Quando Yamaguchi colocou o anúncio de "Procura-se colega de apartamento" no mural da universidade, ele só estava esperando um aluguel mais barato e talvez um novo amigo — ele não tinha muitos, seria bom ter mais alguém para conversar além dos seus únicos dois amigos.

Yamaguchi viu Tsukishima pela primeira vez depois de voltar da faculdade em uma segunda-feira. Seu novo colega de apartamento deveria chegar no começo da tarde, mas como Yamaguchi voltaria à noite, ele havia mandado uma mensagem permitindo que Tsukishima começasse a se acomodar no apartamento antes de ele chegar.

No entanto, quando Yamaguchi saiu do elevador, ele se surpreendeu ao ver um rapaz bonito sentado na frente da porta, jogando alguma coisa no seu celular com uma expressão de tédio — que não tinha o direito de ser tão atraente no seu rosto.

Vários pensamentos correram pela mente em pânico de Yamaguchi. Quem???? Por quê???? É um stalker???? Um invasor??? Eu me endividei sem querer e um agiota veio me cobrar???? Mais importante, ele é solteiro????

Naquele momento, o rapaz bonito ergueu a cabeça para encará-lo diretamente. Yamaguchi instintivamente se endireitou e correu os dedos pelos cabelos, esperando que eles não estivessem tão bagunçados depois de um dia longo.

— Hm… Com licença, posso ajudá-lo?

— Você é Yamaguchi Tadashi? — o outro perguntou. Yamaguchi engoliu em seco.

— Eu mesmo.

O rapaz se levantou e — oh, ele era alto. Mais alto que Yamaguchi, que já era o mais alto do seu círculo de amigos. Não que isso fosse grande coisa, quando seus amigos eram Hinata e Yachi.

— Tsukishima Kei — ele disse, estendendo a mão. Yamaguchi aceitou o aperto de mão, suprimindo um arrepio ao sentir seus dedos gelados contra sua pele morna. Ele estava esperando ali há tanto tempo que começou a congelar? Não era uma noite especialmente fria, mas também não estava calor.

— Meu Deus, eu achei que você já estaria lá dentro!

A mão de Tsukishima se contraiu levemente, como um espasmo, mas seu rosto não revelou nada.

— Eu pedi pro Hinata te dar uma cópia da chave, você faz uma matéria com ele, não é? Ele esqueceu? — Enquanto falava, Yamaguchi puxava a própria chave do bolso e se apressava para abrir a porta. Agora que ele havia reparado, havia uma mala junto ao tapete de entrada, certamente pertencente a Tsukishima.

— Ele não esqueceu. Eu perdi.

— Não se preocupe, eu devo ter mais uma cópia de emergência aqui em algum lugar. — Yamaguchi entrou no apartamento e tirou os sapatos, deixando-os na entrada. — Você pode levar pra fazer uma cópia sua depois.

Yamaguchi olhou para trás e viu que Tsukishima estava parado do lado de fora, de braços cruzados, olhando para o chão. Ele franziu a testa.

— Algum problema, Tsukishima-san?

— … Nada. — Mas ele ainda não entrou, alternando o peso de um pé para o outro. Yamaguchi deu risada, achando aquilo inexplicavelmente fofo.

— Com vergonha? Vem, pode entrar!

— Eu não estou- — Tsukishima suspirou, não se importando em terminar a frase, puxou a alça da mala e entrou.

Yamaguchi fez um tour pelo apartamento, mostrando todos os cômodos. Então, ele deixou Tsukishima para desfazer as malas e seguiu sua rotina normal de quando ele voltava da faculdade.

Depois de tomar um banho e vestir roupas confortáveis, Yamaguchi foi até a cozinha para fazer o jantar. Ele geralmente sobrevivia de comida instantânea ou refeições prontas da loja de conveniência, mas ele queria cozinhar um jantar de boas vindas decente; era a coisa educada a se fazer, certo?

Yamaguchi não era especialmente talentoso na cozinha, mas ele conseguia cozinhar alguma coisa fácil. Logo ele tinha duas tigelas de yakisoba prontas e se sentia muito contente consigo mesmo.

Tsukishima saiu do quarto quando Yamaguchi estava colocando as tigelas na mesa.

— Ah, eu já estava indo te chamar. Eu fiz jantar! — Yamaguchi sorriu e coçando a cabeça, sem jeito. — Eu não sou tão bom, mas é comestível…

Tsukishima olhou para a mesa com um olhar indescritível, sem dizer nada. Yamaguchi sentiu sua confiança murchar pouco a pouco.

— Hm, haha… — Ele desviou o olhar, sentindo vergonha da cabeça aos pés. Ele estava tão animado que não pensou direito. — Eu deveria ter perguntado o que você gostava antes. Ou se você já tinha comido.

Um silêncio constrangedor permeou a cozinha. Tsukishima contraiu a sobrancelha, parecendo passar por uma batalha interna antes de se dirigir à mesa.

— Eu gosto de yakisoba, e eu ainda não comi.

— Hm, okay. — Yamaguchi soltou o ar que ele não percebeu que estava prendendo e terminou de colocar a mesa. Seria realmente embaraçoso se Tsukishima recusasse. — Espera, você não come desde quando?

O outro sentou do lado oposto de Yamaguchi — o que não era muito longe, já que a mesa era pequena. Ele franziu a testa, pensando.

— Desde essa manhã, eu acho.

— Você não pode passar tanto tempo sem comer! Faz mal pro corpo. — Yamaguchi empurrou um par de hashis na sua direção antes de pegar seu próprio par. — Eu sou um cozinheiro decente, eu prometo. Itadakimasu!

Itadakimasu… — Tsukishima disse, com menos entusiasmo, mas ainda pegou uma porção de yakisoba e comeu.

Yamaguchi disfarçadamente prestou atenção na sua reação, mas ficou desapontado ao não ver nada. Nem uma mudança de expressão. Era como se Tsukishima estivesse fazendo um esforço para manter seu semblante neutro. Isso é bom ou ruim???

Yamaguchi logo obteve sua resposta. A tigela de yakisoba estava na metade quando Tsukishima apoiou os hashis na borda da cerâmica e se levantou.

— … Eu vou guardar o resto para depois — ele murmurou.

— Ah — disse Yamaguchi, estupidamente. — Você… você pode usar a prateleira de cima na geladeira…

Tsukishima rapidamente guardou as sobras, lavou os hashis e voltou ao seu quarto.

— … De nada… — Yamaguchi murmurou mesmo sem receber um agradecimento, sentindo-se amuado e irritado ao mesmo tempo. Ele olhou para a sua tigela como se as respostas para os segredos do universo estivessem no macarrão e no molho shoyu. — Ficou tão ruim assim?

Que bom começo, Tadashi…

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

No dia seguinte, Tsukishima disse que, estranhamente, encontrou as chaves no fundo da sua mala. Um lugar estranho para perdê-las, mas Yamaguchi não pensou muito nisso; ele perdia suas coisas em lugares ainda mais estranhos.

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

Yamaguchi não sabia se era coisa da sua cabeça ou se Tsukishima estava realmente tentando evitá-lo.

Suas rotinas não coincidiam na maior parte do tempo — enquanto Yamaguchi estudava de manhã e tarde, Tsukishima trabalhava online à tarde e tinha aulas de noite. Nos fins de semana, quando Yamaguchi estava livre, seu colega de apartamento saía para alguma coisa relacionada ao seu estágio e voltava só à noite. Mas, mesmo quando eles estavam em casa ao mesmo tempo, suas interações eram quase mecânicas. Yamaguchi era solícito e tentava agradá-lo como podia, enquanto Tsukishima continuou indiferente.

Certo, Tsukishima não queria ser seu amigo, mas ele não era um colega de apartamento ruim. Ele pagava sua parte do aluguel em dia, não fazia barulho de madrugada, não sujava nem bagunçava nada, nem deixava louça para lavar — ou ele lavava, secava e guardava imediatamente, ou ele comia suas refeições fora todos os dias, porque Yamaguchi nunca encontrou uma louça dele na pia.

— Isso é bom ou ruim? — Yachi perguntou quando eles se sentaram em uma mesa no pátio externo da universidade. Os dois tinham um projeto em dupla para terminar, e como o tempo estava bom, eles abriram mão da biblioteca para aproveitar o sol ameno do lado de fora.

— Eu não sei. — Yamaguchi deu de ombros. — Você acha que ele está me evitando?

— Por que ele estaria? Por causa do seu yakisoba ruim?

— Por favor, não me lembre disso… — ele gemeu, ainda envergonhado.

Eles trabalharam no projeto por um tempo quando, subitamente, Yachi soltou uma exclamação, fazendo Yamaguchi se sobressaltar.

— Ele é um intolerante?

— O quê?

— Tsukishima-san! Ele te olha torto que nem as senhorinhas na rua?

Yamaguchi tinha experiência com isso, desde que ele tomou coragem e começou a usar piercings, maquiagem e o cabelo mais comprido. No começo foi difícil para um garoto que estava acostumado a passar despercebido, mas com o tempo ele aprendeu a ignorar o desconforto.

— Ah… eu acho que não? — Tsukishima nunca demonstrou aversão ao seu estilo, mas… não é como se Yamaguchi o conhecesse ou o visse o bastante para saber. — Yacchan… O que eu faço se ele for um intolerante…?

O pensamento o deixou ainda mais deprimido.

— Foi só uma ideia! Nada demais! — Yachi abanou as mãos, perdida. — Mas se ele for mesmo, eu chamo o Hinata e a gente chuta ele de lá, okay?

— … Você e Hinata um em cima do outro nem chegam na altura dele.

— Eu sei chutar joelhos muito bem.

Naquele momento, Yamaguchi se surpreendeu ao reconhecer uma figura alta destacando-se dentre os estudantes circulando pelo pátio coberto da universidade, visível do seu lugar nas mesas externas.

Era uma surpresa, porque ele nunca tinha visto Tsukishima na universidade antes.

— Tsukishima-san! — Yamaguchi acenou quando os olhos do outro passaram por ele por acaso.

Tsukishima pareceu ter sido pego desprevenido pelo cumprimento súbito, sua expressão se contraindo em constrangimento pelos olhares que foram atraídos pela voz de Yamaguchi. Mas ele ainda acenou com a mão antes de apressadamente seguir seu caminho.

— Ahh… Eu queria que ele viesse mais perto pra apresentar você. Ele deve estar com pressa.

— Ou ele ficou com vergonha.

As orelhas de Yamaguchi esquentaram.

— Não foi uma boa ideia gritar, né? — Yamaguchi se sentia assim toda vez que tentava interagir com Tsukishima. Ele não era um desastre tão grande normalmente…

Yachi o encarou por um longo tempo como se tivesse entendido alguma coisa e deu tapinhas nas suas costas.

Ganbatte, Yamaguchi-kun!

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

Yamaguchi encarava fixamente a televisão com o coração na boca. Na tela, uma mulher estava caída numa janela de vidro com uma série de rachaduras, como uma teia de aranha, dentro de um trailer pendendo de um precipício.

Ela não vai morrer, né?, ele pensou, aflito, girando seus anéis nos dedos. Ele usava aqueles anéis para ansiedade desde o último ano do ensino médio, quando a pressão dos estudos começou a afetar seu psicológico. Hoje em dia ele estava melhor, mexer neles geralmente era mais um hábito do que qualquer coisa.

Yamaguchi estava esperando o sistema operacional do seu computador terminar de atualizar para ele continuar trabalhando em um relatório para a faculdade, quando ele decidiu colocar um filme qualquer na televisão da sala para passar o tempo. O filme prendeu sua atenção mais do que o esperado e, antes que ele percebesse, ele já tinha começado a sequência, seu relatório completamente esquecido.

Naquele momento, no filme, um objeto caiu, estilhaçando o vidro, ao mesmo tempo que uma voz atrás dele disse:

— Ela não morre.

Yamaguchi soltou um palavrão e virou a cabeça na direção de Tsukishima, que tinha acabado de chegar em casa. Yamaguchi estava tão absorto que nem percebeu.

— Ei! Sem spoiler!

Na tela, de fato, alguém segurou a mulher antes que ela caísse para a morte certa. Yamaguchi soltou uma respiração de alívio.

— Você estava tão nervoso que até me deixou ansioso. E eu assisti Jurassic Park vinte vezes.

— Você gosta tanto assim?

— Não muito. — O outro fez um tsk, olhando para o filme que ainda passava na televisão. — A saga tem um monte de erros.

E você ainda assistiu vinte vezes? Yamaguchi segurou o riso, imaginando que Tsukishima não apreciaria a observação, e perguntou seriamente:

— Sério? Tipo quais?

Tsukishima sentou no apoio de braço do sofá com os braços cruzados.

— Pra começar, os T-Rex não tinham uma visão tão ruim…

Yamaguchi não esperava que tudo o que ele precisava para fazer Tsukishima iniciar uma conversa com ele era um filme sobre dinossauros.

No fim, Yamaguchi acabou colocando o primeiro filme novamente, feliz em ouvir Tsukishima apontar os erros e relutantemente admitir os acertos. Em algum momento, o outro havia sentado diretamente no sofá, a um palmo de distância de Yamaguchi.

Já era madrugada quando eles terminaram de assistir ao último filme da trilogia original. Yamaguchi olhou para Tsukishima e, influenciado pela atmosfera amigável entre eles, sorriu.

— Eu sabia. Você é legal.

Tsukishima ergueu as sobrancelhas para ele. Yamaguchi não conseguia discernir muito bem a sua expressão no escuro, ainda mais com a luz da televisão reproduzindo os créditos do filme refletida nos seus óculos.

— Você tem padrões baixos — ele observou. Yamaguchi finalmente riu.

— Talvez eu tenha.

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

Yamaguchi propositalmente começou a assistir a filmes e séries na sala até mais tarde, esperando que Tsukishima chegasse em casa e sentasse no sofá junto com ele para criticar o que quer que ele estivesse assistindo — mas, mesmo assim, ele assistia até o fim toda vez.

Geralmente era Yamaguchi quem escolhia, mas às vezes Tsukishima chegava em casa quando ele ainda estava revirando o catálogo em busca de algo para assistir, então ele alegremente colocava o controle nas mãos do outro. Tsukishima não era como Yamaguchi, que assistia qualquer coisa, seja bom ou ruim; ele era muito criterioso e passava longos minutos em busca de algo bom.

Yamaguchi era paciente e deixava Tsukishima ser o quão meticuloso ele quisesse. Em um desses dias, ele estava preguiçosamente checando suas redes sociais no celular quando percebeu que o outro havia parado em um filme específico e estava olhando para a televisão com um olhar de desgosto.

— Hm? Já decidiu? — Yamaguchi olhou para a tela, mas Tsukishima rapidamente pressionou um botão no controle, passando para outro filme. Ele só teve tempo de ver, na thumbnail, um poster de uma pessoa muito pálida.

— … Ah, tanto faz. — Tsukishima selecionou uma série aleatória e largou o controle no sofá.

A série tinha muitos episódios, cada um com mais de quarenta minutos. Yamaguchi logo foi fisgado pelo mistério do enredo e pelo casal principal da história, mas ele ainda era um estudante universitário sobrevivendo ao semestre, no fim das contas; ele lutou, mas não conseguiu resistir contra suas pálpebras pesadas e caiu no sono depois de alguns episódios.

Tsukishima, que não demonstrava ter um pingo de sono, pausou a série assim que a respiração de Yamaguchi ficou lenta, indicando que ele estava dormindo.

— Você não devia dormir assistindo uma coisa se você vai ficar curioso sobre o que você perdeu depois — ele murmurou. Então, ele olhou para o relógio digital na cômoda da sala e para a porta fechada do quarto de Yamaguchi.

Tsukishima tirou os óculos e esfregou a ponte do nariz. Que inconveniente.

Ele guiou o corpo de Yamaguchi até ele estar deitado no sofá, seus movimentos gentis apesar da expressão levemente exasperada no seu rosto.

Na manhã seguinte, Yamaguchi acordou com os músculos das costas rígidos e um cobertor sobre seus ombros. Seu cérebro sonolento demorou para ligar os pontos; assim que ele percebeu, ele sentiu o rosto esquentar.

Em algum lugar no sofá, o som do alarme do seu celular tocou, fazendo-o lembrar que ele tinha aula. Yamaguchi decidiu que se desculparia com Tsukishima quando voltasse mais tarde e apressadamente foi para seu quarto, sem reparar no cobertor abandonado no sofá, com uma estampa de luas crescentes e estrelas — que definitivamente não pertencia a ele.

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

— Tsukishima-san? — Yamaguchi chamou, um pouco hesitante. Nos últimos tempos, o relacionamento deles havia melhorado. Yamaguchi, às vezes, se preocupava demais com o que as pessoas próximas dele pensavam, o que o fazia pisar em ovos quando interagia com os outros. Com Tsukishima, no entanto, ele descobriu que quanto mais direto ele era, mais fácil era de se aproximar.

No começo não era uma tarefa fácil para Yamaguchi mas, na primeira vez que ele arrancou uma risada de Tsukishima depois de fazer um comentário cínico totalmente espontâneo sobre um filme que o outro gostava, não passou a ser tão difícil assim.

Yamaguchi distraidamente girou o anel no seu dedo médio, inquieto. Apesar de tudo, ele estava hesitante naquele momento.

— Hm? — Tsukishima tirou os fones de ouvido para dá-lo atenção. Ele estava na mesa da cozinha com seu notebook, assistindo a uma videoaula de reposição por conta de um professor que cancelou uma aula naquela noite. Yamaguchi estava sentado do outro lado, resolvendo uma lista de exercícios com cadernos e livros espalhados por toda a mesa; ele não sabia por que Tsukishima não estava usando a própria escrivaninha no seu quarto, mas estava secretamente feliz em ter companhia no seu sofrimento universitário.

— Eu li na internet que o museu onde você trabalha abriu uma nova exposição.

Tsukishima fazia estágio em um museu de história natural. Ele assentiu.

— Eu estava pensando em ir um dia desses, mas é chato ir sozinho. — Yamaguchi sorriu. — Você pode vir junto?

Ele genuinamente queria ir, mas ele poderia ter arrastado qualquer um de seus outros amigos. Ele não mencionou esse detalhe.

Tsukishima olhou para ele por alguns segundos. Yamaguchi quase conseguia ver sua mente pesando os prós e contras; ele continuou sorrindo o mais inocentemente que conseguia.

— … Se você quer, okay. — Tsukishima voltou a olhar para a tela do seu notebook. Foi tão fácil assim? Yamaguchi ficou nervoso para nada. Bom, não é como se eu estivesse chamando ele para um encontro.

Ele pausou seus movimentos quando aquilo veio à sua mente.

Pare de pensar. Com o coração acelerado, Yamaguchi deu uma resposta qualquer e voltou a trabalhar nas suas equações diferenciais.

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

O dia em que os dois encontraram tempo para saírem juntos era um sábado de tempo aberto. Eles moravam perto o bastante para irem a pé, então o tempo era perfeito.

Tsukishima olhava para o céu pela janela da sala com uma expressão que carregava arrependimentos.

— Se você não quer ir, pode dizer. — Yamaguchi sentiu um desconforto no seu estômago. Talvez Tsukishima realmente odiasse a ideia de sair com ele?

O outro, no entanto, só suspirou.

— Vamos.

Alguns minutos depois, já do lado de fora, Yamaguchi pigarreou.

— Tsukishima-san… você está bem?

Não era um dia frio, mas Tsukishima usava um suéter de gola alta e mangas longas. Além disso, óculos escuros substituíam seu par de óculos habitual. Não era um visual ruim — ele não imaginava que Tsukishima conseguiria parecer ruim em qualquer visual —, mas Yamaguchi se sentiu na obrigação de perguntar.

— Não é nada. — O outro fez um gesto de desdém com a mão. — Eu só não sou muito fã do sol.

— A gente pode ir outro dia…

— Não tem problema.

— … Você sabe que não precisa ter vergonha, né? Algumas pessoas nascem com pele e olhos mais sensíveis, não é-

— Yamaguchi. Cale a boca.

Yamaguchi riu indulgentemente.

— Sim, sim, desculpa, Tsukishima-san.

Eles visitaram a exposição sem maiores problemas. Yamaguchi tirou fotos junto com as réplicas de fósseis de milhões de anos atrás, mas não conseguiu convencer Tsukishima de fazer o mesmo.

— Eu vejo essas coisas todo dia — ele disse inexpressivamente enquanto tirava uma foto de Yamaguchi dando high-five em um esqueleto de um velociraptor.

— Você não acha que a gente devia tirar uma foto pra honrar nossa primeira noite de filmes? Você me magoa às vezes, Tsukishima-san.

— Pare de falar coisas sem sentido…

A discussão boba foi interrompida por uma voz desconhecida.

— Tsukishima?

A voz pertencia a um rapaz parado junto a uma placa próxima, com uma longa explicação sobre ovos de compsognathus. Ele era uns bons centímetros mais baixo que Yamaguchi, parecendo ainda menor usando um moletom alguns números maior que seu corpo — ele também não parecia temer a possibilidade de passar calor. Mas havia alguma coisa no seu olhar fixo que lhe dava arrepios.

Eram como os olhos de um gato.

Yamaguchi não conseguia se livrar da sensação que ele havia visto aquela pessoa antes em algum lugar.

A expressão de Tsukishima se contraiu momentaneamente.

— O que você está fazendo aqui?

— Vendo a exposição? — Ele inclinou a cabeça levemente para o lado, confuso.

— Oh? Você não sai de casa pra nada, que milagre.

O desconhecido deu de ombros e colocou as mãos nos bolsos do moletom. Ele não se deixou levar pela provocação, como se já estivesse acostumado.

— O desenvolvedor do jogo indie que eu estou streamando esses últimos dias está fazendo uma sessão de autógrafos no outro quarteirão. Eu não queria ficar no sol.

A menção a streaming fez uma lâmpada acender na mente de Yamaguchi.

— Você é Kodzuken?

O rapaz voltou aqueles olhos de gato enervantes para Yamaguchi.

— Tsukishima, seu amigo é uma pessoa de cultura.

Aquele era, realmente, Kodzuken — Kozume Kenma, um streamer popular no qual ele tinha ouvido falar de passagem na internet. Tsukishima era conhecido de alguém assim?

— Vocês são… amigos, então? — Yamaguchi perguntou.

— Algo assim. Ele era meu calouro no ensino médio. Eu ajudo ele com umas coisas, às vezes.

Aquilo… não era muito esclarecedor.

Um barulho de notificação se fez ouvir. Kenma tirou o celular do bolso e soltou um “oh”.

— Já é quase a minha vez, eu tenho que ir.

— … Me deixa adivinhar, você deixou Kuroo-senpai guardando lugar na fila pra você?

Kenma ergueu as sobrancelhas para Tsukishima.

— Você só tem o direito de julgar quando tiver um namorado você mesmo.

Yamaguchi sentiu-se corar, mesmo que o comentário não tivesse qualquer indício de ser direcionado a ele. Ele tossiu para disfarçar.

— Se você não quer que eu vá pessoalmente até o seu apartamento, não fique tempo demais sem passar lá em casa. — Kenma tirou alguma coisa do bolso do moletom e pressionou na mão de Tsukishima. Então, seus olhos passaram por Yamaguchi e ele sorriu levemente. — Ou, se você mudar de ideia, é só avisar.

— Certo, certo, eu entendi. — Tsukishima segurou Kenma pelos ombros e o empurrou em direção à saída. — Vai logo antes que Kuroo-senpai surte por ficar mais de cinco minutos longe de você.

— Já foram mais de cinco minutos…

Yamaguchi não sabia se ria ou se chorava.

— Foi um prazer te conhecer, Kozume-san!

— Até um outro dia, espero. — Kenma acenou para ele, ignorando Tsukishima completamente, e logo desapareceu de vista.

Yamaguchi olhou para seu colega de apartamento.

— O que era aquilo?

— Só uns suplementos que ele ficou de me dar. — Tsukishima chacoalhou o objeto que Kenma havia lhe dado anteriormente antes de guardá-lo no bolso. Era um frasco, aparentemente cheio de cápsulas.

Yamaguchi ficou preocupado. Tsukishima tinha algum tipo de deficiência nutricional? Tirando o episódio deprimente do jantar de boas vindas, ele nunca o viu comer… E o que foi aquilo de “se você mudar de ideia”? O que Yamaguchi tinha a ver com aquilo?

Tsukishima o chamou algumas vezes até ele sair dos seus devaneios. Ah, certo, eles ainda tinham metade da exposição para percorrer.

Quando os dois saíram, já estava anoitecendo. Uma rua no caminho que eles tomavam para voltar para casa tinha sido interditada enquanto eles estavam no museu, então Yamaguchi sugeriu uma rota alternativa que ele não costumava pegar, um pouco mais longa — se ele queria estender o tempo juntos nem que fosse um pouquinho, era apenas da sua conta e de mais ninguém.

Yamaguchi tinha seu celular em mãos, vendo as fotos e mandando algumas mais engraçadas para seus amigos. Tsukishima tinha colocado os óculos escuros no bolso e caminhava silenciosamente junto a ele. Às vezes, Yamaguchi olhava para o lado e não podia deixar de admirar secretamente como ele ficava sem óculos, uma visão incrivelmente rara, mesmo vendo-o todos os dias. Seus olhos castanho-dourados ficavam mais visíveis, era bonito.

Yamaguchi tossiu algumas vezes. Controle-se.

Ele olhou ao redor para se distrair; foi quando ele se deparou com uma construção que não lhe familiar ao lado deles na calçada.

— Eu não sabia que tinha uma igreja aqui. — Yamaguchi inclinou a cabeça para cima, tomando nota de toda a fachada. Ele nunca tinha prestado atenção nisso. — Ei, Tsukishima-san, eu nunca perguntei, você tem alguma reli- Tsukishima-san?!

Yamaguchi quase sentiu sua alma sair do corpo. Ao seu lado, Tsukishima estava parado, completamente inexpressivo, com uma trilha de sangue escorrendo do seu nariz.

— … Ah. — Ele levou a mão ao nariz e franziu a testa quando seus dedos voltaram sujos de escarlate. Yamaguchi abanou as mãos inutilmente ao seu redor, sem saber o que fazer.

— “Ah”, que “ah”! Você está doente? Se você não estava se sentindo bem, devia ter me avisado… Ai meu Deus, espera um pouco, eu acho que tenho um lenço.

Tsukishima fez uma careta, mas Yamaguchi estava distraído revirando os bolsos do seu jeans e não percebeu.

— Não é nada, vamos voltar.

— Tsukishima-san, você não parece ser do tipo que negligencia a própria saúde, você devia tomar mais cuidado. — Yamaguchi lhe ofereceu a bandana preta que ele estava usando para prender o cabelo, deixando os fios com as pontas descoloridas caírem sobre os ombros livremente. — Espera, eu acho que eu já vi como parar sangramentos nasais numa aula de primeiros socorros antes. Aqui, eu acho que você tem que ficar com a postura reta e apertar o nariz por dez minutos…

Tsukishima foi surpreendentemente paciente com a aflição de Yamaguchi, obedecendo-o até eles chegarem em casa.

Felizmente o sangramento parou com rapidez; se não fossem as manchas escuras no lenço de Yamaguchi, era como se nunca tivesse acontecido.

— Eu vou lavar e te devolver. — Tsukishima dobrou a bandana cuidadosamente e foi direto para seu quarto.

Yamaguchi o viu desaparecer pela porta e suspirou. É claro que alguma coisa tinha que dar errado na primeira vez que eles saíam juntos…

Será que estou recebendo sinais do Universo?

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

— Você tem um crush nele, não tem?

Yachi realmente não tinha piedade.

Yamaguchi não se deu ao trabalho de negar. Ele enterrou o rosto em uma almofada e ficou lá, deixando os sons de Yachi e Hinata jogando Mario Kart serem a trilha sonora do seu melodrama pessoal.

— Você vira uma bagunça quando gosta de alguém — ela continuou quando não recebeu resposta. — Você pensa muito e tem medo de qualquer coisa dar errado.

— Obrigado pela avaliação grátis, Yachi-sensei — Yamaguchi resmungou, sua voz abafada pela almofada. — Tem certeza que você quer ser designer? Eu acho que a sua vocação é psicologia.

— Você até aprendeu a ser mais sarcástico depois de conhecer ele. Nosso Yamaguchi-kun realmente cresceu.

— Eu ainda não entendo o que você vê no Tsukishima. — Hinata bufou. — Ele é tão irritante.

— Ele não é! — Yamaguchi rolou para o lado no sofá, tirando a almofada do rosto. — Okay, às vezes ele é cínico, antipático e debochado…

— Fã ou hater? — Yachi murmurou.

— … mas ele não é uma má pessoa!

— Noite passada eu estava passeando com o Jackal no parque. — Jackal era o shiba inu de Hinata (um nome feroz para um cãozinho felpudo e inofensivo que adorava que lhe fizessem carinho nas orelhas). — Eu vi Tsukishima correndo lá e parei pra falar de um trabalho da aula que a gente faz juntos, mas o Jackal não parava de latir! Ele nunca late! Eu não confio em quem meu cachorro não confia.

— Essa lógica não é perfeita, okay? Seu cachorro também late para aquele seu vizinho com quem você tem uma rivalidade-barra-ódio-barra-crush—barra-amor eterno — Yachi apontou. — Eu e Yamaguchi-kun temos uma aposta sobre qual de vocês vai desistir e beijar o outro primeiro.

— Vocês o quê?!

— O ponto é o seguinte: — Yamaguchi interrompeu. — A gente se dá bem e eu acho divertido passar tempo com ele! — Ele escondeu o rosto com as mãos e murmurou: — E eu não sei se eu tenho um tipo, mas se eu tiver, provavelmente é ele.

— Você vai fazer algo a respeito? — Yachi questionou.

— Não sei. — Tomar algum tipo de atitude com relação aos seus sentimentos ainda era uma área que ele tentava não pensar muito se não quisesse surtar.

Na tela, a corrida terminou com a Princesa Daisy de Yachi muito atrás do Toad de Hinata. Ela jogou o controle para Yamaguchi com um suspiro derrotado. Ele aceitou a oportunidade para mudar de assunto com prazer.

Ele devia saber que não conseguiria fugir por muito tempo.

O aniversário de Hinata aconteceu algumas semanas depois. Não foi uma festa grande, só com alguns amigos; mas, como era de se esperar em uma reunião casual de universitários depois do fim do semestre, eles acabaram completamente bêbados.

Yamaguchi não bebia com frequência, já que a sua tolerância era baixa; alguns copos depois e ele já estava zonzo. No fim da festa, alguém sóbrio lhe deu carona para casa; assim, Yamaguchi se viu cambaleando para dentro do seu apartamento no meio da madrugada.

As luzes, surpreendentemente, estavam acesas; Tsukishima estava na sala, perfeitamente acordado.

— Você… — Tsukishima inspirou fundo e fez uma careta. — Quanto você bebeu?

— Só um pouco! — Ele não estava mentindo, aquilo era culpa da sua tolerância. Yamaguchi tirou os sapatos com um pouco de dificuldade e se concentrou em alinhá-los perfeitamente ao lado dos sapatos de Tsukishima perto da entrada. Quando ele ficou satisfeito, depois de várias tentativas, ele foi até o sofá e se sentou pesadamente ao lado do seu colega de apartamento, encarando o teto.

— Você devia tomar um banho e ir dormir. Amanhã-

— Tsukki — Yamaguchi o interrompeu subitamente.

Tsukishima pausou e piscou.

— Tsukki. — Yamaguchi deu uma risadinha e inclinou a cabeça para o lado. — Eu estou te chamando, responde! Tsukkiiii~

— … De onde você tirou esse apelido?

— Da lua? — Ele riu de novo e virou o corpo totalmente na direção de Tsukishima. — É fofo, que nem você.

Yamaguchi vagamente registrou como seu eu bêbado era incrivelmente mais descarado do que ele pensava, mas ele estava inebriado demais para se sentir remotamente atormentado pela ideia.

Tsukishima, sendo chamado de fofo pela primeira vez desde que tinha dez anos, o encarou completamente inexpressivo. Ele estava sem palavras.

— … Nenhuma reação? — Yamaguchi se inclinou mais ainda. Àquela altura, ele tinha invadido completamente o espaço pessoal de Tsukishima, mas o outro não estava recuando. — Ehh, Tsukki, você me odeia?

A pergunta pegou Tsukishima de surpresa.

— O quê?

— Você me odeia porque coisas dão errado quando eu tento ficar próximo de você? — Yamaguchi pendeu a cabeça para o lado, as sobrancelhas franzidas. — Você não gosta da minha comida. Você me evitou por semanas quando você chegou. Você parecia incomodado quando a gente saiu juntos e você ainda ficou doente no fim. Eu nem tive coragem de te chamar pra sair de novo…

— Do que você- eu não fiquei doente-

— Ou… — Ele arregalou os olhos. — Ou a Yacchan estava certa? Você é um intolerante???

— Não, eu não- de onde você tirou isso? — Tsukishima franziu a testa, irritado. — Eu não te odeio, okay?

— O pior é que eu sei — Yamaguchi choramingou, contradizendo-se, mas seu cérebro não estava a fim de ter pensamentos lógicos naquele momento. — Mas você gosta de mim?

Seus rostos estavam bem próximos, mas, estranhamente, Yamaguchi não sentia a respiração de Tsukishima se misturar com a sua. Ele estava prendendo a respiração?

Yamaguchi foi quem segurou o rosto alheio com as mãos e selou seus lábios.

O tempo pareceu congelar. Seu coração batia tão forte que o som pulsante era a única coisa que ele conseguia ouvir.

Tsukishima, no entanto, soltou um grunhido abafado, pôs as mãos nos seus ombros e o empurrou.

Os braços de Yamaguchi caíram dos lados do corpo, como uma marionete com os fios cortados. Por alguns momentos agonizantes, ele só olhou para Tsukishima, atordoado.

Yamaguchi se levantou atrapalhadamente. Tsukishima, que estivera tão atordoado quanto ele, despertou seus sentidos e levantou também.

— Espera, Yamaguchi-

Ele segurou sua mão mas a soltou logo em seguida, como se tivesse sido queimado; Yamaguchi usou a oportunidade para fugir e foi para seu quarto.

Depois de fechar a porta atrás de si, ele pressionou as costas nela e, como se estivesse em um filme clichê, deslizou lentamente até o chão.

Os lábios que Yamaguchi tinha beijado eram frios, mas ele se sentia ainda mais gélido por dentro.

─── ・ 。゚☆: *.☽ .* :☆゚. ───

Yamaguchi se encarou no espelho pendurado em uma das paredes do seu quarto. Ele estava uma bagunça. Seu cabelo sofria de um caso crônico de bad hair day, emaranhado e revolto durante o sono. Ele não tinha tirado a maquiagem antes de dormir, e o delineador borrado o fazia parecer ter olheiras profundas. Adeus, rotina de skin care que ele mal havia começado a aderir.

E sua cabeça doía. Inferno.

Mas, pelo menos, não doía tanto quanto seu orgulho. Ele não teve a sorte de esquecer o que tinha acontecido na noite anterior.

Yamaguchi se sentou na cama e gemeu, frustrado. Ele nunca mais iria ingerir álcool na vida; ele se tornaria um eremita abstinente e fugiria das suas próprias decisões ruins para sempre.

Ele se sobressaltou ao ouvir uma batida na sua porta, seus músculos travados protestando contra o movimento súbito.

— Yamaguchi? Você acordou?

Yamaguchi inspirou e expirou fundo. Quando ele acordou há alguns minutos, ele tentou fazer o mínimo de barulho possível, esperando enganar Tsukishima pelo tempo necessário para se preparar mentalmente. O quão boa era a sua audição?

— S-Sim.

— Eu trouxe água e remédio.

A boca de Yamaguchi estava seca como papel. Ele pigarreou.

— A-Ah, okay. Obrigado.

— …

— …

— …

— …?

— Yamaguchi — disse Tsukishima, sua voz soando incrivelmente paciente por trás da porta. — Você pode me dar permissão pra entrar?

Yamaguchi se sentiu parcialmente tentado a negar, mas ele já havia decidido desesperadamente fingir que nada tinha acontecido, e era tarde demais para voltar atrás.

— Okay, pode entrar. — Quando a porta abriu, Yamaguchi distraidamente percebeu que aquela era a primeira vez que Tsukishima entrava no seu quarto. Ele realmente não entraria se não tivesse sua permissão? Ele era certamente educado…

Vendo Tsukishima com um copo d'água e remédio nas mãos, Yamaguchi sentiu um impulso irracional de chorar. Ao invés disso, ele esfregou as têmporas e suspirou.

— Eu exagerei ontem… a última coisa que eu lembro foi chegar aqui no apartamento. Espero que eu não tenha incomodado Tsukishima-san.

Tsukishima cuidadosamente se sentou ao seu lado na cama e ofereceu as coisas que segurava. Ele o observou em silêncio enquanto Yamaguchi engolia o remédio e tomava grandes goles de água, tentando esconder sua vontade de se contorcer sob o seu olhar atento em seus movimentos.

— Você tem certeza que não lembra? — Tsukishima soltou depois que Yamaguchi colocou o copo vazio na cômoda ao lado da cama. Mesmo sem nada na boca, ele engasgou e tossiu.

— Huh?

— Seu coração está todo descompassado. — O outro estendeu a mão e… deslizou a ponta do dedo na parte interna do seu pulso, o toque tão leve quanto uma pena, fazendo arrepios percorrerem sua espinha. — Por favor, seja honesto.

— Meu- o quê?

Tsukishima suspirou e esfregou os olhos por baixo dos óculos. Então, ele endireitou sua postura e, encarando-o diretamente, disse:

— Eu sou um vampiro, Yamaguchi.

Yamaguchi o encarou de volta, estupefato. Ele ouviu direito?

— Hm… você é-

— Um vampiro. Sim.

Huh. Aquele desenrolar de eventos não estava presente nem nas suas mais insanas paranoias.

Seu primeiro reflexo foi querer rir e perguntar por que Tsukishima faria uma brincadeira como essa num momento daqueles, mas-

Bom. Era realmente estranho para Tsukishima fazer algo assim.

— Huh… Tsukishima-san, eu não- eu acho que não estou entendendo-

As surpresas, aparentemente, não acabavam por aí; Tsukishima subitamente segurou seu rosto com as mãos e, em um movimento firme mas gentil, virou sua cabeça para o lado.

Para o espelho na parede.

Por um momento, Yamaguchi só conseguiu sentir seu rosto ruborizar sob o toque frio das mãos de Tsukishima. Depois de alguns segundos, no entanto, ele arregalou os olhos.

O reflexo no espelho mostrava apenas Yamaguchi na cama, sem sinal de qualquer outra pessoa!

— Esse espelho é de prata, não é? — Tsukishima perguntou calmamente. Sua voz era clara perto do ouvido de Yamaguchi, mas, no espelho, ele ainda estava claramente sozinho.

— … Sim — ele conseguiu dizer, entorpecido. — É de prata…

Tsukishima o soltou e a ausência das suas mãos geladas contra seu rosto quente foi o que o fez despertar do torpor.

— Okay. Legal. Isso- isso é normal. Muito legal. Hm. Haha... ha… — Yamaguchi olhou para Tsukishima e desviou o olhar na mesma hora, tentando encaixar aquela informação no quebra-cabeça do que ele já conhecia sobre seu colega de apartamento.

— Eu precisava te contar isso pra você entender… algumas coisas. — Tsukishima parecia desconfortável; falar sobre si mesmo não era realmente sua zona de conforto.

Mas ele faria aquilo. Por Yamaguchi.

— Comida normal tem gosto horrível pra vampiros, não importa o quão boa ela seja. Mas- eu ainda pude sentir o cheiro. Eu comeria sua comida todos os dias se eu pudesse.

Yamaguchi arregalou os olhos. Oh. Ele abriu a boca para falar alguma coisa — qualquer coisa —, mas Tsukishima não tinha terminado.

— Como agora eu divido apartamento com um humano, eu comecei a mudar minha dieta de sangue líquido pra cápsulas, mas o processo pode causar recaídas, então era melhor manter distância. Eu não te evitei por semanas porque não gostava de você, e quando já era seguro eu não sabia como me aproximar.

Cápsulas? Espera, aqueles suplementos, então— e Kenma? Ele sabia? Yamaguchi lembrou dos seus olhos desconcertantes, de como ele não quis ficar numa fila debaixo do sol. Simplesmente saber era realmente seu único envolvimento?

— Quando nós saímos, o sol me incomodou. E, você sabe, chegar perto demais de um lugar sagrado não faz muito bem pra nossa saúde. Não tinha como você saber, mas eu sabia e continuei porque eu quis.

— Espera, Tsukishima-san-

— Eu te empurrei noite passada — Tsukishima o interrompeu. Se ele não falasse tudo agora, ele não sabia se teria coragem de começar a falar de novo. — Não foi porque eu não queria. Bom, você estava bêbado, eu ia te parar de qualquer jeito, mas o empurrão foi um reflexo. Por causa disso.

Ele apontou para as mãos de Yamaguchi. Não havia nada demais nelas — seus dedos finos, pele levemente bronzeada e… Seus anéis.

Anéis de prata.

— Não é prata pura, mas é o bastante pra dor ser muito irritante.

Mas que diabos—

— Então, não, as coisas não dão errado quando você tenta se aproximar de mim. Não é culpa sua. É-

— Não é sua também! — Yamaguchi exclamou, sua indignação o fazendo reorganizar seus pensamentos. Ele esfregou os olhos, ignorando os restos já arruinados de maquiagem. Então foi tudo… mal-entendido em cima de mal-entendido?

Tsukishima parecia ter extrapolado sua cota diária de expor seu coração em palavras e não falou nada. Ele olhava para suas pernas, focado nas suas mãos entrelaçadas. Yamaguchi nunca o tinha visto parecer tão incerto, tão… nervoso.

A visão fez seu coração amolecer completamente. Ele riu, sem um único traço de zombaria, e deitou a cabeça no ombro de Tsukishima. O outro tensionou em surpresa por um instante mas logo relaxou.

— Então… você gosta de mim? — Yamaguchi perguntou de novo; mas, dessa vez, seu tom estava leve como uma pena.

"Não foi porque eu não queria."

Ele já tinha uma ideia da resposta, afinal.

Essa é a sua preocupação?

— Só diga! Por favoooor~

— … Você já sabe.

— Não, não sei. — Yamaguchi sorriu inocentemente. — Você não vai falar alguma coisa tipo "E então o leão se apaixonou pelo cordeiro"? Ou morder meu pescoço de um jeito sexy? Onde está a minha experiência completa?

Tsukishima pressionou a mão contra sua testa e o empurrou até ele cair de costas na cama, rindo até seus músculos ainda doloridos protestarem.

— Se você só vai falar coisas sem sentido, use esse tempo pra tomar um banho e escovar os dentes.

Yamaguchi parou de rir, pensando em algo.

— Isso quer dizer que você não vai me deixar te beijar agora?

— Absolutamente não. — Ele se levantou e foi até a porta. Yamaguchi suspirou, derrotado. Ele supôs que aquilo era justo, ele faria o mesmo.

— E depois?

— … Você pode.

Ele ergueu o corpo e sorriu largamente.

— Como quiser, Tsukishima-san!

— Hm? Por que você está me chamando assim? — Tsukishima inclinou a cabeça. — Você estava tão criativo com nomes antes.

Yamaguchi ruborizou levemente, mas ainda disse:

— Okay, Tsukki.

Tsukishima virou para sair do quarto e dá-lo privacidade para se arrumar, mas Yamaguchi ainda conseguiu vislumbrar um pequeno sorriso no seu rosto antes de virar.

— Estarei esperando, então. — Ele fechou a porta atrás de si, deixando Yamaguchi sozinho para rolar na cama e dar gritos silenciosos. Ele esperava de coração que a audição de Tsukishima não fosse muito aguçada.

Quando ele colocou aquele anúncio no mural da universidade, Yamaguchi só estava esperando um aluguel mais barato e talvez um novo amigo — quem imaginaria que as coisas chegariam àquele ponto?

Yamaguchi se levantou e apressadamente entrou no seu banheiro. Ele ainda tinha um namorado (?) vampiro (!) para beijar.

EXTRA:

— Tsukki, por que você usa óculos?

— Porque minha devastadora beleza vampírica hipnotiza qualquer humano que me olhe nos olhos diretamente.

— Ahh, então é por isso que você sem óculos é tão… haha… cof cof.

— É claro que não, eu tenho miopia, Yamaguchi. Vampirismo não cura miopia. Espera, o que você ia dizer?

— N-Nada…

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.