Arcana Magic Story - A Redenção de Sally Parkers

Capítulo 3 – As tentações de Sally Parkers.


Depois que sai do auditório, não desejei qualquer contato com qualquer pessoa durante aquele dia. Estava cansada e furiosa. Sinta-me perdida e sozinha. Queria um tempo para mim mesmo.

Fui para o meu quarto.

Rolei a minha cauda de forma circular na minha cama fofa e deitei-me sobre ela. Tive preguiça de retirar o meu uniforme e fiquei olhando para o teto.

Fiquei pensando sobre a minha Vida e tudo que sofri pelo fato de ser uma Nagah. Se eu pudesse nascer de outra forma, aceitaria. Porém, sou o que sou. Não tem porque mudar isso.

Subito, a porta começou a bater e, irritada, fui atender.

Era Harumi, a vice-líder e puxa-saco nas horas vagas.

Nunca a tinha a visto assim... Furiosa...

– Que loucura foi aquela?! - gritava.

– Renunciei. Só isso. – respondi de uma direta e calma.

– Eu sei o que é uma renuncia! Mas por quê? – perguntava transtornada.

– Eu não expliquei? Não estavam comemorando a minha prisão? Eu só facilitei as coisas para eles. – digo de uma forma óbvia.

– Sally, pelo Amor dos Deuses! Aqueles idiotas não sabem amarrar um sapato direito e você é a única que sabe organizar um organograma e administrar a lista de punições. Além de ser uma excelente advogada. Muitos seriam expulsos se não fosse por você... – explica a Moreana.

– Por que não elegem o Gorila God? Garanto que ele é muito mais competente do que eu. – digo esperando que Harumi diga, de uma forma direta, a sua opinião sobre o macaco.

A garota nunca disse nada sobre ele. Talvez, por medo.

– Sabe que o God é perigoso demais... – foram as suas primeiras palavras sobre ele. Todos sabem que ele te domina. Indiretamente, ele é o verdadeiro líder do grêmio da serpente. Mas... Aqueles olhos... Parece que nos olham como fossemos menos que bactérias. Acho que você dá um efeito humanizador naquele gorila. Muitos temem que ele faça experiências com os membros de nosso grêmio. – foi a sua resposta.

– Então é um instinto de autopreservação que faz que todos desejam que eu permaneça na liderança. – concluo.

– Também. – diz sincera. Eu vi o que fazia contigo... Aquelas palavras, o que ele te ordenava a fazer. Eu te adulava não só por medo, mas por solidariedade. Sei que não somos amigas. Sei que me odeia por ser rastejante e viscosa na maioria das vezes que trabalhamos juntas. Mas você é uma... – e fica muda.

– Uma serpente. – completo.

– Você é o grêmio. É a bandeira! O símbolo! Até o Gorila God sabe disso. Não temos como dizer do contrário. A sua renuncia seria uma derrota para todos nós. O seu discurso mostrou quem é Sally Parkers. A nossa líder. – diz de uma forma quase convincente.

– Quero ficar sozinha. – decreto. Quero um tempo para pensar.

A garota com um rosto de raposa e cabelos vermelhos se curva e sai do meu quarto, como num relâmpago.

E retorno a repulsar tranquilamente, depois de uma meia-hora, ouço mais batidas. Novamente, vou atender. Quando abro a porta outro grupo solicita uma audiência comigo.

O grêmio da serpente é constituído de vários clubes que formam sua estrutura política. Lembram mais como gangues do que clubes de estudantes propriamente ditos.

O Cabal é o clube mais forte, disfarçado de clube de ocultismo, na verdade é uma seita. Os mesmos adoram os antideuses de Arton e desejam que a sua doutrina se espalhe e o melhor meio seria através da Academia Arcana. Praticamente, foram eles que me elegeram na última vez que fui “obrigada” pelo Gorila God a ser líder.

O seu líder é um garoto asqueroso, humano e magro, chamado Laxus Ignus. Sempre o considerei um merda. Porém, é inteligente e articulado. Acredito que seja uma espécie de “médium” de uma criatura de outra dimensão ou algo assim. Todavia a sua visita foi uma grande surpresa para mim. Normalmente, ele envia alguns dos seus asseclas, alguma vadiazinha qualquer que acredita no seu papinho de messias dele.

– Saudações, Líder. – diz o rapaz com um sorriso simpático e reverencia exagerada.

– O que deseja, Laxus? Eu ouvi o pedido de todos através de minha vice-líder. Não preciso de um doutrinador religioso para mostrar a minha obrigação messiânica como líder. – tento poupar-me do seu discurso religioso.

– Que isso, Sally?! – o garoto ri. Eu vim por outro motivo. Será que pode receber a Rachael? Ela gostaria de trocar algumas palavras contigo... – diz o rapaz.

O meu sangue ferve.

– Como ousa! Eu nunca receberia aquela vaca! Ela maculou o meu sagrado quarto! Se existe um pivô para a minha renuncia, é ela! – digo de uma forma dura.

– Todos os clubes sabem disso. Ela fez um ato arbitrário e estúpido. Ninguém a reconheceu como líder. O que houve, foi um equivoco. Aquela “festa” era uma orgia sabática com intuito do prazer por causa de sua ausência e não uma comemoração pelo mesmo motivo. – explica o garoto com uma expressão de receio e preocupação.

– Orgia... Sabe que nunca aprovaria isso... – digo com certa raiva nos olhos. Temos um acordo com os outros grêmios sobre “festas” e a lei do silêncio.

O garoto coça a nuca.

– Bem... É verdade. Mas muitos membros de outros clubes estavam interessados em se interagir com as Lâmias e... – tenta dizer mais algumas palavras, mas eu o interrompo.

– Com as prostitutas, quer dizer. Não bastou usar a minha cama para suas festinhas... Que NOJO! – berro com asco.

O rapaz de cabelos loiros, quase brancos, ajeita a sua túnica sacerdotal vermelha e toca em meus ombros.

– Os clubes estão dispostos a pagar o que for para compensar qualquer prejuízo. Seja financeiro ou moral. O que precisar! Basta a sua aprovação. - diz em tom de quase suplica.

Eu faço um gesto de recusa ao retirar as mãos do rapaz dos meus ombros. Porém queria ver até que ponto eles estão dispostos para me ver de volta na liderança do grêmio da serpente.

– Pode trazer a piranha da Rachael. – digo esperando o improvável. Vou dar uma chance para se explicar.

Sinceramente, eu não esperava que a minha grande rival e inimiga aparecesse para implorar perdão. Todavia, a cena que vi doeu profundamente o meu coração.

Rachael apareceu...

O seu corpo verdadeiro de lâmia estava exposto. Marcas, feridas e sangue cobria todo o seu corpo. O seu belo rosto inchado e roxo. Uma coleira em seu pescoço. Os seus cabelos castanhos cortados e estava cabisbaixa.

Humilhada até a alma.

– O que fizeram com ela? – pergunto incrédula.

– Nós acharíamos que ela merecia uma punição por macular o seu quarto. Mostramos o nosso desagrado. – diz Laxus. Usufruímos de sua beleza, quebramos o seu espírito e mostramos que não se compara a você. Não é isso que mais deseja, líder?

Eu queria que ela engolisse a sua empáfia e não que a torturasse e destruísse o seu espírito. Aquela pobre garota estava diante de mim, não era a minha inimiga, mas sim uma heroína que se negou a curvar diante de mim. Até o limite de suas forças.

Tudo que queria era viver...

Não resisti mais e abracei a minha inimiga.

Ninguém entendeu a cena.

– Por quê? – pergunta Laxus.

– Porque sou uma louca. – respondo em lágrimas. Porque acredito na bondade. Porque acredito que podemos ser fortes por seremos humanos. Não é mostrando que mais poderoso do que aquele que é fraco ou pequeno, mas o verdadeiro poderoso é aquele que resiste a tudo, mesmo que não aja esperança. É isso que acredito. – e acaricio o rosto machucado da minha inimiga.

– Eu jamais... Faria isso por... Você. – balbucia Rachael tentando entender a minha insanidade final.

Finalmente, compreendi o porquê estou no mundo e o que represento.

Foi o meu momento de loucura que descobri a sanidade.

– Sei disso, Rachael. Eu sempre me odiei por ser uma serpente humanoide. Ainda mais que os da minha raça são considerados traidores e cultuam o Deus da Traição. Porém descobri que podia cumprir o meu destino, “traindo” o traidor. Sendo a mais bondosa e justa num mundo de trevas. Mesmo que matem ou me abandonem num exílio. Mesmo que me odeiem e desprezem. Mesmo que não tenha mais esperança no futuro e que seja esquecida por meus amigos e por aqueles que eu acreditava que se importavam comigo. Eu sou capaz de aguentar tudo. Pois eu sou a Luz do Mundo. – e olho para os céus em lágrimas.

Todos se afastam assustados, inclusive Rachael que me empurra para se livrar dos meus braços. O seu olhar era de medo e incompreensão. Acho que a minha atitude foi muito mais causticante do que toda tortura que sofreu.

Era como um Anjo brilhasse no meio das trevas do Inferno.

Como surgiram, todos desapareceram.

Fiquei, finalmente, sozinha de vez.

Depois do incidente, todos do grêmio da serpente sequer dirigiram uma palavra para mim. Todos se afastavam como eu tivesse uma doença contagiosa. Talvez o conceito do perdão absoluto seja um assunto assustador para aqueles indivíduos.

Eu mesma não entendia o que aconteceu comigo. Tudo que entendia era escravidão, ódio e vergonha. Estava como eles, deliciando com as minhas paixões e lutando por minha liberdade.

Então descobri outra coisa...

Tudo que fazemos é em vão. É vaidade. Só isso. Um orgulho idiota que se acaba quando morremos. Outros vão usar o criamos e rir aqueles que querem mudar realmente o mundo. E outra geração vai rir novamente dos nossos esforços daqueles que lutam para tornar o nosso mundo melhor.

Para que lutar? Para que criar? Para que outros usem e tripudiem daquilo que criamos com tanto esforço e esmero? O que adianta criar se o mundo defeca para os nossos sonhos? E quando lutamos, temos que “vender as nossas almas” para dar para aqueles que realmente não merecem a alegria de estarem no controle e dar as cartas.

Então percebi que faço parte de algo muito maior.

Sou um ser de Luz. Não é que o que os outros acham que seja “Luz” ou “Bem”, mas sim uma honestidade sincera. Diante você mesmo. Não com Deuses ou entidades que queremos nos mostrar, mas para si. O que realmente importa.

Se valeu a pena viver...

Essa Luz que descobri. A grandiosidade da Criação. Somos nada. Então, para que vaidades? Para que se mostrar para outros idiotas que sou especial? Isso não vale nada! Não vale a pena! O que importa é o que aprendemos para leváramos para outras existências e amar a todos acima de tudo. Mesmo que sinta raiva às vezes e deseje socá-los. Mas se percebe que não vale o esforço.

Tudo passa...

Por isso, naquela manhã resolvi enfrentar o meu maior inimigo.

O meu desapego ao mundo não está pronto, mas tenho coisas a fazer contra o meu maior inimigo. Aquele que me escravizou e fez que ainda tivesse sentimentos ruins. Aquele que quer me jogar no lodo do ódio e da inveja.

Vou enfrentar o Gorila God...

Quando chego ao seu laboratório, o grande macaco estava com o seu jaleco branco e com uma mesa com duas cadeiras. Estava posta um grande café da manhã com todo tipo de quitutes que tanto aprecio.

Para a minha surpresa o Gorila diz uma citação que nunca esperaria que saísse dos lábios profanos dele.

– “Vós sois a Luz do Mundo. Não se pode esconder uma cidade situada numa montanha, nem se acende uma Luz para colocá-la debaixo do alqueire, mas sim para colocá-la sobre o candeeiro, a fim de que brilhe a todos os que estão em casa.”*– cita o grande macaco.

(*Nota do Autor: Mateus, Capitulo 5; Vers: 14-15)

– O que é isso? – pergunto achando bonito a citação.

– É uma citação que é bem conhecida de onde eu vim. – e sorri. Gostaria de se sentar? Já que quer me enfrentar... Podemos fazer isso alimentados, não acha?

Eu aceito o convite e sento-me. Logo pego o queijo e espero as palavras do meu inimigo.

– Seja bem-vinda ao mundo do Insight, senhorita Parkers.... – diz ele de uma forma simpática.