Uma melodia agradável soou por toda a casa, Taekwoon tateou cegamente pela cama e desbloqueou o celular apenas para ver que eram apenas 7h04 de uma manhã ensolarada, conferiu o celular novamente, o som não vinha dele. Foi então que se lembrou do piano no andar debaixo e de Ravi.

Por que ele estava tocando tão cedo? Obviamente não precisava dormir.

Tentou fechar os olhos, mas não conseguiu pegar no sono. Depois de mais alguns minutos de batalha, se deu por vencido e se arrastou para fora do quarto.

Quando Taekwoon se aproximou do piano, o chão rangeu e Ravi parou de tocar e encarou a figura totalmente sonolenta do residente.

“Achei que já tivesse acordado”. Seu tom era quase de quem sentia muito por tê-lo acordado.

“Cuidado, assim até parece que você importa”. Brincou.

“Tsc, você bem que gostaria”. Ravi saiu do piano e começou a andar atrás de Taekwoon pela casa, ficou na cozinha papeando enquanto ele preparava o café da manhã. “Quais são nossos planos pra hoje? ”. Perguntou parecendo animado.

“Hmm? ”. Taekwoon ainda estava tentando acordar.

“Vamos ver algum filme ou começar uma série, estou entediado”.

“Você pode ligar o computador sem mim”. Murmurou lutando para manter os olhos abertos.

“E depois eu comento sobre o que aconteceu e você me acusa de spoiler”.

“Hm...”.

“E precisa trabalhar no seu humor matinal”. Ravi disse quase rindo.

Taekwoon o encarou, mas sua expressão estava longe de ser a séria com o olhar cortante, ainda por cima terminou bocejando, o que faz Ravi gargalhar.

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A televisão foi ligada e cada um sentou numa ponta do sofá. Ravi sentava com as pernas cruzadas ainda calçado, não que fizesse alguma diferença. Taekwoon estava meio deitado com a cabeça no braço do sofá, só queria cochilar por alguns minutos.

Fechou os olhos, seria só por alguns minutos, se certificou de que Ravi estava prestando atenção na tv e...

“Leo, Leo”. Uma voz familiar o chamava e seus ombros estavam sendo sacudidos.

Era Ravi? Não poderia, eles nunca haviam tido nenhum tipo de contato físico, Taekwoon só conseguia imaginar que o atravessaria ou que sua pele fosse extremamente fria.

“Ravi? ”. Murmurou abrindo os olhos.

Mas os olhos eram diferentes, o formato do rosto e até a cor do cabelo. Nada de lápis vermelho nos olhos ou pele extremamente pálida, sem falar nas tatuagens do pescoço.

“Quem é Ravi? ”. O rosto estranho, porém, familiar se tornou franzido, quase irritado.

“HONGBIN! ”. Taekwoon deu um salto no sofá.

Quando ele havia chegado? Como ele havia entrado? Quanto tempo dormira no sofá? Onde diabos estava Ravi? Olhou ao redor e viu o fantasma de braços cruzados próximo da porta.

“Quem é Ravi? ”. Hongbin perguntou sentando-se no sofá.

“Ah... é um personagem da série”. Disse apontando para a tv que ainda estava ligada, porém no mudo. Lançou um rápido olhar na direção de Ravi que deu de ombros, mas continuou onde estava.

“Estou te mandando mensagens tem alguns dias, por que não me respondeu? ”.

“Às vezes fico sem sinal quando estou em casa, mas... como você entrou?”.

“A porta abriu de repente, toquei a campainha e bati, parecia que estava trancada a princípio, mas depois simplesmente abriu”.

Era por isso que Ravi estava parado próximo da porta então.

“Ah... De qualquer forma, o que aconteceu pra você vir de repente? ”.

“Eu queria te ver e conversar... Achei que precisamos conversar pessoalmente”.

Taekwoon não gostou do que estava ouvindo ou da expressão cansada de Hongbin, ele costumava sorrir o tempo todo, agora tinha apenas olheiras e um sorriso triste.

Leo? ”. Por que até Ravi parecia preocupado?

“Vamos conversar lá fora”. Taekwoon se colocou de pé e marchou para fora de casa, Hongbin o seguiu.

Eles entraram no carro de Taekwoon que estava estacionado mais próximo, mas ficaram em silêncio olhando para direções opostas.

“Vamos acabar logo com isso”. Hongbin disse primeiro.

“C-como? ”.

“Não fique tão surpreso, você nem se importa mais”. Outra vez o sorriso triste e pequeno.

“Claro que eu me importo”. Taekwoon o encarou, procurando algo, alguma coisa específica no rosto do namorado. Ex-namorado?

“Leo, você comprou uma casa sozinho, você foi se mudar para longe e nem falou nada comigo”.

“Eu só queria tomar uma decisão sozinho”.

“O que isso significa? ”.

“Nada! ”

“Você simplesmente não fala mais comigo, você sequer tenta”.

“...”. Ele queria terminar o namoro? Era por isso que vinha se sabotando? Não ligar, não responder rapidamente quando claramente tinha tempo livre, ficar em casa vendo séries com Ravi ao invés de ir ao encontro do namorado...

Era difícil aceitar algo que sua mente parece já ter dado como definitivo quando seu coração parecia não aceitar a mesma decisão.

Mas ele sabia que eles estavam caminhando para o fim da linha. Eles sabiam.

“E depois de um tempo eu também parei de tentar. Por que vamos continuar com isso? ”.

“Nós estamos nos magoando há muito tempo, não é? ”. Embora não fosse uma pergunta.

“Eu gosto de você, não é como se isso tivesse mudado, apenas... nós estamos em lugares diferentes, nós estamos um do lado do outro, mas estamos a quilômetros de distância”.

Hongbin esticou a mão e Taekwoon colocou sua mão sobre a dele, entrelaçando seus dedos uma última vez.

“Você sabe que eu sou péssimo para essas coisas...”. Taekwoon falou olhando para baixo, para qualquer lugar mais reconfortante.

“Eu também... Leo”. Era um pedido.

E Taekwoon nunca deixaria de atendê-los, ergueu o rosto.

“Isso é um adeus”.

E puxou a mão, Taekwoon abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu. Hongbin saiu do carro e caminhou sem olhar para trás.

Saiu de vista e por definitivo da vida de Taekwoon.

Um calafrio horrível passou por seu corpo, ele se encolheu o máximo que pôde no banco e continuou lá até que as primeiras lágrimas caíssem e ficou naquela posição até a última cair.

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Quando Taekwoon entrou tropeçando em casa já era noite. Ele derrubou uma ou duas coisas no caminho. O barulho automaticamente fez com que Ravi se materializasse na escada, sentado no corrimão como de costume.

“Você está bêbado? ”. Perguntou meio que achando graça ou simplesmente numa tentativa de melhorar o clima.

“Cale-se! ”. Apontou na direção dele, mas não exatamente na direção certa porque estava vendo dois Ravis. “Tenho todo o direito de beber, primeiro... primeiro porque eu sou maior de idade e segundo... e segundo porque o idiota do meu namorado terminou comigo”.

“Ah ex-namorado. Drama dos vivos”. Ravi continuou onde estava, apenas apoiou o queixo em uma das mãos.

“Eu gostava dele, mas acho que gostar não é o bastante”. Resmungou deprimente.

“E por que terminou com o cara das flores? ”.

“Não, aquele é só um amigo”.

“Amigos não trazem buquês! ”. Ravi riu.

“Amigos que trabalham numa floricultura sim! ”.

Ravi achou melhor não entrar no mérito da questão, ou Taekwoon era cego ou preferia se fazer de cego.

“E por que vocês terminaram? ”.

“Agora é sua vez”.

“O que? ”.

“Fingindo que se importa”.

Ravi arregalou os olhos, ele não se importava, mas não é isso que as pessoas fazem?

“Cale-se, você está bêbado e eu tenho tempo livre”. Saltou de onde estava. “A propósito... Você dirigiu bêbado? ”.

Taekwoon foi se arrastando escada a acima e chutou os sapatos quando chegou no quarto.

“Hmm... saí para comprar bebidas, mas só bebi quando estacionei o carro de volta, patético”. Se jogou na cama.

Iria se afundar no colchão, dormir, acordar de ressaca e depois continuar vivendo, ao menos era o que pretendia, mas Ravi o seguiu.

“O cara que veio aqui era o seu namorado? ”. Perguntou embora fosse óbvio.

“Hm... ex-namorado”. Girou na cama ficando de barriga para cima. Ravi sentou ao seu lado. “Por que abriu a porta para ele? ”.

“Tentei te acordar, você não me ouviu, ele obviamente te conhecia, então achei melhor deixa-lo entrar”.

“Não faça isso de novo”.

Ravi assentiu. “Não vai acontecer, eu prometo”.

“Não prometa”. Parou de encarar o teto para olhar para o rosto pálido do garoto. “As pessoas prometem muitas coisas e no final nenhuma delas é verdade”.

“Qual foi a maior mentira que já te prometeram? ”.

“Que seria para sempre”. Riu sem vontade.

“Nada é para sempre”.

“Você ainda está aqui. O que isso significa? ”.

“Muitas coisas”.

“E você não pode ou não quer falar a respeito? Por que... acho que não vou lembrar de muita coisa amanhã, então no momento sou ótimo para segredos”.

Ravi girou os olhos. “Não posso falar muitas coisas e outras eu simplesmente não quero”.

“Por quê? ”.

“Porque não confio em você”. Respondeu com um sorriso.

“Ouch”. Taekwoon continuou olhando para Ravi que olhava em outra direção com o mesmo sorriso leve nos lábios. Taekwoon não acreditava nele. “E você? Qual foi a maior mentira que te prometeram? ”.

“Que eu seria capaz de sair daqui”. Ravi olhou ao redor.

“Dessa casa? Você não pode sair? ”.

“Não”.

“Por quê? ”. Ravi apenas sorriu em resposta. “Isso é uma coisa que você não pode dizer”. Constatou.

“Não pode voltar pro seu ex? Dizer que as coisas vão ser diferentes dessa vez? ”. Perguntou mudando de assunto.

“Não seria verdade”. Taekwoon estava derrotado.

“Mas você pode fazer com que seja”.

“O ser humano não muda assim... Apenas conta mais mentiras quando querem algo”.

Ravi se ajeitou na cama, se inclinou na direção de Taekwoon, mãos apoiadas em cada lado de seu rosto, não muitos centímetros de distância.

“Me conte uma mentira”. Pediu o encarando, como se fosse possível confirmar dessa forma.

Taekwoon não se sentiu desconfortável, apenas achou estranho, mas estranho combinava com Ravi.

“Eu tenho medo de você”. Respondeu automaticamente.

Ravi sorriu. “Essa é uma péssima mentira, dá pra perceber de longe, você nunca teve medo de mim”.

“Sua vez”.

“Eu quero te beijar”.

Os olhos de Taekwoon arregalaram, mas logo se acalmou.

“Mentiroso”. Disse com um sorriso.

Ravi riu e voltou para a posição que estava anteriormente.

“Por que você tem um piano se não sabe tocar? ”. Perguntou completamente aleatório.

“Eu sei tocar”. Se defendeu meio ofendido e meio que achando graça.

“Desde que se mudou eu sou a única pessoa que mexe naquilo”.

“Vou tocar pra você um dia”. Disse fechando os olhos, se fazendo mais confortável na cama para dormir.

“Isso é uma promessa? Cuidado~”.

“Hn... Quero prometer uma coisa boa pra você”.

“Por que? ”.

“Porque você merece, todos merecemos uma promessa que vá ser cumprida e que valha a pena”. Respondeu abrindo os olhos, embora os sentissem pesados.

“Você deve ser o bêbado mais eloquente que conheço”. Avistou um sorriso, combinava com ele.

“Sou o único bêbado que você conhece”. Retrucou.

“Touché”.

“Qual a sua promessa pra mim? ”. Perguntou soando distante.

“A minha é a mais egoísta. Eu nunca vou me esquecer de você”.

Taekwoon não respondeu, apenas sorriu e se ajeitou no travesseiro, já dormindo. Ravi esticou a mão, seus dedos passaram de leve sobre os fios negros e desceram para seu rosto, encostando apenas com a ponta dos dedos, mas logo afastou a mão como se tivesse tocado em algo extremamente quente.

Sua expressão antes calma também mudou completamente, para uma mais séria e sombria, uma que Taekwoon nunca havia visto e ele desaparece.