Picard estava em seu gabinete anexo à ponte da nave, estudando os últimos relatórios do setor de inteligência da Frota Estelar a respeito de ataques que instalações cardassianas ao longo da fronteira que haviam sofrido recentemente, quando ouviu o trinar suave da companhia.

— Entre – disse o capitão.

Quando a porta se abriu, o bajoriano Benten Falor entrou, olhando apreensivo para Picard.

Solicito, o oficial da Frota se levantou e estendeu a mão a ele para cumprimentá-lo.

— Bem-vindo à Enterprise.— disse. E indicou a cadeira que estava em frente à sua mesa – Sente-se, por favor.

Quando ambos se acomodaram, o bajoriano perguntou ao oficial da Frota, desconfiado:

— Sou realmente bem-vindo, capitão?

Jean-Luc esboçou um sorriso e suspirou.

— Sr. Falor, por enquanto não tenho motivos para pensar de outra maneira – disse ele – mas em virtude dos últimos acontecimentos, você entende que eu preciso lhe fazer algumas perguntas.

O bajoriano olhou em silêncio para o capitão por alguns instantes e por fim, relaxou, recostando-se na sua cadeira.

— Claro capitão – disse ele – pode perguntar o que quiser.

Picard ficou sério e olhou com atenção para o bajoriano, antes de falar.

— Como você certamente notou – disse o capitão – estamos com um cruzador de batalha cardassiano colado na nossa proa e cujo comandante, gul Makbar, o acusa de ser um terrorista que está atacando instalações dentro do território deles. Ele exige que nós o entreguemos para ser julgado em cardassia por crimes de guerra.

Falor olhou para Picard e surpreendentemente deu uma sonora gargalhada.

— Capitão, me desculpe, não quis ser indelicado. – disse ele, ainda sorrindo – Mas um cardassiano me acusar de ser “terrorista” chega a ser hipócrita e até ofensivo!

— Essa é uma acusação grave, Sr. Falor – disse Picard sério.

O bajoriano cruzou os braços sobre o peito e abaixou ligeiramente os olhos, pensativo.

— Capitão – disse ele repentinamente, olhando novamente para Picard – vamos então esclarecer algumas coisas. Você sabe que meu planeta, Bajor, esteve sob ocupação cardassiana por cinquenta anos. Eles exploraram nossos recursos naturais, praticamente escravizaram nosso povo e nos impuseram uma lei marcial vitalícia, sob um governo fantoche e colaboracionista. Durante todo esse período eles enfrentaram a feroz resistência de grupos organizados que usaram de todos os meios, lícitos ou ilícitos, para libertar o nosso planeta. E finalmente, depois de cinco décadas de muitos sofrimentos e lutas, nós conseguimos expulsá-los

— Eu sei de tudo isso – disse o capitão – e considero os membros da resistência bajoriana nada menos do que heróis.

Benten Falor esboçou um sorriso, apesar do seu olhar ainda se mostrar triste.

— Quando os cardassianos deixaram Bajor – continuou ele – eu pensei que poderia tentar retomar a minha vida e ajudar na reconstrução do meu mundo. Mas nós obtivemos informações de que os cardassianos ainda estavam mantendo dezenas de prisioneiros bajorianos em campos de trabalho forçado dentro do seu território, apesar de o governo deles negar.

— Vocês tem provas disso? – perguntou Picard, preocupado.

— No começo, eram apenas rumores – respondeu Falor – mas seis meses atrás um grupo de cinco destes prisioneiros conseguiu fugir de um campo localizado em Goralis em uma nave roubada. Mesmo perseguidos pelos cardassianos, conseguiram chegar a Bajor. Três estavam tão desnutridos e feridos que não sobreviveram à viajem.

— E quais as providências que o governo de Bajor tomou? – quis saber o capitão.

— Nosso mundo ainda está sob um governo provisório, formado por burocratas e líderes religiosos, que ainda temem uma reação de Cardassia a qualquer questionamento, mesmo contando com o apoio da Federação e da Frota Estelar. Por isso preferem aguardar um momento oportuno para negociar com os cardassianos. Eu, porém, não pude ficar de braços cruzados. Não depois de combater por mais de trinta anos para que todos os bajorianos fossem livres. O que este gul Makbar chama de “atos terroristas” foram ataques específicos a estes campos de trabalho forçado, com o único objetivo de libertar o maior número de prisioneiros que eu conseguir.

O capitão Picard olhou para o cansado combatente sentado à sua frente e pode sentir apenas admiração e respeito.

— Sr. Falor – disse o capitão, sério – eu pessoalmente acho que suas ações são justas, louváveis e acima de tudo, corajosas. Mas as circunstâncias me obrigam a tratar a presente situação com extremo cuidado, principalmente em função do tratado que a Federação assinou recentemente com Cardassia. Por isso peço que por enquanto aguarde a solução deste impasse a bordo da Enterprise, como nosso convidado.

O bajoriano levantou-se a acenou com a cabeça, concordando.

— Como quiser capitão – disse ele, levantando-se.

Assim que o bajoriano saiu, Jean-Luc Picard tocou seu broche-comunicador.

— Sr. Data, tente contatar o almirante Andrews no Comando da Frota Estelar – ordenou ele – e transfira-o para o meu gabinete assim que conseguir.

— Entendido, senhor – respondeu o oficial androide.