“Senhora Hudson, traga chá!” Gritava uma voz profundamente autoritária, proveniente do famoso – e arrogante! – detetive do apartamento de cima, que estava observando algo no microscópio, tenho certeza. “Não sou tua empregada!” Responde uma voz feminina e geralmente doce, da senhora que administra os apartamentos da Rua Baker. Desde que me mudei para o apartamento 221C, é praticamente só isso que escuto, e não faz muito tempo. A mesma senhora me convida todos os dias para o chá da tarde, ela é muito terna, é como uma avó que não poupa esforços para ver quem ama feliz, e eu me sentia bem em sua companhia, e na do doutor Watson. No entanto, se tinha alguém com quem eu não ia com a cara, era justamente Sherlock Holmes. Seus modos e arrogância me tiravam do sério, e eu só lhe falei duas vezes!

Oh, eu não me apresentei, perdão. Me chamo Anne White e, sou balconista no Starbucks, porque né... Quem resiste a um bom café... Principalmente naqueles copos?

Naquele mês de setembro, houve uma sexta-feira tão linda que precisei tomar parte, até visitei meus vizinhos! “Senhorita White, que agradável surpresa! Espero que esteja bem.” Sorrindo largamente, assenti e respondi que estava muitíssimo bem, que meu humor estava excelente – e isto é algo raro. Perguntei se Holmes estava em casa, apenas para me certificar. “Sherlock está em um novo caso, talvez volte à noite. Gostaria de falar-lhe?” Não pude evitar um riso zombeteiro e logo em seguida completei “Meu dia está bom demais, obrigada.” Pelo semblante do doutor, ele não entendeu nenhuma palavra minha “Quero dizer que apenas a visão de seu amigo estragaria meu dia.” Recebi um “Oh sim, não posso negar que ele tem o dom de estragar o dia de qualquer um.” Mas notei o quão desconfortável ele ficou. Sinceramente, achei estranho que apenas Holmes estivesse resolvendo seja lá qual caso, mas não mencionei, nem mencionaria isto. “Bem, é sempre um prazer conversar com o doutor, já vou indo.” Nos despedimos com um caloroso aperto de mão seguido de um “A senhorita pode me chamar de John, está bem?” Repouso as mãos na cintura e faço uma pequena chantagem. “Apenas se passar a me chamar de Ann, de acordo?” John fez uma reverência e foi abrir a porta para mim, neste instante nos deparamos com o detetive em pessoa. Instintivamente, dei um passo pra trás, proferindo um sonoro “Céus, parece assombração!” Por incrível que pareça, a assombração abriu seus lábios em um meio sorriso, que seria uma gargalhada se não houvesse ninguém por perto. “Senhorita White, já de saída? O que a trouxe aqui?” Pronto, meu humor mudou da água pro vinho, até parece que o céu tornara-se cinza! “Minhas pernas me trouxeram aqui, tá bem?! Agora dê-me licença.” John não pôde segurar o riso, enquanto o outro ostentava uma expressão de orgulho ferido que lhe caía muito bem.

Saí em disparada, nem me recordei que havia uma escada para descer, e acabaria caindo com tudo, não fosse uma mão me resgatando. Me levantei e ajeitei minha roupa, sem nem olhar na cara de meu salvador. “Agradeço por não permitir que eu beijasse o chão-“ Ao olhar para cima, me dou conta... “-Senhor Holmes.” Minha expressão agora era puro desgosto. “Não há necessidade de agradecer-me. Seria muito ruim para minha reputação se deixasse um acidente ocorrer à minha porta.”

Chute na canela

Soco na boca

Fuga desesperada

Coração acelerado

Olhos estreitos

Narinas dilatadas

“Você me irrita tanto, Holmes...”

“Foi um prazer vê-la também, White.”