Foi como se um machado partisse minha cabeça. Olhei para o chão, reuni forças e me esforcei para falar de maneira racional.

— Acho que tenho uma ideia para que possamos liberta-los. — eu disse, e descrevi meu plano tentando soar firme e confiante.

Todos me escutaram e após alguns momentos meu pai disse:

— Tara, você tem certeza? — faço que sim com a cabeça. — Vamos precisar dos nossos mais talentosos oficiais. Dentro de algumas horas garanto que tudo estará pronto.

— Não temos “algumas horas”. — me descontrolo e elevo o tom de voz. Jinora se levanta e toma minhas mãos.

— Ninguém aqui quer que você fique sentada deixando que esses terroristas façam o que quiserem. — a voz dela está repleta de dor. — Tudo que queremos é deixar a situação o mais segura possível pra você. Você não faz ideia do quanto eu estou destruída por saber que meus filhos estão mantidos como reféns. Não vou suportar se acontecer algo com você. — ela faz uma pausa e acaricia meu rosto. — Saiba que aprecio seu sacrifício, mas não pense que deixarei você se entregar de bandeja nas mãos de terroristas.

As palavras de Jinora me acalmaram e deixei o escritório com a cabeça rodando. Estava decidida e pronta a lutar para defender as pessoas desses malditos terroristas. Fui para meu quarto, comecei a bater no saco de areia que Jinora havia mandado instalar aqui. Não sei quanto tempo passei fazendo isso, mas quando dei por mim estava encharcada de suor e meus músculos doíam. Resolvi tomar um banho rápido e vestir minha armadura, quando calçava as botas de combate minha visão começou a ficar turva. Em menos de um segundo entendi que estava revivendo uma das memorias de Korra. A cena surgiu como se eu mesma tivesse passado por aquilo. Eu vi tudo que acontecia, os pensamentos de Korra eram os meus, senti o medo dela e ao mesmo tempo a coragem de estar se entregando para salvar a nação dos nômades do ar.

A cena sumiu da mesma forma que apareceu, apertei os olhos e sacudi a cabeça para me situar. Senti alguém entrar no quarto, virei o rosto e vi Dao. Não sei por quantas seções de cura ele passou desde que o mandei para a enfermaria, mas ele parece pronto pra enfrentar qualquer coisa. Corri até ele e o envolvi em um abraço apertado. Ele se afastou e segurou meu rosto com suas mãos, seus olhos verdes me davam tranquilidade.

— Obrigada por me salvar, Tara. De verdade. — ele me agradece com seus olhos fixos nos meus.

— Não tem por que me agradecer, não imagino como seria minha vida sem você nela. — direcionei o olhar para o chão, constrangida.

— Me perdoe se de alguma forma te magoei. Sei que você sabe disso, mas acho que posso dizer de novo. Eu te amo e meu amor se multiplicou quando você me salvou.

A declaração de Dao despertou algo em mim. Nós hesitamos por um breve momento admirando o rosto um do outro. Ergui meu rosto e Dao delicadamente se inclinou em minha direção. Passei meus braços ao redor de sua cintura enquanto ele mantinha meu rosto em suas mãos, e então, finalmente nos beijamos.

Tomamos um susto quando Kadda abriu a porta do quarto e nos separamos rapidamente, mas isso só nos fez parecer mais suspeitos.

— Desculpe. Desculpe. Não foi uma boa hora. — ele se desculpava enquanto nos dava as costas. — Tara, seu pai me pediu para te chamar, tudo ficou pronto mais cedo e podemos ir quando você quiser. — ele parecia segurar o riso.

— Ok, já estou indo. — andei em direção à porta sem olhar para Dao, dei um soco no ombro de Kadda para que parasse de rir e fomos rumo ao pátio da ilha.

Tomamos uma lancha e partimos em direção a escola. Suna, Kadda e Dao me acompanhavam e senti que naquele momento eles seriam capazes de matar e morrer em meu nome. Dao parecia ser uma montanha de músculos, seu rosto estava serio e ele permanecia sentado ao meu lado em alerta. Kadda parecia apreensivo, mas ainda assim determinado a dar o máximo de si. Suna estava em pé a nossa frente, de costas para nós enquanto brincava com os machados que havia escolhido como arma. Dao ligou o radio da lancha.

Numero de mortes confirmadas pelas explosões em Cidade Republica aumentam e seus números chegam a 300; 250 civis estão desaparecidos. A escola técnica para dominadores e não dominadores continua sob o poder dos terroristas. O que as autoridades, os lideres mundiais e principalmente nosso recém-descoberto avatar vão fazer a respeito?

Sinto meu estomago revirar com essas noticias, não podia imaginar as proporções que as explosões tiveram. Uma sensação familiar invade meu corpo, uma voz ecoa em minha mente. Vaatu.

“Olá, Tara. Sentiu saudades? Tenho certeza que pensou em mim 24 horas por dia. Você precisa de mim certo? Não se preocupe, dessa vez vou quebrar seu galho, mas saiba que vou cobrar esse favor.”

Fiz uma confirmação silenciosa. Dessa vez preciso de toda a força que tiver. Preciso da sede de sangue de Vaatu para destruir os terroristas e da luz de Raava para salvar todos os reféns. Chegamos em frente a escola, as ruas estavam interditadas. Mako estava lá e fui em sua direção. Ele me explicou a situação. Disse que a líder do grupo radical que está em posse da escola se chama Yuka e que parece ter aceitado trocar todos os reféns por mim contanto que ganhasse Suna de brinde. Mako estava tenso e suando frio, não suportava a ideia de ver o filho em perigo assim e parece ter medo por mim também. Eu o abraço e fico surpresa quando Suna permite que Mako o abrace mesmo que por um breve momento. Reparo em uma mulher que está a poucos metros atrás de Mako, ela me olha ternamente e sinto um enorme carinho por ela, seus olhos são verdes e seu cabelo escuro tem poucos fios grisalhos; ela parece ter a mesma idade que Mako, mas mesmo assim dá pra ver que o tempo só a deixou ainda mais linda do que devia ter sido em sua juventude.

Entramos pela porta da frente da escola seguindo as instruções que Yuka passou para a policia, apenas Suna, Kadda, Dao e eu poderíamos entrar ou ela garantiu que a escola ganharia uma nova pintura com o sangue de todos os estudantes. Ao entrar no prédio da escola reparei que o local não lembrava em nada a escola que Cidade Republica tinha tanto orgulho. Os corredores estão sujos de areia e entulhados de pedaços que se desprenderam das paredes por causa das explosões.

Gritos de dor e medo aumentavam à medida que eu me aproximava das salas, adolescentes e professores gemiam e crianças choravam. A maior preocupação em minha cabeça era encontrar os filhos de Jinora, segui meus instintos e arrombei a porta de uma sala. Entrei automaticamente em estado de alerta ao perceber que não havia nenhum radical presente aqui, somente Bei tian e Rizia que mesmo feridos tentavam acalmar seus pequenos irmãos.

Corri para ajuda-los, Bei tian estava mais próximo de mim por isso o ajudei a levantar. Kadda e Suna pegavam os pequenos no colo, Dao levantou Rizia com um cuidado exagerado, ela falou algo em seu ouvido e descansou sua cabeça no ombro dele. Fiquei sentida, mas espantei esse sentimento. Estávamos nos dirigindo para fora da sala quando dois explosivos rolaram através da porta, esperei a detonação sem medo. As explosões vieram, pedaços de vidro das janelas caiam como uma chuva cortante e alguns perfuravam minha pele nos vãos da minha armadura. Eu estava curvada com Bei tian sob mim, agi como um escudo nos protegendo com minha armadura.

Alguns segundos se passaram e em seguida alguns radicais entraram na sala, o lugar ainda estava quente, minha raiva pairava no ar e senti vontade de comer suas tripas, mas não por causa de Vaatu isso é um desejo pessoal meu.

“Primeiro certifique-se que todos estejam a salvo...”.

“Depois mate todos os malditos e pinte as paredes com seu sangue.”

A fala de Vaatu completava a de Raava. Senti que tinha toda a força do mundo dentro de mim.

“Você é a arma mais poderosa dos dois mundos.”

Os dois falaram em uníssono.

Estávamos no segundo andar e eles estavam muito machucados, mas todos sabíamos da capacidade dos filhos de Jinora. Rizia e Bei tian fizeram que sim com a cabeça e arremessamos os cinco para fora pelas janelas, observamos todos pousarem suavemente no chão. Os radicais olharam dentro de nossos olhos e perceberam que não cederíamos sem lutar. Kadda se transformou em um monstro coberto de areia. Suna girava seus machados como se fossem extensões de seus braços. Da armadura de Dao brotaram espinhos de metal. E dentro de mim estavam os dois espíritos mais poderosos dos mundos.

Antes que pudéssemos atacar houve outra explosão mais horrível ainda que as ultimas, ouvi gritos da sala ao lado e de repente tudo ficou em um silencio horrível. Fomos lançados contra a parede, os garotos caíram desmaiados, mas algo me mantinha desperta.

“Eles não podem ajudar você. Só vão te atrapalhar. Você está sozinha comigo agora.”

As palavras de Vaatu são verdadeiras, não posso me concentrar em uma luta se estiver preocupada com eles.

“Não precisa ter medo Tara. Nada de mal vai te acontecer. Você tem a mim.”

A voz de Raava me impedia de enlouquecer.

Um som agudo ensurdecedor surgiu e pareceu trincar meus ossos. Antes que eu pudesse ter qualquer reação, meus punhos e meus tornozelos foram algemados e eu fui sendo empurrada para algum lugar. Tentei resistir ao máximo, mas o som me deixava baqueada. Um dos radicais arrastava um Suna desacordado pelos punhos. Kadda e Dao permaneciam no chão, imóveis. A tortura se intensifica e agora tudo está escuro, não sinto vontade de abrir os olhos. Sinto que estou sendo levada para o subsolo. Quando chegamos sou empurrada, me forço a levantar e a abrir os olhos. A imagem que vejo é Yuka com o olhar fixo em mim, sentada em uma espécie de trono e com os pés apoiados no cadáver de alguém. Em seu rosto há um sorriso maligno e vitorioso.

— É um prazer revê-la Tara. — ela se levanta de sua cadeira e caminha até mim. — Agora se curve pra mim. — me recuso a fazer o que ela diz e seu sorriso desaparece enquanto a encaro sem piscar. — Se quiser que seus amigos e os alunos sobrevivam faça o que eu mando. — não vacilo em minha posição. Sinto seu joelho atingir a boca do meu estomago. — Eu disse CURVE-SE. — meu corpo se contorce para frente, mas não ouso soltar ruído algum. Ela coloca sua bota sobre minhas costas e empurra meu corpo com força contra o chão. — É disso que eu estou falando. — seu sorriso voltou. — Viu? Não foi tão difícil.

Levanto o rosto para encara-la. Sinto vontade de apertar o pescoço dela até que seu rosto fique tão azul quanto seus olhos. Quando penso em dar o controle do meu corpo inteiramente a Vaatu a voz de Raava surge em minha cabeça.

“Você é o avatar, Tara. Tem o fogo dentro de si. Use-o. Use-o por aqueles que te amam.”