Avel Emar Aza

Serenata Immortale


Nada se comparava a sua beleza, no entanto, essa beleza só existia devido a uma característica, e somente uma. Seu rosto fino e liso, seus cabelos louros e longos, que se estendiam do topo de sua cabeça até a cintura, terminando em uma linha reta, impecável e perfeita. Seu toque delicado e suave, o seu doce perfume. Nada disso importava, nem mesmo a sua personalidade, o seu jeito dócil e benevolente, a sua presença calma e consoladora. Não fazia diferença alguma, nem se combinasse tudo isso com os seus olhos, olhos estes no mais belo tom de azul, como se fossem safiras. Olhos estes que pareciam encará-la diretamente na alma e que lhe traziam o mais puro conforto, eles eram acolhedores e calmos, ao encará-los ela sentia que nada poderia lhe fazer mal, estaria sempre segura e feliz. Nada disso importava. Sem aquela característica, tudo era perdido e assim para sempre desapareceria a memória.

Mas isso não era verdade, em nenhuma hipótese poderia ser considerado tal absurdo. Jamais deixaria de ser bela. Seus cabelos não se tornariam cinzas levadas pelo vento, a suavidade de seu toque não seria substituída pela aspereza de uma rocha e o seu perfume não se perderia em meio a noite. Seus olhos jamais deixariam de observá-la e sua presença pura e bondosa sempre estaria ao seu lado. Não, nada disso era perdido, tudo existia em seu devido lugar. Mas ela não se lembrava, só se recordava de um traço e era esse traço que trazia a forma à vida, lhe encorajava e ajudava a suportar por instantes a própria existência.

E esse mesmo traço a lembrava que havia falhado e jamais se perdoaria por isso.

Ventava, mas não era um vento gélido e desconfortável, era uma brisa cálida e suave. Que fazia com que as copas das árvores que rodeavam a vila balançassem preguiçosamente. A brisa era constante, tornando a noite excepcionalmente agradável. Os ventos cortaram o topo das árvores, avançaram pela fonte da vila e se dirigiram a uma exuberante casa senhorial.

No andar superior da casa, em uma das janelas abertas estava uma mulher. Seus cabelos eram louros e vastos, se estendiam do topo da cabeça até a cintura e durante todo esse trajeto não havia um fio sequer fora do lugar. Seu rosto era fino e liso e seus olhos eram de um azul terrivelmente belo. Estava debruçada sobre o parapeito da janela quando uma suave brisa lhe alcançou a face, jogando parte de seus cabelos para trás em um movimento único e fluído, revelando a suas orelhas, que eram marcadas por acentuadas pontas.

A elfa fechou os olhos e respirou fundo, enchendo seus pulmões do límpido ar que aquela noite oferecia, seus lábios se moveram formando um sincero e leve sorriso. Assim que abriu novamente os olhos ouviu uma voz fina e aguda, que saía de um ponto próximo a sua cintura.

- Me deixa ver também? –a voz era carregada de entusiasmo e vontade.

Virou-se para dentro do cômodo e pegou em seu colo uma garota, que não tinha mais do que seis anos de idade. A menina possuía as mesmas orelhas pontudas. Seus cabelos eram loiros e desciam até a cintura e os olhos eram do mesmo azul. Era uma perfeita miniatura.

- Mamãe, o que tem depois daquele morro grande? – disse a pequena enquanto o seu dedo apontava para o horizonte.

- Tem mais cidades – respondeu a elfa enquanto segurava a criança e mantinha no rosto um sorriso sincero e tenro. – Por que você pergunta? – indagou enquanto começava a afagar os cabelos dela.

- Porque é longe, aí eu não consigo ver – respondeu a garota enquanto se ajeitava melhor no colo da mãe.

- Um dia você vai conhecer, não só aquelas como muitas outras – explicou a elfa.

Em seguida lhe deu um beijo na testa. A pequena elfa ao recebê-lo fechou os olhos, abriu um sorriso e se encolheu ainda mais nos braços que a seguravam.

Ela abriu os olhos e fitou a sua mãe no rosto. Os dois pares de olhos azuis se encontraram. Depois de alguns instantes nos quais a elfa vislumbrou a garota que tinha agora em seus braços e pensou o quanto a amava, ouviu-a dizer com muita energia:

- A gente podia ir lá agora, não é mamãe?

Não se conteve, soltou uma breve risada e então respondeu com todo o carinho que pode expressar:

- Não, Avel, está ficando tarde, você tem que dormir agora.

-Ah mamãe! – respondeu Avel, que ergueu os seus olhos para sua mãe e disse no tom mais doce que pode. – Por favor.

- Eu prometo que você vai ver todas – respondeu-lhe a sua mãe com enorme ternura nos olhos – Mas agora você precisa dormir.

- Tudo bem – disse Avel em um tom alegre – Mas você vai ter que me pegar! – e ao dizer isso saltou do colo de sua mãe e correu pelo cômodo que estavam.

Era um quarto, não era extremamente luxuoso, mas estava longe de ser modesto. Possuía uma larga cama encostada na parede, um armário à lateral da cama e outro maior a sua frente.

Avel correu contornando a cama, sua mãe a perseguiu e a alcançou antes que pudesse se esconder embaixo da cama e a agarrou pela barriga, erguendo-a no ar. Avel soltou um grito agudo em meio a uma risada estridente. A pequena elfa caiu sobre o macio colchão da cama enquanto sua mãe lhe fazia cócegas.

- Tá bom! Tá bom! Você ganhou, eu vou dormiiiiiiiir! – ofegava Avel em meio às risadas.

Ambas as elfas davam gargalhadas, quando enfim pararam, Avel se enfiou embaixo dos cobertores e ficou olhando para a mãe, ansiosa. Era agora. A pequena elfa manteve-se em um absoluto silêncio enquanto aguardava.

A elfa se posicionou sentada a cama e começou a afagar os cabelos da pequena, em seguida fechou os olhos por um instante, quando os abriu novamente eles estavam fitando Avel fixamente e a menina se perdeu em meio aquele olhar extremamente dócil e amoroso, e sentiu todo o seu corpo mais leve quando ela começou a mover os lábios. E deles saíram a canção, em um élfico perfeito.

Al barol os si pas bol Ai cali paestaer os bai paedasaer Sher ei shalol paes os jhylae eil jhol Car jhaes ti Shyjael-caesar Ein! Shar air byr ei paes shia pae Sai caes shyri aer eisi tar Ol sol eisyl caes shor ei vae Sesaer shas iadyl si var? Sar paes os jhyli Sholi eir si shys shaesi todol ti Car taesaer ti eir jhylaelia shaes Ei jhylaelia mosor kedol Shar syl si jhol, syl mys eil bol Mai saestaer thys eiras Shar tyr shi tysi vesaelia shol

Ail Ser'm pae-mas?

Sua voz era doce e suave e a cada verso Avel se sentia completa, feliz e segura. Ao fim da canção Avel encarou sua mãe com todo o carinho que conseguiu expressar e viu aqueles olhos fitando-a com um carinho maior ainda.

Era isso! Não se lembrava de nenhuma característica, mas um traço e somente um traço lhe vinha a mente! Era a voz, aquela voz. Ao se lembrar dela Avel sentia todo o amor e pesar por sua mãe. E era naquela voz que Avel se lembrava de ouvir a frase antes de adormecer, antes de se deixar levar pelo sono depois de fazer um último esforço para fitar aqueles olhos extremamente azuis antes que eles se dissolvessem em meio a escuridão do sono. E se lembrava da frase, que carregaria pelo resto de sua vida. E seria, ao mesmo tempo, sua lembrança mais feliz e mais triste.

“Eu vou estar sempre com você. Boa noite Avel”

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.