— Hora de dormir, pequena.

A moreninha olhou o pai, fazendo um biquinho que o mais velho achava adorável. Ainda estava cheia de energia, apesar do horário, então não queria ir pra cama:

— Não adianta fazer essa cara, Ayumi-chan. Já está tarde.

— Então me conta uma história?

O pai a olhou desconfiado, pois sabia que, apesar de pequena, a filha era ótima em manipulá-lo. Mas afinal, a quem queria enganar? Não saberia dizer não àquele pedido, então apenas sorriu para a menor:

— Qual história você quer? - perguntou já pegando sua pequena nos braços.

— Conta aquela do príncipe Shiroyama. - pediu com um largo sorriso enquanto o pai a carregava para o quarto.

— Você realmente gostou dessa história, hein?

A criança apenas afirmou com um aceno de cabeça enquanto o pai a colocava na cama e logo sentava ao seu lado, escorado à cabeceira, com os pés esticados sobre o colchão. O mais velho puxou a coberta para cima de ambos e sorriu para a filha. Ele também gostava daquela história…

Era uma vez um príncipe. Ele morava num lindo palácio e sua família possuía vários tesouros. O príncipe podia ter todo o bem material que quisesse, bastava estalar os dedos e um criado atenderia seus desejos. Mas mesmo com tantas riquezas, o príncipe era infeliz.

— Por que o príncipe tava triste, papai? - Ayumi perguntou, se aconchegando no peito do mais velho em busca de um abraço para consolá-la, que logo lhe foi dado.

— Ele se sentia sozinho. - a respondeu, beijando sua testa. - Sabe, o pai do príncipe nunca leu histórias pra ele.

— Eu não gosto dessa parte da história.

— Você quer que eu pule?

— Vai pra parte que ele conhece o Takashima.

— Tá bem.

Um dia, passeando pelo pátio do hospital, o príncipe viu um plebeu que estava sorrindo. Ele era a única pessoa sorridente daquele lugar, e o príncipe ficou curioso. Queria saber como aquele homem podia estar feliz quando todos os outros naquele lugar pareciam tristes como ele.

— Mas papai, como o príncipe foi parar no hospital?

— Você não me pediu pra pular essa parte da história? - o pai riu e a pequena fez bico.

— Tá bom, tá bom, sem pular. Volta do começo.

Era uma vez um príncipe.

— Não, essa parte você já falou.

— Você não disse pra voltar do começou? - sorriu, implicante. Às vezes ele parecia ter a mesma idade da pequena em seu colo.

— O príncipe tava triste. Volta nessa parte.

— Tá bem.

O rei e a rainha estavam sempre muito ocupados, e o príncipe Shiroyama às vezes se perguntava se os dois se importavam com ele. Então ele tentava chamar atenção. Se esforçava pra ser o melhor em tudo que fazia, mas os pais estavam muito ocupados para dar os parabéns. Então ele começou a agir como um desastrado e quebrar coisas no castelo, mas o rei e a rainha não deram atenção pra isso também. O príncipe não sabia mais o que fazer, e acabou desistindo.

— Foi aí que o príncipe foi pro hospital, né papai?

— Foi sim, pequena.

Quando o príncipe desistiu de tudo, o castelo perdeu seu brilho. Os empregados, preocupados, chamaram um médico pra cuidar do jovem Shiroyama, e o doutor o levou embora para o hospital pra que ele melhorasse. Sabe, o príncipe estava com a doença do coração despedaçado, então teve que ficar internado. Mas mesmo sabendo que o filho estava doente de tanta tristeza, o rei e a rainha não voltaram para o castelo, pois estavam muito ocupados no reino vizinho. Disseram que o príncipe não estava realmente doente, estava só tentando chamar atenção e não ia conseguir daquele jeito.

— Ele não conseguia de jeito nenhum. - a pequena bufou, revoltada.

— É verdade.

— O rei e a rainha não são muito bons em ser pais.

— Não, eles não são.

— Papai Kou é muito melhor que o rei. - afirmou abraçando o pai, que devolveu o gesto, abrindo um enorme sorriso.

— Arigatou. - ele deu dois tapinhas nas costas da filha pra que ela o soltasse e voltasse a prestar atenção, ou não terminariam aquilo nunca. - Voltando a história…

O príncipe ficou muito triste quando acordou no hospital, porque ele continuava sozinho. Ele esperou que seus pais fossem visitá-lo, mas mesmo depois de um mês, ninguém apareceu. Foi aí que ele encontrou o rapaz sorridente no pátio e não pôde deixar de se aproximar. Queria saber o que aquele plebeu tinha para estar tão feliz mesmo naquele lugar:

— Olá. - o plebeu o cumprimentou ao ver o príncipe se aproximar. - Você é novo por aqui, não é?

— Nem tanto. - o príncipe o respondeu, triste. - Já estou aqui há um mês.

— Primeira vez? - o plebeu perguntou, fazendo o príncipe arregalar os olhos em espanto.

— Sim. Você não? - perguntou o príncipe.

— Eu estou sempre indo e voltando. - o plebeu o respondeu entre risos. - Me chamo Takashima. Se precisar de algo, pode falar comigo. Eu conheço tudo e todos por aqui.

— Shiroyama. - o príncipe se apresentou, e o plebeu se assustou ao reconhecer o nome.

— Perdão, majestade. - pediu, se curvando. - Eu não fazia ideia.

— Tudo bem. - o príncipe afirmou com um sorriso. - Aqui dentro sou apenas um paciente, como você.

— Isso quer dizer que nós podemos ser amigos?

A pergunta do Takashima pegou o príncipe de surpresa. Ele nunca teve um amigo antes, mas gostou da ideia. Talvez assim ele não se sentisse tão sozinho:

— Amigos. - o Shiroyama afirmou, segurando a mão do plebeu.

— Eles viraram melhores amigos, né papai?

— Foi sim.

O príncipe e o plebeu se tornaram inseparáveis depois daquele dia. Às vezes o príncipe ainda ficava triste quando pensava no rei e na rainha, mas seu novo amigo sempre o fazia rir pra esquecer dessas coisas. Eles ficaram muito tempo naquele lugar e o príncipe sempre se perguntava porque o Takashima estava ali se estava sempre tão alegre, mas o plebeu sempre mudava de assunto quando o Shiroyama tentava perguntar.

Um dia o príncipe não viu seu amigo no pátio e foi procurá-lo. Ele encontrou o Takashima machucado e correu pra buscar ajuda. O doutor falou que o príncipe salvou a vida daquele plebeu e pediu que ele fizesse companhia ao amigo aquela noite. Foi então que o príncipe Shiroyama viu o Takashima chorar pela primeira vez.

— Por que ele tava chorando, papai?

— Acontece que o Takashima também estava doente de tristeza, igual o príncipe.

— Mas ele estava sempre feliz.

O mais velho balançou a cabeça em negativo:

— Ele só sorria pra tentar alegrar as pessoas a sua volta, porque não queria que ninguém mais ficasse triste como ele.

— Por isso ele tentava fazer o príncipe feliz?

— Uhum. - afirmou, passando uma mão pelos cabelos de Ayumi.

O plebeu contou para o príncipe todas as suas tristezas e o príncipe ouviu atentamente, depois enxugou as lágrimas do plebeu e propôs um acordo:

— Vamos fazer um pacto, Shima. Eu prometo que vou me esforçar todos os dias pra te fazer feliz e você faz o mesmo por mim. Assim a gente vai se curar e vamos poder sair daqui.

O plebeu sorriu com a proposta e prometeu que faria seu melhor. Então o príncipe selou o acordo com um beijo.

— Eca. - a pequena resmungou, arrancando uma risada do pai. - Os adultos são nojentos.

— Eu quero gravar isso pra quando você for mais velha. - um moreno afirmou, escorando-se ao batente da porta.

— Papai Yuu! - Ayumi gritou, correndo em direção ao recém chegado, que sorriu ao pegar a pequena em seu colo. - O papai Kou tá me contando a história do príncipe Shiroyama.

— É mesmo? - sorriu e se aproximou do marido para um rápido selar de lábios. - Eu adoraria ouvir essa história.

— Pena que já acabou. - Kouyou o respondeu com as bochechas coradas. Ele nunca contava aquela história quando Yuu estava em casa.

— Não acabou não, papai. - Ayumi reclamou. - Você ainda não chegou no felizes para sempre.

— E viveram felizes para sempre.

— Pai… - a pequena chamou manhosa, arrancando risadas dos dois mais velhos.

— Tá bem. - Kouyou cedeu, ainda que estivesse envergonhado. Não sabia falar não para Ayumi. Bem que Yuu havia avisado que estava mimando demais a pequena, mas não conseguia evitar.

O príncipe e o plebeu começaram a cuidar um do outro, então o coração cheio de tristeza foi curado pelo amor deles. O rei e a rainha não ficaram nada felizes pelo príncipe sair com um plebeu, então o Shiroyama renunciou ao trono e criou seu próprio castelo. Os dois se casaram e adotaram uma linda princesinha, que era a garota mais amada de todo o reino. E os três viveram felizes para sempre.

— Eu gostei dessa história. - Yuu afirmou. - Quero ouvir do começo da próxima vez.

— Conta de novo pro papai Yuu ouvir.

— Nem pensar. - Kouyou foi logo cortando a garota, antes que ela fizesse alguma carinha fofa que fosse convencê-lo. - A senhorita vai dormir agora.

— Mas, papai Kou… - o biquinho da pequena fazia Kouyou se sentir tentado a ceder e ele agradeceu mentalmente quando Yuu interveio a seu favor.

— Já está tarde, Ayumi. Amanhã seu pai conta a história pra gente, tá bem?

O biquinho ainda estava presente nos lábios da menina quando ela se deitou, mas deu lugar a um sorriso assim que Yuu a cobriu e beijou sua testa:

— Boa noite, meu anjinho.

— Boa noite, papai.

Kouyou se aproximou e também deixou seu beijo de boa noite antes de apagar o abajur. E mesmo com a luz desligada ele e Yuu ainda ficaram ali por algum tempo, abraçados um ao outro enquanto observavam sua pequena dormir:

— Você ia contar a história de novo, não ia? - Yuu perguntou num sussurro, fazendo o marido corar.

— Claro que não. - respondeu igualmente baixo e saiu do quarto da filha.

— Você ia sim.- o moreno riu, seguindo o outro pro quarto dos dois.

— Tá, eu ia. - confessou, sentando-se do seu lado da cama. - Aquele biquinho é golpe baixo.

— Só você mesmo pra deixar uma garotinha de seis anos te manipular.

— Eu não sei como você não é manipulado também. - resmungava, fazendo um biquinho que, na visão de Yuu, era igualmente adorável ao da filha. - Aquela garota é esperta, ela sabe como usar seu charme.

O moreno riu, sentando-se ao lado do marido, e levou sua mão ao rosto de Kouyou, virando-o para si. Jamais se cansaria de admirar aquele rosto. Jamais deixaria de achar Kouyou a criatura mais adorável do universo e jamais deixaria de agradecer todos os dias por ter chegado a tempo de salvá-lo quando o maior cortou os pulsos naquele hospital. Agradecia por sua própria tentativa de overdose ter falhado e agradecia por seus pais não terem se importado o bastante para transferi-lo a um hospital mais caro do que o que a ambulância o levou na emergência. Foi isso que permitiu que ele conhecesse a pessoa que traria de volta sua vontade de viver:

— Eu te amo, Kou.

O mais alto sorriu e o beijou. Um beijo doce e calmo. Afinal, tinham todo o tempo do mundo um para o outro:

— Também te amo, Yuu.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.