— Você está bem? — A Ana perguntou, me tirando de meus pensamentos. Estávamos caminhando para casa.

— Aham. Foi só um enjoo. — Expliquei, mas sem olhar pra ela.

— Não tava falando disso. Você está estranho. — Suspirei. Como poderia esconder?

— Não se preocupe. É só cansaço. — Menti. Ela parece ter acreditado (ou pelo menos fingido que o fez), porque deu de ombros e não falou mais nada.

Cheguei em casa e imediatamente subi para o meu quarto e me atirei na cama. Crow estava dormindo e acordou com o susto, depois ficou reclamando com grasnados e bater de asas. O tirei da gaiola, e o mesmo se acalmou.

— Está meio frio hoje... — Falei comigo mesmo, fechando a janela junto com a cortina e me enrolando num cobertor: Era hora de uma boa maratona de video game.

Eu ainda tinha meu Super Mimtendo, que tinha ganhado quando criança, e ainda jogava muito nele — Mesmo tendo outro console mais atual que tinha vários jogos velhos adaptados e refeitos. Fazer o quê, era uma mania minha, que eu não abandonaria tão cedo.

Ouvi alguns barulhos vindos de fora, mas não me importei. Sabe, meus vizinhos eram as pessoas mais barulhentas do mundo, seja ouvindo música, reformando a casa, o cachorro latindo, qualquer coisa. Se bem que daquela vez não parecia um cachorro latindo nem nada daquilo... Ah, mas quem se importa, né?

Ignorei o mundo a minha volta e fiquei jogando em torno de 5 horas, até o barulho começar novamente. Estávamos numa época em que o sol se punha cedo, então já estava começando a escurecer, porém o barulho retornara. 5,10 minutos com esse ruído incessante e chato. Irritado, levantei e olhei pela janela.

─ NIIIIIIIIIIIIIIICK! ─ Alguém me chamava lá embaixo. Esfreguei os olhos para poder ver melhor(ficar tanto tempo no escuro em frente à uma televisão não é o melhor para sua vista). ─ Caramba, você demorou!

Olhei para a telha da casa: Estava cheia de pedrinhas. "Ela estava jogando pedras na minha janela?!"

─ Ana, eu agradeceria se você não fizesse que nem vê nos filmes. Minha janela poderia ter quebrado! Eu tenho uma campainha e um celular! ─ Resmunguei, e ela cruzou os braços.

─ Não importa, desce aqui. Mas não deixa ninguém te ver. ─ Comecei a suspeitar o que ela estaria planejando, mas fiz o que dissera. Sem fazer barulho, desci as escadas e dei uma olhada em volta da sala. Minha mãe não estava lá, provavelmente no banheiro ou em seu quarto. Continuei o caminho e passei pela porta.

─ O que foi? ─ Bocejei.

─ O que estava fazendo? Vim mais cedo mas você não deu sinal de vida... Enfim, vamos pra algum lugar? Eu estou morrendo de tédio. ─ Ela se sentou na mureta que ficava ao lado.

─ Você poderia: Ter me ligado, mandado mensagem, ligado pra minha casa, mas nããão, tem que complicar tudo! ─ Reclamei mais uma vez.

─ Ah, você parece um velho chato! Eu te liguei, sim, mas você não atendeu. E se eu quisesse que seus pais soubessem que você saiu eu não teria mandado você vir escondido, né cabeção?

─ E pra quê tanto segredo? ─ Arqueei as sobrancelhas.

─ Porque é mais legal assim! ─ Suspirei ─ E além do mais, sua família está meio apreensiva, não? Não acho que deixariam você sair, ainda mais nessa situação.

─ É, pode ser... ─ Cocei a cabeça. ─ Mas vamos sair daqui antes que descubram.

Fomos até a praça perto dali, para então decidir onde ir de verdade. Conversamos sobre coisas comuns do dia-a-dia no caminho, porém...

─ Ei, Nico... ─ Ela chamou.

─ Já disse pra me chamar de Nick.

─ Que seja. ─ Ela andava com as mãos nas costas. ─ Você conhece o Gustavo, né?

─ Já conversei com ele algumas vezes... Por quê? ─ A fitei, curioso.

─ Ah... É que ele... Parece... Um cara legal, sabe? ─ Ela parecia... Envergonhada? "Pera aí... O Gustavo não sentava na minha frente?".

─ Não me diga que você... Você gosta dele? ─ Perguntei, surpreso, mas não obtive resposta. Ela apenas virou o rosto. Era mais que óbvio. ─ ... Entendi...

Não sei se depois daquilo eu seria capaz de sorrir, pelo menos por aquela noite. Era isso a tal "friendzone"? Não era tão engraçada quanto na internet, pelo jeito.

De qualquer forma, não importando o que acontecia, eu tinha que ficar cauteloso. Meus pais tinham razão em se preocupar, porque se eu me descontrolasse ali seria um grande problema. De noite, pessoas indefesas nas ruas, estabelecimentos cheios de gente, muita coisa poderia dar errado.

Minhas ações expressavam bem o que estava sentindo, e eu sabia disso, não podendo evitar. A garota do meu lado começavaa ficar incomodada com esse fato, e, num suspiro, olhou para mim e começou a falar:

─ Escuta, se você ficar com medo demais, não vai dar pra curtir. Relaxa. Está tudo bem, não dá em nada. ─ Ela deu um sorriso que ajudou a eu me tranquilizar, mas não muito. ─ Você quer voltar? Nós podemos ver um filme ou sei lá, na sua casa ou na minha mesmo.

─ ... Acho que é melhor assim. ─ Falei, depois de pensar um pouco.

─ Uff, você é um chato. Vamos pra sua casa, então. ─ A Ana falou, visivelmente decepcionada.

Paramos em uma loja pra comprar um filme(de aventura, ambos nós dois não gostávamos de romance ou coisas do tipo), para depois seguirmos para casa. Não tínhamos ficado fora por mais de 20 minutos, então provavelmente ninguém ficaria bravo comigo.

─ NlIIIIIIIIIIIIIICOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO! ─ "Acho que me enganei..." Pensei, logo depois de abrir a porta e uma mãe furiosa se aproximar. ─ Onde você estava?!

─ C-Conversando com a Ana aqui fora... ─ Menti, coçando a nuca.

─ Isso é verdade? ─ A mulher olhou para a garota, que assentiu com a cabeça. ─ Tudo bem então. Seja bem vinda.

Uma expressão amigável e acolhedora tomou conta de sua face, tanto que desacreditei que fosse a mesma pessoa.

"Depois eu que sou o bipolar..."