Capitulo 26 – Tempo

Tempo... Embora o tempo fosse algo capaz de ordenar a ocorrência de eventos, a percepção dele relacionava varias variáveis, nos momentos felizes a sensação é que o tempo passou rápido demais, já em momentos tristes os minutos pareciam horas para passar. Hermione sentia isso a cada minuto desde o momento em que viu o filho deitado naquela cama. Foi preciso ser arrastada dali e tomar um sedativo para se acalmar e conseguir conversar com o médico responsável.

Depois de algumas horas escutou as explicações do médico, Erick tinha sido atingido pelo feitiço Sectusempra o que levou a vários cortes em seu corpo, e consequentemente, uma grande perda de sangue. Quando ele atingiu o salgueiro lutador, foi arremessado outra vez contra o chão e o impacto provocou uma fratura no braço direito e duas costelas quebradas, além de contusões em algumas partes do abdômen, mas o pior foi à batida na cabeça.

Quando Erick desacordou, Hagrid e mais alguns professores conseguiram afastar os comensais que fugiram em seguida. Neville conseguiu ser rápido lançando um contrafeitiço, Vulnera Sanentur, que parou o sangramento e fechou lentamente as feridas, conseguiu curar algumas lesões e fraturas pequenas com magia, porém as internas eram mais graves sendo necessário ir direto para emergência. Como o corpo do rapaz estava fraco, Erick, entrou em um coma induzido que ajudaria seu corpo a se recuperar.

Hermione não saiu nenhum momento do lado do filho, já estava ali há quase dois dias, embora os amigos se oferecessem para ficar em seu lugar, ela recusou a todos falando que só sairia quando o filho fosse para casa. Já era noite, podia notar o silêncio nos corredores do hospital, Luna tinha acabado de sair acompanhada de Rony, haviam trazido algumas roupas para ela poder tomar banho, não demorou e eles tiveram que ir embora.

Aproximou-se da cama, outra vez, observando o semblante tranquilo do filho, deslizou os dedos pelo rosto dele que já estava sem o aspecto pálido, voltando aos tons rosados. Afastou os fios escuros que caiam sobre o rosto sereno, sentiu lágrimas invadirem seus olhos, inclinou o corpo depositando um beijo em sua testa. Levou a mão sobre o coração dele, precisava sentir as batidas ritmadas e calmas na palma de sua mão para conseguir se tranquilizar e se certificar que o filho estava vivo.

— Ele vai ficar bem. – Harry, que até então, estava encostado no batente da porta, entrou e se aproximou de Hermione que levantou o olhar para ele.

— Eu só... Eu nunca imaginei ver ele assim. – Falou baixo sentindo as lágrimas voltarem aos seus olhos, voltou a acariciar o rosto do filho. – Dói muito ver ele nessa situação.

— Eu queria estar no lugar dele. – Suspirou profundamente, ficando ao lado dela, permitindo-se sentir. - Tirar toda essa dor e...

— Shh! – Hermione tocou a mão dele. – Não fala assim, Harry. Ninguém deveria passar por isso.

— Eu não consigo ver ele aqui e não poder fazer nada. – Observou o rosto do filho. – Por minha culpa.

— Não é sua culpa. – Hermione tocou o rosto dele e olhou dentro de seus olhos que estavam marejados, segurou as mãos dele entre as suas, aquelas palavras voltaram a sua mente. – Eu estava nervosa quando falei aquilo.

— Me desculpe. – Falou baixo com a voz embargada, o toque e as palavras dela fizeram escapar as lágrimas que ele tanto segurou, Harry desviou o olhar tentando se afastar.

Não é culpa sua.— Sussurrou novamente, sentindo um aperto no peito, ver Harry dessa maneira frágil e vulnerável, despertou nela algo diferente, uma necessidade de acabar com aquele sofrimento.

Hermione abraçou Harry, que aos poucos quebrou suas barreiras e se permitiu chorar, sentia o corpo dele balançar entre seus braços. Caminhou com ele até o sofá no canto do quarto fazendo-o deitar e encostar a cabeça em seu colo, ele falava algumas coisas desconexas, mas escutou vários "me perdoa" no meio daquele choro. Falar que não estava magoada era mentira, mas escutar que ele preferia estar ali no lugar do filho, tirar sua dor e se culpar pelo que aconteceu fez seu coração acelerar, aquelas lágrimas eram provas do amor de pai para filho. Acariciava os cabelos dele, sentindo suas próprias lágrimas molharem seu rosto, ficou um bom tempo passando os dedos nos fios escuros dele até perceber que ele havia adormecido.

***

Harry não soube quanto tempo havia se passado, mas quando abriu os olhos notou que tinha dormido sentindo os toques de Hermione, levantou o olhar e percebeu que ela estava cochilando encostada no sofá, parecia desconfortável. Ajeitou-se melhor no pequeno sofá, que mais parecia uma poltrona e a puxou aconchegando-a em seu corpo, a morena estava tão cansada que nem acordou com o movimento. Harry sempre adorou ver Hermione dormir, a paz que ela transmitia, o cheiro e a maciez da pele dela em seus dedos, tudo trouxe lembranças da primeira vez deles.

Deslizou os dedos carinhosamente contornando o rosto dela, mesmo depois de tantos anos, ainda conhecia cada traço dela, segurou a mão direita e não deixou de sentir o incomodo ao ver a aliança em seu dedo anelar, respirou profundamente, não poderia estragar aquele momento. Fechou os olhos sentindo todo o peso de suas escolhas, se ele tivesse ficado as coisas seriam diferentes... Hermione nunca deixaria de ser sua, e o principal, Erick não estaria nessa situação. Abriu novamente os olhos, encontrando aquele infinito castanho, cheio de mistério que envolvia seus pensamentos.

— Acho... Acho que estávamos em outra posição. – Desviou o olhar, sentindo suas faces esquentarem, embora fosse mulher ainda tinha a timidez da adolescente que se apaixonou pelo melhor amigo.

— Nos dois acabamos dormindo, quando acordei vi que você estava em uma posição desconfortável, apenas te aconcheguei melhor em mim. – Harry explicou depois que ela se sentou ajeitando suas roupas.

— Tudo bem. – Falou sem graça, voltando o olhar para o filho.- Alguma mudança?

— Ainda não, amanhã ele deve amanhecer melhor.

— Eu não aguento essa espera. – Suspirou cansada, Hermione sempre foi controladora, a coisa mais difícil para ela sempre foi esperar. - Er... Você já pode ir embora.

— Eu vou ficar Hermione.

— Não precisa, acho melhor você...

— Nada do que você disser vai me fazer mudar de ideia. – Falou firmemente, vendo um misto de emoções passarem em seu rosto. Como ela não falou nada, completou. – Eu sou o pai dele, quero estar aqui quando ele acordar.

— Tudo bem. – Concordou ficando em silêncio pensativa e inquieta, depois de alguns minutos, virou-se para Harry. – Tem como você ficar com ele enquanto eu vou tomar banho?

— Eu não vou embora Hermione. – Harry repetiu sorrindo, observando a sombra de um sorriso na morena. – Leve o tempo que precisar, pode ir tranquila.

— Obrigada. – Balançou a cabeça, realmente precisava de um banho, nesses dois dias, mal comeu e mal dormiu, seu corpo precisa relaxar e naquele momento só a água quente do chuveiro poderia proporcionar isso.

Depois de algum tempo, Hermione saiu do banheiro enxugando os cabelos, o cheiro do sabonete dela preencheu o quarto com o vapor vindo do banheiro. Harry levantou o olhar e a viu caminhar em sua direção, ela estava vestindo uma calça de moletom preta e uma camiseta folgada branca, parecia confortável, diferente de todas as vezes que encontrava com ela no ministério, sempre com roupa social. Ela estava incrivelmente linda, o perfume característico preencheu suas narinas, despertando reações em seu corpo que só ela despertava.

Hermione sentiu suas bochechas esquentarem, Harry não desviava o olhar de seu corpo, quando ele levantou o rosto pode ver suas pupilas maiores que o normal, reconheceu o olhar de desejo, mas não quebrou o contato visual, depois de tantos anos borboletas voltaram a preencher seu estômago. Não podia deixar transparecer o quanto ele a afetava, aquele não era o momento nem lugar apropriado para isso, soltou o ar que nem percebeu que estava preso, virando-se em direção ao armário. Desviou sua atenção para sua pequena mala, onde retirou seu creme de pentear e uma escova e começou a pentear seus cabelos até que as sensações em seu corpo voltassem ao normal.

Harry observou atento cada movimento dela, não podia deixar de sentir seu coração bater acelerado e seu corpo ansiar pelo dela. Respirou profundamente passando as mãos pelos cabelos, levantou-se e foi em direção à janela tomar um ar, ficou alguns minutos olhando a escuridão da noite. Quando se virou viu a morena depositar um beijo na testa do filho e voltar a se sentar na cadeira próximo a cama cruzando as pernas.

— Uma enfermeira passou aqui enquanto estava no banho. – Quebrou o silêncio, voltando para o sofá.

— E então? – Virou-se para ele preocupada.

— A temperatura e pressão estão normais e o quadro dele está melhorando. – Sorriu observando Hermione ficar aliviada. – Ela disse que amanhã ele deve acordar.

— Não vejo a hora. – Sorriu abertamente, acariciando o rosto do filho.

O silêncio preencheu o quarto novamente, Harry começou a responder algumas mensagens no celular, enquanto Hermione parecia inquieta, algo martelava em sua mente, levantou-se e foi até o sofá, Harry ficou surpreso com a aproximação dela.

— Harry... E Sophie onde ela está?

— Deixei ela na casa de Gina.

— Nossa, nem imagino o que as duas devem estar aprontando, vai ter que levar ela em um psicólogo depois. – Sorriu de lado.

— Nem me fala. – Riu da careta de Hermione.

— Como ela está? – Hermione levantou o olhar, já gostava da menina. – Com isso tudo.

— Não está sendo fácil, ela é só uma criança, mas... – Harry sabia que ela se referia ao divórcio e sua ausência. – Cho nunca foi mãe para ela, Sophie nunca teve amor materno. Sempre tentei suprir essa necessidade. – Desabafou fechando os olhos. – Não sei se consegui.

— Sei que conseguiu. – Falou baixo, sentiu seu coração apertar, Sophie era uma criança tão amável, não imaginava que a indiferença de Cho fosse tanto. – Dá para ver que ela te ama e é muito amada, eu sei que não é fácil.

— Me desculpe... Por estar ausente todos esses anos. – Falou sinceramente, segurando a mão esquerda dela entre as suas.

— Não vamos falar disso agora. – Pediu baixo desviando o olhar. – Ainda não estou pronta para conversar sobre isso.

— Tudo bem. – Suspirou ficando em silêncio.

Hermione afastou o corpo, dobrou os joelhos e ficou abraçando as próprias pernas, perdida em seus pensamentos. Harry lembrou-se dos tempos de Hogwarts, tudo o que viveram no tempo de escola, deixou escapar uma risada despertando a atenção da morena que franziu a testa curiosa.

— Lembra quando o Rony quebrou a varinha e vomitou lesmas no segundo ano? – Riu fazendo-a rir também com a lembrança.

— Como esquecer? – Riu balançando a cabeça. – E a vez que o trasgo invadiu o banheiro? Fiquei tão assustada aquele dia.

— Era a primeira vez que nos aventuramos juntos. – Sorriu perdendo-se no sorriso dela.

— Vivemos bons momentos juntos. – Encarou o olhar dele, seus rostos estavam próximos e sua respiração estava descompassada, desceu os olhos para a boca dele, os dentes brancos marcavam um lindo sorriso.

Ainda podemos viver bons momentos.— Falou baixo passando os dedos levemente no rosto dela, seus lábios entreabertos estavam convidativos, se inclinou observando o misto de sentimentos que passavam em seus olhos.

— Harry... – Desviou o olhar, a presença dele mexia com seus sentimentos, estava frágil e carente, sentiu os lábios dele tocarem sua testa em um beijo casto, sentiu o braço direito dele em volta de sua cintura, aconchegando-a.

— Como perdemos isso tudo?

Eu não sei... – Sussurrou, embora soubesse perfeitamente, ficaram lado a lado como faziam em Hogwarts, naquele momento todas as brigas pareciam não importar, a presença um do outro já era suficiente.

— Independente da sua escolha... Não se afaste, por favor. – Pediu, Hermione levantou o rosto para encara-lo. – Não consigo viver sem você outra vez, mesmo que seja como amigo.

Hermione não sabia o que falar apenas maneou a cabeça concordando, tudo estava acontecendo rápido demais, sabia que também não conseguiria viver longe, encostou-se no ombro dele igual fazia quando eram adolescentes, sentia falta dele, da proteção e carinho que ele lhe proporcionava, fechou os olhos pensando em tudo que aconteceu nos últimos dias, a conversa no ministério foi sincera e esclarecedora, embora estivesse magoada conseguiu compreender os motivos dele. Não estava pronta para um relacionamento amoroso, mas permitiu se aproximar, e quem sabe, retomar a amizade de antes, acabou adormecendo com esses pensamentos.

***

O dia amanheceu relativamente fresco e ensolarado, Viktor já estava irritado de esperar o horário de visita chegar, só poderia entrar depois das 8 horas da manhã, quando finalmente o ponteiro do relógio marcou o horário, dirigiu-se até o quarto andar, caminhou a procura do quarto em que Erick estava internado, quando encontrou viu que a porta estava entreaberta, entrou devagar encontrando uma cena que preferia não ter visto.

Harry e Hermione estavam dormindo no sofá, ela estava aconchegada no ombro dele, a cabeça dele apoiava na dela e o braço dele contornava a cintura dela, os dedos da mão dele estavam entrelaçados com os dedos da mão dela. Ambos pareciam se encaixar perfeitamente, ela parecia tranquila. Não pode deixar de sentir uma pontada de ciúmes diante daquela cena, respirou profundamente se aproximando.

— Hermione? – Chamou dando uma leve tossida.

— Viktor? – Abriu os olhos, quando viu o noivo na sua frente, soltou-se rapidamente de Harry que também tinha acordado com a chegada. - Oh Viktor. – Correu para os braços dele, desmanchando-se em lágrimas.

— Eu cheguei ontem, mas só me deixaram entrar hoje. – Se justificou, abraçando-a contra seu peito.

— Eu fiquei tão assustada... – Falou entre lágrimas. – Pensei que você não fosse vir.

— Nunca te deixaria nessa hora, amor. – Beijou a testa dela, limpando as lágrimas que escorriam por seu rosto.

— Eu vou... Eu vou tomar café. Querem alguma coisa? – Harry não suportava ver aquela cena, precisava sair dali, nem esperou resposta e saiu irritado do quarto.

— Como o Erick está? – Viktor se aproximou do rapaz, ainda abraçado com a morena.

— Melhor. – Apoiou a cabeça no ombro dele. – O medico falou que ele deve acordar hoje.

— Que bom amor. – Beijou o topo da cabeça da morena, tocando a mão dela que segurava a do filho, depois de alguns minutos precisava tirar uma duvida que estava martelando em sua cabeça. – Por que o Potter estava aqui?

— Harry é o pai dele. – Falou naturalmente sem perceber que era a primeira vez despois de todos esses anos, que afirmava isso. Viktor sentiu um aperto em seu peito, mas não demonstrou. – Eu descobri muitas coisas sobre o passado, conversamos...

— E? – A incentivou a prosseguir, embora estivesse com medo do que escutaria.

— Nada mudou, mas estamos dispostos a tentar restaurar nossa amizade. – Falou deixando-o mais aliviado. – O Erick precisa disso.

— Entendo. – Balançou a cabeça, não queria que a noiva se aproximasse dele novamente, mas se era a decisão dela sabia que não mudaria. - O que você descobriu sobre o passado?

Hermione passou os próximos minutos contando tudo, desde a profecia até o ataque em Hogwarts, sabia que podia confiar em Viktor, ele sempre foi seu amigo. Descansou a cabeça em seu peito sentindo a respiração dele, Viktor levantou o rosto dela para beija-la, mas foi interrompido pela chegada de Harry.

— Trouxe café. – Informou se aproximando de Hermione, ele estava observando de fora o que estava preste a acontecer e entrou.

Hermione sentiu seu rosto esquentar, a situação já estava bastante constrangedora, apenas se afastou dos dois e se aproximou da cama do filho. Este não estava mais entubado, desde o dia anterior ele já respirava sozinho, seu corpo já estava se recuperando sozinho. Hermione notou um pequeno movimento dos dedos do filho, arregalou os olhos, ansiosa. Sorriu depois de alguns minutos quando os olhos dele se abriram e pode ver novamente a imensidão azul preencher seu coração.