"As vezes acho que Amelyne quer me contar alguma coisa... Se eu for sincero, já faz quase um ano... Ela se distrai quando estamos juntos. Me acaricia, conversa... Mas é como se ela estivesse em outro lugar. Acho que a realidade a assusta. O segredo a assusta.

Será que ela sabe? Quem teria contado a ela sobre isso? Será que está com raiva?

Talvez minha mãe tenha contado... Mas eu nunca falei isso pra minha mãe... Não que faça diferença, mães sabem tudo.

Hoje, enquanto estavamos no balanço, eu senti que ela queria dizer alguma coisa. E chegamos tão perto.

Mas um grupo de meninas passou por ali. Elas queriam que eu explicasse um exercício de matemática. Eu fui o mais rápido que pude, mas quando voltei pro balanço, ela não queria mais conversar sobre aquilo. Amelyne estava triste. Será que ela tem ciúme das outras meninas? Que boba... Se ela soubesse o quanto eu a amo..."

—Acho que você se enganou, Jacob.-Murmurou para a folha inanimada, atraindo a atenção de CC.-Hoje você dorme com outra mulher... E não consegue lembrar dela.

—Jake...-A voz do baterista soou incerta.-O que aconteceu entre você e a Amelyne naquele dia?

—Não aconteceu nada.-Fechou o diário de couro.-Christian... Depois do acidente... Por que todo mundo concordou em... Deixar pra lá?

—Não concordamos, Jake. Não concordariamos com algo assim, e você sabe. É que... Você é reservado demais. As vezes você até mostrava algumas fotos, contava algumas coisas... Mas nunca tínhamos visto ela pessoalmente. A não ser alguns encontros ocasionais no hospital. Mas ela estava sempre tão triste... Ashley foi o primeiro a falar com ela, dois meses atrás.

—No enterro da minha mãe. Não consigo lembrar... Quer dizer, eu lembro dos... Sentimentos em relação a ela. Eu lembro do cheiro, lembro da voz... Mas eu não lembro da figura.

—Jake, se você não reconhece mais a sua melhor amiga.-Andy chamou sua atenção.-Por que não tenta... Começar do zero? Comece de novo. Talvez um dia suas memórias voltem... Ou talvez não voltem nunca! Então para de perder tempo tentando lembrar.

Abaixou os olhos para a foto na tela do celular. Era o contato dela. Havia pego o número com sua irmã.

—Acha que ela toparia algo assim?

—O Jake de anos atrás não amou essa mesma mulher? Ele escreveu nos diários o que levou a esse sentimento?

—Sim...

—Então mande uma mensagem pra ela. E deixe de ser tão medroso.

•~☠~•


Se largou na cama, com o celular em mãos. Estava de banho tomado e sozinho. Ella havia saído para um dia de princesa com Anna, Alice e Juliet. Foi por isso que abriu a tela de mensagens.

"•Oi, Amelyne... Está ocupada?"

—Sério, Jake? Não conseguiu ser minimamente criativo?

O celular vibrou, e quase foi parar no chão com o susto do dono.

"•Vou me arrepender de responder que não?"

Acabou rindo sozinho da resposta dela. Aquilo devia ser muito a cara dela.

"•Eu também já acabei tudo o que tinha que fazer hoje... Será que você não quer... Um café?"

Sabia que estava brincando com a sorte. Ele ainda era um homem casado. Com o relacionamento em frangalhos, mas era casado.

"•Claro. Naquela cafeteria perto de casa?"

Era uma cafeteria pequena e antiga. Sua mãe os levava lá todo sábado a tarde.

"•Claro. Chego em 20 minutos."

"•Tudo bem."

Colocou uma calça jeans desbotada, calçou um par de tênis, colocou uma camiseta de mangas longa preta, arrumou os cabelos de forma relaxada e disparou porta a fora. Aproveitou que Jinxx ia na mesma direção e descolou uma carona.

Agradeceu ao amigo, antes de caminhar as duas quadras restantes, tentando fazer exercícios de respiração.

Adentrou o local, procurando pela ruiva. Ela estava sentada na mesinha do canto, perto da imensa janela fumê. Duas canecas fumegantes, e um prato com biscoitinhos quentes.

Foi cumprimentado por uma das meninas mais antigas do lugar, antes de conseguir chegar na mesa. O som da cadeira arrastando fez os olhos cinzas se voltarem para si.

—Você disse vinte minutos.

—E você podia ter me dito que já estava aqui.

—Eu não precisava dizer.-Ela lhe deu um sorriso fraquinho.-Eu pedi o seu... Mas não sei se ainda é seu favorito.

—Chocolate quente com marshmellow sempre vai ser meu favorito.-Se acomodou na cadeira.-O que é o seu?

—É só Cappuccino... Com melaço. Mas é só cappuccino.

Escolheu um biscoitinho amanteigado, e, para fazer graça, o colocou inteiro dentro da boca. Por mais bobo que fosse, aquilo fez a ruiva rir baixinho.

—É bom ver que algumas coisas não mudaram...

— Minha mãe trazia a gente aqui, não é?

—Até sermos adolescentes. Vinhamos toda quarta-feira de tardinha. Era o pior dia da semana, de aulas. Então vinhamos pra cá. E nos primeiros semestres da faculdade... Vinhamos todos os dias, para discutir a matéria.

—Tínhamos um passatempo favorito? Além do café.

—Bom... Acho que tínhamos... As vezes íamos pra fazenda dos meus pais. Você sentava em baixo da sua árvore favorita para compor.

—E o que você ficava fazendo?

Aquela resposta ele sabia. Estsvacwscrito nos diários. Ela deitava ao lado e passava a tarde toda lendo e desenhando. Suas mães costumavam fazer baldes de pipoca e sucos para eles.

—Nada... Eu ficava rabiscando e lendo. Não era nada muito incrível.

"Diga isso ao Jake de 15 anos. Vocês dois iriam brigar."

Resmungo em pensamento, mas continuou sorrindo pra ruiva.

—Então você gosta de desenhar.

—Um pouco... Mas faz muito tempo que não desenho.

—Entendi...-Os dois deram um gole em sua respectiva caneca.-Amelyne... Qual sua música favorita?

A ruiva colocou a cabeça d e volta na mesa, e pareceu pensar por um momento. Então os dois encararam em uma longa lista de "Nada a Lugar Algum", onde Jake passou a redescobrir quem era sua melhor e amiga, e porque havia sido tão apaixonado por ela por mais de uma década.

•~☠~•


—O que tem de tão incrível e importante nesses diários, Jake? Você não larga essas coisas!

—Ella, por favor... Pode me deixar quieto? Só hoje.

A mulher deu uma bufido alto e bateu a porta. Depois de tranca-la, o guitarrista pegou um diário de capa vermelha. Ainda não havia tido coragem de ler aquele, especificamente. Nas agora ele Entendi a melhor o que o outro Jake sentia.

"Ela veio hoje. Veio dormir comigo. Eu tinha decidido... Eu ia contar, ia dizer a ela tudo o que eu sinto. Mas eu falhei.

Agora ela está dormindo. Estávamos assistindo algum romance adolescente qualquer, achamos ele enquanto passávamos os canais.

Eu não consigo deitar na minha própria cama. Não consigo deitar ao lado dela, abraçá-la e dormir. Se eu me deitar no sofá, ela vai me perguntar o que aconteceu.

Eu não quero responder perguntas. Posso mentir pra quem eu quiser... Pra ela não. Nunca consegui que acreditasse nas minhas mentiras. Talvez por isso ela seja minha melhor amiga.

E eu não consigo dormir ao lado dela.

É o Desejo. Eu quero essa mulher pra mim. Quero tocar, acariciar, beijar... Mas é errado. Ela está dormindo. Eu a amo, não posso ter esse tipo de atitude asquerosa.

Ela ficaria magoada.

Talvez eu devesse contar a ela. Deixar que leia os outros diários. Esse aqui não... Eu preciso contar as coisas que tenho sonhado. Com ela. Não posso deixar que ela descubra. São minhas perversões. E elas vão ficar só entre mim e essas folhas."

Eram sonhos diversos, em que eles tinham idades diferentes. Os fetiches, os cenários, até os aromas e os dons eram descritos de forma perfeita.

—Ótimo, além de me apaixonar por ela... Eu ainda tinha perversões com ela... E depois de velho não faria nenhuma delas com a minha esposa, que provavelmente toparia qualquer uma... Mas faria com ela. Faria agora... Ai Jacob... Você não tem jeito mesmo. Entenda que ela não é sua. Nunca foi.