Eles entram correndo e se deparam com um saguão grande e branco.

– Olá? Olá? - diz Rick

– Vigiem os mortos - diz Dale

– Tem alguém contaminado? - outro grita

– Um de nós estava, não sobreviveu - responde Rick, tomando a frente enquanto o outro aparece, alto, na casa dos quarenta, de boa aparência com um fuzil nas mãos.

– O que querem aqui?

– Uma chance.

– É pedir muito nesses tempos.

– Eu sei.

– Terão que fazer um exame de sangue, é o preço da estadia.

– Podemos fazer isso.

O homem avalia bem eles, não parecem ruins, ele baixa a arma - Se querem pegar alguma coisa, sejam rápidos, quando essas portas fecharem não abrem mais!

Marie, Ana e Drake correm para o jipe, Drake mata com a faca três errantes que estavam no caminho até chegarem lá e na volta, ele carrega as armas enquanto as moças levam as malas. Eles são os últimos a entrarem, o médico espera ali e passa um cartão num leitor quando vê que não há mais ninguém.

– Vi, sele a entrada principal e corte a força do setor.

Portas de aço descem do teto e fazem um barulho alto ao baterem no chão. Ana lê o letreiro e o símbolo do lugar, é bonito, grande e demonstra poder.

– Rick Grimes - diz o policial com a mão estendida

O médico olha ele, a mão e diz sem aperta-la - Dr. Edwin Jenner.

Jenner os conduz até um grande elevador, e mesmo assim é pequeno com toda aquela gente, malas e armas, Marie fica grudada nas costas de Glenn, olhando por cima do ombro dele.

– Os médicos sempre andam armados assim? - pergunta Daryl e Marie olha para o lado , espremida para encara-lo

– Muitas armas sobraram, já me familiarizei com elas. Mas vocês parecem inofensivos… - ele olha cada um do grupo e para em Carl, depois diz em tom divertido - Exceto você, vou ter que ficar de olho em você.

O grupo fica quieto até as portas se abrirem para um grande corredor, há muitas portas por ali.

– Estamos no subsolo? - pergunta Carol

– Você é claustrofóbica?

– Um pouco - ela diz quase se perguntando

– Tente não pensar nisso… Vi! Acenda as luzes da sala grande - as luzes são acesas, revelando a sala grande, com um um altar no centro, com vários computadores, uma tela grande na parede - Bem vindos á zona cinco

– Onde estão todos? Os médicos e funcionários? - pergunta Rick

– Só eu. Só sobrou eu aqui

– E quanto à quem estava falando? - pergunta Lori - A Vi.

– Vi, diga “oi” aos nossos convidados, diga a eles… “Bem vindos”.

Ana se sobressalta com a voz computadorizada feminina ecoando pela sala - Olá convidados, sejam bem vindos.

– Sou só o que sobrou. Sinto muito…

Jenner desce do altar dos computadores e os guia para uma outra sala, onde havia cadeiras e mesas, para o exame de sangue, Ele percebe o olhar perdido de Marie e pergunta enquanto enfia a agulha em seu braço - Você está bem?

– To… - ela sussurra, olhando o sangue encher a seringa.

Daryl quase consegue ve-la ficando mais pálida, e ele sente vontade de dar um soco na cara do médico, que está tirando as forças que ela não tem. Ana está atrás dela e a ajuda a levantar, Marie cambaleia e perde o foco, tudo se embaça a sua volta, a pressão dela está baixando, Jenner move as mãos para ampara-la, mas Ana a tira dali.

– Ela está bem? - ele pergunta

– Ela está sem comer direito há dois dias, todos nós.

Jenner havia esquecido totalmente disso, ele tirou sangue de todos ali e só os enfraqueceu mais. Ele guarda a maleta com os frascos do sangue e pede que o grupo o siga com a cabeça. Ele leva o grupo para uma pequena cozinha, com várias geladeiras por ali e um mesa no centro e do outro lado uma pia e um grande fogão.

– Fiquem vontade - diz e deixa o grupo.

***************

– Sabem… Na Itália, as crianças bebem vinho na janta - diz Dale, depois olha para Marie - E na França também.

Marie concorda com a cabeça, ela se lembra de tomar meio copo uma vez por semana com seus tios e a... July.

– Bom, quando o Carl estiver na Itália ou França, ele vai poder tomar - diz Lori

Rick diz sorrindo - Não vai fazer mal. Deixa - ele abre mais o sorriso - Deixa!

Lori esconde um sorriso enquanto enche o copo de Carl, ele bebe um pequeno gole, e antes mesmo de engolir, seu rosto se contorce em uma careta.

– Continue com a sopa rapaz - murmura Shane

Daryl que já estava levemente feliz, entrega um garrafa a Glenn - Você não rapazinho, bebe, quero ver sua cara bem vermelha.

Glenn toma um gole e também faz um careta - Forte né?

– Bebe mais que passa! - e assim, Daryl faz Glenn ter a pior ressaca da sua vida.

Rick bate com o garfo na taça e se levanta - Eu acho que a gente não agradeceu nosso anfitrião devidamente.

– Ele é muito mais do que nosso anfitrião - diz T-Dog erguendo a taça e todos dizem - Jenner

Daryl ergue sua taça e o movimento faz ele bater na taça vazia de Marie, ela olha indiferente para ele - Booyah! - ele grita e o grupo grita depois, ele se abaixa e enche a taça da amiga - À July.

Ela pega a taça e bate de leve na garrafa dele - À July

Daryl deposita um beijo na bochecha dela e depois para atrás de Drake que está dois lugares depois dela, ao lado Ana - Hoje você fica bêbado!

Drake concorda e fica em pé - Tô com uns projetos ai… de encher a cara.

O grupo ri mais uma vez, menos Marie e Andrea, elas se encaram e voltam a bebericar do vinho e comer queijo.

– E então, quando vai nos contar o que aconteceu aqui, doutor? - pergunta Shane - Os outros médicos, onde estão?

– Estamos comemorando, Shane - diz Rick - Não precisa ser agora.

– Não foi por isso que viemos? E acabamos encontrando um homem só… - ele se vira completamente para Jenner - Um homem só, por quê?

– Quando as coisas ficaram ruins, foram embora, foram ficar com suas famílias. Quando piorou, quando os militares foram aniquilados… o resto fugiu - diz Jenner, sem receio ou hesitação nenhuma.

– Todos eles?

– Não, alguns não tiveram coragem de passar pela porta, eles… simplesmente desistiram, teve uma onda de suicídios.

– Você não saiu - diz Ana - Porque?

– Fiquei trabalhando, esperando fazer algo de bom.

O grupo fica quieto, nem Daryl e Drake fazem mais uma palhaçada.

– Cara, você é um estraga prazeres - diz Glenn para Shane

Eles comem em silêncio, Daryl as vezes rouba alguma coisa do prato da Marie ou da Ana, e seca duas garrafas e meia de vinho. Jenner os leva até o corredor por onde vieram, é onde estão os alojamentos.

– A maior parte da instalação foi trancada, terão que se virar por aqui, os sofás são confortáveis, mas há camas no depósitos se quiserem. Tem uma sala de recreação no fim do corredor, as crianças vão gostar… Só… Não liguem os video games, ou qualquer coisa que consuma bateria, isso vale para os banhos, manerem na água quente.

Glenn se vira para Ana sorrindo - Água quente?

Ela sorri e olha T-Dog - Foi o que o homem disse - ele fala

Marie se instala numa sala no meio do corredor, coincidentemente de frente para Daryl, o que é mentira, ele esperou ela entrar para escolher um quarto perto dela, ela nem olhou para ele depois do brinde. A porta do quarto dela se fecha. Daryl senta no sofá e bebe mais um grande gole da garrafa de vinho, ele pode escutar os chuveiros do corredor funcionando, e então decide ir para o seu.

Ele deixa a água cair pelo seu corpo, os cabelos grudam no rosto, a água que desce e entra pelo ralo é suja. Aquilo é bom pra caralho.

Drake deixa a porta do box aberta para se ver no espelho e se barbear durante o banho, dois meses de barba. Até que não ficou tão ruim.

Ana gasta meio pote de shampoo nos cabelos, aquilo é tão bom, poder esfregar as pernas até doer… Condicionador, pinça de sobrancelha, perfume, lençóis e travesseiros… Ah!

Marie deixa o chuveiro bem aberto, ele faz barulho e água sai quase fria, ela chora enquanto limpa o sangue seco no braço e nos ombros, descontando toda a raiva e a tristeza que acumulou em dois meses. July. July. July. July! JULY! Ela bate na lateral do box, na barra de ferro onde a porta corre e acaba cortando a mão, o sangue molhado escorre na parede, se misturando com água e espuma quando chega no chão até o ralo.

Ela bate na porta do quatro de Ana e a amiga diz que pode entrar. Ela está sentada com um garrafa de vodca e um livro no colo. Marie senta do lado dela e deita a cabeça no ombro da amiga.

– Ô, Marie… Vem cá - ela segura a cabeça da amiga e a faz deitar em suas coxas, e fica ali desembaraçando os cabelos cacheados da amiga com os dedos.

– Eu queria ela aqui… - diz a moça que chora.

– Ela está, Marie, está sim.

Marie tira do bolso da calça de moletom a foto delas, não a que estava no carro, a que pertencia à Marie, as duas estavam sentadas lado a lado, com as cabeças juntas e sorrindo, ela se lembra perfeitamente daquele dia, era uma festa da faculdade. “Festa não!” disse July “Assim parece que não estudamos, só festamos... Reunião na pizzaria” e entrega à Ana.

– Que lindas - ela diz com a voz também embargada - Queria ter conhecido vocês antes.

Se tinha uma coisa que Ana pediria ao gênio da lâmpada mágica é que colocasse Marie em sua vida antes. Ela costumava brincar com isso. “Conheço Drake desde que eu tinha 14 anos, dá pra se livrar dessa criatura né? Trocaria o dia que conheci ele pelo dia que conheci você, Marie!”. Agora, ela pediria “Que o dia anterior dessa praga nunca acabasse”.

Marie fica em pé e seca o rosto enquanto guarda a foto - Eu vou pra minha cama. Você deve estar cansada.

– Pode ficar.

– Não, não… Eu vou pra lá.

Elas se abraçam de novo e Marie sai do quarto, no exato momento em que Daryl sai do dele - Oi - ele diz.

– Oi… Vai pra cozinha?

– Ah… Não… Ia falar com você.

– Sobre?

– Nada.

Ela dá um sorriso enquanto funga - Boa noite, Daryl.

– Espera… - ela para na porta do quarto e vira para ele - Você tá me evitando? Eu fiz alguma coisa? Sério, me fala. O que acontece?

– Acontece que você disse que estava aqui por mim e pra mim. Aí, a gente chega aqui e você vai encher a cara!

– Desculpa… Eu não sei, eu acho que é meu modo de… Aliviar.

– Aliviar o que? Seu irmão tá vivo. Eu perdi minha prima, não pude fazer nada. Ela morreu diante dos meus olhos.

Drake vira o último gole da garrafa de tequila e se concentra pra ouvir, tem alguem discutindo no corredor, ele já tem o olhar vago e inchado, sente que de manhã vai vomitar e a ressaca vai ser brava.

– Marie, tem alguma coisa que eu faça que vá te ajudar?

– Só se trouxesse minha prima de volta.

Ele dá um passo pra frente, estão a dois passos de distância - O que ela iria querer que eu fizesse?

– Que me desse apoio - ela diz abaixando a cabeça e chorando. A ultima vez que sentiu essa dor foi quando soube que seu bebê havia morrido dentro de si.

Aquela cena é quase um soco no peito de Daryl - Então é o que eu vou te dar - ele estica o braço e segura a mão dela, Marie até tenta soltar enquanto abre a porta do quarto e quando o faz, Daryl a puxa com força para seu peito. Marie bate contra ele com um forte impacto, mas logo se aconchega nele, ele está cheiroso e limpo, os braços dela seguram seus braços que abraçam sua cintura e ele a ergue a cinco centímetros do chão, enquanto a leva para dentro do quarto, a porta ele fecha com o pé.

Ainda abraçados, Daryl a leva para o sofá já com lençol e travesseiro e a faz deitar, depois ele se deita do seu lado, o espaço é pequeno, mas vai ter que dar, ele a puxa de volta e encaixa a cabeça dela em seu peito, apoiando seu queixo no topo da cabeça dela, os cabelos dela estão cheirosos, Marie entrelaça sua perna na dele e acaricia o braço que a segura pela cintura.

Acabam dormindo assim, juntos.

***************

Daryl abre os olhos, num quarto que não era o dele, ele reconhece pelas cortinas, ali são azuis, a dele era branca, e o sofá, ali é couro preto, o dele era couro branco, ele olha para o teto, sua cabeça lateja, enfim ele se vira de costas e olha ao redor da sala, definitivamente, ali não era seu lugar.

“Cristo… Onde eu to?” ele se senta e põe a cabeça nos joelhos, tudo gira. Por fim ele olha a mesa de centro, e a Ruger Hawk .50 da Marie está ali. A mochila preta dela também e o all star jeans surrado ao lado de sua bota. “O quarto dela?”

Ele olha em volta de novo, ela não está ali. “Mas que merda… O que eu to fazendo aqui? Na cama dela? Céus… Será que a gente…?”

Ele coça a cabeça e sente aquela pontada de dor de quem bebeu demais. Se concentra e então se lembra. Eles só dormiram juntos. “Tá. Cadê ela?”

Ele calça as botas e fica em pé estalando as costas, o pescoço e os dedos. Dormiu de mal jeito. Vai até a porta que imaginava ser o banheiro e bate - Marie?

– Oi! Já tô saindo!

– Não! Só pra saber onde você tava.

– Tudo bem!

– Eu vou pro meu quarto tá?

Silêncio. - Marie? Tá tudo bem? - ele escuta aquele urro de quem está vomitando - Posso entrar?

– Não!

– Marie! - ele força a porta, está trancada - Abre pra mim.

– Daryl, sério. É nojento, sai.

– Eu vou arrombar. Eu derrubo essa porta se você não…

Ele escuta uma descarga e a porta se abre - Que foi?

– Você tá bem?

– To.

Ele concorda e olha pra baixo passando os olhos por ela, estava tão bebado ontem que não percebeu o quão linda ela esta com aquela calça de moletom azul clara e a regata branca ou ela trocou hoje? Ele fixa o olhar numa bandagem na mão direita dela, Marie tenta esconder no bolso mas ele segura - O que você fez?

– Me machuquei - ela diz puxando a mão de volta

– Deixa eu ver.

– Eu já cuidei Daryl, tá tranquilo.

– Deixa eu ver!

– O QUE VOCÊ QUER?

– CUIDAR DE VOCÊ, PORRA!

– A July fazia isso. Agora eu cuido de mim mesma, Dixon.

Ela passa por ele com um esbarrão e sai do quarto. Daryl vai logo atrás, Ana está saindo do seu e vê os dois juntos, ela pensa em dar um sorriso, mas a expressão dos dois quase a aterroriza. Daryl tem ódio nos olhos que estão nas costas da Marie, onde os cabelos cacheados e embolados balançam.

Eles entram na cozinha, onde uma parte do grupo já está lá, de ressaca, dentre eles Glenn que geme com a cabeça da mesa. Jacqui acaricia ao cabelo dele e T-Dog serve o prato dele com ovos.

– Ovos em pó, não ficaram ruins. Come Glenn, proteína ajuda a curar ressaca.

– Nunca mais, nunca, nunca mais me deixem beber.

Carl dá risada, Marie abre uma lata de coca-cola e dá pra ele - Glicose - diz no ouvido dele.

Glenn olha bravo para Daryl que senta num balcão com um pedaço de torrada na boca - Foi culpa sua!

– Eu não me lembro - Daryl responde sorrindo.

Rick se senta com Lori e Carl, e o garoto pergunta - Está de ressaca? A mamãe disse que estaria.

– Sua mãe está certa - Rick corre o olhar pela mesa - Acho que todos estão.

Edwin Jenner entra na cozinha e atravessa ela sem olhar para ninguém - Bom dia.

– Bom dia - responde o grupo.

– Doutor, odeio começar o dia já te enchendo de perguntas… - diz Dale

Jenner enche seu copo de café e diz sem se virar - Mas vai perguntar mesmo assim…

– O que está acontecendo?

Jenner se vira e encosta no balcão. Ele balança a cabeça - Vamos.