Betrayed

Queda livre


O helicóptero para.

Max e eu tiramos os cintos, mas nenhum de nós sai. A realidade do que está acontecendo me abate, e eu fico atordoada. Cheguei aqui, mas não tenho a mínima ideia do que fazer, por onde começar. Estou desarmada, machucada, abalada pelo desespero de perder a última coisa mais próxima de uma família que já cheguei a ter.

Devo começar a tremer, porque Max pousa a mão em meu pulso. Eu me afasto rapidamente, saindo do helicóptero para o ar frio cortante da noite. Pergunto-me quanto tempo se passou desde que deixamos nossa garagem.

Há dois prédios de tijolos altos e largos onde paramos, bem próximos um do outro, que parecem ocupar o espaço até o outro lado da ilha onde Natalie e Drake pousaram, onde a bomba está.

Max para na minha frente depois de uns minutos.

- Você não pode aparecer para eles ainda. Dar a volta não é uma opção, há soldados armados no perímetro. – Max olha para trás, para os dois prédios de tijolos. – Este lugar já foi uma fábrica. Acho que tem alguma escada grande o suficiente lá dentro.

- Uma escada? – pergunto. – Pra quê?

Então entendo. Posso não ser a pessoa mais esperta do mundo, mas só de seguir o olhar de Max sei o que ele quer que eu faça. Antes não havia notado direito, porém, os dois edifícios estão tão perto um do outro que em um andar mais alto duas janelas parcialmente grandes ficam no mesmo nível. É possível passar de um para outro. Se uma escada for usada.

- Tudo bem. Eu pulo – digo, assentindo. – Tem alguma arma sobrando?

- Não. – Ele parece constrangido por um momento. – Entreguei a de Drake a Vicent Foster para não levantar suspeitas. Vamos, eu te ajudo a puxar a escada.

- Me diz uma coisa antes – falo. Sei que não é hora para perguntar ou me preocupar com isso, mas sinto que se não tiver certeza vou explodir. – A história que você me contou... sobre o seu passado... algo daquilo era verdade?

Max olha para mim com ternura.

- Era, eu juro. Algum dia vai voltar a acreditar em mim?

Não o encaro nos olhos.

- Você se certificou de saber tudo sobre mim – acuso. – Você perguntou até do que eu tinha medo para saber onde tinha que atingir. Você dormiu comigo, e depois me traiu. Não pode esperar que as coisas voltem a ser como antes tão fácil assim.

Max assente, ainda me olhando.

- Vamos atrás da escada.

Corremos até a porta enferrujada do primeiro prédio. Max a arromba com o ombro e nós entramos. Um arrepio me percorre a espinha só de imaginar fazer qualquer coisa com meu ombro esquerdo numa hora dessas. Afasto a ideia da cabeça. Vislumbro um soldado enorme carregando um rifle atravessado nas costas do lado de fora, rezando para que não nos veja.

Resolvemos nos separar para procurar no meio do entulho. Combinamos de gritar quando acharmos a escada e eu duvido que alguém vá ouvir. Só o tanto de coisas inúteis espalhadas pelo interior pode abafar qualquer ruído que venhamos a fazer.

De início, ando olhando atentamente dentro de todas as salas, procurando no meio dos destroços. Mas demora muito, estou perdendo tempo e nada se destaca. Começo a correr. Restos de máquinas, pedaços cortados de fios desencapados, caixas de papelão mofadas, peças quebradas inutilizadas sabe-se lá há quanto tempo estão espalhados pelo chão ao longo de corredores.

Respiro pesadamente, arfando. Subo vários andares às pressas, tropeçando nos degraus até perder a conta de quanto já corri. Minhas pernas gritam de dor pelo esforço, meus pulmões ameaçam serrar minhas costelas para absorver oxigênio, minha barriga e meu ombro queimam.

- Jennifer! – Ouço Max gritar de um ponto um pouco abaixo de mim. – Achei! Onde você está?

- Aqui! – grito de volta.

Dois minutos e vinte e quatro segundos até ele me encontrar, segurando debaixo do braço uma escada de metal dobrável. Contei o tempo para me manter calma, mas não adiantou muito.

- As janelas ficam dois andares acima – diz Max, respirando fundo com o peso.

Subimos apressados e logo estamos em frente a janela na altura da outro do prédio vizinho. Quebro o trinco e ergo o vidro com o braço direito. Sou suficientemente magra para me esgueirar pelo espaço, isso não será problema. Abrimos a escada, e Max a joga para a outra janela, que graças a Deus está aberta. Max segura nossa ponta da escada para firmá-la desse lado, mas não há nenhuma garantia do outro.

Respiro fundo. Pulo para o parapeito, deitando sobre os degraus para conseguir maior equilíbrio. Troco um olhar com Max antes de começar a me movimentar. Olho para frente, só para frente. Preciso fazer isso.

Agarro o primeiro degrau, tomando o cuidado com as pernas. Avanço devagar, prestando atenção onde seguro. Lanço um olhar de esguela para a ponta da escada na janela da frente, que treme no concreto, ameaçando escorregar dali a qualquer momento.

Estou na metade do caminho. Mais dois metros e eu chego.

A escada desliza centímetros para a esquerda.

- Jennifer!

Contenho o grito de horror por pouco. Meu estômago se revira. Minha perna direita que eu estava impulsionando para frente quando a escada mexeu agora paira no ar. Apertei os degraus com mais força no susto, o que fez com que uma pontada latejante de dor transpassasse meu ombro.

Não consigo evitar olhar para baixo, ainda paralisada. A queda é de mais de sete metros até o chão. A escada continua deslizando até a beirada, e se chegar na beirada, eu caio. Perco a coragem por um instante. Não posso cair agora. Não posso cair. Não posso.

Tento manter a calma que evapora. Tomo um suspiro trêmulo e uma decisão. Não tenho tempo para atravessar calmamente e com cuidado antes de a escada escorregar por completo. Arremesso-me para frente na esperança de cobrir o restante do caminho, e a escada cai.

Agarro-me ao parapeito da janela com as mãos, ficando pendurada. Solto um grunhido de dor por meu ombro baleado, lágrimas me vem aos olhos. Minhas mãos começam a escorregar, são arranhadas pelo cimento. Posso ver meu corpo despencando em queda livre até o concreto lá embaixo. Chuto os tijolos para conseguir alguma tração, mas isso não acontece. Travo os dentes, quase começando a chorar de desespero.

Por favor, não. Não posso ter chegado até aqui só para cair. Se me soltar, na melhor das hipóteses, fraturo as pernas. O mais provável é que, se eu não quebrar o pescoço, os civis me achem e me bombardeiem.

Tenho que continuar. Puxo o máximo que posso o tronco com a ajuda dos braços, fincando as unhas na quina. Ignoro a dor excruciante que me atinge, lanço uma perna sobre o parapeito. Rolo e caio no piso dentro do prédio, segurando o braço com os dentes trincados.

Respiro fundo várias vezes, tentando controlar o coração. Levanto-me, trêmula, e espreito o outro lado. Com um aceno de cabeça, Max e eu nos separamos novamente. Ele some na outra janela, eu me viro e atravesso o cômodo abandonado no qual cai em direção a porta.

Silêncio. Não há sequer um mínimo barulho no corredor. Volto a correr, descendo em disparada até o primeiro piso. Passo por mais metais enferrujados. Visualizo um ferro parecido com um atiçador de lareira. Eu o pego, para ao menos ter uma arma, nem que seja ruim.

Saio do edifício, deparando-me com mais vários outros postos de comando. Pelo que posso identificar, estão vazios. Esgueiro-me encostada às paredes, mantendo-me no escuro. Um homem caminha ao redor da cabine ao lado, distraído, mas vindo na minha direção. Dou um passo atrás, e, quando ele dobra a curva, enfio o ferro em seu abdome.

O homem solta um arquejo, inclinando. Retiro e volto a enfiar o ferro mais duas vezes antes de ele estar morto completamente. Revisto-o à procura de uma arma, mas ele não carregava nenhuma. Encontro apenas uma pequena faca presa ao cinto. Pego-a para mim, colocando no cós da calça.

Há um clarão do outro lado do prédio na minha frente, que é para onde estou indo. Segue-se um estampido de sacudir o mundo, e então tiros.

Corro, perguntando-me quem está no meio do tiroteio desta vez. Drake tem que estar vivo. Não posso ter chego tarde demais.