BitterSweetheart

Capítulo 5 – No terraço


Anne

– Anne, você é jovem e linda. Não pode ficar enterrada em casa. Tem que ter muita vontade de se divertir. Vem aqui – A morena me pegou pela mão e foi me puxando. – Vou te mostrar como viver é bom.

– Onde você está indo? Aonde vai me levar? – Eu estava realmente nervosa, não consegui controlar minha respiração nenhum minuto desde que ela se aproximara de mim. Só percebia o seu perfume no ar, seus cabelos castanhos e lisos, seu olhar interrogador no meu. Eu não sabia como me controlar junto a ela e ela parecia perceber meu medo, mas não interpretou da forma correta.

– Não esquenta. Só vou descobrir se posso subir em um lugar que vi lá de fora. – Se virou para o bartender. – Guarde minhas bebidas que eu volto em um minuto.

Ela correu me puxando até o fundo da boate e puxou um segurança pelo braço. Eles trocaram algumas palavras e eu a vi sorrir e pegar na mão dele. Não pude deixar de reparar que Carla deixou um papel na mão do segurança que o colocou logo no bolso.

– Consegui. Eu adoro fazer isso, vem comigo. – Ela estava radiante e eu enciumada. Ai meu Deus, enciumada? O segurança abriu uma pequena porta de serviços que dava acesso a um pequeno terraço onde havia um pára-raios.

– Você deu seu telefone ao segurança? Vai sair com ele mais tarde só para subir em um terraço? – Espere, eu estava tendo uma crise de ciúmes, não estava?

– Em que mundo você vive, Anne? Nem tudo se resume a sexo... Na verdade é a dinheiro que o mundo se resume. Eu dei grana a ele. Não meu telefone.

E mais uma vez eu me senti uma idiota. Era incrível como isso acontecia com frequência desde que conheci Carla. Tentei disfarçar e olhei para baixo. Grande erro! Senti meu corpo todo congelar e uma onda de pânico me invadiu. Era muito alto! Voltei para a porta correndo muito assustada. Vi que Carla já subia por uma escada até um pequeno tablado em baixo do pára-raios.

– Você está louca? Isso é muito perigoso.

– Eu sei. E é aí que está a graça. Sobe aqui e sente o vento no seu rosto. Isso sempre me faz pensar no que realmente importa e me mostra como a vida tem coisas a nos oferecer, mesmo nos lugares mais inesperados. – Ela deve ter visto minha cara de pânico de quem não estava muito disposta a subir. – Deixa de ser frouxa e vem logo.

Eu não tinha a menor intenção de subir ali. Odiava altura. Eu apenas fazia sinal de negativo com a cabeça, totalmente birrenta, mas Carla abriu o sorriso mais sincero e meigo que eu já tinha visto enquanto me estendia a mão.

– Confie em mim.

E era esperado que eu resistisse a isso? Nem no meu melhor sonho eu resistiria àquele sorriso, segurei sua mão e subi. Meu medo dominava cada nervo e eu nem conseguia abrir os olhos. O vento era muito forte ali e parecia sacudir todo o tablado dando a sensação de que ele despencaria a qualquer momento. Eu tremia.

– Você está com tanto medo assim? Pára de pensar tanto nos riscos e viva mais as emoções, loira. Quantas vezes você teve uma visão tão linda como a daqui? Aposto que nenhuma, porque você deve estar sempre com os olhos fechados pelo medo como agora. Abra os olhos e aproveite o que a vida tem de melhor. – Ela segurou forte na minha mão e se sentou atrás de mim, encaixando seu corpo no meu com uma perna de cada lado. Apoiou o rosto no meu ombro e sorriu. Aquilo causou uma onda tão forte de arrepios e tremores por meu corpo que eu tive que agradecer muito pelo vento forte... Ela achou que fosse o frio e o medo que causara aquilo. – O que essa mulher ta fazendo comigo? Pensei, enquanto ela continuava seu discurso de “fazer a Anne abrir os olhos”. – Você só vai ter vontade de ganhar se souber o que está perdendo. É por isso que você não tem vontade de se divertir, você nunca se arriscou. Abra os olhos, Anne.

Parece idiotice, eu sei, mas me senti incrivelmente segura com a presença dela. Suas palavras bateram fundo, nunca achei que fosse tão transparente assim, mas aquela menina acabara de entender a maior parte da minha personalidade na segunda vez que me viu. Senti uma súbita vontade de ouvir seus conselhos e me arriscar. Abri os olhos aos poucos e, de verdade, senti vontade de chorar. Era lindo. Uma das coisas mais lindas que já tinha visto. A cidade se estendia aos meus pés, as luzes formando um tapete brilhante como quilômetros de infinitas estrelas à frente. O vento soprava alto nos ouvidos, abafando o som da boate e de todo o resto. A cidade toda era como o meu reino e ali só existíamos eu e a morena perfeita que me abraçava e segurava minhas mãos. Mal acreditei que aquele momento estivesse realmente acontecendo. Era perfeito demais. Não havia sonhado com algo tão lindo nem no meu maior devaneio com essa mulher. O momento mágico se quebrou num segundo quando ela simplesmente me soltou do seu abraço e desceu dali. A proteção foi levada e o medo tomou conta de mim novamente.

– Você está indo muito bem. Agora tome o controle da sua vida. Desce daí e vem se divertir porque estão todos te esperando lá dentro. Você tem muito a fazer essa noite ainda.

– Carla não me deixe aqui! Ajude-me a descer! Caralho, eu não consigo descer sozinha.

– Você consegue tudo que desejar. Basta querer de verdade. Vem loira. Estamos te esperando. – E entrou. Pude vê-la ir em direção ao bar antes que a porta se fechasse completamente e eu ficasse ali, desprotegida e tremendo de medo, sem nem mesmo conseguir me mexer. – Eu mato essa morena. Eu vou esganá-la.

Carla

– Achei que tinha fugido com alguém. Você demorou horrores. Tava pegando quem? – Gui não poderia deixar de tentar me arrancar verdades.

– Ninguém! Eu encontrei a Anne e estava convencendo-a a vir para cá. Mas eu ainda vou pegar alguém hoje. – Disse isso sem conter o olhar malicioso na direção de Claudinha.

– A Anne ainda está? Onde ela está?

– Deve estar chegando por aí.

– E me diz safada... Em quem você está de olho?

– Eu vou pegar essa sua amiga, a Claudinha. Ela é linda.

– E como você vai fazer isso? Ela é hétero, amiga.

– Mas não ficou com nenhum cara aqui. E tem vários loucos para fazer isso. Não me importa se ela é hétero. Eu dou meu jeito e ganho um beijo dela hoje. – Opa! Eu devia ter percebido que ela estava logo atrás da gente e pôde escutar tudo? Se eu tivesse vergonha na cara talvez eu devesse sim...

– E como você acha que vai fazer isso?

– Caramba... Você ouviu Claudinha? – Gui sorriu sem graça e foi saindo para falar com Caio. Olhei nos olhos dela com desejo, sem medo de demonstrar o quanto a queria naquele momento. Como ela não desviou o olhar me senti segura para me aproximar lentamente, um passo de cada vez.

– Sei lá... Eu faço fazendo.

– Mas e se eu não gostar de mulher, como faz?

– Não precisa gostar, é só um beijo. Você descobre se gosta depois. – Cheguei perto o suficiente para segurar sua cintura, puxei-a devagar e colei nossos corpos. Mordi os lábios e aproximei-os dos dela, observando atentamente sua reação. Claudinha não parecia querer me afastar, então dei um selinho e esperei alguns segundos. Como ela não fez objeções e nem mesmo rolou aquele tapinha básico, eu a beijei intensamente e, claro, ela retribui. Ficamos por um longo tempo ali, “quase nos engolindo” como me disse Gui mais tarde, até que uma voz rouca e melodiosa desviou minha atenção do beijo da morena nos meus braços.

– Cara cadê a novata? Eu mato aquela menina, Gui.

– O que ela fez, Anne?

– Me deixou no terraço no alto de um tablado. E eu tenho muito medo de altura. – Anne parecia muito, muito irritada mesmo.

– Então como você foi parar lá? – Disse Gui sem entender nada do que estava acontecendo.

– É uma longa história, só me diz cadê aquela garota para que possa esganá-la.

– Cara, garotas adoram longas histórias! Não é um bom momento agora Anne. – Ele fez sinal com a cabeça paro lado onde eu estava com Claudinha.

Anne

Naquele momento senti meu mundo cair. Toda minha irritação sumiu e me veio uma súbita vontade de chorar. Como ela pôde fazer isso? Me dizer todas aquelas coisas e se agarrar com a primeira pessoa que passou pela frente?

– Então, eu já vou Gui. Minha noite está uma merda mesmo. – Eu não queria que ninguém percebesse como eu fiquei e muito menos por quem eu fiquei assim. Já estava saindo quando decidi aceitar o conselho daquela cobrinha e tomar as rédeas da minha vida. Voltei, fui até Carla e falei baixinho em seu ouvido. – Muito obrigada por me deixar lá. Eu tive que gritar até que o segurança tirasse de lá. Minha sorte foi que a música parou depois de uns dez minutos e ele conseguiu me ouvir. – Me virei e sai batendo o pé e bufando de raiva.