As Sete Ameaças

Parte IV: Sangue e Água – A má notícia.


Eles estavam demorando muito e Clyde já estava começando a ficar preocupado. Mais que ele, Ana estava preparando-se para sair e procurar o amigo.

— Quer que eu vá com você? – perguntou Saulo.

Ana olhou para Medved, sabia que a ursa teria que ficar, chamaria atenção demais do lado de fora.

“Tudo bem” falou ela “Eu espero você. ”

“Obrigada. ”

— Está pronto para ir?

— Sim.

— Então vamos.

— Ana – gritou Clyde quando a viu perto da porta – Você vai atrás deles com Saulo?

— Sim.

— Eagle vai seguindo vocês do alto, qualquer problema ele irá me relatar e iremos ajudar.

— Certo.

A águia no ombro de Clyde pulou para o de Saulo, que estremeceu de medo, mas não se moveu para tirá-la dali.

— Até mais – despediu-se ela para o líder e saiu pelos túneis com Saulo em seu encalço.

Saíram para a floresta quando o sol estava baixando no horizonte e o céu estava ficando escuro. Ana olhou para Eagle sabendo que só ele conseguiria achar Yuki, Zaki e Li rápido o suficiente.

— Você consegue encontra-los e nos levar até eles?

Eagle guinchou e alçou voo, sumindo no horizonte.

— Você se preocupa muito com seu amigo cego, não é mesmo?

— Ele é muito mais que só um amigo.

— Eu já percebi isso. Vocês são tão bonitinhos juntos, parecem um casal de crianças.

— Obrigada... eu acho.

Eagle logo voltou guinchando para chamar nossa atenção.

— Vamos! Eles não devem estar muito longe!

Ana correu antes de Saulo e logo tomou vantagem, mas não se preocupou em espera-lo, queria ver Yuki logo e saber se estava bem.

Ela reconheceu o caminho que estavam percorrendo. Estavam voltando para a vila. Com a quantidade de soldados que tinha lá, não a surpreenderia nada se tivessem sido capturados, mas a impressionava que não tivessem fugido. Será que os tinham matado? Não sabia se aguentaria perder Yuki depois de reencontra-lo após doze anos.

Contudo, ao chegarem onde deveria estar a vila, só encontraram um campo de cinzas negras e casas intactas. Zaki e Li estavam conversando perto da entrada e pareciam muito sóbrios. Yuki estava mais à frente, no centro, curvado sobre alguma coisa.

— O que houve aqui? – perguntou.

Zaki a olhou, seus olhos estavam inchados e vermelhos. Ana nunca o tinha visto daquele jeito.

— Ele precisa de você – falou Li apontando para Yuki, que agora estava tremendo.

Ana nem se importou em chamar Saulo, sabia que ele não iria. Deixou-o ali e correu para onde estava Yuki. Sua borboleta jazia no topo da sua cabeça e batia as asinhas bem devagar, sem voar.

— Yuki? – chamou.

Ele ajeitou a coluna e parou de tremer ligeiramente.

— Anya – falou com voz embargada.

— O que aconteceu aqui?

Ele então se levantou e se afastou, dando espaço para Ana ver a cabeça de Ivo. Primeiro ela não acreditou, depois as lágrimas inundaram sua visão, de modo que ela não via nada à sua frente e deu um grande soluço, sem conseguir respirar direito.

— Quem...

— Nós não sabemos. Ele estava no centro da vila – chorou ele – Zaki queimou tudo quando os soldados estavam vindo em nossa direção e os outros cida...

— Yuki... – interrompeu ela.

As lágrimas a invadiram mais fortemente e achou que fosse desabar, provavelmente iria se ele não a tivesse segurado habilmente. Ela encostou a cabeça na curva de seu pescoço e soluçou como uma criança.

— Mestre Ivo! – gritou de dor.

Eagle desceu dos céus e pousou em frente à cabeça do mestre, pegou um fio de cabelo e alçou voo.

Saulo se aproximou.

— Oh não... – murmurou consigo.

Saulo não conhecia Ivo Jaroisk, não chorava sua morte, na verdade não derramava uma única lágrima e não estava impressionado com a morte de um homem velho como aquele. Contudo não gostou nada do momento e do modo como aquilo estava acontecendo. No momento em que os outros vissem aquela cabeça...

Não precisou raciocinar muito, olhou para a entrada da vila e viu Clyde correndo, seguido por Paul, Riley, Nina, Sophie e todos os outros. Eles corriam como se estivessem sendo perseguidos por monstros. Zaki os acompanhou, correndo com eles ao encontro de Ivo.

Eles formaram um círculo perfeito ao redor da cabeça do mestre e, sem dizer uma única palavra, seguraram as mãos uns dos outros. Todos, sem exceção, choravam com os rostos contorcidos de dor. Começaram a cantar uma música suavemente, com uma melodia calma.

A música que cantavam falava sobre a volta para casa e do que seria um lar. Parecia que cantavam para Ivo, como se dissessem que o lar de cada um deles era no coração um do outro.

Os outros que estavam ao redor, abaixaram suas cabeças em sinal de luto, sentindo a dor dos oito.

Quando a música acabou, eles não soltaram as mãos uns dos outros, mas fecharam os olhos e falavam baixinho.

Demorou muito tempo até que se soltassem e distanciassem-se um pouco.

Clyde comunicou algo com Eagle e a enviou voando pelos céus. Então reuniu-se com os outros, seu rosto vermelho com o esforço para não chorar.

— O que faremos, Clyde? – perguntou Quon com calma.

Os outros sete começaram a se reunir perto do líder. Eagle voltou voando e pousou no ombro de Clyde. Ele assentiu para a águia e começou:

— Temos a cabeça de Ivo, precisamos reaver o resto de seu corpo para podermos enterrá-lo com dignidade. Eagle confirmou o que eu esperava: os restos do mestre estão nas vilas vizinhas.

— Esperavam que estivéssemos em algum lugar por perto – concluiu Paul com a voz embargada, mas cheia de raiva.

— Sim. Nós vamos nos dividir para pegá-lo e nos reuniremos novamente aqui para prestar suas homenagens – eles assentiram, sem poder concordar mais - E depois vamos atrás de quem fez isso.

— Se eles querem guerra – falou Sophie surpreendendo a todos – É guerra que terão!

Os sete deram um grito de concordância.

Ana só pôde encostar a cabeça no peito de Yuki, que a apertou mais ao encontro de si. Ela estava enganada: naquele momento, a dor da perda de Ivo doera tanto nela quanto a perda de Yuki teria doído.