Atraída por um Darcy

Excitantes Férias de Verão — Parte 3


POV Georgiana

Eu poderia ser descrita, como muitas vezes já li nos jornais, como uma das nobres mais sortudas que poderia encontrar no Reino Unido. E eu até concordo com isso, afinal eu tinha uma família tão atenciosa e havia ganhado, recentemente, amigas com as quais me sentia tão bem, principalmente Lizzie. Então por que eu tenho esses momentos de infelicidade? E isso sempre acontece quando eu olho para ele, tão sorridente dando bastante atenção a todos, mas fazendo o impossível para me evitar, quando no passado ele fazia de tudo para estar comigo. Ele me odiava tanto assim?

Eu havia escutado atentamente tudo o que minhas novas amigas haviam dito, concordado em fazer de acordo com o programado, mas eu sabia que não daria certo. Rick tem sido tão indiferente a mim nos últimos meses que acho improvável algo sair daquele lado. No entanto, eu não perderia muita coisa em tentar, certo?

Enquanto eu repensava sobre o que iríamos fazer a tarde, afinal Charlotte veio com a ideia de fazermos um piquenique à beira do rio, um nervosismo tomou conta de mim. Será que eu conseguiria fazer isso direito? Eu estava tão nervosa!

— Vamos, meninas, precisamos nos arrumar! — disse char, ainda à mesa, assim que terminou seu almoço. Como eu teria que resolver as questões sobre a alimentação ainda, assenti para elas e disse que logo as encontraria no quarto de Lizzie, pedindo licença a todos os presentes e indo até a cozinha.

— Querida menina Georgiana, o que a traz para esse lado? — falou Hill, sorrindo como sempre, assim que entrei na cozinha.

— Por Deus, vó, a senhora soa como se eu nunca entrasse aqui. — respondi também sorrindo, afinal eu precisava espantar todo o humor ruim que tinha se apoderado de mim durante o almoço, e me aproximei de uma das mais antigas empregadas da família para lhe dar um abraço. Madeleine era tão querida por todos que havia chegado a um nível em que eu e meu irmão a considerávamos nossa avó, uma vez que as nossas haviam nos deixado cedo. E, como passávamos mais tempo em Pemberley quando criança, essa proximidade havia criado laços tão fortes quanto os de sangue. No entanto, quando crescemos, fomos obrigados a nos mudar para a cidade, mas Madeleine não aceitou a mudança, afinal toda a sua família morava na região. Eu, embora tivesse ficado infeliz, não pude ser contra a sua decisão.

— Deixe-me, pequena, pois sinto-me negligenciada por você. Seu irmão ainda me visita, mas você parece gostar bem mais da desorganização da cidade. — suspirou teatralmente e eu tive que rir. Ela era uma péssima atriz. — No entanto nos últimos tempos ele vem me deixando de lado também. O que tem de tão especial na cidade, minha querida? Ele sempre gostou bem mais de Pemberley, mas agora só vem quando o seu pai o obriga. — Ela parecia tão desolada que eu tive que rir e me afastei um pouco, ainda mantendo meu braço esquerdo sobre seu ombro.

— Oh, vó, não fique assim. Você sabe que tenho meus compromissos com o orfanato e eles precisam de mim principalmente nos fins de semana, já meu irmão não tem desculpa.

— Ele diz que está muito ocupado com a escola, o que não me convenceu em nada. Seu irmão estudando? Talvez ele devesse estudar como inventar uma boa desculpa, pois anda precisando. — ela bufou fingindo estar irritada e eu gargalhei, mas encontrei ali uma forma de fazer com que meus planos futuros dessem certo.

— Você está certa, embora eu acredite que ele não precisará muito desses planos. No entanto algo me diz que seu real motivo para se manter afastado de Pemberley é porque ele não quer se afastar de casa.

— De casa? O que há de tão especial na casa da cidade? Se ainda fosse Pemberley...

— Não sei, vó, mas algo me diz que tem a ver com a nossa nova hóspede. — falei sacudindo as sobrancelhas.

— A menina Lizzie... sua mãe me mostrou uma foto quando veio, e pude ver que é uma jovem linda, mas eu ainda não a vi pessoalmente. Ela veio com vocês?

— Sim, ela veio.

— E Fitzwilliam está apaixonado, eu suponho. — falou com um sorriso malicioso.

— Eu não diria tanto, vó, mas acredito que ele tem estado confuso. Não sai daquela estufa durante todo o fim de semana! — respondi revirando os olhos.

— Aquela estufa... Não se preocupe, pequena, quando ele encontrar uma resposta sairá de lá. — murmurou e, não querendo mais entrar no assunto, pois aquela estufa lhe lembrava dos meus avós, ela se afastou para novamente voltar-se, dizendo: — Mas me fale, o que posso fazer por você?

Como eu entendi completamente o motivo da mudança de assunto, e não querendo mais lhe lembrar de coisas que a deixavam triste, lhe comuniquei os arranjos para a tarde e ela se ofereceu para preparar uma cesta com tudo que desse tempo preparar. Por sorte, muita coisa já estava pronta, pois Madeleine era de uma disposição tão boa que havia preparado tortas e outros tipos de doces e salgados assim que soube da quantidade de jovens que iriam passar aquela semana em Pemberley. Eu só pude agradecer e depois de lhe dar outro abraço, ainda mais apertado que o primeiro, deixei a cozinha e fui para o quarto de Lizzie.

— Nossa, como você demorou. — falou Lizzie, irritada, assim que abriu a porta.

— Eita que estamos de mau humor... — respondi entrando.

— Desculpe, Georgie, mas Char me tira do sério. — Como eu não entendi nada, tive que perguntar o motivo e ela começou a me responder: — Ela só cismou com meu biquíni, então não parou de falar desde que entro-

— Não seja tola, Lizzie, você trouxe esse lixo nada sexy. O que você tinha na cabeça quando comprou isso? É por esse motivo que Darcy não te olha como mulher, deveria no mínimo fazer a mente do cara viajar, mas não... fica usando esses trapos que nem a minha vó ousaria vestir. Olha isso, gente! — disse Char enquanto segurava um pedaço de pano rosa que parecia um short. Um short curto, mas um short. Sobre a cama eu podia ver um top da mesma cor, que me pareceu ser a combinação da outra peça. Ela iria usar aquilo mesmo? Eu tive que segurar o riso.

— Não exagere, Char, ele ficou muito bonito em mim quando provei na loja.

— Maldita hora que te deixei naquela loja sozinha. O que você tinha na cabeça? Por Deus, o que você tem agora? Não usará isso!

— Irei usar sim, mesmo porque não trouxe nada além disso. — falou Lizzie e se sentou na cama, cruzando as pernas. Pelo que eu já havia visto, estava na cara que Char não desistiria fácil. Por que ela ficava discutindo mesmo?

— Pois não usará. Prefiro que vá nua a usar isso na minha frente. Você está viajando? Uma amiga minha usando isso? Não mesmo! — insistiu Char.

— Calma, gente. — Finalmente Jane entrou na conversa! — Embora isso seja um horror, ela não tem mais nada para vestir, então teremos que aceitar. Não há nada o que fazer, Char, você terá que suportar. — finalizou sorrindo com todo habitual sorriso meigo. Char suspirou, mas pareceu ponderar.

­­­— Ok, até porque não há muito o que fazer... não é como se algum dos nossos biquínis fosse servir. Por Deus, Lizzie! — ela gritou e depois saiu do quarto. Eu tive que segurar o riso.

— Não pode ser tão mal, Lizzie, meu irmão nem liga para essas coisas, é só que... que... isso é roupa de banho para criança.

Ao ouvir minhas palavras ela abaixou um pouco a cabeça e sentou-se na cama, ao lado das peças.

— Eu não estava pensando nisso na outra... Digo, pensando em chamar atenção. Na verdade eu queria mesmo era esconder. — ela murmurou e eu olhei para Jane que havia se aproximado dela e sentado ao seu lado.

— Esconder o que, Lizzie? — indagou.

— Vocês vão me achar idiota, mas no fim é isso que eu sou mesmo. — tornou ainda de cabeça baixa. A essa altura eu já estava agachada em frente a ela, preocupada que o seu lamento estivesse relacionado com um certo alguém que eu conheço muito bem.

— El- Digo... Vocês sabem, não é como se eu tivesse seios fartos ou normais como vocês, os meus estão bem longe disso... eu só não queria deixá-los em evidência para ele não fazer piada.

— Ele? — dessa vez foi eu quem perguntou. Ela olhou rapidamente para mim, depois para Jane e depois para a porta. Foi o suficiente para entendermos. Eu principalmente.

— Eu não sei direito, mas tenho a lembrança dele falar algo sobre eles... talvez tenha sido um sonho, então eu venho pensando muito nisso desde que decidimos vir para cá e cheguei a conclusão de que não quero que ele veja que eu não tenho nada demais no meu corpo, nada que chamaria a atenção de um homem.

— Você está assim por causa de um sonho? — indagou Jane revirando os olhos. — E que conversa é essa sobre não ter nada que chame atenção de um homem? Não conheço ninguém mais inteligente que você... Bem, ninguém exceto o Darcy, o Richard, o Charl-

— Ok, Jane, você já provou seu ponto. — interpelou Elizabeth e Jane ficou vermelha, mas não perdeu muito tempo assim.

— Certo, vamos esquecer a parte da inteligência, até porque sabemos que isso é uma das últimas coisas que alguns homens dão importância, embora ache que Darcy não seja desses, mas você é linda, Lizzie, tanto de rosto quanto de corpo. Só porque tem seios pequenos? Talvez eles ainda estejam crescendo...

— Ou talvez não. Mas decidi parar de evitar o inevitável e prefiro esconder de uma vez. Mas vamos nos arrumar, logo teremos que ir.

Me despedi de ambas e fui para o meu quarto tomar um banho e me arrumar. O assunto abordado com as meninas havia não só desviado a minha atenção do que me assustava, mas feito eu me lembrar de algo que havia acontecido alguns meses atrás...

Will havia levado Lizzie porque ela estava muito fora de si e mal conseguia ficar em pé, mas a cena que eu presenciei era algo que, por mais otimista sobre o relacionamento deles que eu pudesse ser, nunca esperei ver. Depois daquele dia William passou a tratar Lizzie melhor ou ignorar. Para os demais era algo normal para a convivência humana, mas para mim era algo muito estranho.

Antes de Lizzie chegar a nossa casa, isso depois do trágico acidente dele, meu irmão tinha feito o possível e o impossível para evitar perturbações, e nisso consiste em ignorar e não deixar que nada o afete. Ele tem sido frio sempre que necessário e se comportado como alguém sem coração (não no sentido cruel, afinal é um homem muito generoso, mas nada do que façam ou falem consegue deixá-lo triste). Não que ele sociável antes, mas havia piorado muito. Outro fato que sempre me perturbou foi o dele não ter namorada, afinal, mesmo depois de tudo, é normal homens na idade dele ter alguém. Isso tudo era muito estranho. Parecia como se meu irmão existisse, mas fosse apenas um robô programado para executar atividades, onde as vezes uma delas era ser o meu irmão.

Foi só quando Lizzie chegou a nossa casa que eu pude ver um pouco de vida surgir dele. Mesmo na forma do aparente ódio, meu irmão estava de novo na minha frente agindo como um ser humano. Eu o observei durante algum tempo quando Elizabeth se aproximava e ele sempre mudava sua postura, ainda que fosse para evitá-la. Tudo isso chamou a minha atenção e eu pude chegar à conclusão que Lizzie foi a única que conseguiu torná-lo quem ele realmente é, principalmente depois que presenciei aquela cena no saguão onde ela estava sentada no colo dele. Naquele momento eu achei que eles finalmente tinham se acertado, e só confirmei depois, enquanto ia para o meu quarto, ao presenciar o beijo dos dois. A certeza do começo de um relacionamento que só poderia fazer bem aos dois morreu dias depois, quando ele passou a se comportar de forma fria também com ela. No começo achei que era apenas teatro, que eles estavam se vendo em segredo e não queriam que ninguém da família se intrometesse (isso seria muito a cara do meu irmão), mas o olhar de saudade que muitas vezes presenciei nos olhos de Lizzie sempre que olhava para ele me disse o contrário. Ele estava se fechando novamente, e talvez agora não tivesse mais volta.

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Terminei de me arrumar pouco tempo depois, o que foi um tanto rápido se comparado ao meu normal, mas não rápido o suficiente uma vez que fui a última a chegar no piso inferior.

— Você está fabulosa, Georgie! — gritou Char assim que me viu. Eu não entendi de primeira o motivo daquela gritaria, então apenas sorri e tentei evitar o tom vermelho que tomava conta do meu rosto, o que foi um fracasso. Quando já me aproximava foi que entendi o motivo, o seu grito havia chamado a atenção de todos para a minha chegada, inclusive a de Richard. Ok, eu estava vermelha igual a um pimentão maduro.

Na propriedade havia duas piscinas, alguns rios, lagos e pequenas cachoeiras. Na verdade, havia um enorme lago bem na frente da casa principal, que havia sido alterado para um tamanho bem maior, mas de forma bem natural. Era algo esplêndido e eu havia decidido desde cedo me casar ali bem ao lado dele. Mas não era para onde iríamos, uma vez que havia muitos peixes que precisavam serem deixados em paz. O escolhido foi o preferido de William, um que ele sempre ia quando era pequeno, mas que ficava um pouco distante da casa.

Para evitar andarmos demais, Will dispensou os motoristas e decidiu ir dirigindo até a maior parte do caminho. Perto da entrada da trilha havia um estacionamento de barro e alguns seguranças já que a área era sempre alvo de alguns invasores que causavam transtorno e deixava tudo sujo. Ele também tentou dispensar Harvey, mas não foi preciso muito para o nobre marquês desistir. Eu tentava evitar rir, mas era hilário como as vontades de Will eram nada quando Harvey batia o pé. Coitado do meu irmão.

Não demoramos muito e logo estávamos nos organizando na margem do rio. Como Char havia me instruído, eu tentei ao máximo ficar próxima a Rick, mas ele parecia não perceber e não facilitava algum início de conversa. Eu achei aquilo muito estranho, estava mais como se fôssemos estranhos ou inimigos e não primos, como era o caso.

— Como vai a minha tia, Rick? — perguntei assim que tive a chance de ficar a sós, pois o meu irmão havia ido buscar umas garrafas de suco que haviam ficado no carro. Ele me olhou surpreso, mas como se esperasse que eu também ignorasse a existência dele, mas respondeu.

— Ela está viajando a trabalho tem uns dias, não acho que eu possa dizer muito sobre como ela está.

Droga!

Richard 1 x 0 Eu.

Eu tentei pensar em como poderia continuar aquela conversa mesmo com aquela tirada, o que foi complicado, mas eu tentei novamente.

— E a escola? Tem se saído bem?

Ele olhou novamente para mim, parecia desconfortável, mas respondeu:

— Não tão bem quanto seu irmão, mas acho que conseguirei uma vaga na universidade que eu quero. — falou e voltou o olhar para o rio, onde Lizzie, Jane e Char nadavam. — Você não vai nadar com as meninas?

Tentando não ficar vermelha, eu respondi (afinal precisava de uma desculpa): — Err, sim, eu vou, só não quero me impor. Estou dando um tempo para elas aproveitarem entre si. — Ufa!

— Besteira! Não acho que elas sejam assim, você deveria ir até elas.

Me sentindo indesejada eu comecei a me levantar, enquanto falava: — Ok, se você não me quer aqui, é melhor e-

Ele não me deixou terminar de falar, segurou no meu pulso direito me fazendo parar:

— Não, não, Georgie... Você pode ficar, só achei que poderia ficar melhor lá. — falou e estava notavelmente envergonhado. Eu mordi o lábio inferior, mas me organizei e sentei novamente, voltando a olhar para as meninas a fim de me recuperar do momento. Eu sabia que teria que ficar ali ou elas me matariam... e eu sabia que iria me arrepender depois se saísse. Aproveitando a sensação da mão dele segurando meu pulso, tornei a falar:

— Ok, eu achei que-

— Fitzwilliam, preciso que me ajude aqui! — a voz do meu irmão chegou até nós alta e cortante. Ele nos encarava sério. Bem, não a mim, mas a Rick. Voltando-se para Richard, pude ver quando ele ficou vermelho e se ergueu no mesmo instante, pedindo desculpas a mim e indo até ele. Eu nunca tive tanta raiva do meu irmão!

Permaneci sozinha por poucos segundos, porque logo Char sentou ao meu lado toda afobada.

— Certo, agora me fale que merda foi aquela.

— Que merda? — perguntei confusa. Ela revirou os olhos.

— Seu irmão parecia que iria matar um. Vamos, o que tem demais em você e Richard conversarem um pouco? Parecia até que estavam se comendo e não que ele estava apenas segurando o seu pulso. — ela falou enquanto admirava as unhas da mão direita.

— Charlotte! — gritei vermelha.

— Tsc, tsc. — deu de ombros, mas logo ficou séria e me encarou. — Não sei nada do que está acontecendo, mas tem coisa aí e teu irmão pode explicar muito mais do que tu acha. Ele estava ali conversando com Harvey sobre a viagem que ele iria fazer com o pai de vocês, de repente, quando viu vocês dois conversando, ele ficou sério e soltou aquele grito. Você sabe que não perco nada do que se passa com o meu Harvey. Que homem gostoso, por Deus! Mas voltando porque falar demais daquela gostosura está me dando vontade de comer... Tem merda aí, acho melhor apurar.

— Apurar? E como vou fazer isso? Eu nem mesmo faço ideia sobre o que deve ser! — falei assustada.

— Sabe sim. É sobre você e Richard, o resto não importa. Agora deixe-me ir, quero aproveitar que meu Harvey está só. — e com uma piscadela ela se afastou.

Eu fiquei refletindo sobre o que Char disse, mas a verdade era que eu estava esperando Richard. Quando já fazia muitos minutos e nenhum sinal dele, eu comecei a dar crédito às palavras da minha nova amiga. Será que era alguma coisa séria ou eu estava exagerando? Quando eu já estava cansada de esperar, pois já fazia quase meia hora que estava sentada sozinha como idiota, me levantei e fui para a beira do rio, onde Lizzie, Jane e Charles conversavam animadamente sobre um assunto qualquer.

— Isso soa assustador, Charles! — falou Jane, chocada.

— E é! Tenha cuidado, Lizzie, ouso dizer que você não ficará inteira por muito tempo. Minha irmã anda muito curiosa para saber quem é você e costuma ficar lhe ameaçando. — disse Charles, rindo, e eu também tive que rir. Já havia escutado muitas coisas sobre as irmãs de Charles e, pelo que eu já sabia, ele deveria estar falando de Caroline, a irmã mais nova.

— Mas ela nem me conhece! — disse Lizzie, igualmente chocada, e Charles gargalhou.

— E pode-se dizer sortuda por causa disso. Ela não se importa em lhe conhecer, mas você mora com William. Ouça o meu conselho: não se aproxime dela! Ela provavelmente vai se fazer de amiga, como, infelizmente, já a vi fazer muitas vezes, mas tudo o que ela quer é o Will. Chega a ser vergonhoso e sinto muito por ter uma irmã daquela.

— Nossa! — disse Jane e Lizzie ao mesmo tempo, mas eu já estava acostumada com aquilo. Caroline costumava aparecer na nossa casa pedindo para fazer uma visita, mas só a deixávamos entrar por respeito a Charles, afinal era insuportável aturar alguém tão sem maneiras capaz de fazer visitas sem avisar antes.

Ficamos conversando sobre muitos assuntos, desde o sumiço de Charlotte e Harvey, que não estavam em nenhum lugar onde devíamos ver, até coisas aleatórias. Depois de um tempo Charles chamou Jane para dar uma volta, que aceitou depois dele muito insistir e de darmos uma forcinha. Quando já estávamos sozinhas ali já a algum tempo, meu irmão voltou sozinho, o rosto totalmente fechado em uma carranca que eu via poucas vezes.

— Onde está Richard? — perguntou Lizzie, mas eu sabia que ela havia perguntado porque eu não teria coragem de fazer. Eu ainda era uma covarde perto do meu irmão.

— Voltou para Londres. — respondeu Will.

— O quê? — indagamos Lizzie e eu ao mesmo tempo, ambas no mínimo chocadas – eu estava triste também.

— Assuntos mais urgentes surgiram e ele precisou ir.

— O que um garoto de 17 anos tem de urgente para tratar? É alguma coisa com nossos tios ou primos?

— Não.

— Então o que é? — insisti, não conseguindo esconder o toque de tristeza da minha voz. Will me olhou confuso por algum tempo e depois voltou-se para a rio.

— Não me pergunte mais, Georgiana. — Sua voz era tão dura que eu preferi me calar, mas Lizzie olhou irritada para ele, depois com pena para mim e depois com raiva novamente para ele.

— Você é o quê, idiota? Não pode falar direito com ela? Ela só quer saber o motivo do primo ir embora de uma hora para a outra, uma vez que não havia dado sinal algum de que iria voltar mais cedo. Por Deus, chegamos hoje!

Meu irmão olhou chocado para ela, depois com raiva.

— E quem é você para se intrometer? Cuide da sua vida, não é porque come de graça na minha casa que pode se intrometer nos assuntos da família.

Eu vi quando a expressão de Lizzie mudou de raiva para tristeza e me senti com muita raiva de mim uma vez que aquilo era culpa minha. Se eu não tivesse começado com tudo aquilo, provavelmente essa discussão não teria começado. Pior, Richard não teria ido embora, pois algo me dizia que Will tinha alguma coisa a ver com aquilo, assim como Char falou. Ele não tinha motivo para ficar tão irritado.

— Eu vou voltar para casa. — falei já me levantando para buscar minhas coisas.

— Eu vou com você, Georgie. Não estou com a mínima vontade de ficar com esse idiota. — me seguiu Lizzie.

— Georgiana, não faça isso! Você veio comigo! — gritou o meu irmão, mas eu não parei de andar.

— E posso voltar sozinha. Tenho certeza que nossos pais vão concordar comigo ao ficarem sabendo que você expulsou nosso primo daqui. — gritei sem olhar para ele, estava mais preocupada em chegar ao estacionamento.

— Eu não o expulsei, ele decidiu ir embora sozinho. — ele falou, afinal já havia conseguido ficar ao nosso lado.

— Por culpa sua, tenho certeza! — disse ao tentar entrar no carro, mas ele segurou meu braço para que o olhasse.

— Olhe, as coisas não são assim. Vamos conversar mais tarde, ok? Me espere e conversaremos.

— Estou voltando, Will.

Ele não gostou muito, mas me soltou e ficou me olhando parecendo confuso enquanto eu dirigia na direção da casa, com Lizzie ao meu lado.

— Eu não sabia que você sabia dirigir. — disse Lizzie e eu sabia que ela estava tentando me distrair. Eu tive que sorrir e tentei mandar os problemas para longe por um tempo, embora fosse difícil.

— Nosso pai nos ensinou tem uns dois anos. Desde pequena eu sei manobrar uma carruagem, mas quando crescemos ele viu que era necessário saber dirigir também, afinal não conhecemos o futuro. No entanto ele só nos deixa pegar em um carro quando estamos em Pemberley, diz que é mais seguro.

— Ah... Meu pai é tão protetor que nunca permitiu, mas eu já me acostumei.

— Isso é uma pena, mas acredito que uma vez que você fizer 18 anos ele aceitará.

— Eu duvido muito, mas não custa nada esperar para ver. — disse ela sorrindo e eu agradeci por ela estar se esforçando daquela forma para desviar a minha atenção para assuntos menos estressantes, mas eu não podia fugir da realidade por muito tempo, então tive que falar.

— Char me disse que viu algo estranho hoje mais cedo... — comecei, receosa.

— A Char é muito observadora. Se ela falou, você precisa dar crédito. Foi o que exatamente?

— Bom, nem ela sabe direito, mas acreditou ter visto algo que envolve Rick, meu irmão e eu e me mandou apurar. Não sei como fazer isso, afinal Will nunca me falaria nada...

— Mas Richard sim. Por que não pergunta a ele?

Eu refleti sobre isso e ela estava certa, Richard poderia falar a verdade, porém...

— Mas ele está indo embora, Lizzie.

— Não ainda. Ele levará um tempo até organizar as suas coisas, acho que chegaremos a tempo e você irá falar com ele. Force, ele falará.

— Não... — repliquei com medo, olhando a estrada. — Acho melhor você falar, eu não vejo isso dando certo.

— Não, você falará. Ao menos deve tentar. Caso não dê certo, eu falarei, mas você precisa assumir suas próprias batalhas. Se o seu irmão tem alguma coisa a ver com isso, é inteiramente da sua conta, não da minha. — disse ela e eu senti seus olhos em mim, mas me recusei a olhar. Da forma que eu estava, era preciso olhar bem para a estrada ou poderia acabar perdendo o controle e causando um acidente.

— Ok, vou tentar.

Não demorou muito e eu estacionei na frente da casa principal, saindo correndo na direção do quarto de Richard. Assim que cheguei à porta fiquei parada como uma estátua.

O que eu estava fazendo ali mesmo? Que drama todo era aquele? Por que diabos iria cobrar satisfação dele? Por Deus, eu não poderia fazer aquilo! Era idiotice e eu acabaria pagando um mico. Talvez ele estivesse realmente com problemas e eu estava culpando o meu irmão. Mas aí...

Espera, se ele estava com problemas de família, como realmente recebeu a notícia? Celulares não pegam ao redor do rio, é preciso andar bastante antes de conseguir sinal, chegando quase perto da casa. Sendo assim, como Richard recebeu notícias de casa?

Eu precisava fazer isso.

Quando finalmente encontrei coragem para bater na porta do quarto, ela se abriu e um Richard com os olhos vermelhos e cabelo desgrenhado apareceu na porta. Ele me olhou surpreso e com a boca aberta, mas logo levou seu tempo para se recompor.

— Georgie... Eu, hm...

— Está tudo bem? — me apressei em perguntar, ele não parecia muito bem.

— Sim, claro. Está tudo perfeito. — afirmou, abrindo um sorriso que, pelo que o conhecia, não havia chegado aos olhos.

— Er... não parece muito bem. Algum problema em casa?

— Problema em casa? — ele pareceu confuso por algum tempo, mas se apressou em dizer. — Oh, sim, problemas em casa. Se me dá licença, eu preciso ir na lavanderia buscar a minha roupa de montaria.

Eu não estava muito convencida, então continuei no mesmo lugar.

— Você poderia ser um pouco mais sincero comigo, como antes. — disse e mordi o lábio, estava sendo muito idiota.

Seus olhos abriram-se um pouco, surpreso, mas ele se controlou rapidamente e sorriu dando de ombros: — Antes... G, isso faz muito tempo.

Eu mordi o lábio novamente, vermelha. Eu amava quando ele me chamava de “G”, mas a forma como falou que fazia muito tempo deixou claro para mim que ele não dava importância alguma ao passado e que eu estava sendo idiota em ter esperanças.

— É, você tem razão, faz muito tempo. — suspirei dizendo isso e me afastei, abrindo caminho para que ele passasse. Ele hesitou me encarando nos olhos, mas logo balançou a cabeça e passou por mim, desaparecendo pelos corredores.

Assim que não havia mais sinal de Richard eu corri para o meu quarto e me tranquei, jogando na minha cama e deixando que as lágrimas molhassem o meu rosto. Além de tristeza, eu estava com muita raiva. Raiva de mim, não dele, afinal eu estava colhendo o que plantei. E eu ainda havia tido esperanças quando não devia, acabando por me frustrar novamente e estragando uma semana de férias que havia desejado há muito tempo. Tinha como ser mais estúpida?

Eu fiquei tanto tempo ali que acabei adormecendo, só acordando com batidas frenéticas na porta. Qual era o doido que havia fugido do hospício e estava batendo na porta? Droga!

Levantei-me rapidamente, pois achava pouco provável que a outra pessoa parasse de bater antes que eu desse sinal de vida, corri até a porta e abrindo apenas para encontrar uma Lizzie sorridente do outro lado.

— Vamos, Georgie, está na hora do jantar! — ela disse toda animada e eu me perguntei se ela havia sofrido transplante de cérebro. — Bem que eu queria, metade dos meus problemas havia de se resolver.

Espera, eu havia falado isso em voz alta? Céus, ainda estou dormindo!

— Não está não e nem vai voltar. Vamos, se arrume logo e desça. Estão todos esperando por você.

Droga, havia falado de novo. Argh.

Afastei-me da porta e fui até o banheiro para tomar um banho. Enquanto a água descia pelo meu corpo eu revivia lembranças daquela tarde idiota e sentia vontade de voltar para casa, mas já estava tarde e eu precisaria deixar para o dia seguinte.

Assim que estava pronta me obriguei a deixar o quarto. Embora ainda estivesse chateada com o meu irmão, mesmo sem saber o motivo, eu estava mais calma e poderia facilmente estar em sua presença novamente. Eu precisaria sim saber o que realmente aconteceu, mas poderia conversar com ele depois do jantar, por hora eu precisava agir como uma adulta e fazer companhia aos meus amigos, afinal o meu irmão não era lá muito sociável e sem Richard a convivência não seria lá das melhores. Enquanto descia as escadas com uma resolução tomada, estanquei ao ver Richard encostado à porta principal olhando o crepúsculo sozinho. Aquilo só poderia ser uma visão.

— Richard... — sussurrei, incrédula. Embora tivesse saído muito baixo, ele me ouviu e se virou, seu rosto adornado por um antigo sorriso que havia muito não via. Um sorriso que só conseguia ver em meus sonhos.

— G. — ele sibilou e eu me vi diante do meu antigo Ricky, alguém que eu não esperava mais encontrar.