– Zara. – Respondeu sem conseguir conter o pequeno sorriso que tinha no rosto.

Os dois meninos ainda não conseguiam entender nada.

De súbito, um brilho apareceu no olhar de Zara. Não sabia o que fazer. Qual deveria ser a sua reação?

Hian colocou a mão sob o ombro dela com um sorriso nostálgico, enquanto a menina franzia o cenho.

– Não vou te cobrar nada, Zara. – Disse um tanto triste. Ela engoliu em seco.

– Airon, Gumo. – Chamou a menina dando alguns passos para trás, para longe do homem, que apenas permaneceu abaixado, claramente magoado, assim como ela estava. Airon e Gumo deram alguns passos para alcançarem a amiga, e a fitavam um tanto hesitantes.

– O que houve? – Perguntou Gumo preocupado.

– Este é Hian, meu pai de sangue. – Disse num sussurro quase inaudível. Airon olhou para o homem. Não sabia porquê, mas tomou uma certa raiva pelo homem. Já Gumo apenas boquiaberto, mal conseguiu deixar o sorriso lhe sai pela boca.

Zara olhou para Hian pelo canto do olho. O homem já estava sentado no chão, esperando que a menina se acalmasse um pouco. Ela suava frio.

Depois de algum tempo reunida com seus amigos, sem uma palavra sequer, a jovem avatar voltou-se para seu pai, ajoelhando-se na frente do mesmo.

– O que houve? – Ela perguntou. O homem sabia que muitas palavras seriam ditas a partir daquele momento. Não fazia ideia de qual poderia ser a reação de sua filha. Queria poder fazer-lhe perguntas também, mas não podia.

– Quando sua mãe...

– Kayun. - Corrigiu a menina. Hian olhou-a confuso, mas deixaria suas próprias dúvidas para depois.

– Quando Kayun ficou grávida, a nação do fogo infiltrou dezenas de dobradores dentro do palácio. Eu, como homem adulto e saudável, precisava ir. O General daquele navio me confundiu com um dobrador de água, e me levou junto com mais seis dobradores. Nunca mais vi Kayun desde aquele dia.

“Quando descobriram que eu não era dobrador, nem tinha nenhuma habilidade em especial, eles me mandaram para uma prisão qualquer de exilados do Reino da Terra. Um dia uma tropa invadiu aquela prisão e levou os prisioneiros para Omashu, e de lá, os úteis seriam trazidos para cá.”

Hian parou de falar por um longo período de tempo, esperando que Zara se manifestasse.

– Estou aqui desde então. Vivo bem aqui, vivo seguro. Meu único limite são os muros externos de Ba Sing Se. Deles eu não posso passar. – Concluiu.

Zara ainda estava muito confusa. Não sabia se devia correr e abraça-lo, e achava que realmente não devia. Seu pai era, e sempre seria Gaibo.

– Zara, onde está sua m... Kayun? – Ele perguntou depois de algum tempo, estava nervoso, meio hesitante.

Ainda a amava, estava óbvio.

– Eu não sei. – Disse a menina fazendo Hian franzir o cenho. – Quando você foi levado pela Nação do Fogo, Kayun deu a luz e me deixou na porta de um orfanato. É tudo o que sei sobre ela. Fui adotada por Tera e Gaibo.

Ainda mais confuso, Hian suspirou profundamente.

– E estes são...? – Perguntou referindo-se a Airon e Gumo.

– Meus amigos. – Disse sem querer entrar em detalhes.

Ainda não sabia se poderia confiar em Hian, mesmo ele sendo seu pai.

– E para quê vieram para Ba Sing Se? – Perguntou ainda muito confuso. Feliz por encontrar sua filha, mas mesmo assim confuso.

Zara suspirou.

Airon e Gumo temiam que ela lhe contasse a verdade.

– Viemos procurando um dobrador de terra, então seguiremos para o Templo do Ar Sul, e então para a Ilha do Avatar Roku. – Disse a menina casualmente, fazendo Hian arregalar os olhos.

– Mas para quê?! – Perguntou exaltado.

– Eu e Gumo somos responsáveis pela dobra de água do próximo Avatar, Airon é o responsável pela dobra de fogo. Estamos em busca dos outros dois professores. – Explicou, o que não era de todo mentira.

– Espera, você é dobradora de água? – Perguntou Hian estupefato. Zara confirmou com a cabeça, olhando de canto para seus dois amigos, com um pequeno sorriso que os outros dois também carregavam.

Na cabeça dos três, a mesma frase: Dobradora de água, terra, fogo e ar.

Talvez um dia contasse a Hian.

– E vai sozinha? Quem mandou? – Perguntava cada vez mais exaltado.

– Vou com Airon e Gumo. Yue nos mandou. – Respondeu simplesmente, um pouco incomodada com a maneira como Hian estava falando com ela. Não era acostumada a dar satisfações a qualquer um que não fosse Tera, Gaibo ou algum professor.

– Yue? Aquela menina...

– A Princesa Yue. – Interrompeu Zara, já se levantando.- Poderia nos mostrar nossos aposentos? Caso sejamos um incomodo, podemos procurar um outro lugar para ficar. – Disse a menina friamente, causando aquele arrepio em Gumo e Airon.

– De jeito nenhum. – Sussurrou Hian, magoado. – Por aqui. – Disse os guiando para o quarto.

Era um quarto pequeno, com apenas uma cama. Mas Hian trouxe dois colchões extras para completar o número. Estava muito escuro, e só tinha um candeeiro no quarto. Lençóis, travesseiros, tapetes e cortinas, tudo num tom de marrou ou verde escuro.

Mal o Tenente havia saído e Zara sentou-se no colchão que ficava diante da janela baixa, fechada pelas cortinas. Abriu uma brecha com os dedos e olhou para o lado de fora. Havia começado a chover.

Gumo se aproximou da menina, sentando ao lado dela e olhando a chuva pela brecha de quase um palmo.

– Eu queria poder estar lá fora agora. – Comentou num sussurro cansado.

– Eu também. – Sussurrou Zara em resposta. O silencio tomou o quarto em seguida, sendo quebrado apenas pela chuva lá fora, era uma trilha sonora em tanto.

– Zara... – Gumo começou a falar com um tom aveludado e compreensivo. – Não ficou nem um pouco feliz de encontrar o seu pai? – Perguntou o menino um tanto nostálgico.

– Se você conhecesse alguém que todos diziam estar morto... – Começou a explicar a menina, sem sequer tirar os olhos da janela. - ... e que você nunca conheceu... Como se sentiria? – Perguntou. O menino podia entender.

– Não sentiria nada demais. – Disse Gumo num sussurro. – Mas se fosse o meu pai... – Deu um sorriso tristonho. – Eu ficaria feliz. – Concluiu.

Zara nunca perguntou sobre a família de Gumo, nem sobre a de Airon. Parecia que o menino tinha uma história triste.

– Mas eu já tenho um pai. – Sussurrou a menina sem querer ofender o amigo. – Um pai que me ama, que cuidou de mim. Cada ferimento, ele esteve lá. Cada sorriso, ele participou. Eu já tenho um pai, não preciso de mais um. – Concluiu.

– Mas ele não se foi por querer. – Gumo tentou defender.

– Eu sei disso. Mas aconteceu. – Justificava Zara. – Sei que ele deve gostar muito de mim e estar muito feliz por me encontrar. Mas eu não o conheço, Gumo. Eu não faço ideia de quem seja esse homem, tudo o que sei sobre ele é o nome.

Gumo fitou o chão com os olhos marejados. Olhou de lado para a amiga.

– Zara... Estive pensando em voltar para o Polo Norte. – Revelou o menino recebendo um olhar assustado da amiga. – Não é por sua causa. Pouco antes de sairmos de lá, descobri que tenho uma irmã... – Sussurrou com um sorriso vago e tímido. – Quero estar com ela...

Zara estava sem chão. Gumo tinha sido a esperança do trio, a lógica, o conhecimento cientifico. Soltou o ar ofegante.

– Gumo... – Sussurrou sem conseguir falar mais nada.