Apenas um olhar

Capítulo 116:


Por Anita...

Sentir -se só é como caminhar por um campo vazio e em meio a toda solidão que se reserva na escuridão de uma noite gélida e com uma calmaria que revela um silêncio agonizante. Eu estava parada sentia que algo dentro de mim me dizia que eu precisava atravessar aquela imensidão, mas por segundos que me enchia de coragem, eu também via toda frieza daquela noite atravessar minha alma e se instalar em meu coração, era horrível, minha impotência me fazia ficar também sem força alguma, eu estava parada, por algo que me bloqueava e fazia de mim a pessoa mais inútil do universo. Meu caminho não poderia se revelar apenas observado ao longe, eu tinha que estar por ele, descobrindo ali, a cada passe dado o que o futuro iria me revelar, era preciso atravessar a escuridão, contempla-la, explora-la, descobrir enfim o que ela queria de mim, era coragem que seria meu alimento bastava encontra-la, mais eu também sabia que meu tempo estava acabando, precisava de presa...

A noite era fria havia uma névoa encobrindo a lua, minhas pernas estavam cansadas como se eu tivesse caminhando por horas, mas pra onde eu estava indo, ou vindo de onde, porque eu estava ali? Eu não tinha respostas, era tão só aquele lugar, meu coração se apertava, era só eu tentar respirar mais profundamente, havia algo me sufocando, mais eu não consigo decifrar o que é. Eu tentava, mas era inútil... De repente aquele lugar vazio e irreconhecível por mim se torna tão familiar, eu estava no portão de casa, agora eu conseguia olhar para o céu com muita precisão, ele estava límpido e estrelado. O casarão parecia tão calmo, todas as luzes estavam apagadas menos a da sala, todos deveriam estar lá como sempre, mais fui sentido um medo de estar errada. Não entendi por que. E porque eu não estava com eles, já era noite, mais eu perambulava...

Fui devagar me aproximando até a porta, mas ainda não se ouvia nenhum ruído, medrosa me atrevi a girar a maçaneta da porta, corri meus olhos nervosamente por toda extensão da sala, o silêncio era a maior ruído que eu pude ouvir, meu coração se apertou mais uma vez repleto de angústia, a força foi tanta que pude achar que minhas pernas não aguentariam sustentar o peso do meu corpo.

– Eu tava te esperando. - de repente uma voz se pronuncia vindo da cozinha, e junto dela a sombra de um vulto vai se deslocando. Algo me dizia que eu já conhecia aquela voz, e porque ela me acalmava, mesmo fazendo esforços eu não conseguia lembrar.

Esperei mais alguns segundos até contemplar o rosto da pessoa e quando finalmente o vi meu coração sorriu do mesmo jeito que era o sorriso leve e feliz que eu estampei em meu rosto sem nem pensar.

Ben! - balbuciei surpresa, tendo minha voz sendo sabotada pela emoção que eu sentia, eu poderia flutuar.

– Porque a surpresa, afinal a gente precisa comemorar. - ele me respondeu meio que rindo da minha cara alegre e abobalhada e sem acreditar.

– Sério. - me senti tão contente quando vi que ele estava muito feliz.

– A gente conseguiu, o Antônio não vai mais atrapalhar nós dois, você conseguiu meu amor. - Ben disse e por um momento fiquei como ele sem crer que o pesadelo havia acabado, eu nunca mais precisaria mentir como havia mentido nas últimas semanas, e isso era libertador.

– Eu nem consigo acreditar. - me atirei nos braços dele que me recebeu com um abraço cheio de carinho e proteção, que não precisava acabar nunca mais, eu parecia ter imaginando e sonhado com aquele momento durante muito tempo. Me sentia tão feliz, que definir em palavras seria impossível.

Mas de repente, minha alegria e tranquilidade parecia ser interrompida pelo enorme estrondo que foi a porta se abrindo. Ben e eu nos separamos abruptos mas ainda com sorrisos no rosto, sorrisos estes que foram se desmanchando quando visualizamos de quem eram os passes da pessoa que entrava. Antônio estava ali nos olhando cinicamente como era de costume, sem falar no olhar de ira, com que ele fitava eu e Ben abraçados, comecei a tremer involuntariamente.

– Vocês acharam mesmo que iam conseguir me vencer, tolos isso sim. - ele nos encarou com ódio, um ódio que eu nunca vi no olhar dele com tamanha intensidade.

– O que você quer. - eu me atrevi a perguntar, mesmo com muito medo.

– Ué o óbvio, vou cumprir minha promessa, acabar com os dois, você não achou que podia me subestimar Anita. - Antônio parecia sem controle. - Agora chegou a hora deu cumprir a minha parte do acordo. - ele gargalhou.

– Não, não vai. - eu comecei a chorar de imediato, não podia ser possível.

– Ah vou sim, eu avisei pra você não me trair. – Antônio reforça enfurecido. - E eu vou começar por esse desgraçado, você não preferiu ele, então. - avisou Antônio, olhando para Ben logo atrás de mim.

– Não, não, não vai, eu não vou deixar, não vou, não. - comecei a gritar para ele com todas as forças que eu encontrei em meio ao medo que senti.

– Ben, Ben, Ben... - Ben, não... - Ben!

– Anita, que isso minha filha. - Vera fazia os últimos ajustes no almoço, percebendo Anita que dormia no sofá, até que a garota começou a se debater no sofá de maneira agitada.

– Mãe que. - Anita olhou para Vera ainda trêmula, mal decifrando onde estava.

– Você tava sonhando filha. - a mulher informou docemente, como não se dirigia a ela nos últimos tempos.

– É só não entendi uma coisa, você ficou noiva do Antônio, mas sonhava romanticamente com o Ben, isso Anita. - Vitor que estava na mesa junto com Giovana e Pedro questionou com deboche e ironia.

– Vai ver ela acha que pode manter meu irmão de estepe, caso não dê certo com o Antônio, tem ele pra otário. - Giovana também ruborizou, estava com raiva de Anita, não entendia porque ela deixou Ben, e ficava ainda mais irada quando percebia o sofrimento do irmão mais velho.

– Gente vamos deixar a Anita em paz, por favor. - Ronaldo se viu obrigado a intervir, já que o olhar cabisbaixo da enteada demonstrou que ela se quer tinha forças pra isso.

– Qual foi pai vai defender ela, logo você que não gosta de nada incorreto. - a ruiva ficou revoltada.

– Giovana vai arrumar o que fazer. - o homem ordenou a dispersando.

– Vocês estão doídos na boa. - ela subiu as escadas reclamando e não aprovando a defesa do pai a Anita.

– Vamos almoçar Anita, chega desse assunto, apesar de que eu também não entendi o sonho. - Vera voltou com o olhar duro a Anita.

– To sem fome, mas vocês podem almoçar, vou lá pro quarto. - Anita se justifica desanimada caminhando até a escada, depois de jogar a almofada que estava consigo em cima do sofá.

– Pelo visto pensando em terminar o sonho. - Vitor não resistiu em não zoar, mas se calou diante do olhar de Ronaldo que era severo.

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– Pois eu não entendo a Anita. - Vera dialogava com Ronaldo. - Terminou com o Ben e agora sonha com ele. - cobrava.

– Então não julgue a Anita ela... Ronaldo se calou quando viu alguém. Queria contar tudo a esposa, mas toda vez que tentava perdia a coragem e a fala.

– Pai você queria falar comigo. - Ben entrou pela porta calmo, mais se perdeu na falação dos dois. - Aconteceu alguma coisa com a Anita. - mesmo não devendo Ben não habitou em perguntar.

– Não filho. - esclareceu Ronaldo tão logo quando entende a aflição dele.

– Ou talvez, você devesse perguntar a ela Ben, a Anita que eu convivo está irreconhecível a julgar pelas atitudes. - tensa e preocupada Vera desabafou.

– Ela tá aí pai. - Ben preferiu não responder à madrasta, já que jamais concordaria com ela.

– Subiu pro quarto. - informou. - Mais é melhor você não... - Não vai falar com ela, você sabe que... - Ronaldo tentou se expressar sem despertar a curiosidade de Vera quando o viu com pressa rumar a escada.

– Desculpa pai, mais você sabe também que eu jamais poderia te obedecer. - Ben rebateu, nunca deixaria de se preocupar com Anita, sempre precisaria da felicidade dela pra ter a sua, e a ver angustiada e sozinha como a garota estava nos últimos tempos, continuaria sendo seu fim, cuidar dela e a proteger sempre seria o extinto que falaria mais forte dentro de si, e não importaria o que houvesse.

– Gio, você pode sair um minuto eu quero ter uma conversa com a Anita. - Ben pediu em parte com certa calma quando chegou se escorando a soleira da porta, fitando Giovana em sua cama parecendo ouvir música a todo vapor com os fones de ouvido.

– Oi? - Eu entendi direito, você quer falar com ela. - a ruiva aponta para Anita sentada de lado na cadeira da escrivaninha rabiscando algo em um caderno, pensativa.

– Acho que eu não falei chinês, não é. - Ben repreende meio irônico.

– É né, já você não sei se está ouvindo muito certo tudo que te dizem. - Giovana afirmou revirando os olhos com ira, o irmão só poderia ter gostado de bancar o paspalho, o que ele ainda poderia querer com Anita. - Depois do que ela te fez você ainda quer conversar com ela, por favor. - ela bufou fuzilando o irmão mais velho, que suspirou sem responder de imediato. Anita olhou a discussão atônita, parecendo não conseguir intervir, se via zonza.

– Por favor, digo eu Giovana, sai agora, qual parte de que eu quero falar só com a Anita você não compreendeu. - Ben murmurou sem a menor cordialidade.

– Aff, tá bom eu saio, grosso também, eu hein. - acatou a menina enraivada, passando pela porta intempestiva.

– Você tem que parar com isso. - Ben entrou se dirigindo a Anita.

– Com o que? - ela não entendeu claramente.

– Deixar todo mundo te insultar e não se defender. - alegou ele, sentado a cama dela.

– Eu não tenho muito o que dizer também. - Anita afirma olhando para ele sem disfarçar o semblante de exaustão.

– A verdade talvez fosse um bom começo. - Ben a fitou severo.

– Você veio aqui pra brigar comigo também, o pessoal lá na sala já fez isso, se não te contaram. - disse ela triste, Ben tinha razão ela tinha se acostumado com os insultos de todos e também a não se defender, como sempre fez, mais ouvir dele também seria o seu fim, não aguentaria.

– Não. - Ben negou baixando o olhar. - Você pode até achar que não, mais eu ainda me preocupo com você. - admiti ele, penalizado com o que os dois viviam calados. Anita o olha procurando sufocar a emoção que lhe atingiu. - Vem cá. - ele solicitou lhe estendendo a mão, Anita apenas negou-se balançando a cabeça. - Vem... Ben implorou insistentemente. Anita cedeu acuada e em parte sem mais forças de ficar só como andava nos últimos dias, pôs sua mão sob a dele sentando próximo a si.

Ben a abraçou com ternura, desejando com todas suas forças que nunca mais precisa-se deixa-la. - As vezes eu juro que não sei o que vai me matar primeiro, se é a saudade que eu sinto de você ou a aflição por essa situação toda. - Ben confidencia, ajeitando uma mecha do cabelo dela.

– Ronaldo me disse que a Cícera já marcou as passagens. - mesmo sabendo que não gostaria da resposta Anita acabou indagando.

– É parece que sim. - Ben não desmentiu o pai, também não adiantaria.

– Então tá tudo acabado. - lamentou Anita olhando para a parede atrás de si sem solta-lo, talvez fosse a última vez que o teria tão perto, ela não pode deixar de se lamentar por dentro.

– Anita eu não vou a lugar algum. - Ben rebateu taxativo, jamais pensou diferente.

– Não vai ter como, ela não vai ceder, não depois de tudo que aconteceu. - falou ela deixando o medo em seu olhar ser facilmente percebido por Ben.

– Você vai ter que confiar em mim. - respondeu ele levantado seu queixo para que ela lhe olhasse nos olhos.

Anita o encarou sem se pronunciar, talvez nem tivesse mesmo o que dizer, não estava em posição de cobrar nada de Ben, pelos motivos certos ou mesmos errados ela havia o deixado, por mais que seu coração doesse muito por isso.

– É bom eu vou indo, tinha deixado uns currículos e me ligaram mais cedo, quem sabe dessa vez eu não dou mais sorte. - Ben informou, quebrando todo o silêncio, que unia os dois.

– Claro pode ir. - ela concordou forçando um sorriso.

– E você se cuida, por favor. - Ben pediu a olhando nos olhos.

– Eu vou. - prometeu. - Tá eu vou tentar. - Anita procurou se corrigir quando notou um sorriso descrente se formar no rosto de Ben, com a forma pouco convencida com que ela havia se pronunciado.

– Eu vou cobrar hein, pode apostar. - afirma Ben deixando um beijo carinhoso na testa dela.

– Eu já esperava. - Anita se permitiu sorrir despreocupada por alguns segundos.

– Filha. - Vera surgiu na porta e quando os fitou onde estavam, não deixou de estranhar o clima ameno entre os dois.

– O que? - Anita indagou observando Ben levantar-se.

– Eu... - Você não vai almoçar, deixei um pedaço de frango pra você. - Vera convidou percebendo que Anita se alimentava cada vez menos.

– Não, to sem fome, depois eu como alguma coisa. - respondeu ela não muito animada.

– Hei e a promessa que você me fez. - Ben rebateu ligeiro, não deixando ela escapar.

– Já me arrependi sabia. - Anita suspirou impaciente pela lembrança.

– Tarde de mais. - Ben retribui o sorriso. - Bom eu tenho que ir. - recordou-se ele.

– Boa sorte lá. - desejou Anita sorrindo esperançosa.

– Obrigado, acho que eu vou precisar. - sorriu ele de volta e tão logo saiu.

–Você e o Ben, Anita o que está acontecendo de verdade. - Vera cobrou da menina quando viu Ben ir embora.

– Nada mãe, a gente só conversou. - Anita achou melhor não entrar em detalhes.

– Engraçado Anita, o Ben não te olhou como alguém que foi trocado por outro, assim sem nenhuma explicação viável, ao contrário ele te olhou com carinho. - Vera não entendia mais nada, cada vez entendia aquilo tudo menos, depois de vê-los ali tão cordiais um com o outro ficou ainda mais confusa.

– Não é mais fácil você pensar que ele só não quer meu mal, não tem nada de errado mãe. - Anita negou veemente todas as desconfianças da mãe.

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No dia seguinte Anita encontrou a sala vazia e a mesa do café já bagunçada.

– Ai que isso. - A figura do vulto que se encontrava parado a porta a fez levar um susto.

– Bom dia meu amor. - cinicamente Antônio se dirigiu a ela.

– O que você quer. - Anita foi até a mesa já pensando em iniciar o dia de estômago vazio mais uma vez, já que a presença do garoto lhe havia novamente lhe lembrado de seus problemas.

– Ué não posso desejar bom dia pra minha noivinha querida. - ele dissimulou.

–Me erra, eu não sou nada tua. - Anita o corrigi com raiva, entornando todo o suco que havia colocado em seu copo.

– É sim, você é minha, e é assim que vai ser pra todo o sempre. - Antônio tratou de garantir.

– Não, nunca, eu já te falei uma vez e eu vou repetir, eu prefiro morrer do que ter alguma coisa com você. - Anita ergueu-se enfurecida cuspindo as palavras, tamanha era sua raiva sentiu sua cabeça rodar enquanto seu olhar confuso e de certa forma embaçado percorreu o cômodo, talvez as queixas da mãe e até de Ben eram válidas, ela tinha que voltar a comer com regularidade antes que fosse mesmo parar em um hospital.

– Você vai mudar de ideia, eu sei que vai, com o tempo você vai perceber que, o amor da tua vida sou eu, não o Ben, você vai dizer pra mim que me ama, que gosta de estar comigo, eu sei que vai. - taxou Antônio nervosamente.

– Eu não vou nunca, nunca... - repetiu ela buscando o ar que parecia lhe faltar.

– Você não vai ter escolha. - rebateu o garoto altivo.

– Você é que pensa. - teimou Anita sentido suas pernas bambas, Antônio riu pois entendeu o que estava acontecendo com ela. - O que você fez Antônio. - Anita desconfiou da forma possesiva e irônica com que ele a olhou. - Você botou alguma coisa naquele suco não boto, foi isso não foi. - ela deduziu se assustando com as tonturas que se intensificaram, mesmo com ela relutando.

– Você tá ficando esperta mesmo princesa. - ele confirmou descaradamente, botar seu plano em prática foi mais fácil do que ele previu.

– Você não vai... - Alguém... - pena que Anita custou a perceber, já era tarde para que ela tentasse evitar cair desmaiada ou gritasse para fora na busca de alguém, mesmo lutando consigo mesma sua vista ficou escura e ela caiu desacordada recebendo o auxílio de Antônio que sorriu vitorioso por sua conquista.