Apenas o seu sangue

Só se eu for o único


— Eu… eu quero ser uma vítima fixa, sim.

— Ah, que bom! — ela sorriu.

— Mas… só se eu for o único.

— … hein?

— Alissa… você foi direta e sincera comigo desde o início. E eu gosto disso, então também vou ser.

— … como assim?

Jungkook então pegou a mão dela e disse:

— Eu quero namorar com você. Quero que você largue todas as outras vítimas e fique só comigo.

— O-oi?! — Alissa arregalou os olhos, fazendo Jungkook sentir que precisava se justificar:

— Eu sei que a gente se conhece há pouco tempo. Sei que você provavelmente não tava esperando isso logo de cara. Mas… bom, eu também não tava esperando que você me pedisse pra beber o meu sangue assim que a gente se conheceu — Jungkook riu de leve, em parte pela situação e em parte por nervosismo — Mas eu deixei, e… agora eu gosto ainda mais de você. Então… Alissa… você aceita namorar comigo, e beber só o meu sangue a partir de agora?

A vampira ficou alguns segundos sem reação, boquiaberta, a mão dela ainda na dele. Então, finalmente respondeu, sem jeito:

— Jungkook… mesmo se eu quisesse, eu não poderia abrir mão das outras vítimas pra beber só o seu sangue.

— Por que não? — ele perguntou, a ansiedade transparecendo na voz.

— Porque eu preciso de mais sangue do que você pode me dar — ela tirou a mão da dele, delicadamente — Lembra quando eu disse que era praticamente uma doação de sangue? Que eu queria as minhas vítimas vivas e saudáveis?

— Lembro.

— Então, é por isso que eu bebo mais ou menos a mesma quantidade de sangue que é retirado numa doação normal, num hospital. Pra eu ter certeza do quanto e com qual frequência eu posso beber sem prejudicar a minha vítima. E, pra homens, é a cada dois meses. Essa é a frequência máxima que você pode doar sangue, porque é o tempo que demora pro seu sangue se regenerar.

— Ah… entendi…

“Agora a resposta dela no instagram dizendo que algumas vítimas só se repetem a cada dois meses fez mais sentido…” Jungkook pensou.

Alissa continuou:

— Eu preciso de sangue pelo menos uma vez por semana. Mas se eu beber o seu sangue mais do que uma vez a cada dois meses, você vai ficar doente. Vai ter deficiência de ferro e anemia. E eu não quero fazer isso com você, nem com ninguém.

— Eu não ligo se eu ficar um pouco anêmico! — Jungkook afirmou assertivamente, fazendo Alissa arregalar os olhos novamente:

— Mas eu ligo! E não seria só “um pouco anêmico”! Se eu realmente fosse beber o seu sangue na quantidade e na frequência que eu preciso, você é que ia precisar de uma transfusão! E eu não vou fazer isso com você, desculpa.

Jungkook abaixou o olhar:

— E… se você ficasse sem beber o sangue de ninguém… — ele começou a pergunta, já sabendo a resposta. Mesmo assim, ela completou:

— Eu não consigo. Em menos de três semanas eu já começo a ter dores no corpo, crises de ansiedade, tremores, confusão mental… — ela repetiu o que ele já havia lido no seu instagram.

— Hm… — Jungkook ainda olhava pra baixo, os ombros caídos — Mas… você disse “mesmo se você quisesse”. Então isso quer dizer que… — ele levantou o olhar e os ombros, tentando passar uma tranquilidade que não estava sentindo — … que mesmo que você pudesse, você não iria querer largar as outras vítimas pra namorar comigo?

Alissa abriu a boca pra responder, porém demorou alguns instantes para de fato falar. Ela não queria magoá-lo. Porém, sabia que era inevitável:

— Não é só com você… eu não quero namorar com ninguém

Jungkook desviou o olhar e forçou um sorriso, tentando esconder como se sentia:

— Entendi…

— Me desculpa se eu fiz ou falei alguma coisa que passou a impressão errada… realmente não era a minha intenção.

— Não, você não fez nada. Eu é que… — Jungkook não conseguiu se levar a falar o que estava pensando: “Eu é que me iludi”. Então, engoliu em seco e apenas repetiu: — Você não fez nada.

Após alguns segundos de silêncio, ela perguntou:

— Você… acha que consegue continuar sendo minha vítima mesmo assim?

— Ahm… — Jungkook respirou fundo, procurando coragem pra dizer: — … não, eu não acho que consigo. A gente não teve uma chance de conversar sobre isso, mas… eu tô procurando alguém com quem eu possa ter um namoro monogâmico. Alguém que seja só minha, e que eu também seja só dela. Então… eu entendo que você não pode abrir mão das outras vítimas, mas… eu acho que não vou conseguir continuar te vendo se eu souber que toda semana você tá… bebendo o sangue de uma pessoa diferente.

— Entendo… — a vampira disse, decepcionada.

— Desculpa...

— Não, não tem por que pedir desculpas. Como eu disse desde o início, era só se você quisesse.

— … ok…

Os dois ficaram alguns segundos sem saber o que dizer.

— Bom, então… acho que é melhor eu ir embora… — Alissa falou, se dirigindo para a porta.

— Desculpa te fazer vir até aqui pra isso… — ele disse, a acompanhando.

— Não, tudo bem. Eu vim porque eu quis.

Ele abriu a porta pra ela. Antes de sair, ela se virou pra ele mais uma vez:

— Se você mudar de ideia, você pode me procurar.

— Ahm… eu não vou mudar de ideia. Mas obrigado por ser sincera comigo, e… não mentir nem ficar me enrolando só pra…

— Sim, claro! Obrigada por ser sincero comigo também.

— Claro…

Sem mais o que dizer, Alissa apenas se despediu:

— Bom… tchau…

— Tchau… — ele disse, a tristeza evidente na voz.

Com dor no coração por vê-la indo embora, ele fechou a porta.

***

— Eu vou dar três tapas na sua cara, amiga! — Yumi falou quando Alissa terminou de contar tudo o que tinha acontecido entre ela e Jungkook, duas semanas após o ocorrido. Elas estavam na casa da Yumi, sentadas na cama e conversando.

— Por quê?! O que eu falei de tão ruim? — a vampira perguntou, na defensiva.

— Ah, não sei… — Yumi admitiu — Tá, na verdade você não falou nada de mais. Eu é que tô triste por ele.

— Você devia é ficar triste por mim! — Alissa fingiu que estava irritada — Eu fui pra lá achando que ia fazer sexo e terminei recebendo um pedido de namoro!

— Aish… hahahahahahahaha!

Embora estivesse brincando, Alissa realmente tinha ficado decepcionada. “Eu tinha colocado uma lingerie sexy e tudo…” ela pensou.

— E ainda perdi o melhor sangue que já bebi na vida… olha como os meus olhos ainda estão vermelhos! Olha como eu ainda tô quente — ela segurou a mão da amiga — Isso não é das vítimas que eu tive depois dele. Eu não voltei a ficar gelada desde que bebi o sangue dele!

— Caramba…

— Né? — Alissa suspirou e se jogou pra trás, deitando na cama.

— Vocês não se falaram mais depois desse dia?

— Não. Nada. Ele continuou vendo os meus stories durante uns três dias, e depois parou. Não sei nem se ainda tá me seguindo.

— Ah… ele deve estar tentando não te ver pra conseguir te esquecer…

— É, eu sei. Mas, sinceramente, não sei o que fez ele pensar que eu queria namorar.

— Mas… por que exatamente você não quer?

— Porque eu não quero ficar presa a ninguém! Eu quero poder fazer o que eu quiser com quem eu quiser.

— Mas você ganha outras coisas com um namorado! Você ganha um companheiro em quem você confia, que te dá carinho e amor, como um porto seguro!

— Amizade não é pra isso? — Alissa retrucou na mesma hora.

— Também, mas… é diferente.

— Não, eu tô bem sem um homem esperando que eu seja “só dele”. Não te falei que ele queria que eu largasse as outras vítimas pra ficar só com ele? Eu não faria isso nem se eu pudesse. Eu gosto de beber sangue.

— Ah, mas… eu entendo ele… eu também não ia gostar se o Felix fosse um vampiro e bebesse o sangue de outras garotas. Ainda mais sabendo como é, e o efeito que daria nelas.

— Hm… — sabendo que não concordariam, Alissa apenas respeitou a opinião da amiga. Então, voltou a se sentar na cama e mudou de assunto: — E como tá o seu namoro com o Felix?

Yumi abriu um sorriso enorme:

— Aaaahhh, tá maravilhoso! Ele é perfeito!! Ele é tão doce, tão alegre… — ela falava como uma adolescente apaixonada — O olhar dele é tão intenso, a voz dele é tão profunda, o sorriso dele é tão lindo…

Alissa não entendia como alguém podia ficar tão boba só por causa de outra pessoa. No entanto, quis apoiar a amiga:

— Que bom! Se você tá feliz, eu fico feliz.

— Nhaaaaa! — Yumi abraçou a vampira.

— E ele tá te tratando bem, né?

— Sim, muito!!

— Ótimo.

— E as suas últimas vítimas, como foram?

— A maioria foi… bem ruim — ela admitiu.

— Ruim como?

Alissa suspirou antes de responder:

— Gosto ruim, ou sem graça, ou então a pessoa acha que, porque eu bebi o sangue dela, ela pode me tocar do jeito que ela quiser…

— … ah — Yumi falou, sem saber mais o que dizer. Percebendo o desconforto da amiga, Alissa completou:

— Mas teve um semana passada que foi bom! E ele disse que quer repetir daqui a dois meses, então… é isso.

— Ah… que bom então… — Yumi disse, tentando retribuir o apoio da amiga.

***

Jungkook estava voltando de um encontro com uma garota que Namjoon havia apresentado a ele. O amigo disse que ela estava interessada no JK, que ela era bonita, inteligente e, principalmente, normal, e insistiu que ele deveria pelo menos dar uma chance e sair com ela num encontro. No mínimo, o ajudaria a esquecer a Alissa. Jungkook então a levou pra jantar, mesmo sem muita vontade.

Porém, quando ele deixou a garota em casa após o jantar, ele já sabia que não haveria um segundo encontro. Ele se despediu dela de um jeito que claramente a decepcionou (já que ela estava esperando um beijo que não veio), e andou de volta pra casa enquanto remoía pensamentos:

“Por que eu não consigo me interessar por alguém como ela?”

“Não tinha absolutamente nada de errado com ela! Ela realmente era bonita, inteligente, simpática…”

“E mesmo assim, eu não me senti atraído por ela. Nada! Nem mesmo uma faísca!”

“... eu tenho problemas.”

Por hábito, ele pegou o celular do bolso e abriu o instagram. Também por hábito (embora esse fosse mais recente), ele abriu seus stories pra ver se Alissa tinha visualizado. Ela não tinha.

“... ela parou de ver meus stories pouco depois de eu parar de seguir ela…”

“Será que ela reparou? Será que ficou chateada?”

“... não, lá vou eu de novo, enxergando coisa onde não tem. Ela só não deve estar nem aí, mesmo…”

Jungkook suspirou, tentando tirar Alissa de sua cabeça.

Enquanto andava por uma rua particularmente vazia, um homem se aproximou de moto. Ele parou na frente de Jungkook, bloqueando sua passagem, e perguntou:

— Ei. Tu que é o Jungkook, né? — ele perguntou, com uma voz nada amigável.

— Ahm… quem é você? — ele perguntou de volta, incerto se deveria mesmo confirmar.

O estranho tirou o capacete e desceu da moto. Jungkook achou o rosto do homem familiar, mas não se lembrava de onde o conhecia. Ele se aproximou mais de Jungkook, estufando o peito:

— Tu achou que ia pra cama com a minha namorada e não ia acontecer nada contigo, filho da puta?!

Assim que ele disse isso, Jungkook lembrou onde o tinha visto: no instagram da menina que havia mentido pra ele sobre não ter namorado nem instagram, e depois sobre ter um relacionamento aberto.

— Olha, cara… me desculpa, mas ela não me falou que tinha namorado! — ele disse, levantando as mãos em sinal de que não queria briga.

— Não quero saber!

O homem então enfiou a mão na jaqueta e tirou uma arma, apontando-a para Jungkook.