Quando chegou ao templo, não havia sinal de vida.

– Zara! – Gritou o rapaz entrando na construção sem sinais de hesitação. – Zara! – Gritou novamente, recebendo em resposta apenas o eco de sua própria voz. O corpo de Airon tremia.

Ela não pode. Ela não pode achar. Pensava freneticamente numa angústia sem fim.

Airon escondia como podia aquilo que não queria que ninguém visse. Zara era a última pessoa que ele queria que visse.

– Zara! Por Favor! – Gritou angustiado, quase chorando de raiva de si mesmo. – Vamos para a Nação do Fogo! – Disse tentando chama-la de alguma maneira.

Ele subia pelos andares correndo como um louco, mas não encontrou a menina em nenhum dos quatro. O desespero aumentou ainda mais. Se ela não estava em nenhum dos andares superiores era porque estava em algum dos submersos. Desceu correndo as escadas até o térreo e entrou pelo portal do túnel para o sobsolo.

Eram incontáveis andares criados pelo Avatar Roku durante a sua vida. Airon desceu correndo o mais rápido que pôde, e quando ia chegar na clareira do primeiro andar parou bruscamente.

O que diria para Zara? Quando a encontrasse, o que diria? O que faria?

Suas pernas tremiam de nervosismo, de medo. E se ela não tivesse encontrado nada? Ele contaria?

Deixou que o futuro ficasse em seu tempo e seguiu para a clareira. Não havia nada nem ninguém, apenas as paredes com suas molduras belíssimas e antigas da Nação do Fogo.

Franziu o cenho numa expressão de sofrimento e desceu para o próximo e para o próximo. Quando estava prestes a descer a caminho no quinto, sentou-se no chão, encostado na parede.

Airon chorava.

Ele sabia que perderia Zara para sempre.

Durante mais de vinte minutos Airon chorou.

Depois deste tempo, levantou-se enxugando as lágrimas. Seu corpo tremia e suas pernas não tinham forças.

Não quero ver. Eu não quero ver aquilo de novo. Pensava descontroladamente. Eu não quero mais, eu parei. Eu já parei, eu não quero ver, não aguento ver de novo.

Lutava consigo mesmo. Ele sabia que encontraria Zara no andar seguinte, a menos que ela tenha sido forte para descer mais um e mais um.

Se eu não aguento ver, imagine Zara. Pensou num sussurro mudo, que calou todos os outros pensamentos. Um olhar morto tomou seu rosto e ele deu passos lentos e silenciosos no túnel para o andar seguinte. No meio do túnel ele ouviu os sinais de vida da menina.

Ela chorava.

Ele ouvia os soluços da menina e seu peito gelou. Airon continuou a descida e seu corpo não aguentou dar um passo sequer em frente.

Lá estava Zara.

Abraçada a um dos corpos das dezenas de crianças em suas bancadas de pedra. Ela chorava descontroladamente, traumatizada com o que via.

Em cada bancada, uma criança de 4 a 7 anos de idade, com terríveis queimaduras de grau elevado em diversos pontos do corpo. Algumas estavam com até metade do corpo com aquelas queimaduras que deformavam a pele onde passavam. Outras não tinham sinais de queimadura, mas podiam ser encontrados apenas alguns pontos terrivelmente queimados.

Era com o um hospital de queimados. A fúnebre sessão de crianças queimadas. Aquelas que não aguentaram a dor e partiram.

E Airon conhecia cada um daqueles rostos, ele vira cada um rir e chorar pela última vez. Ele vira cada último suspiro de vida de cada um, de cada uma.

Quando Airon ia dar um passo na direção de Zara, Sozen entrou na frente dele. Tinha o rosto rígido e a posição ameaçadora, mas estava protegendo o rapaz.

– Zara... – Sussurrou chamando-a com a voz embargada.

– Airon! – Exclamou ela chorando e correndo na direção dele, abraçando-o apertado e soltando todas as suas lágrimas no peito dele. – É horrível! – Exclamou novamente.

Ela chorava sem controle, seu corpo tremia como nunca, o rosto vermelho e uma careta de dor. Não passou dois segundos abraçada ao garoto e correu para o cadáver mais próximo. Era uma menina de cabelos compridos e pretos e com um vestido típico da Nação do Fogo. Tinha a testa negra de tão queimada, o resto do rosto coberto por queimadura mais leve causada pela maior. No pescoço da menina tinha a mesma queimadura, e nas costas de suas mãos.

Zara retirou o corpo da menina daquela bancada mórbida e a abraçou como se abraçasse um irmão muito amado que acabara de morrer.

– Quem é capaz de fazer algo assim? – Perguntava Zara, mais para si do que para qualquer um. – Airon... – Gemeu em dor a menina olhando para ele. O rapaz já não aguentava vê-la daquela maneira.

– Zara, vamos sair daqui... – Pediu num sussurro mudo.

– Não! Eu quero encontrar. Eu vou encontrar a pessoa que fez isso! – Disse convicta. – Eu vou fazê-la pagar! – Prometia, cada palavra uma flechada em Airon. – Seja quem for, não tem coração, não merece compaixão. – Declarou mergulhada em fúria olhando para o rosto do pobre cadáver.

– Tenho certeza que vai. – Sussurrou Airon. – Zara... – Tentava falar algo, mas nada saía-lhe da boca. – Vamos embora. – Pediu mais uma vez não aguentando lembrar-se de todas aquelas crianças quando eram vivas e alegres.

– Airon! Por que continua fazendo isso?! – Gritou Zara colocando a menina de volta no lugar, assustando o garoto com a insinuação. – Por que não me conta? Por que esconde? – Perguntava.

– Vamos embora, por favor. – Pediu mais uma vez, sem conseguir encará-la.

Zara olhava para o rapaz com o rosto molhado e o olhar confuso. Por que Airon não estava impressionado ou surpreso com aquela cena terrível?

– Airon, o quê você sabe? – Perguntou com a voz mais fria que o rapaz já ouvira, fazendo com que seu corpo estremecesse. Sabia que precisava contar.

– Zara... olhe... – começou na defensiva, fazendo os olhos de Zara se arregalarem numa careta de repugno. – Não é isso, eu... Olhe... – Ele não sabia como explicar.

Zara abaixou a cabeça olhando para o rosto do cadáver a sua frente, pasma e de olhos arregalados. As lágrimas começavam a cessar finalmente.

– Eu não... Eu... – O menino procurava desesperadamente por palavras, e quando deu um passo na direção da menina Sozen se colocou na frente dele novamente. – Eram experiências... – Sussurrou mal acreditando nas próprias palavras.

A menina levantou a cabeça instantaneamente num movimento torto e robótico.

Experiências? – Perguntou Zara com uma voz dupla e adulta que tremeu até o chão. Seus olhos adquiriram o brilho do Estado Avatar. – Então foi pela ciência? Pelo bem do mundo? – Perguntou novamente, sendo irônica. Zara virou-se de frente para Airon com a postura rígida. O rapaz já pensava em fugir, já temia pelo seu fim.

O solo, o teto e as paredes começavam a tremer sem Zara fazer um gesto sequer, dando a Airon a impressão de que todo o subsolo do planeta havia entrado em colapso num terremoto sem fim. Mas era apenas Zara.

Os cabelos da menina se erguiam brevemente e chegaram a se soltar um pouco do coque apertado que os mantinha presos. Mesmo sem ter aprendido a dobra de ar, ela parecia "instintivamente" dobrar o ar quando entrava no estado avatar, causando chicotadas de vento para todos os lados emanando de seu próprio corpo.

Algumas das chicotadas atingiam Airon certeiramente, jogando-o cada vez mais para trás, quando Zara sequer movia um músculo.

– Zara, eu não...

Acho que posso fazer algumas experiências também! – Gritou interrompendo-o e acentuando a careta de fúria em seu rosto.