—... tem certeza que olhou o nome certo? — Amy escutou uma voz masculina perguntar.

—Sim, Amélia Hope Cahill! — respondeu outra. — Já disse milhões de vezes que não me enganei!

—Isso é estranho... — a primeira voz constatou. — Chama, chama, chama... Mas ninguém atende.

O corpo inteiro de Amy doia. Ela estava gelada, suas roupas grudadas em sua pele, porém sentia algo mais... Talvez um cobertor ou uma manta, tapando-a. A garota permaneceu de olhos fechados, sua respiração irregular.

—Ligue novamente! — a segunda voz parecia ordenar. — Não podemos fazer nada até que alguém venha buscá-la...

Um barulho alto de telefone tocou. Algumas portas bateram. Vozes de pessoas conversando. Um cheiro de café preto e rosquinhas no ar... Amy poderia jurar que estava em uma delegacia.

A ruiva já esteve uma vez em uma delegacia, com 16 anos, quando ela e Dan viram um assalto. Naquela ocasião, Amy chorava compulsivamente, pois uma senhora havia sido morta na sua frente...

Em seus pesadelos, Amy ainda ouvia o berro da mulher... Algo tão doloroso que seus ouvidos não acreditaram... Um assalto, se é que poderia ela chamar assim, custou a vida de uma mulher... De uma senhora... Custou lágrimas de uma família inteira, custou dores para todos os presentes, tudo por dinheiro! Amy odiou tudo naquele dia, odiou o simples fato de estar viva.

Com isso a garota prometeu, em um minuto de consciência e deixando um pouco de lado suas dores, que no dia em que assumisse a liderança da empresa, iria desviar grande parte do dinheiro para causas sociais, para impedir que mais pessoas entrem na vida do crime, para salvar vidas...

Mas era claro que seu plano, o único plano que ela já tinha feito alguma vez na vida, tinha que dar errado! Porque um infeliz apareceu da Inglaterra para tomar o que era dela...

Lágrimas secas escaparam de seus olhos, era horrível ter seus sonhos, ok, planos, destruídos por uma simples notícia... Na verdade, Amy entendia bem o que era destruir coisas através de notícias... Já que foi uma notícia que a fez entrar para esse mundo horrível...

—Onde eu estou? — perguntou a garota de 10 anos, seus cabelos ruivos bagunçados e soltos, ela usava uma camisola do hospital, e tinha em seus braços vários fios e tubos.

—Você está no hospital, querida — respondeu uma voz de uma mulher, sua voz era doce e calma, mas Amy não se deixou enganar... Suas últimas lembranças eram confusas e bagunçadas....

—Onde estão meus pais? — perguntou a garota. — E minha vó? Por que não estão aqui? E quanto ao meu irmão? O nome dele é Daniel e ele não sobrevive sem mim...

Amy viu a mulher engolir em seco, e não compreendeu esse gesto, mas quando a enfermeira abriu a boca para responder a porta do seu quarto abriu, revelando um homem alto, com pele escura e olhos igualmente escuros. Amy o achou familiar, mas foi só quando viu a bengala que reconheceu.

—Tio Alistair! — gritou a menina, acreditando que já que seu tio estava lá, tudo estava certo. Amy só o tinha visto uma vez, no casamento de alguma prima distante, mas Grace disse que aquele homem era incrível, e Amy jamais desconfiou das palavras de sua avó.

—Olá, Amélia... — saudou-a o homem, que com um gesto de mãos dispensou a enfermeira, a mesma saiu apressada. — Você está bem? Sente dor?

—Na verdade, um pouco — respondeu a ruiva, olhando para seu braço entubado. — O que é isso?

—Você está no hospital — explicou-lhe seu tio.

—Isso eu sei, tio Alistair, achas que sou burra? — a menina falava rindo, como se quisesse fazer piada de tudo.

—Tenho certeza que não é — o tio concordou.

— Então, diga-me, onde estão meus pais? E a minha vó? — o coração da menina ficou pesado ao ver a expressão no rosto do tio. — Onde está Dan? — ela quase berrou o final, assustada com o rosto do tio.

—Dan está bem, não se preocupe — o tio secou rapidamente algumas lágrimas, tentando fazer Amy não ver, mas era tarde demais.

—Onde estão meus pais? Onde está minha avó? — exigiu, o coração doendo cada vez mais.

—E-eles... — tio Alistair apenas negou com a cabeça, e a garota — que sempre foi esperta demais, segundo o tio — começou a chorar.”

Amy percebeu as lágrimas caindo e ouviu uma cadeira sendo arrastada. Tomando uma lufada de ar, a garota levantou os olhos, encarando um homem que a olhava, atentamente.

A sala onde estava era pequena, apenas alguns armários e mesas de trabalho. Duas cadeiras com rodas embaixo, e dois homens sentados. O cheiro do café preto vinha de uma caneca, em cima da mesa de trabalho de um deles, e o cheiro das rosquinhas ela ainda não sabia da onde.

O homem que a encarava era alto, tinha barba castanha e cabelos da mesma cor, seus olhos eram escuros, como breu, porém tinha uma expressão simpática em seu rosto.

O outro homem estava com o telefone no ouvido, tinha cabelos claros e olhos caramelo. Parecia cansado e Amy localizou sua carteira de identidade entre as mãos dele, a única coisa que Amy levava para todo lugar era aquela carteira.

—A Bela Adormecida acordou, Gared — falou o moreno, sem tirar os olhos de Amy, que estava cada vez mais nervosa com aquele contato visual, desviando seus olhos do rapaz, encarando o chão, o teto... Qualquer coisa que não fosse aqueles olhos marcantes do homem a sua frente.

—Já não era sem tempo, pretendo ir para casa logo! — disse o loiro, largando o telefone e levando sua cadeira até parar de frente para ela.

Foi só então que Amy percebeu que estava deitada em algo duro, com certos relevos, como almofadas de policia — aquelas duras que não servem para nada. Quase com um salto, a garota se sentou, a manta velha que a cobria escorregando em direção ao chão.

Por alguns segundos, ninguém disse nada. Provavelmente eles esperavam que Amy começasse a falar, mas a garota, após olhar para eles rapidamente, fitava suas mãos, como de costume.

—Então... — Gared finalmente quebrou o silêncio. — Quem é você?

Amy sabia que estavam falando com ela, mas as palavras simplesmente não saiam de sua boca.

— Seu nome, apenas diga seu nome — falou o moreno, cujo nome Amy ainda não sabia, sua voz era reconfortante, como quem fala com um bebê, mas Amy não conseguia falar.

A garota levantou rapidamente a cabeça, fitando os olhos do moreno, e baixando a cabeça novamente. Sua mão, tremendo devido ao frio, apontou para a mão de Gared, que segurava sua carteira de identidade.

—Aham... — Gared disse irônico. — E você que que acreditemos que você é ela, sendo que você nem sabe o nome dela — Amy achava aquilo ridículo, sempre achou policias estúpidos, mas nunca pensou que eles não reconheciam uma foto.

—Amélia... — conseguiu dizer, enquanto apertava as mãos — Hope Cahill.

Gared bufou, e Amy ouviu a cadeira dele voltando em direção ao telefone.

—Não ligue para ele — o moreno disse, e Amy o viu levantar-se. — Ele apenas está cansado pois queria estar em casa.. Já faz três minutos que o turno dele acabou, mas só podemos ir embora quando te mandarmos para casa... — ele pegou a manta que estava caída no chão e passou em torno de Amy, que queria poder demonstrar gratidão, mas só conseguia tremer. O tom de voz dele não era bravo ou irritado, como Gared, parecia mais brincalhão. — Quer uma rosquinha e uma xícara de café? Talvez assim você se sinta melhor para falar...

Amy afirmou com a cabeça, notando que seu estômago estava se revirando.

—Aliás, meu nome é Josh — o moreno falou, enquanto abria um armário — E o desse rabugento aqui é Gared, nós te encontramos no parque, sabe... — Amy o viu se abaixar para pegar uma xícara. — Você estava deitada em uma pedra... Totalmente ensopada, e acho que morreria de hipotermia se continuasse ali — ele levantou-se novamente e olhou para ela, que o encarava admirada. — De nada.

Amy queria conseguir sorrir para ele, mas não era capaz... Fazia muito tempo que não conseguia sorrir de verdade...

—Sei que não terei resposta, mas você pode, ao menos, escrever um nome para procurarmos? — ele perguntou, entregando uma xícara de café quente e uma rosquinha de creme nas mãos da garota. — Espero que goste de rosquinhas.

—E-eu... amo — Amy conseguiu dizer, e deu uma pequena mordida na rosquinha, para provar suas palavras.

—Boa garota...

Josh esperou em silêncio até ela terminar de comer, sendo o mais gentil possível na sua tarefa de encará-la. Gared não parava de dar telefonemas, mas era ridículo como não conseguia encontrar ninguém.

Assim que terminou, Amy limpou as mãos no jeans, e as estendeu na direção de Josh, que — quase como combinado — largou um bloco de papel e uma caneta ali.

Amy o segurou e escreveu três nomes:

Alistair Oh (tio/ responsável)

Janet McLiks (atendente do hotel)

Danniel Cahill (irmão)

Amy rabiscou os números ao lado dos nomes, e entregou de volta para Josh, que passou para Gared, que quase cantou de alegria.

Ela terminou de tomar o café enquanto ouvia a frustração de Gared, foi apenas na última tentativa que Amy conseguiu ouvi-lo dizer:

— Olá, aqui é da policia, você conhece Amélia Cahill? — Gared ficou em silêncio, ouvindo a resposta. — Encontramos ela deitada em um parque, alguém poderia vir buscá-la? — pausa para resposta. — Não, na verdade acabou de terminar o meu expediente — Amy queria fugir, com quem ele estava falando? — Desculpe, mas não quero saber onde, raios, vocês estão. Alguém precisa vir pegar essa garota... — Amy se encolheu, com medo de sua própria família a estar negando.

—Ei, Gared, talvez eu possa levá-la — Josh disse sorrindo para Amy, que estava muito vermelha. — Manda o endereço do local.

—Que? — Gared disse ao telefone. — Calado, Josh — ele disse, tapando a parte da fala. — Ok, vamos esperar que este senhor apareça, por favor, seja rápido — Gared desligou e lançou um olhar de raiva misturado com confusão na direção de Amy. — Você é complicada, hein garota? Mas um tal de Ian Kabra está vindo te buscar.