– Zara, filha de Kayun e Hian. Tens a minha vida entregue e dedicada apenas a tu. – Ouviu um sussurro. – É o meu presente mais valioso, e até o meu último sopro de vida honrarei o teu nome. Zara. – Concluiu Sozen, com a voz feminina, doce e elegante.

– Então nossas vidas são dedicadas a todos eles, Sozen. – Disse Zara sorrindo. – E a propósito: Muito Obrigada. – Concluiu Zara, ouvindo um breve ronronar vir do peito do Tigre-leão.

A manhã se passou como num sopro rápido, e Sozen se levantou lentamente, inclinando a cabeça em direção à sala que estava atrás da porta, diante das duas. Zara assentiu com a cabeça antes que o Tigre-leão se retirasse, descendo as escadas elegantemente.

A porta era trabalhada e feita de madeira escura, repleta de escrituras e desenhos que contavam histórias. Zara observou atentamente antes de pensar em abri-la. Haviam quatro entradas pelas quais o ar devia, supostamente passar.

No centro da porta, dividido em dois, estava a imagem de um monge meditando, com um sorriso pacífico no rosto e quatro objetos flutuando diante de suas mãos, um para cada direção das quatro entradas.

Zara experimentou dobrar ar para as quatro entradas, mas não houve reação alguma. Logo parecia muito óbvio o que devia fazer, e o que seria aquela sala.

Era a sala do Avatar, apenas quem fosse mestre dos quatro elementos poderia abrir aquela porta. Zara pôs-se em posição de expectativa, alinhando os pés aos ombros, e ergueu as mãos na altura do rosto, tocando a testa com as costas dos dedos.

Inspirou e expirou profundamente, fechando os olhos e concentrando-se. Teria que conseguir dobrar os quatro elementos de uma só vez.

Ouviu a voz de Raava em sua mente, incentivando-a a prosseguir. Ao reabrir os olhos, estres brilhavam numa luz branca pura.

Logo a garota parecia dançar sozinha diante da porta gigante. Fez um movimento circular com a mão direita, enquanto trazia o pé do mesmo lado para trás do outro, trazendo na palma da mão uma chama baixa. Ao mover a outra mão, trouxe a perna esquerda para o mesmo lado, voltando a alinhas os pés e fazendo um movimento circular com as mãos, liquidificando algumas gotículas de água para que flutuassem diante de seus dedos.

Fitando atentamente as quatro entradas, identificou aonde deveria entrar cada elemento. O fogo para cima, a água para baixo, o ar para esquerda e a terra para direita. Sorriu desafiadoramente, erguendo as duas mãos e unindo os pés.

Pisou com força no chão, erguendo uma rocha de tamanho médio arrancada do piso do templo, deixando um buraco no chão. Num movimento rápido, Zara chutou a pedra para a entrada direita e ricocheteou o pé, de modo que movesse uma massa de ar para dentro da entrada da direita, enquanto girava o corpo para lançar fogo e água ao mesmo tempo, cada um numa direção, respectivamente para cima e para baixo.

Quando aterrissou do salto, seus olhos voltaram ao normal enquanto seu corpo permanecia em postura de batalha, porém elegante e confiante.

A porta rangeu devagar, para só então começar a abrir. Por alguma razão, Zara não estava curiosa para ver o que havia lá dentro, e quando a porta finalmente abriu por inteiro ela sorriu ternamente.

Era um quarto, o seu quarto. Entrou com passos lentos observando todo o cômodo. Era grande e aconchegante, tinha as paredes altas e o teto todo esculpido diretamente na pedra. A primeira coisa que via ao entrar no quarto era uma grande cama de lençóis amarelos e laranja, arrumada e brevemente empoeirada, com dois travesseiros. Era uma cama muito baixa e tinha dois tapetes marrons, um de cada lado da mesma. Ao lado direito da cama havia uma porta pequena e simples, de madeira, com alguns móveis antigos e empoeirados nos dois lados. Ao lado esquerdo da cama havia uma mesa de tamanho médio com alguns papéis em cima, com um banco simples e um baú do lado.

Zara soltou um suspiro impressionado, sentia-se extremamente à vontade ali.

É o meu quarto...? Pensava estupefata.

Lentamente, Zara pôs o pé direito diante do corpo e inclinou o tronco para frente enquanto abria os braços aos dois lados do mesmo, num movimento calmo e delicado. Tão devagar quanto o movimento, uma brisa suave soprou no quarto, tirando a maior parte da poeira que nele havia.

Por fim, Zara pôs-se em posição de expectativa e, num movimento bruto e veloz, cruzou as mãos diante do corpo para então abrir os braços, levando toda a areia do quarto embora.

Sorriu satisfeita, começando a andar lentamente pelo quarto e preparada para explorá-lo.

Não longe dali, dentro do templo, Avalon estava sentado no parapeito de uma varanda. Pensava sobre a atitude de Airon em partir. Sabia a importância da presença do irmão, e por isso estava ciente de que não era tanta. Durante aqueles meses vivendo quase como um nômade do ar, pôde observar e pensar sobre muita coisa.

Imaginava que Airon fizera o mesmo. Com um suspiro intenso e demorado, Avalon fechou os olhos e sorriu de canto. Permitiu-se a sorrir um pouco pensando em tudo que havia acontecido nos últimos meses.

Então o vulto negro de Sozen parou na escada, ao fim do corredor, no campo de visão de Avalon. Ele encarou o tigre-leão por alguns segundos antes que o mesmo seguisse seu caminho lentamente escada a baixo.

– Sozen...? – Sussurrou pensativo e franzindo o cenho. Num suspiro cansado, Avalon se levantou e soltou o cabelo, para prendê-lo novamente dessa vez mais forte. Caminhou até a escada e olhou para baixo, procurando por algum sinal de Sozen, mas ela já havia ido embora. Olhou para cima e imaginou quantos andares ainda existiam até o topo da torre principa do templo, e o que Sozen fazia nos andares superiores. Hesitante, Avalon começou a subir os degraus.

Havia em torno de sete andares para cima, andares estes que o rapaz explorou minunciosamente. Tratava-se de quartos, depósitos, salas vazias e varandas. Algumas salas não podiam ser abertas por ele, já que necessitava dobra de ar para abri-las, o que o deixou um tanto curioso. Cada andar tinha três escadas em pontos distintos, e Avalon acabou por trocar as escadas enquanto subia.

Quando chegou ao último andar, encontrou-se num salão amplo e ventilado, com varanda para três lados, e apenas uma parede atrás de si. A vista era magnífica, e a vontade de se jogar dali era quase incontrolável. Imaginava quanto tempo demoraria para chegar no oceano. Só de imaginar que a montanha era enorme e o templo também, sequer conseguia dar um palpite sobre a altura em que estava.

Era, sem dúvidas, o ponto mais alto onde já estivera na vida inteira.

O parapeito daquela varanda era composto por dezenas de pequenas colunas, com alguns centímetros de distância entre elas. Naqueles espaços Avalon colocou suas pernas, com a cabeça apoiada no corrimão em si enquanto olhava as nuvens, que pela primeira vez na vida estavam embaixo, e não em cima.

O sol do final da tarde era de tirar o fôlego, e em pouco tempo o rapaz estava começando a ficar com sono. O vento forte que passava parecia mais aconchegante que incômodo, e os olhos de Avalon fechavam-se aos poucos enquanto aquele mesmo vento tirava-lhe o prendedor do cabelo, deixando os fios soltos.

O sono lhe invadiu tão suavemente quanto aquela brisa que soprava.

Após explorar o quarto por completo, o sol já havia passado do horizonte e a lua estava majestosa no alto do céu. Para Zara, só faltava um lugar para explorar, que seria o cômodo atrás da pequena porta ao lado esquerdo da cama. Mal colocara a mal na maçaneta, lembrou-se de um lugar onde havia esquecido de explorar.

Era um baú grande ao lado da escrivaninha. Ela se aproximou e não encontrou nenhum cadeado ou nada do tipo, embora o baú fosse belamente repleto de escrituras e desenhos que pareciam contar uma história totalmente paralela à da jovem avatar.

Ela abriu o baú devagar, encontrando dentro dele alguns tecidos dobrados com alguns colares pousados por cima dos mesmos, cuidadosamente. A má iluminação não permitiu que entendesse bem as cores, e Zra se negava a dobrar fogo ali dentro por puro medo.

Ao começar a tirar os panos dali de dentro, depois de colocar os colares delicadamente no chão ao seu lado, Zara percebeu que tratava-se de uma roupa, e não conseguiu conter um sorriso estonteante. Era uma roupa de alguma de suas encarnações passadas, de algum avatar que havia sido monge do ar. Zara queria saber quem havia sido, saber o nome, a história. Lembraria de perguntar à Muraoka.

Não se atreveu a vestir as roupas, apenas as dobrou e manteve ali no baú, guardadas com cuidado. Zara se levantou devagar e com um parcial sorriso no rosto. Ficou encarando o baú por algum tempo, com a mente divagando sobre aquelas roupas.

Não se demorou mais que poucos minutos para então voltar-se para a porta simples que havia bem ao lado da cama. Abriu-a lentamente e logo seus olhos brilharam.

Tratava-se de um belo salão, onde a única parede era a que tinha a conexão como quarto, e os outros três lados eram apenas varandas. A noite estava muito escura e o vento muito frio, mas Zara não conseguiu resistir à tentação de aproximar-se do parapeito e inspirar profundamente o ar frio e puro que soprava ali, no ponto mais alto do Templo.

Depois que a surpresa passou e a garota se acalmou, ela virou-se de frente para a pequena porta de onde saíra, encarando a bela parede repleta de escrituras e desenhos antigos. Foi quando percebeu, num canto próximo à parede, um vulto sentado no chão com as pernas para fora da varanda.