07 de maio de 1993

Querido Amigo, não tentei descobrir quem era que me mandava suas cartas, afinal também não quero que descubra quem eu sou. Como você, Charlie, pode me chamar de Bianca, eu vou atender.

Como essas cartas chegaram até de mim? Do mesmo modo que as minhas cartas vão chegar até você. Não me pergunte como novamente. Eu não vou saber explicar.

Minha vida não é diferente da sua. Se hoje sou quem eu sou é por muito esforço e muita luta, coisa que você entende muito bem. Já fui diagnosticada como uma garota mentalmente perturbada. Tenho meus problemas e vou lhe dizer logo logo quais são.

Não me culpe se eu parecer muito intima nas cartas, é uma coisa minha.

Sua carta demorou um pouco pra chegar aqui. Foi porque demorou a escrever ou porque pensou em não enviar?

Bom, antes de tudo, foi um prazer ter recebido todas as suas cartas, li todas elas com muita atenção, mesmo estando muito chateada por ficar tanto tempo sem me mandar nada. Sei que disse que não era para me preocupar, mas me desculpe, eu me preocupo.

Vai começar de novo, eu com minha mania de proteção. Me desculpe.

Quero desabafar com alguém. Esse alguém tinha que ser você. Perdi meus pais em um acidente de avião. Estou sozinha com meu irmão mais velho. Você sabe como é perder alguém, não é Charlie?

Não tenha outra crise, amigo, eu estou aqui, precisando de você, seria egoísta da minha parte se eu pedisse para não tentar se matar agora enquanto eu desabafo?

Eu não vou tentar me matar ou qualquer coisa do tipo, não sou assim, mas fiquei muito tempo sem conversar com ninguém, e quando conversava, ficava irritada e jorrava palavras agressivas nas pessoas. Isso não é normal, Charlie, não é. Tive que ir para uma psicóloga e depois para um psiquiatra. Não sou doida, mas, como disse antes, mentalmente perturbada.

A situação está complicada pra mim na escola. Falta dois anos pra terminar e não sei como viver. Meu irmão cuida muito bem de mim, mas não quero passar toda a minha vida como um fardo pra ele. Jamais aceitaria se um irmão mais novo ficasse na minha cola o tempo todo.

Você já sofreu muito por ser isolado do mundo, não foi? No primeiro ano, aconteceu algo parecido comigo.

Cheguei na escola. Ninguém me conhecia. De novata só havia eu e mais uma pessoa. Ela já se enturmara com todos da sala. Eu ficava no meu canto, ou lendo suas cartas ou algum livro novo da minha estante. Todos ao meu redor me ignoravam. Eu tive a sensação de ser realmente invisível.

Estou falando demais, não é?

Me desculpe.

Vou polpar papel para a próxima carta.

Charlie, por favor, responda as minhas cartas.

Com amor,

Bianca.