Sexta-feira, depois da aula, fui para casa da minha mãe. Não teria a menor graça ficar em casa quando todos seguiam com suas vidas. Júlia foi visitar alguns parentes no interior e eu passava por problemas familiares. Precisava de um momento família, um abraço, um pouco de carinho e atenção.

Durante do café da manha de sábado, depois de uma conversa simples com mamãe, resolvemos que já era hora de contar a Pedro o que estava prestes acontecer.

Diferente de mim, sua reação foi encantadora ao saber que finalmente ele veria o nosso pai. Melhor assim do que odiá-lo tanto quanto um dia eu o odiei por tudo que ele fez. Deixei claro que primeiro eu teria uma conversa com ele a sós. Após isso, marcaríamos um dia para conversamos os três. Ele garantiu que não via a hora desse momento chegar e contaria os dias.

Depois do almoço, saímos para caminhar com Ben e Pedro ficou me perguntando de Júlia. O que me surpreendia era que ele já gostava muito mais dela do que um dia gostou de Malu.

— Se eu disser que estou começando a entender essas paradas de amor, você acredita? – ele perguntou. — É que eu estou começando a achar que estou gostando de uma garota lá do colégio, mas é complicado.

— Sério mesmo? – perguntou surpreso.

— Sério, mano. O nome dela é Manuela. É uma lourinha de olhos claros. Parece um anjo. Ela doce, educada e extremamente inteligente. Da minha turma. Mas não houve um dia em todos esses anos que ela falou comigo e eu me pergunto o porquê de gostar dela.

Soltei um riso.

— Talvez porque ela seja especial aos seus olhos. Não é necessariamente preciso que ela fale com você para você se apaixonar. Basta ela ser encantadora. Mas então, se ela não falou contigo ainda, fale com ela.

— Poxa vida, Daniel, não é tão simples assim – ele parecia chateado. — É que quando estou perto dela, eu travo, sabe? Fico tremendo, a voz até some. Eu não sei como agir perto dela, de repente me sinto estranho e diferente. Nem parece que sou eu mesmo – ele pausou. — O pior é que os outros garotos são tão na dela quanto eu. E perto dela eles agem normalmente e até a fazem rir. Acho até que ela curte toda essa atenção em sua volta.

— Não seja tolo, irmão – lembrei-me de uma história quase que familiar. — Ela deve gostar de simpatizar com todos. Mas sabe de uma coisa? Seja você mesmo. Caso ela tiver que gostar de você, vai gostar porque você é simples e natural. Só faça um esforço maior de se aproximar se você tem certeza que ela é quem você deseja. Agora se não tiver, parta para a próxima, mostre seu valor. Há tantas garotas especiais nesse mundo, basta procurar direito.

Continuamos a conversar um pouco mais a respeito da tal garota e ele pareceu compreender meus conselhos. Tudo o que eu mais queria é que meu irmão não tivesse que passar por uma desilusão amorosa na vida tão cedo.

Chegamos em casa, soltei Ben da coleira e ele correu livre pela casa, como de costume. Tomei um copo de água, fazia muito calor aquele final de semana, e procurei mamãe.

— Filho? Que bom que chegaram! – ela sorriu. — Tem alguém te esperando no quarto.

Me perguntei se Júlia estaria me fazendo uma surpresa aquela tarde. Subi correndo sem perguntar mais nada, mas me assustei quando vi quem estava ali. Maria Luiza.

— Olá. Soube que você estaria por aqui esse final de semana e vim para conversamos. Lembra-se que combinaríamos, não é? Pois bem, desculpe se não telefonei antes. Como você está?

— Bem – falei confuso. — Nossa! Que surpresa! Eu não esperava por você. Aqui não é o lugar mais favorável para conversarmos. Que tal sairmos um pouco?

— Foi exatamente o que pensei – ela disse sorrindo de novo. O mesmo sorriso perfeito de sempre.

— Malu? – Pedro apareceu de repente com um sorriso gigantesco.

— Pedrinho, como você cresceu! – ela o admirava, depois olhou rapidamente para mim e voltou à atenção para ele. — Nossa! Cada dia mais parecido com seu irmão.

Ele parecia intimidado. Até meu lançou um olhar de quem diz: Será? Despediu-se dela educadamente com mais um longo abraço e foi embora.

Avisei mamãe que iria sair. Levei Malu até meu carro, dei partida e discutimos para onde iríamos. No final das contas, ela resolveu que seria no parque, onde havíamos passado muito tempo juntos desfrutando daquele nosso louco amor.

Sentamos em um banco perto do lago e abaixo de uma bela árvore. Fazia muito calor, mas de alguma forma o ar estava fresco. Havia poucas nuvens e o ambiente estava pouco movimentado.

— Soube que seu pai reapareceu. Fiquei contente com a surpresa. Espero que dê tudo certo entre vocês – ela começou falar, sem me olhar, mas sempre sorrindo. — Ah bom, foi sua mãe quem me contou enquanto esperávamos vocês chegarem.

— Hum – falei com desdém. — Foi. Ele voltou mesmo. Vamos conversar em breve e acertar as contas. Como vão as coisas para você?

— Tudo indo – ela parou de sorrir. — Ainda estou estudando. Também estou fazendo um estágio preparatório em uma das clínicas da região. E bom, acho que só isso – ela finalmente me olhou, seus olhos pareciam ainda mais cristalinos aquela tarde.

— E o namoro? – perguntei friamente. Sei que ela evitava aquele assunto, mas era bom para esclarecermos as coisas de uma vez só.

— Está tudo ótimo. Não tenho do que me queixar. Fernando é um ótimo parceiro, além de primo e amigo – ela desviou o olhar. — Mas e você? Está namorando?

— Não – falei friamente. — Nunca mais me relacionei com nenhuma outra garota.

— Sei – ela parecia inquieta. — E aquela sua amiga no restaurante aquele dia... O que ela é para você?

— Como você mesma disse. Júlia é só minha amiga mesmo. Uma grande e boa amiga.

— Certo – ela pausou. Olhou-me rápido e sorriu. Depois voltou a olhar para qualquer outro ponto fixo do parque. — Olha Daniel, creio que não viemos aqui para falar exatamente sobre essas coisas. Eu realmente quero me desculpar com você, de verdade.

— Por favor, sem perdão. Que coisa mais exaustiva – confessei atordoado. — Só me diga uma coisa: por que você fez aquilo comigo? Conosco? Por que preferiu viver sozinha para aproveitar a vida do que viver ao meu lado? Poderíamos ter aproveitando ao máximo o que você queria. Poderíamos ter sido felizes. Eu a amava e você dizia me amar. E, até hoje, eu me pergunto que tipo de amor é esse que você diz sentir por mim?

Bufei. Finalmente as palavras saiam exatamente como eu queria. Para ela as coisas não pareciam estar saindo da forma como esperou.

— Foi o amor mais incondicional que eu já pude sentir por alguém, acredite – ela me olhou. — Pode parecer que não, mas Daniel, eu não amo meu primo o quanto te amo. Ele não é como você e jamais vai ser. Só estou com ele porque um dia cometi uma burrada e estraguei a minha vida. Fernando era minha única saída. Eu não me via conhecendo outros garotos.

— Não faz sentido – explodi de novo. — Se você está certa que me machucou aquele dia, por que diabos você não correu atrás de mim como eu fiz por você? Por que você não lutou pelo nosso amor? Porque você o preferiu a mim? Acha mesmo que não está o machucando? Eu duvido muito que ele saiba que está aqui comigo dizendo que me ama mais que tudo nessa vida. Eu duvido!

— É, não sabe. Caramba! Porque eu faço tudo errado, Daniel? Você falando dessa forma comigo me faz perceber o quanto sou estúpida. Estúpida ao implorar pelo amor dos meus pais. Estúpida por acreditar que posso te substituir – ela começou a choramingar. — Por favor, me ajude. O que faço para mudar quem sou? Me ajude! Eu quero consertar, eu preciso consertar.

De repente Malu já chorava como um bebê que é roubado dos braços dos pais. Chorava tão intensamente que fez meus olhos arderem, meu peito se oprimir, minha garganta secar.

O que eu faria? Eu não podia deixa-la chorar. Eu não podia nem vê-la chorando dessa maneira. Será que eu tinha sido rude demais em minhas palavras?

— Não fale assim – sussurrei me aproximando dela cuidadosamente. — Não queira mudar. Eu ainda te amo por você ser exatamente o que é. Linda, meiga, carinhosa, divertida e completamente apaixonante – Encostei sua cabeça com cuidado no meu peito. — Todos nós cometemos erros. Eu também cometo. Eu não devia ter deixado que você destruísse nosso amor precipitadamente.

— Você não tem culpa! – ela se afastou bruscamente. — Eu quem sou a inútil aqui!

— Não fala assim, Maria – puxei-a de volta para os meus braços.

Nossos rostos colados, nossos corpos encostados, sua respiração fraca, os olhos úmidos, vermelhos e inchados. Minha expressão séria, meu coração dolorido, meu estômago embrulhando, meus lábios tremendo.

— Amo você – sussurrou ela bem baixinho me fazendo tremer ainda mais.

Não sei se aguentaria. Não sei se suportaria tê-la por perto mais uma vez. O que faria? Em minha mente eu só tinha um desejo. Um desejo louco e atormentador. Uma vontade que eu sempre tive, mas me segurei. Sempre me segurei. Seria loucura cometer esse erro.

Mas acho que por ela eu cometeria esse erro quantas vezes fosse preciso. Não podia me segurar mais um minuto. Eu preciso sentir, preciso saciar, preciso tomar... Preciso dela. Eu a desejava. Eu a queria.

De repente nuvens cobriam o céu. Nuvens grandes e cinzentas. Um trovão nos assustou, mas ainda estávamos imóveis. A chuva estava próxima. Mas quem se importa?

Meu coração parou. Os olhos se fecharam. Minha mão tocou sua nuca trazendo seu rosto para mais perto. A respiração ofegante tomou conta. O disparo foi alto, rápido e cheio de ansiedade.

Levemente senti meus lábios se encaixando nos dela. Por um segundo, ela recuou. Talvez estivesse certa. Deveríamos parar com aquela loucura. Por fim, ela pareceu vencida pela vontade e encostou seus lábios úmidos nos meus. Devagar, as nossas bocas se abriram e as línguas se entrelaçaram em uma sintonia única e incomparável.

Pingos de águas caiam do céu. Leves, gelados e fracos. Um beijo aconteceu, finalmente. Há quanto tempo eu não sentia aquele toque? Aqueles lábios? Aquela vontade?

A chuva forte começou em questão de segundos. Entre beijos ela sorria e eu sorria junto.

— Vem – tive que parar.

Corríamos de mãos dadas pelo parque para encontrar uma saída. Entramos encharcados no carro. Olhei para ela e sorri. Sim, mais uma vez eu tive a impressão que ela estava ainda mais bonita. Agora molhada, com os cabelos pingando e a roupa grudando no corpo.

Ela sorriu também e me deu um beijo. Liguei o carro e dei partida. Louco para chegar a um lugar onde pudéssemos continuar aquele sonho. Mas onde?

— Siga até minha casa. Estou sozinha – ela disse lendo meus pensamentos — Meus pais estão no exterior.

Certo. Lá estava eu dirigindo como um louco para o apartamento de Maria, onde eu não pisava há séculos.

Subimos o elevador aos beijos. Beijos rápidos e ofegantes. Mesmo molhado e sentindo o vento frio da chuva, sentia um calor invadir meu corpo.

Batemos a porta. Ela subiu perfeitamente em meu colo e entrelaçou-me com as pernas, ainda me beijando. Tropeçamos no primeiro degrau da escada, mas nada disso importava.

Subimos as escadas até seu quarto com dificuldade. Joguei-a na cama e beijei seu corpo molhado. Tirei sua roupa e olhei para seu corpo nu por um bom tempo, admirando cada detalhe, cada ponto. Suspirando de satisfação.

Malu tirou minha camiseta. Eu beijava seu pescoço descendo por toda extensão de seu corpo. Queimando. Saciando. Cheio de prazer e fogo. Ela sorria lindamente para mim. Permitindo cada movimento, cada encaixe, cada beijo e toque.

Horas depois, deitados um ao lado do outro, eu acariciava seus cabelos longos e claros.

— Eu te amo – ela sussurrou entre sorrisos. — Você acredita em mim?

— Sim – beijei-a rapidamente. — Acredito em você meu amor, pode ter certeza.

Beijamos mais uma vez. Um beijo suave e lento. Em seguida beijei sua testa. Ela sorriu de olhos fechados parecendo agradecer o carinho que eu tinha por ela.

— Vem tomar banho comigo? – ela sentou me encarando com um sorriso malicioso.

Eu nem respondi. Em um pulo a peguei mais uma vez no colo e corremos até o banheiro. Beijei-a ferozmente enquanto a água quente caia em nossos corpos. Era como em um dos meus sonhos mais íntimos. Ela estava ali e era minha. Eu estava ali e sendo seu. Mais uma vez.

Depois dos momentos de prazer, demos uma pausa enquanto a chuva ainda caia lá fora.

— Trouxe um lanchinho para gente – ela surgiu sorrindo.

— Ah! Nossa! Que maravilha! – agradeci.

Comíamos sanduíches e um suco de manga natural, não sei se foi feito por ela ou se já estava pronto, mas estava maravilhoso.

— Sei que a aparência dos sanduíches está horrível – ela brincou. — Pela sua cara é o que está pensando, mas se conforme, ao menos eu tentei.

— Está ótimo. Não se preocupe – garanti dando mais um beijo nela. Eu a beijaria pelo resto da minha vida.

Pude ver pelas janelas abertas que já era noite e ainda chuviscava. A cortina voava com a rajada de vento que entrava pelo quarto. Ela estava deitada no meu peito. A bandeja estava ao lado completamente vazia. Eu acariciava seu rostinho angelical.

— Como você conseguiu? – perguntei inesperadamente. — Como conseguiu viver sem mim durante tanto tempo? Porque para mim cada dia era como mais uma tempestade que eu enfrentava e, no final, eu sempre me encontrava em meio a lágrimas de choros incontroláveis com a falta da sua presença. Agora que estou aqui de novo e você está me fazendo acreditar que eu sou louco por você como nunca fui capaz de um dia acreditar que seria por alguém.

— Mas eu também te amo, Daniel. Senti uma falta enorme de você, acredite. Eu te amei muito mais do que demonstrei.

— Ora, não chore – sussurrei. — Eu sou um tolo mesmo em tocar nesse assunto justamente agora. Mas é que a falta que senti de ti fora tão grande que agora que está aqui ao meu lado tenho uma necessidade enorme de fazer com que você sinta o quanto te quero.

Beijamo-nos mais uma vez e já estávamos novamente fazendo aquele amor que só ela podia me dar.

— Quer uma garantia do quanto te amo? – ela perguntou por fim, ainda ofegante. Voltando a se encostar-se a mim. Os olhos nos meus, a boca bem perto da minha.

— Não precisa...

— Não. Quero de uma vez por todas sentir que você confia de verdade em minhas palavras. Lembra-se da nossa primeira vez? Bem, você sabe que foi meu primeiro. E agora tenho a imensa satisfação em lhe dizer que além do primeiro você é o único em minha vida.

— Está querendo me dizer que...

— Sim, Daniel – ela interrompeu-me. — Eu nunca... Hm, você sabe... com mais ninguém. Nem com outro, nem com Fernando. Não seria capaz de me deitar com outro homem. Não outro que não seja você. Pois é você quem amo, é para você que eu quero me entregar sempre.

— Como que... Então por que... Mas como ele... Ah, droga! – gaguejei confuso. — Não sei ao certo o que dizer. Vou deixar a merda das dúvidas para depois. É encantador poder ouvir isso, Malu. Sinceramente, isso me faz ainda mais feliz em amar você. Só em saber que sou o único – lembrei-me de algo desnecessário enquanto fixava as ideias. — Pena que eu não possa dizer o mesmo.

— Tudo bem. Eu já esperava que não. Somos dois tolos perdendo tempo com outras pessoas. Mas e agora? O que será de nós?