirava nos olhos e acariciava os lábios alheios com seu dedo.

– Vince... – Sorriu feliz como nunca esteve.

– Feliz Ano Novo, Gil. –Desejou ao mesmo antes de se afastar para arrumar a criança.

– Feliz Ano Novo, Vince. – Respondeu de coração.

Nunca mais o deixaria partir... Nunca mais. Queria tê-lo ali, junto, para o ano que vem e no outro ano, e no outro e outro também. Queria estar com ele para sempre, para toda eternidade.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.