Algo acaricia meus pés levemente e quando me esquivo do desconhecido, sinto um calor terrível. Grito com as forças que me restam quando sinto os dedos queimarem e encolho minhas pernas de encontro ao meu peito o máximo possível. Aquelas três me apagaram e me amarraram em uma das vigas que sustentam o teto. Próximo a mim a fogueira de Elli clama furiosamente mais tributos. O fogo domina metade do palco, deixando pouco espaço para mim.

O calor e a fumaça me fazem tossir e lacrimejar e tento desesperadamente soltar os pulsos na corda, os puxando, o que lesiona minha pele. Não quero e não consigo parar de tentar.

Meus olhos choram e o desespero compele meus gritos a ganhar o mundo e os faço sem um plano, sem ser racional. Os faço pelo desespero. Todos morrem um dia. E eu também irei. E muito antes do que pensei. Já imaginei e li sobre diversas formas de morrer, estupidamente tentando decidir qual a pior. Até então havia escolhido o afogamento. E nem sequer cogitara o fogo nem mesmo depois do que ocorreu com Giane.

Ver aquelas chamas selvagens e impiedosas pessoalmente anula qualquer coisa. E me faz pensar nas idiotices que cometi ao longo da vida. Os momentos que passei brigando por causa alguma ou por todas as causas.

Grito e grito e grito e fico rouca. Engasgo com a fumaça. As lágrimas esquentam em meu rosto. Quero minha mãe. Meu pai. Quero bater naquelas meninas por fazerem com que eles sofram com minha morte. Quero brigar com minha avó de brincadeira. Quero rir do meu tio. Quero os lábios do Lucius e todo o resto do seu corpo. Eu quero viver e grito a Deus por isso.

No fogo vejo Giane. Não como um ser que queima no fogo, mas a alusão que fazia aos seus cabelos. A última vez que estive no hospital, eu lhe beijei os cabelos e pintei as unhas de preto, na esperança dela se irritar o suficiente para acordar. E esse pensamento estranhamente me acalma. Talvez, eu parta e me encontre com ela. E morrer agora não parece tão mau. Não grito por não poder mais. Sussurro.

– Por favor. Quero estar com ela. Com ela.