Eren observava a mulher se atrapalhar com as sacolas de compra enquanto seu filho mimado a sacodia de um lado para outro, implorando aos berros.

— Mas mamãe, eu queria tanto o cereal ruffles — o garoto gritava atracado à mãe — Todos meus amigos que compraram dizem que ele vem com a miniatura do megatron. Todos meus amigos tem menos eu, POR FAVOR.

Ele fez uma careta.

Eren teve que intervir.

— Senhora, eu peço que controle seu filho. Você está atrapalhando o fluxo de clientes que estão na fila logo atrás — Eren tentava demonstrar a sua insatisfação com a mulher de um modo não ameaçador. Para isso, tinha utilizado de seu sorriso apreensivo que tanto havia treinado até o aperfeiçoar.

Regra número um ao lidar com clientes: não os pressione, mas também não os dê abertura. Havia aprendido aquela lição rapidamente desde que fora trabalhar ali. Não podia arriscar perder daquele emprego naquele momento de sua vida.

A mãe observava o garoto fazer seu showzinho, quando parou para notar que todo mundo no estabelecimento a estava encarando. Os clientes logo atrás de si demonstravam a sua insatisfação com rostos ranzinzas e cenho franzido.

A mulher, então, pediu para que o menino corresse para pegar o pacote de cereal o qual tanto pedira. Ele voltou sorrindo, como se tivesse ganhado na loteria.

— A próxima vez que você me fazer passar vergonha em público eu juro que arranco seu coro fora, tá me entendendo? — A mulher tirou seus sacos do carrinho e entregara para Eren que, após conferir o preço de tudo, empacotou e devolveu para ela.

— Tenha um bom dia — disse Eren, aliviado pela mulher finalmente ter dado vaga para o próximo.

Durante os meses desde que havia conseguido o emprego no Walmart local, Eren aprendera que a paciência é a chave para lidar com os clientes problemáticos, caso contrário você teria muita dor de cabeça. Cartões de crédito, produtos vencidos, perda de aparelhos telefônicos, todos eram pequenos problemas que, se não fossem tratados com cuidado, acabariam se transformando em verdadeiras bolas de neve.

Houve uma vez em que uma estagiária, Historia Reiss, responsável pela limpeza do chão do supermercado, esqueceu de enxugar completamente o chão, o deixando escorregadio. Uma senhora de idade avançada havia escorregado e quebrado alguns ossos da coluna, devido ao seu estado avançado de osteoporose. Como resultado, Historia fora demitida e o estabelecimento sofreu um processo por parte da família da mulher.

A família conseguiu vencer na justiça e o estabelecimento teve que pagar uma indenização bem gorda para a mulher. Eren soube que, até hoje, Historia não tinha conseguido arrumar outro emprego.

Desde desse dia, os funcionários faziam de tudo para evitar o menor deslize para não acabarem no olho da rua. Seus menores movimentos estavam sendo vigiados, e não poderiam arriscar acabar no olho da rua, principalmente com o momento em que o estado de Massachusetts enfrentava. E é claro que isso afetava Boston diretamente, assim como todas as suas áreas. O desemprego estava em alta e agora, mais que nunca, ter um emprego era uma dadiva que apenas poucos desfrutavam. Principalmente aqueles que não tinham um ensino superior como Eren.

Após o fim de sua jornada de trabalho, a qual ia de 14:00 às 19:00, Eren fora para o banheiro dos funcionários se trocar. Ele colocou sua roupa de funcionário em cima da pia do banheiro e vestiu as que tinha guardadas em sua mochila. O jeans, a camisa polo por debaixo de um casaco marrom claro e uma bota marrom escuro já eram quase sua marca registrada, sendo difícil se imaginar usando uma combinação diferente de roupa.

No espelho do banheiro, seu reflexo mostrava um rapaz que muitos não chutariam ter a idade que tem. Eren ainda apresentava traços característicos da sua adolescência, como seu aspecto franzino e rosto fino, principalmente seu queixo. Seus fios de cabelo castanho escuro estavam oleosos devido ao tempo de trabalho e seus olhos verde-azulados denunciavam a vermelhidão causada pelo longo tempo em que passara frente ao computador do caixa.

Depois de colocar tudo em sua mochila, se dirigiu para o estacionamento onde sua bicicleta se encontrava. Era uma Aro 26 que havia conseguido em um site de compra de usados. Apesar de ser de 2º mão, a bicicleta não o tinha deixado na mão. Era seu bem mais valioso e uma das poucas coisas que tinha comprado sem a ajuda dos pais.

Ele colocou a mochila nas costas, seus fones no ouvido e partiu pedalando rumo à rodovia 150.

O aleatório caiu em A Sky Fullof Stars do Coldplay.

✳️✳️✳️

Forest Hills era uma das poucas áreas de Boston que não tinha se rendido completamente a industrialização. Haviam longos hectares de áreas verdes por todo o seu lado, em contraste com a capital.

Ele retirou seus fones de ouvido ao perceber uma grande fileira de carros parados na estrada. À sua frente, as luzes dos carros ao lado da rodovia representavam um enxame de buzinas tocando, como uma orquestra barulhenta e sem ritmo.

— Não vou poder chegar na hora combinada porque a droga da rodovia foi interditada, parece que um idiota causou um acidente. — Ao seu lado, um homem de terno em uma porsche vermelha com o vidro abaixado falava furiosamente no seu celular.

Ótimo.

Felizmente estava de bicicleta, então poderia pegar algum desvio que o levasse para a 151, onde seguiria direto para sua casa.

Pensou por algum tempo até se lembrar do pequeno caminho de terra que passava pelo cemitério de Forest Hills. Uma vez, ele e alguns amigos haviam pegado o caminho, como parte de um daqueles desafios infantis que crianças desocupadas fazem. No colégio, existia um mito do qual o cemitério era amaldiçoado por um espírito que vinha ao plano dos vivos levar a vida daquele que olhasse no fundo de seus olhos negros e vazios.

Mas aquela era apenas história para boi dormir. Além disso, Eren não tinha medo do lugar nem quando fora criança. Aquela história toda de entidade sobrenatural era bobagem. Na verdade, o cemitério era considerado um ponto turístico de Forest Hills por pertencer a era vitoriana. Várias personalidades relativamente conhecidas como William Lloyd Garrison e James Freeman Clarke foram enterradas no lugar.

Eren mudou o percurso da bicicleta e seguiu em direção ao caminho de terra que havia ao lado da rodovia.

As luzes dos carros logo são deixadas para trás e o asfalto começava a dar lugar a árvores e vegetação nativa que eram comuns da região. Após algum tempo, seus pés começavam a dar sinal de calos sendo formados. O chão de terra fofa da estrada tornava dificultoso para a bicicleta prosseguir, sendo necessário um esforço extra e às vezes levantar em determinadas partes lamacentas.

Já estava exausto quando conseguiu ter a vista do cemitério. Parou perto da entrada e encostou a bicicleta para descansar.

Na sua frente, se encontravam grades de ferro pontudas que circundava toda a área retangular do lugar. O tamanho do local deveria ser equivalente a dois shoppings de tamanho médio. Ao longo da planície gramada, haviam centenas de túmulos e também alguns mausoléus, provavelmente pertencentes a pessoas de famílias ricas. Apesar da distância do local da área urbana, haviam postes de luz por toda a sua extensão.

As pernas de Warren não aguentariam nem mais um minuto de pedalada, então resolveu descansar enquanto explorava o local.

O céu estava limpo, sendo possível se admirar o amontoado de estrelas, o que não era muito comum em metrópoles como Boston, devido a grande quantidade de poluição emitida pela cidade. A lua estava cheia e casou perfeitamente com o céu estrelado. Os túmulos eram alinhados de forma que a área para caminhar formasse uma cruz.

Parou em frente a um túmulo que identificou com o nome Sasha Blouse.

Sasha Blouse

1810-1876

Em memória à Sasha Blouse, mulher que sempre será lembrada como uma revolucionária que batalhou pelo direito das mulheres em uma época em que muitos tinham medo de lutar por seus direitos.

R.I.P.

Após ler, Eren caminhou para um outro túmulo.

Jean Kirstein

1907-1961

Sempre quando olharmos para o céu, nos lembraremos de seu sorriso e sua empatia com aqueles em sua volta e sua família. Um homem que impactou a vida de todos aqueles que o conheciam de forma profunda. Nunca o esqueceremos.

R.I.P.

Como será a sensação de morrer? Apesar do temor da maioria das pessoas em relação a morte, Eren olhava a ideia a partir de uma perspectiva um tanto quando diferente. Depois da morte, existiria um plano existencial superior ou você só desaparecia do mundo? Essas questões sempre o fascinava, apesar de não achar que seria muito diferente da vida que leva atualmente.

A verdade é que ele sempre se sentiu como um intruso nesse mundo. Desde criança teve a sensação que fora um intruso na sua família, como se sua presença ou a ausência dela não fosse impactar a vida de ninguém. As vezes, sente como se estivesse apenas existindo. Nunca havia se apaixonado por ninguém ou criado laços com outra pessoa, especialmente com sua família. Eles haviam escolhido seu irmão, Nick, como o verdadeiro filho e o deixado para trás no caminho.

Apenas deixar de existir.

Seus pensamentos são interrompidos por um súbito ruido de passos. Ao se virar, a alguns metros de Eren, uma figura de terno enfeita a paisagem noturna do cemitério.

Quem?

Apesar da distância, ele pode identificar que se tratava de um homem. Estava caminhando, parecendo conferir os túmulos.

Mas a essa hora o local deveria estar completamente vazio, a não ser que fosse o dia dos mortos... O homem não pareceu ter notado a presença dele.

Erem concluiu que fosse o coveiro do local. Checou a hora no seu celular e marcava as 21:00.

Droga.

Então, refez o caminho para a entrada.

Após alguns minutos andando, Eren teve a impressão que o local parecia ter ficado maior. Começou a se preocupar e apressar o passo, até perceber que estava correndo.

Estava andando em círculos. O lugar parecia não ter fim, como se fosse infinito ou algo do tipo. Ele pegou o seu celular, mas checou que o sinal havia desaparecido.

Estranho, até a pouco o sinal estava em todos os pontos...

Repentinamente, sentiu uma mão fria tocar seu ombro. Todo seu corpo paralisou e os pelos do braço se enrijeceram. Ao virar, deu de cara com o homem de terno. De perto, notou que era um terno de mordomo e não os comumente usados por homens de alto nível social.

Sua pele era pálida como a lua. Usava luvas brancas em conjunto com o terno e a calça social combinando. Seus cabelos eram negros como a noite e caídos, cortados em formato sidecut, quase cobrindo os olhos. O local em que ele havia tocado estava gélido como neve de inverno, assim como seu corpo, cujas ondas geladas emitidas lembravam uma geladeira aberta. Os olhos eram o que mais o prendia. Eram completamente cinza e vazios, como se pertencessem a uma boneca sem vida.

— É perigoso andar por essas bandas sozinho a essa hora – disse ele delicadamente. As suas voz fez com que uma sensação estranha fosse produzida em seu corpo. Quase como se várias borboletas estivessem batendo asas naquele exato momento em seu estômago.

Erem não conseguia formular nenhuma palavra. Nada fazia sentido. Como o homem havia chegado ali se a poucos minutos estavam longe um do outro. E como não tinha percebido a sua aproximação?

— Vo-vo-vo-você é o coveiro?

O homem pareceu surpreso.

— Podemos dizer que sim.

Eren engoliu o seco. Sentia a

— Poderia me levar para a entrada... acho que acabei me perdendo.

O homem parece devanear sobre algo, como se tivesse pesando dois pesos de uma medida e decidindo. Logo em seguida, respondeu:

— Não.

Eren vacilou com os olhos completamente abertos.

— Como assim... não!?

O coveiro sorriu, exibindo seu par de dentes brancos e perfeitamente alinhados.

— Brincadeirinha. Se você virar vai dar de cara com a saída.

Eren fez o que foi dito e o que viu o deixa a beira de um surto. Logo a sua frente, estava a entrada do cemitério de Forest Hills.

— Ma-ma-mas até uns segundos atrá-trá-trás.

Sua mente estava um caos. Não existia nenhum modo com o qual Eren não tivesse visto a entrada. Havia alguma coisa muito errada com aquele lugar.

— Tem certeza que você está bem? — disse ele sorrindo, como se aquela situação fosse a coisa mais normal do mundo.

Eren não fez questão de responder e saiu correndo do lugar, deixando o homem para trás. Sua bicicleta estava no mesmo lugar em que havia deixado. A pegou e, então, pedalou como se a sua vida dependesse daquilo.

✳️✳️✳️

Eren chegou na rodovia 151 e partiu rumo à sua casa. Ao chegar, como imaginava, seu pai e sua mãe não tinham notado que havia chegado mais tarde que o usual. Estavam sentados no sofá da sala assistindo aquele estúpido programa de culinária que sempre assistiam.

— Cheguei — falou, ao entrar pela porta de casa.

Os dois continuaram com a sua atenção voltada para a TV.

Obrigado pela consideração.

A cozinha estava vazia. Teria que preparar seu jantar, já que suspeitava que sua mãe havia feito o suficiente apenas para ela e seu pai. Porém, não estava com psicológico bom o suficiente para cozinhar. Pegou uma daquelas embalagens de macarrão instantâneo, ou como gostava de chamar, câncer enlatado, ferveu água e misturou os dois juntos. Então, levou para o seu quarto.

Ao terminar de comer o macarrão instantâneo, ele deitou na cama, tentando dormir. No entanto, a única coisa que conseguia pensar era naquele homem. Parecia que todas as células em seu corpo estavam o puxando para o encontro dele, como um imã magnético misterioso. E excitante.

Ele levantou e checou se sua porta estava fechada com a chave.

Eren abriu o flexiquer de sua calça.

Começou a pensar no coveiro. Sua aura era sombria era inebriante. Como se sua presença fosse o bastante para o deixar em um coma álcoolico por uma semana inteira. Seus músculos saltavam de seu terno, denunciando o bom porte físico.

Seu membro ficou duro.

Eren começou a puxar-lo com as mãos, para cima e para baixo. Em alguns minutos, a sua mão estava cheia de gozo.

Ele dormiu.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.